O calor de Duncan irradiava nas minhas costas, uma presença sufocante que me fazia estremecer, embora ele ainda nem tivesse se encostado em mim. Abracei-me com mais força ao edredom e me encolhi, como se pudesse me proteger da proximidade dele. O cheiro de nicotina estava presente suavemente no ar, se misturando ao seu aroma amadeirado e cítrico.Meu coração disparava com a ideia de que ele pudesse colocar a mão em mim de alguma forma. Afinal, éramos noivos, mas não tínhamos nenhuma intimidade. Quando pensei que ele pudesse gostar de mim, tudo se revelou como uma jogada suja, um truque de cartas. Duncan era o tipo de jogador que escondia suas cartas, que nunca mostrava todos os naipes que tinha à disposição e, por algum motivo, isso me deixava desconfiada e irritada.A personalidade dele era incrivelmente fora do comum e surpreendente, mas também assustadora. Eu não estava preparada para lidar com um homem como ele, doze anos mais velho e cheio de segredos. Ele já era um homem formado
— As estradas estão fechadas, senhor — disse o concierge, devolvendo o cartão de crédito preto para Duncan. Sua voz ressoou pelo saguão luxuoso e vazio do hotel. Eu me vi encarando Duncan, cuja expressão mostrava um breve descontentamento com a notícia.Acordei mais tarde para encontrar Duncan já vestido, eu me apressando para nos prepararmos. Minhas roupas novas haviam chegado, e eu optei por um conjunto confortável de calça jeans e suéter, adequado para a longa viagem de carro. Depois de algumas palavras rápidas no elevador com seus dois guardas, concordamos em sair para comer no caminho de volta para casa, saindo do hotel na esperança de chegar antes do anoitecer.— Che palle! Mas o que aconteceu? — Duncan questionou, sua frustração transparecendo em cada palavra.— Um acidente com colisão e incêndio, senhor — explicou o homem atrás do grande balcão de madeira maciça. — Não é algo comum de acontecer, sinto muito.— Ah — murmurei, sentindo um arrepio percorrer minha espinha. — Então
Meus pensamentos estavam em um turbilhão, minha cabeça girava. O silêncio no táxi me trouxe um pouco de calma e peguei o celular, com a mão trêmula, buscando encontrar um destino para acalmar meus nervos e reorganizar pensamentos.Veneza tinha vários lugares, mas alguns eram chatos demais ou movimentados demais, acabei escolhendo uma galeria de arte que não ficava muito próxima.Arte sempre me trouxe uma forma de paz, motivo pelo qual eu comecei a pintar, primeiro era terapêutico e depois se tornou uma forma de expressão. Olhar para arte era uma tentativa fraca de me reconectar comigo mesma.Pedi ao motorista que me levasse até lá e ele concordou.Meu coração ainda estava a milhão quando entrei na galeria e foi até estranho ser abruptamente envolvida pelo silêncio reverente e a luz suave que banhava as obras de arte. Respirei fundo absorvendo o ambiente e acalmando aos poucos minha alma.Duncan era um maldito furacão incontrolável! Eu sei que não sou fácil, mas ele conseguia despertar
O perfume amadeirado e cítrico deu lugar ao forte aroma de café torrado e manteiga conforme nos aproximávamos da cafeteria. Indiquei silenciosamente uma mesa próxima a um enorme painel fotográfico, repleto de imagens antigas da cidade. O tom sépia das fotos trouxe um alívio aconchegante aos meus olhos.Ao me sentar, olhei para Duncan e percebi algo inquietante nele. Pela primeira vez, seu sobretudo não estava perfeitamente alinhado nos ombros, pendendo ligeiramente para a direita. Seus olhos escuros tinham um leve contorno avermelhado, que o fazia parecer alterado.Senti nervosismo e culpa enormes ao olhar para ele. Duncan parecia realmente abalado pelas minhas palavras e atitudes, o que me deixou chocada. Não esperava que ele reagisse assim. Meu coração estava apertado, devastado, por estar noiva dele em pura obrigação e eu me sentia sufocada por sua presença tão marcante e intensa. É pior que andar em uma montanha russa… eu nunca fui muito fã de grandes aventuras, gosto de rotina e
