POV ENRICAPassei o restante do dia na biblioteca com Alicia. Entre livros, mapas e pergaminhos, deixamos o tempo escorrer com mais lanches do que descobertas. A conversa ia e vinha, às vezes descontraída, às vezes intensa. Mas servia para manter meu coração sob controle.Quando o sol começou a baixar, Alicia fechou o último tomo com um suspiro.— Você precisa descansar — disse ela, estalando os dedos e se espreguiçando. — Vai acabar sonhando com palavras antigas se continuar.— Eu podia ficar mais um pouco… — comentei, mordendo o lábio.— Só se quiser atrapalhar — retrucou, com um sorriso debochado. — Vai, vai. Amanhã tem mais. E eu preciso de um tempo longe de você. Tô ficando mole demais.Ri e aceitei. Saí da biblioteca com passos lentos, voltando ao quarto que agora era… meu. Ou dele? Ou nosso? Não sei.Os guardas me seguiram como sombras, junto com duas empregadas que não saíam do meu encalço. O tempo todo perguntando se eu precisava de algo, se queria mais travesseiros, se desej
POV ENRICA— E o que é isso? Encontro secreto ou grupo de leitura esotérica? — Oliver disse enquanto passava as mãos pelos livros espalhados na mesa.— Vai embora, alfa — Alicia respondeu, sem paciência. — Você já atrasa bastante a evolução humana, não atrasa nossos estudos também.— Que hostilidade… — ele entrou e puxou uma cadeira, se jogando nela com descaso. — E quando vai parar de me chamar de Alfa?— Você é um.Oliver bufou.— Enrica já chama Caleb pelo nome. Por que você não pode fazer o mesmo?— O quê? — disse sentindo o rubor subir pelo pescoço e ele deu uma risadinha.O tanto que Alicia revirava os olhos, parecia que eles iriam saltar das órbitas.— Você quer que eu chame o futuro rei pelo nome?— Não ele!Samuel suspirou.— O que faz aqui, Oliver?— Senti sua falta, conselheiro. Estava com saudade das suas teorias impossíveis.— Se continuar falando, vai sentir saudade do maxilar também — respondeu Samuel, sem nem disfarçar a irritação.— Até tu, Brutus?— Vocês dois discut
POV CALEBEla pediu. E o mundo parou.O sangue em minhas veias rugiu. Como se o próprio lobo em mim despertasse com um uivo surdo, feroz, primitivo. Cada fibra do meu corpo gritou para obedecer. Para tomá-la. Para marcá-la como minha.Mas eu travei.A respiração ficou presa. As mãos ainda estavam em sua cintura, mas rígidas. O olhar dela era um convite… e um salto no abismo.— Enrica…Minha voz saiu rouca. Quase irreconhecível até para mim.— Você não tem noção do que está me pedindo — murmurei, o peito subindo e descendo com esforço. — A marca… ela não é só uma mordida. É vínculo. Sangue. Alma. Dor. Desejo. É para sempre.Ela não piscou.— Eu sei — disse, e seus dedos tocaram meu rosto com a mesma firmeza de antes. — E eu escolho você, Caleb. Escolhi quando cuidei de você naquela noite. Escolhi quando não corri. E escolho agora. Porque você também me trouxe de volta.O lobo em mim parou de lutar.Ele se ajoelhou dentro de mim. Silencioso. Submisso. Como se reconhecesse a fêmea que o
POV ENRICAAcordei com a estranha sensação de que faltava algo.O quarto estava silencioso, banhado por uma luz suave que atravessava as cortinas esvoaçantes. O ar carregava o perfume dele — ferro, pinho e aquele algo inexplicável que só Caleb tinha. O calor ainda impregnava os lençóis, como se ele tivesse estado ali havia poucos minutos. Mas não havia sinal dele.Minhas mãos tatearam o lençol, o travesseiro… vazios.O corpo ainda doía. Não da forma ruim. Era uma dor funda, morna, que vinha da marca que ele deixara em mim. A mordida ainda ardia em meu ombro, mas era uma chama doce. Um lembrete de que eu agora pertencia a algo maior do que eu mesma. A ele.Mas onde ele estava?Me sentei devagar, puxando o lençol contra o peito. Meus olhos buscaram pistas pela imensidão do quarto. Havia uma rosa vermelha, agora tombada sobre o criado-mudo, como se tivesse desistido de se manter ereta. Uma camisa dele, esquecida sobre a poltrona. Um copo com água, pela metade, ainda com uma gota escorren
