Primeiro Dia

Depois do sonho motivador que tive, o dia mal acabou de nascer e eu já estava de pé, tomando meu café preto, e comendo um pão caseiro que minha mãe tinha mandado. Já tinha tomado meu banho e me certifiquei de estar com todas as peças que compõe uma roupa adequada. Seis e meia ele passaria para me levar e eu esperei.

Já tinha passado quase dez minutos, e ele não vinha.

Eu peguei minha bolsa, minhas chaves, e saí, na esperança de ver ele saindo também. Mas nada, o corredor estava vazio, respirei fundo e peguei o elevador, desci, saí para a rua, e fui tentando me lembrar onde era.

Depois de meia hora andando, me perdendo e voltando, comecei a xingar Marcelo mentalmente. Pelo menos eu cheguei na faculdade.

Entrei correndo como.no sonho, me informei onde era a sala, que ficava no quarto andar, e que, não tinha elevador disponível. Acho que emagreci uns quilos.

Meu professor me recebeu de cara feia. Pedi desculpas, e ele apontou um lugar meio no fundo da sala para mim.

Assim que sentei, eu reparei uma loira aguada rindo de mim, e falando com outra loira aguada com jeito de burra. Até olhei para baixo, vai que tinha esquecido a calça em casa.

Mas estava tão feliz por estar lá que nem liguei, afinal de contas, ia ser uma fisioterapeuta.

Enquanto o professor explicava às matérias, e os horários da aula, eu ouvia a voz do meu pai na minha mente, cada palavra tinha um peso na minha vida . O olhar triste dele, agora me dava pena. Ele se sacrificou por mim a vida toda. Essa faculdade era o mínimo que eu fazia por ele.

Tivemos um dia cheio, conheci mais alguns professores, tivemos a prévia de cada matéria e a relação dos livros que Marcus já tinha me comprado e deixado em casa.

— Por hoje vocês estão dispensados.

Fui saindo da enorme sala, o professor dizendo um tchau, ou bons estudos pra cada grupo que passava. Quando passei pelas coisas loiras ridículas, elas riram tão alto que o restante dos alunos na sala pararam para olhar. Confesso que minha vontade era voar no pescoço delas, e torcer, mas, dei meu olhar cínico de espanto, e passei por elas.

Voltar para casa foi estranho. Me situei e voltei, meio que seguindo umas pessoas. São Paulo era lindo, mesmo que cheio de gente, um movimento de carros que Deus me Livre. Mas não deixava de transmitir o vai e vem de gente como eu. Que deixou a casa e foi em busca dos sonhos. Trabalho, estudo. Tudo isso resumia São Paulo.

Parei em algumas lojas só para olhar mesmo. Não tinha um real furado no bolso. Em cada loja que passava, pensava "Um dia entro aqui e compro tudo o que me der vontade". Grande mentira. Quando tiver meu dinheiro, sei que vou segurar até o último. 

Também vi coisas para os meus irmãos, minha mãe e meu pai.

Não falaria na frente deles nem sob ameaça de morte, mas estava sentindo muita falta deles.

Quando cheguei na minha nova casa estava cansada, com fome e sono. Na época que morava com a minha mãe, era só chegar, comer e dormir. Agora porém, ou fazia ou morria de fome. 

Fiz. Arroz branco, frango grelhado e salada. Para temperar usei minhas lágrimas.

Pois é, odiava comer rodeada de criança bagunçando na mesa. Agora com o silêncio que eu tanto quis, chorei. Chorei tanto que nem senti o gosto da comida. 

Lavei meus pratos e guardei. Já tinha lição de casa. Quando terminei, ainda eram seis horas da tarde. Liguei a TV e deixei passando novela, dormi, acordei e dormi de novo.

Meu vizinho ou era muito silencioso, ou tinha rodinhas nas pernas. Cheguei até colocar o ouvido na parede, não escutei nada. Por certo estava fugindo de mim. Não ia querer chegar com uma pobre de meio metro na faculdade. 

— Besteira. - Me repreendi. — Ele deve ser mais feio que eu. Certeza que é isso.

Besteira ou não, deitei no sofá de orelha em pé. Era estranho morar em um apartamento. Dava para ouvir algumas coisas dos vizinhos de baixo. Por exemplo, os pratos, talheres, uma pequena briga que a dona da casa teve com a Dona Jurema, seja ela quem for, era uma guerreira, eu tinha dado uma de louca e quebrado tudo. Me sentia em uma gaiola, não tinha o gramado para andar, nem as frutas para tirar do pé, e muito menos a emoção de correr dentro de casa, caso um morcego entrasse. Era quase tão divertido quanto ir em algum parque.

Depois de uns dias nem a piscina é tão legal assim. A água parada e cheia de produtos ressecou meu cabelo. Os dias ensolarados quase não se viam.

Por fim, vencida tomei um banho, coloquei minha roupa de dormir e deitei na cama espaçosa de barriga para cima. Fiquei olhando as ondas que a piscina fazia no teto do quarto e dormi. 

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