POV CALEB A respiração dela estava baixa, ritmada, como se o peso de suas próprias palavras ainda estivesse se acomodando dentro dela. Enrica não percebeu o impacto do que dissera, mas eu senti cada sílaba reverberando no fundo do meu peito.
Ela estava sozinha. E isso me incomodava mais do que eu queria admitir.
Seus dedos ainda estavam sobre minha pelagem, quentes, hesitantes, mas sem recuar. Seu cheiro oscilava entre incerteza e um alívio que me aquecia de uma forma inexplicável. Mas havia algo mais ali, escondido sob as camadas de controle que ela tentava manter. Um vazio.
— Às vezes, acho que me acostumei com isso — ela continuou, sua voz um sussurro para si mesma. — Mas noites como essa me lembram que não.
A forma como seu corpo se curvava levemente, como se estivesse acostumada a se manter pequena, invisível, me fez rosnar baixo. O som reverberou no fundo da minha garganta. Não era uma ameaça, mas carregava algo primitivo, algo que nem eu conseguia nomear.
Ela estava tão acostumada à solidão que aceitava isso como se fosse inevitável. Isso precisava mudar.
Me movi lentamente, aproximando-me mais. O calor do fogo atrás dela contrastava com o frio impregnado em meu corpo, mas nada parecia mais quente do que o cheiro dela preenchendo meus sentidos. Eu queria afastar aquela tristeza de todas as formas possíveis. Meu lobo queria que ela entendesse, sem palavras, que não estava mais sozinha.
Ela se mexeu levemente, surpresa com minha aproximação. Seus olhos verdes me encararam, inseguros, mas ela não recuou. Apenas respirou fundo, como se absorvesse minha presença.
Eu me ergui, deslocando-me lentamente até a frente do fogo, bloqueando a luz que antes banhava seu rosto. Minha silhueta se projetou sobre ela, imponente, instintivamente protetora. Eu queria que ela sentisse.
Sua respiração vacilou. Seus olhos se arregalaram quando, pela primeira vez, ela realmente viu o tamanho que eu tinha. Como se, sob aquela luz trêmula, a verdadeira extensão da minha presença se revelasse.
A pequena fagulha de medo que surgiu em seu cheiro me fez congelar. Ela não precisava temer.
Mas parte de mim gostou da forma como ela reagiu. Como seu corpo ficou tenso, como seus olhos brilharam com um reconhecimento involuntário. Eu era um Alfa. E ela sentia isso.
Tive que me conter para não me aproximar mais. Ela engoliu em seco, seus olhos percorrendo meu corpo com um misto de fascínio e hesitação. Eu podia sentir cada batida do seu coração. Cada mudança em sua respiração.
Meu desejo crescia e lutei contra isso. Contra a vontade de me transformar ali mesmo, de fechar a distância entre nós e reivindicar o que meu lobo já havia decidido ser meu. Então, me permiti observá-la.
Seus olhos eram tão verdes que pareciam capturar a luz do fogo. Eles brilhavam com algo que eu não conseguia decifrar, e me peguei encarando cada detalhe, cada pequena sardinha espalhada por sua pele pálida.
Eu queria tocar. Queria sentir.
Minha mente já imaginava como seria pressionar meus lábios ali, descobrir o calor do seu corpo de uma maneira mais íntima. O cheiro dela, doce e quente, me envolvia como uma corrente invisível, da qual eu não conseguia me livrar. Meu lobo queria mais. Ele queria tudo.
Minha imaginação me traiu.
Vi Enrica sob mim, sua pele marcada pelas minhas mãos, sua boca entreaberta soltando meu nome em sussurros ofegantes. Seu corpo delicado se arqueando em submissão voluntária, entregando-se ao que já era inevitável. Seus dedos deslizando hesitantes sobre meu peito e sua respiração entrecortada enquanto meus dentes deslizavam sobre a curva de seu pescoço, pronto para reivindicá-la. Nossos corpos unidos num prazer primal e profundo...
Minha. Apenas minha.
Meu lobo rugiu dentro de mim, incitando o instinto Alfa a tomar o controle. O desejo de protegê-la, de tomá-la, de garantir que nenhum outro macho jamais ousasse sequer pensar nela desse jeito, explodiu dentro do meu peito como um trovão.
Minhas presas brilharam à luz do fogo quando um rosnado escapou de minha garganta, uma ameaça silenciosa ao próprio ambiente. Meus olhos faiscavam, o peito subindo e descendo com a necessidade primitiva de agir.
Enrica arregalou os olhos e se levantou de supetão, o coração disparado, a respiração curta. O cheiro dela mudou no mesmo instante. Um misto de surpresa e receio.
Droga. O que eu estava fazendo? Meu controle estava se esvaindo como areia entre os dedos.