POV ENRICAO vento cortante soprava contra a cabana, uivando como uma entidade raivosa, mas foi outro som que me despertou no meio da noite. Um uivo, longo e carregado de um sofrimento que eu não sabia nomear. Não era apenas um chamado ou um aviso, era um lamento profundo, um grito de dor rasgando a escuridão.Sentei-me na cama, ofegante. Meu coração martelava forte contra o peito, a sensação de inquietação se espalhando por minhas veias como veneno. A lareira ainda crepitava, lançando sombras trêmulas contra as paredes de madeira. Mas o calor não era suficiente para abafar o arrepio que se arrastou pela minha pele.Outro uivo ecoou, mais fraco dessa vez, como se a própria noite estivesse engolindo sua força. Engoli em seco. Algo estava errado.Levantei-me sem hesitação, puxando um casaco grosso e calçando minhas botas. O medo sussurrava para eu ignorar aquele chamado, mas a curiosidade sempre foi um veneno que corriam em minhas veias. E eu precisava ver com meus próprios olhos o que e
POV ENRICAAproveitei o momento para agir. A luz tremulante da lareira iluminava os ferimentos abertos em seu pelo negro, o sangue escorrendo em filetes espessos. Precisava cuidar disso antes que a infecção fizesse seu trabalho.Peguei minha caixa de primeiros socorros, os dedos ágeis trabalhando com a familiaridade de anos lidando com agulhas e tecidos. Não era muito diferente.Ajoelhei-me ao lado dele e passei os dedos com cuidado sobre sua pele quente, identificando as flechas alojadas em seu corpo. Ambas exigiriam precisão para serem removidas sem causar mais danos.Respirei fundo e agarrei a haste da flecha do ombro, sentindo a rigidez da madeira sob meus dedos.— Isso vai doer…Ele dormia, mas sua respiração se alterou quando comecei a puxar. O som da carne se rasgando sob a pressão da retirada me fez prender o ar, mas continuei. Um último puxão, e a flecha deslizou para fora, trazendo consigo um fluxo quente de sangue.Imediatamente pressionei um pano limpo contra o ferimento. O
POV CALEBUm rosnado baixo escapou de minha garganta. Meu corpo ainda estava fraco, mas a necessidade de encontrá-la se sobrepôs à dor. Me obriguei a me mover. Cada músculo queimava. Meu peito protestou, minhas pernas tremeram.Mas eu não poderia simplesmente ficar ali.O piso rangeu sob meu peso quando consegui me erguer. Minha cabeça girou. Meu focinho captou um rastro fraco, e eu já estava pronto para segui-lo quando…A porta se abriu. Lá estava ela.Os cabelos ligeiramente desalinhados pelo vento frio. O olhar fixo em mim. O cheiro dela tomou o ar, afogando meus sentidos, preenchendo cada espaço vazio dentro de mim.Relaxei sem perceber. Ela voltou.— Eu trouxe frutas para você. — A voz dela era suave, mas hesitante. — Não tenho mais nada… Me desculpe.Ela se desculpava? Apenas a observei. Comida não era o que eu queria. Mas deixei que se aproximasse, sentando-se ao meu lado, oferecendo um pedaço da fruta.Seus dedos hesitaram antes de tocarem meu focinho. E quando finalmente tocar
POV CALEBO castelo surgiu no horizonte como uma sentinela silenciosa, um farol sombrio na vastidão gelada de Vartheos. As torres perfuravam o céu acinzentado, e as bandeiras negras tremulavam com o vento cortante, carregando o brasão do reino como um aviso.Eu deveria me sentir em casa. Mas não me sentia.Cada pedra, cada sombra naquele castelo deveria me ser familiar. Mas agora, parecia estranho. Como se eu fosse um estrangeiro em minha própria terra.O frio me recebeu como um golpe de lâmina quando pisei dentro dos portões. Meu corpo protestou contra a transformação, músculos enrijecidos queimando com a dor da mudança abrupta. Minha pele nua se arrepiou, e o vento cortante me lembrou de que eu ainda estava ferido, exausto e marcado pela batalha.Um dos guardas hesitou antes de retirar seu próprio manto e me estender, sem dizer uma palavra. Peguei a peça de roupa e a vesti rapidamente, cobrindo os cortes e hematomas que ainda latejavam. Meu corpo pulsava de dor, mas aparecer diante d