As palavras que eu tanto esperava finalmente saíram da boca de Duncan:— Entendo o quanto isso é importante para você. — Soltou um suspiro genuíno, pesado. — Não estou ignorando a seriedade da situação, só… preciso de um pouco de tempo para encontrar as palavras certas.Não imaginei que Duncan Delvecchio era um homem que tinha dificuldade de se comunicar. Ele sempre me pareceu alguém que se destacava pela sua presença marcante, um homem com uma aura de confiança quase arrogante. Ele parecia direto e espontâneo, como se tivesse um roteiro a ser seguido… ou nenhum, dado o quanto eu sabia sobre ele. Sua extrema capacidade de improvisar nas situações mais inesperadas dava-lhe uma impressão de desdém pelas regras convencionais e um talento inato para lidar com a vida de maneira audaciosa. Essa revelação foi um choque. O homem que eu pensava ser um estrategista infalível e um mestre das palavras revelava, na verdade, um lado vulnerável que lutava para se expressar de maneira clara.O garço
O caminho até o vaporetto foi envolto em um silêncio contemplativo, com nossos passos ecoando suavemente nas ruas desertas. Veneza parecia ainda mais encantadora à noite, com as luzes refletidas nos canais criando um brilho suave e mágico. Foi naquele momento, quando Duncan tomou o chá apesar da careta que fez, que percebi o quanto ele realmente me afetava. Aquele gesto simples era a prova que eu precisava de que ele estava disposto a fazer nosso relacionamento funcionar.Enquanto caminhamos, Duncan tirou seu sobretudo preto e o colocou sobre meus ombros com uma gentileza inesperada. Ele tem suas virtudes, afinal.— Está esfriando. — disse ele calmamente, ajustando o casaco sobre mim.— Obrigada. — sorri em agradecimento, sentindo o calor de suas roupas me envolver como um abraço.Eu adorava quando ele demonstrava cuidado comigo, quando parecia preocupado e perturbado. A ideia de que eu mexia com ele de alguma forma me dava uma sensação reconfortante e única, uma sensação de pertencim
Um grito estridente escapou de meus lábios enquanto desferia socos frenéticos no saco de pancadas da academia. O impacto reverberava pelos meus braços, meu corpo inteiro vibrava com a descarga de adrenalina, enquanto minhas mãos ardiam dentro das luvas. Os golpes eram uma explosão de raiva e frustração, um desabafo silencioso de dor e fúria. A academia estava envolta em um silêncio tenso, interrompido apenas pelo som repetitivo dos meus socos e pela respiração ofegante que escapava de minha boca.Maldito seja, Duncan Delvecchio! Ele não vale nada, nem mesmo um centavo! Ele me enganou, me iludiu com promessas vazias... Lembro-me daquele olhar falso, das palavras mentirosas que ele usou para me manipular. Um traidor! Ele é um verme desprezível! Não consigo acreditar que eu quase permiti que ele me beijasse! A traição dele ainda estava fresca em minha mente, um corte profundo que parecia não cicatrizar.— Vicenza! — minha treinadora, a morena Imelda, exclamou, com uma expressão de desap
— Qual dos capachos ele enviou? — perguntei, minha voz carregada de desdém.— Pietro Labruto! — Ottavia revelou, cortando o ar com um dedo em riste, como se estivesse apresentando um espetáculo. Percebi a careta em meu rosto e ela acrescentou rapidamente: — Ele é muito mais bonito pessoalmente do que nas fotos!Fiquei alguns segundos parada, tentando lembrar quem era Pietro Labruto. Peguei a toalha e sequei o suor do rosto. Então, como um estalo, me dei conta de quem ela estava falando. Meu queixo caiu em surpresa.— Não é aquele que teve o escândalo com a irmã dele? — perguntei, perplexa.— Exatamente ele.Coloquei minha garrafa dentro da bolsa da academia cor-de-rosa e fechei o zíper com força, meus movimentos bruscos revelando a raiva que ainda consumia cada parte de mim. Se eu havia amolecido antes, agora sentia o fogo da frustração enchendo minhas veias novamente.Concluí que Duncan Delvecchio era um covarde. Ele não tinha coragem de me encarar diretamente.— Cancelei cinquenta