Eu queria marcá-la. Agora. Meus instintos gritavam que aquilo era certo, que eu precisava fazer isso antes que algo ou alguém tentasse tirá-la de mim. Mas ceder significaria cruzar um limite do qual não haveria volta.
Fechei os olhos por um instante, forçando-me a respirar, a conter o impulso avassalador que fazia meus músculos tensionarem. Minhas garras fincaram o chão de madeira, o último resquício de autocontrole que eu ainda possuía.
Se eu não tomasse cuidado, se permitisse que essa necessidade falasse mais alto...
Não podia assustá-la. Não podia perdê-la.
Quando abri os olhos novamente, Enrica me observava com cautela, o cenho levemente franzido.
— O que foi isso? — sua voz era baixa, hesitante.
O queixo dela ergueu um pouco, como se tentasse esconder qualquer receio que pudesse ter sentido. Mas eu senti. Senti o nervosismo em sua respiração, o modo como seus dedos se fecharam ao lado do corpo.
Ela estava sentindo minha mudança.
— Você está bem? — perguntou, inclinando levemente a cabeça, os olhos verdes perfurando os meus.
Meu lobo rugiu em resposta, mas dessa vez, em silêncio dentro de mim. Como diabos eu poderia estar bem, quando cada fibra do meu ser me empurrava para ela? Quando tudo dentro de mim berrava que eu precisava fazê-la minha antes que fosse tarde demais?
Eu apenas respirei fundo, tentando conter o ímpeto de fazer exatamente o que meu lobo desejava.
A conexão entre nós estava ficando forte demais, intensa demais. E eu não sabia por quanto tempo mais poderia me segurar.
Seus olhos verdes me avaliavam, analisando cada centímetro do meu corpo lupino como se tentasse decifrar um enigma que não conseguia compreender. Seus dedos tremiam levemente ao lado do corpo, e eu podia sentir o cheiro suave de sua dúvida misturado à ansiedade. Ela queria se aproximar. Seu corpo respondia ao meu, mesmo que sua mente ainda lutasse contra isso.
Avancei um pouco, mantendo meus movimentos lentos, cuidadosos. Eu queria que ela entendesse que eu não era uma ameaça. Que nunca seria. Meus olhos se fixaram nos dela, minha respiração quente escapando em baforadas suaves na pouca distância que nos separava.
Ela estendeu a mão, hesitante, seus lábios se entreabrindo como se quisesse dizer algo, mas se conteve. Suas pupilas dilataram, o coração acelerado bombeando sua essência pelo ar. Meu lobo rugiu em satisfação silenciosa. Ela sentia a conexão, mesmo sem entender o que era.
E então, seus dedos tocaram algo inesperado. Meu pingente.
Passou o polegar devagar sobre os símbolos cravados na joia. Meus músculos tensionaram no mesmo instante. O olhar dela se fixou na peça de metal, e sua expressão mudou. Curiosidade, surpresa… suspeita.
— O que é isso? — murmurou, passando o polegar lentamente sobre o brasão de Vartheos gravado na joia. — Você pertence ao castelo?
O simples som daquela pergunta fez algo em mim se incendiar. Meu pelo se eriçou, e minha respiração ficou mais pesada. Pertenço? Como se eu fosse um objeto, uma posse insignificante dentro daquelas muralhas? Um mero cão de guerra a serviço de uma coroa?
O lobo dentro de mim rosnou de indignação, mas me forcei a permanecer imóvel. Ela não fazia ideia de quem eu era. Mas mesmo assim, o incômodo se instalou sob minha pele como uma maldita farpa.
Ela girou o pingente entre os dedos, estudando o brasão gravado nele.
— Você é um cão de guerra real, não é? — continuou, a ponta dos dedos ainda roçando o pingente. — Um soldado de elite, treinado para lutar.
O gosto amargo daquelas palavras me atingiu como um soco. Um cão de guerra. Um peão descartável no tabuleiro de Vartheos. Se eu estivesse em minha forma humana, teria rido. Eu não era um cachorro do rei. Eu seria o rei.
E, apesar da raiva queimando em meu peito, meu lobo captou algo diferente nela. Não era desprezo nem frieza. Era preocupação.
— Você se machuca muito? — sua voz saiu mais baixa, carregada de um peso que não deveria estar ali. — Eles fazem você lutar? Como um animal?
Ela mordeu o lábio, e algo em sua expressão se fechou. Seus olhos brilhavam, as sobrancelhas franzidas em um gesto de angústia.
— Isso não é certo… — murmurou, quase para si mesma.
Meu peito se apertou. O cheiro dela mudou. A tristeza que escorreu de seu corpo atingiu meus sentidos como uma lâmina invisível. Foi tão repentino que quase perdi o controle.
