POV ENRICADepois que Alicia comentou sobre Samuel, fiquei em silêncio por alguns segundos, mas a pergunta escapou antes que eu pudesse segurá-la.— Você… sente algo por ele? Por Samuel?Alicia piscou, surpresa.— O quê? — Ela riu, sem graça. — Samuel? Claro que não. Ele é um beta, Enrica. Isso nunca daria certo. Uma ômega como eu… como nós… é fadada a ser marcada por um alfa. É como as coisas são.A resposta dela me atingiu com um gosto estranho na boca. Havia um toque de desprezo em suas palavras. Ou talvez fosse só o reflexo de uma verdade social que nos foi imposta desde sempre. Mas ainda assim… doeu.— E o Oliver? — perguntei, tentando soar casual, mas o nome saiu quase sussurrado.Alicia bufou.— Oliver é irritante. Arrogante. Nunca me permitiria ser marcada por alguém como ele. Nem que fosse o último alfa do mundo.Ela disse isso com convicção, mas algo em seus olhos vacilou por um segundo. Um lampejo que ela rapidamente escondeu.E eu… não consegui evitar o pensamento.Quantas
POV ENRICAPassaram-se dias desde que encontramos o livro escondido. E apesar de todo nosso esforço, não conseguimos avançar muito mais do que aquelas páginas já diziam. Por mais que revirássemos registros antigos, genealogias confusas e mitologias entrelaçadas com realidade, tudo parecia… inconclusivo. Como se sempre faltasse uma peça para completar o quebra-cabeça.A biblioteca, que antes parecia um refúgio, começava a pesar. As paredes altas, repletas de conhecimento, agora soavam como um labirinto que não queria nos deixar sair. Alicia estava especialmente frustrada. Seus dedos folheavam os livros com agressividade crescente. O olhar, cada vez mais sombrio.— Isso aqui não leva a lugar nenhum — ela murmurou, empurrando um tomo grosso de lado.— Alicia… — tentei, mas ela me interrompeu com um gesto.— E se minha avó… e se ela estava envolvida com tudo isso? — a voz dela quebrou, embargada. — Com os laboratórios. Com os desaparecimentos. Com os testes. E meu irmão…Ela baixou a cabe
POV ENRICAEu não podia me perder nos meus próprios sentimentos. Não quando Alicia precisava de mim também. Então tentei sorrir e estar presente para ela. Caminhei para me aproximar dela quando uma tontura me pegou desprevenida.Apoiei as mãos na mesa, respirando fundo.— Enrica? — Alicia me olhou, preocupada. — Você tá bem?— Tô… só… talvez um pouco de fome. — Sorri, tentando disfarçar. — Nada demais.— Você vem dizendo isso há dias — ela rebateu, se levantando. — Eu vou pedir algo. Também tô faminta.Assenti, mas antes que ela desse um passo em direção à porta, uma das criadas entrou com uma reverência apressada.— Senhoritas… o senhor Oliver pediu que eu as levasse até ele. Ele as espera no jardim interno. — A moça sorriu com suavidade. — Está tudo pronto.— Tão rápido? — Alicia me lançou um olhar como quem dizia “lá vamos nós” e eu apenas sorri de volta, tentando afastar a estranha sensação que crescia no fundo do estômago.Seguimos a criada pelos corredores até um dos setores mai
POV ENRICAAcordei com a garganta seca, os lençóis ao meu redor embolados e o quarto mergulhado em um silêncio estranho. A luz do sol atravessava as frestas das cortinas pesadas, criando listras douradas no chão de pedra escura. Meus olhos ainda estavam pesados quando virei a cabeça para o lado e vi Alicia.Ela dormia em uma cadeira desconfortável, os joelhos encolhidos, a cabeça pendendo para o lado. A coluna torta denunciava o desconforto, mas o rosto… ela parecia exausta. E mesmo dormindo, não soltava minha mão.Fiz menção de me levantar, devagar, para não acordá-la, mas o leve movimento foi o suficiente para seus olhos azuis se abrirem num estalo.— Enrica? — A voz dela veio rouca, carregada de alívio e preocupação. Ela se endireitou com pressa. — Como você está?— Sede — murmurei. — Nada demais. Só…Antes mesmo que eu terminasse, ela já alcançava uma jarra com água e me servia, segurando o copo com as duas mãos trêmulas.— Aqui. Bebe devagar. — Seus olhos analisavam cada moviment