Ela estava… sentindo por mim. Não me via como uma ameaça, como um monstro. Mas como algo que precisava ser protegido.
A ideia deveria me irritar. Eu era um Alfa. Um rei. Eu não precisava de proteção. Mas, por algum motivo, a dor silenciosa em sua voz me desestabilizou mais do que qualquer batalha.
E então, fiz o impensável.
Antes que pudesse me conter, antes que minha mente racional tivesse tempo de processar o erro colossal que estava prestes a cometer… me inclinei e passei a língua quente por sua bochecha.
Ela congelou. O choque brilhou em seus olhos, o corpo paralisado, a respiração presa no peito.
Merda. Minha mandíbula se travou, e o desejo cresceu dentro de mim como uma fera fora de controle. O gosto dela estava em minha boca. Suave. Viciante. E eu queria mais.
Eu precisava sair dali. Agora. Se eu ficasse por mais tempo… eu não conseguiria mais parar.
POV ENRICAO lobo diante de mim estava tenso, os olhos vermelhos brilhando como brasas enquanto me observava de perto. Meu coração ainda batia rápido depois do que ele tinha feito. Eu deveria estar assustada, deveria querer distância depois daquele gesto inesperado. Mas, por algum motivo, não consegui me afastar.Passei a língua pelos lábios, sentindo a pele quente onde a língua áspera dele havia tocado. Minha mente gritava que aquilo não fazia sentido, que eu deveria me afastar, mas meu corpo parecia reagir a ele de uma maneira que não conseguia controlar.Suspirei, tentando aliviar a tensão.— Acho que meus hormônios estão desregulados — murmurei, mais para mim mesma do que para ele. — Tem acontecido com frequência… essa sensação estranha, como se meu corpo estivesse mudando. Talvez seja por isso que os homens ficam tão esquisitos perto de mim.O lobo moveu-se ligeiramente, as orelhas se erguendo. Ele estava atento, absorvendo cada palavra.— Não sei o que é exatamente — continuei,
POV ENRICAEu ri sem humor, desviando o olhar.— Estou bem, Marco — respondi com leveza, pegando uma maçã da barraca ao lado. — Só… tem sido um inverno difícil. Ele suspirou, cruzando os braços. — Você devia sair daquela cabana, sabia? Viver sozinha no meio da floresta não é seguro. Apertei os lábios, sentindo o mesmo aperto de sempre quando esse assunto surgia.— Eu já te disse. Não posso. É o último lugar que ainda me liga aos meus pais. Marco me observou por um instante, sua expressão suavizando. — Eu entendo, Rica. Mas isso não significa que você precisa se isolar. Desviei o olhar, focando na maçã em minhas mãos. Antes que ele pudesse continuar com seu sermão, algo chamou minha atenção.O jornal dobrado embaixo do braço dele.— O que é isso?Marco seguiu meu olhar e bufou. — Ah, só mais um artigo sobre a realeza. Ele desdobrou o jornal e mostrou a página principal. Meu olhar foi direto para a imagem de um homem de aparência imponente. Príncipe Caleb de Vartheos. H
POV ENRICAO rosnado reverberou pela cabana, baixo e carregado de algo que eu não conseguia identificar completamente. Meu corpo enrijeceu, os pelos da minha nuca se arrepiaram, e, por um instante, o ar ao meu redor pareceu pesado, espesso. Virei-me devagar, encontrando os olhos vermelhos incandescentes cravados em mim. Mas havia algo errado naquele olhar. Ele me observava de um jeito diferente, como se estivesse me vendo pela primeira vez. O som ameaçador cessou, mas a tensão não desapareceu. Seus músculos estavam rígidos, os pelos eriçados, o corpo maior do que nunca. — Ei… — minha voz saiu baixa, hesitante. O lobo avançou um passo brusco, e um arquejo escapou dos meus lábios enquanto meu corpo reagia por puro instinto, recuando contra a bancada. Meu coração disparou, e por um instante, a ideia de que ele me atacaria cruzou minha mente. Mas não havia agressividade em seus olhos. Havia algo muito, muito pior. O peso da sua presença me cercava sem que ele precisasse sequ
POV CALEBNo instante em que senti o cheiro, soube que algo estava errado. Não era o vento frio da floresta, nem a umidade da madrugada. Era um vestígio. Fraco. Quase imperceptível. Mas presente.Meu lobo reagiu antes de mim, os pelos se eriçando em um alerta silencioso. Meu faro se expandiu, procurando qualquer sinal de movimento, qualquer ameaça que se escondesse na escuridão. Algo esteve aqui. Algo que não deveria estar.Mas não havia nada. Somente o silêncio absoluto da floresta. Meus músculos se retesaram, e meu lobo rugiu em silêncio. Eu não gostava disso. A sensação de que algo espreitava na sombra. Meus olhos percorreram a área, minhas garras se cravaram no chão. Não importava quem ou o quê estivesse ali. Eu não deixaria nada chegar até ela.Fortaleci minha marca na cabana, roçando meu cheiro contra a madeira de forma mais agressiva, deixando um aviso ainda mais claro. Se alguém ousasse entrar naquele território, eu arrancaria sua garganta com os dentes.Mas isso não era o
POV CALEBMe sentei no muro de pedra do castelo, o vento frio cortando minha pele enquanto meus olhos percorriam a cidade abaixo. As luzes tremulavam como estrelas presas no chão, as ruas ainda movimentadas, mesmo com a noite avançada. O reino que esperava que eu seguisse as tradições, que eu me dobrasse às suas exigências, que eu me tornasse um rei moldado por suas vontades.Mas minha mente não estava ali. Estava a quilômetros de distância, em uma cabana isolada na floresta.Em Enrica.Minha mandíbula se contraiu ao lembrar do cheiro dela, do jeito que sua voz preenchia aquele espaço pequeno e quente, da forma como seu olhar me atravessava sem nem ao menos perceber. Eu sentia o peso de sua solidão, e isso me enfurecia mais do que eu gostaria de admitir. Não deveria me importar. Mas a verdade era que eu queria voltar. Agora.Minhas mãos se fecharam em punhos. Meu dever estava aqui, mas cada fibra do meu corpo gritava que o meu lugar era ao lado dela.Como eu poderia conciliar as duas
POV ENRICAO vento cortante soprava contra a cabana, uivando como uma entidade raivosa, mas foi outro som que me despertou no meio da noite. Um uivo, longo e carregado de um sofrimento que eu não sabia nomear. Não era apenas um chamado ou um aviso, era um lamento profundo, um grito de dor rasgando a escuridão.Sentei-me na cama, ofegante. Meu coração martelava forte contra o peito, a sensação de inquietação se espalhando por minhas veias como veneno. A lareira ainda crepitava, lançando sombras trêmulas contra as paredes de madeira. Mas o calor não era suficiente para abafar o arrepio que se arrastou pela minha pele.Outro uivo ecoou, mais fraco dessa vez, como se a própria noite estivesse engolindo sua força. Engoli em seco. Algo estava errado.Levantei-me sem hesitação, puxando um casaco grosso e calçando minhas botas. O medo sussurrava para eu ignorar aquele chamado, mas a curiosidade sempre foi um veneno que corriam em minhas veias. E eu precisava ver com meus próprios olhos o que
POV CALEBA escuridão sempre foi minha aliada. Nela, eu caçava, matava e sobrevivia. Mas agora, ela parecia diferente. Densa. Sufocante. Como se tentasse me arrastar para um vazio do qual eu não poderia escapar.Então, algo cortou a escuridão.Um cheiro. Doce, quente. Nada como o sangue ou a terra molhada que eu estava acostumado. Era reconfortante, mas, ao mesmo tempo, errado. Um erro que me fazia querer me afundar nele.Meu corpo protestou ao mínimo movimento, a dor queimando por cada fibra dos meus músculos. Mas o cheiro persistia, se infiltrando em minha mente, me puxando para longe da inconsciência.Meus olhos se abriram.A visão ainda estava turva, mas clara o suficiente para perceber que eu não estava mais na floresta. O calor envolvia meu corpo, uma luz branda tremulava nas sombras. Pisquei algumas vezes, tentando me situar.E então, eu a vi.Os olhos verdes.Os mesmos que me fitaram antes da escuridão me consumir. Agora, estavam ali de novo. Observando. Medindo. Seu olhar era
POV CALEBO castelo surgiu no horizonte como uma sentinela silenciosa, um farol sombrio na vastidão gelada de Vartheos. As torres perfuravam o céu acinzentado, e as bandeiras negras tremulavam com o vento cortante, carregando o brasão do reino como um aviso.Eu deveria me sentir em casa. Mas não me sentia.Cada pedra, cada sombra naquele castelo deveria me ser familiar. Mas agora, parecia estranho. Como se eu fosse um estrangeiro em minha própria terra.O frio me recebeu como um golpe de lâmina quando pisei dentro dos portões. Meu corpo protestou contra a transformação, músculos enrijecidos queimando com a dor da mudança abrupta. Minha pele nua se arrepiou, e o vento cortante me lembrou de que eu ainda estava ferido, exausto e marcado pela batalha.Um dos guardas hesitou antes de retirar seu próprio manto e me estender, sem dizer uma palavra. Peguei a peça de roupa e a vesti rapidamente, cobrindo os cortes e hematomas que ainda latejavam. Meu corpo pulsava de dor, mas aparecer diante