POV ENRICAO vento cortante soprava contra a cabana, uivando como uma entidade raivosa, mas foi outro som que me despertou no meio da noite. Um uivo, longo e carregado de um sofrimento que eu não sabia nomear. Não era apenas um chamado ou um aviso, era um lamento profundo, um grito de dor rasgando a escuridão.Sentei-me na cama, ofegante. Meu coração martelava forte contra o peito, a sensação de inquietação se espalhando por minhas veias como veneno. A lareira ainda crepitava, lançando sombras trêmulas contra as paredes de madeira. Mas o calor não era suficiente para abafar o arrepio que se arrastou pela minha pele.Outro uivo ecoou, mais fraco dessa vez, como se a própria noite estivesse engolindo sua força. Engoli em seco. Algo estava errado.Levantei-me sem hesitação, puxando um casaco grosso e calçando minhas botas. O medo sussurrava para eu ignorar aquele chamado, mas a curiosidade sempre foi um veneno que corriam em minhas veias. E eu precisava ver com meus próprios olhos o que e
POV ENRICAAproveitei o momento para agir. A luz tremulante da lareira iluminava os ferimentos abertos em seu pelo negro, o sangue escorrendo em filetes espessos. Precisava cuidar disso antes que a infecção fizesse seu trabalho.Peguei minha caixa de primeiros socorros, os dedos ágeis trabalhando com a familiaridade de anos lidando com agulhas e tecidos. Não era muito diferente.Ajoelhei-me ao lado dele e passei os dedos com cuidado sobre sua pele quente, identificando as flechas alojadas em seu corpo. Ambas exigiriam precisão para serem removidas sem causar mais danos.Respirei fundo e agarrei a haste da flecha do ombro, sentindo a rigidez da madeira sob meus dedos.— Isso vai doer…Ele dormia, mas sua respiração se alterou quando comecei a puxar. O som da carne se rasgando sob a pressão da retirada me fez prender o ar, mas continuei. Um último puxão, e a flecha deslizou para fora, trazendo consigo um fluxo quente de sangue.Imediatamente pressionei um pano limpo contra o ferimento. O
POV CALEBUm rosnado baixo escapou de minha garganta. Meu corpo ainda estava fraco, mas a necessidade de encontrá-la se sobrepôs à dor. Me obriguei a me mover. Cada músculo queimava. Meu peito protestou, minhas pernas tremeram.Mas eu não poderia simplesmente ficar ali.O piso rangeu sob meu peso quando consegui me erguer. Minha cabeça girou. Meu focinho captou um rastro fraco, e eu já estava pronto para segui-lo quando…A porta se abriu. Lá estava ela.Os cabelos ligeiramente desalinhados pelo vento frio. O olhar fixo em mim. O cheiro dela tomou o ar, afogando meus sentidos, preenchendo cada espaço vazio dentro de mim.Relaxei sem perceber. Ela voltou.— Eu trouxe frutas para você. — A voz dela era suave, mas hesitante. — Não tenho mais nada… Me desculpe.Ela se desculpava? Apenas a observei. Comida não era o que eu queria. Mas deixei que se aproximasse, sentando-se ao meu lado, oferecendo um pedaço da fruta.Seus dedos hesitaram antes de tocarem meu focinho. E quando finalmente tocar
POV CALEBO castelo surgiu no horizonte como uma sentinela silenciosa, um farol sombrio na vastidão gelada de Vartheos. As torres perfuravam o céu acinzentado, e as bandeiras negras tremulavam com o vento cortante, carregando o brasão do reino como um aviso.Eu deveria me sentir em casa. Mas não me sentia.Cada pedra, cada sombra naquele castelo deveria me ser familiar. Mas agora, parecia estranho. Como se eu fosse um estrangeiro em minha própria terra.O frio me recebeu como um golpe de lâmina quando pisei dentro dos portões. Meu corpo protestou contra a transformação, músculos enrijecidos queimando com a dor da mudança abrupta. Minha pele nua se arrepiou, e o vento cortante me lembrou de que eu ainda estava ferido, exausto e marcado pela batalha.Um dos guardas hesitou antes de retirar seu próprio manto e me estender, sem dizer uma palavra. Peguei a peça de roupa e a vesti rapidamente, cobrindo os cortes e hematomas que ainda latejavam. Meu corpo pulsava de dor, mas aparecer diante d