A Primeira Impressão É A Que Fica

— Te amo filha.

— Mãe credo! Não chora tá! Daqui á duas semanas estou aqui de novo.

— Eu sei, mas você sempre vai ser minha pequena.

Abracei minha mãe pela enésima vez e, entrei no carro.

— Partiu São Paulo. – Meu pai me olhou de lado.

Tinha um medo terrível de sofrer com piadinhas. Aqui em São Carlos me chamavam de Filha do Curupira, ou Caipora. Cabelo de fogo foi o mais bonitinho. Isso tudo por causa dos meus um metro e sessenta, e se não bastasse, meus cabelos ruivos dão o toque final. Já sofri muito bullyng, mas nem ligo. Gosto de usar jeans, camiseta e botas. Nada de vestidos, brincos, muito menos maquiagem. Fico igual ou pior que uma palhaça as vezes. E não é nada pratico quando tenho que ajudar meu pai na roça.

No caminho, paramos tanto que nem achei que íamos chegar nessa semana, meu pai ia me levar e trazer o amigo dele pra passar uns dias lá em casa.

O clima era de tensão, da minha e da parte dele.

Conversamos bastante, rimos e quando o assunto ia ficar xoxo conectei meu celular no carro e coloquei minha playlist favorita.

Leandro e Leonardo.

Acabei dormindo, e quando acordei estávamos parados no trânsito.

- Achei que tinha morrido. – Meu pai brincou.

-Onde estamos?

-Indo ao encontro do meu amigo. – Ele deu seta e saiu da pista.

- Da onde o Senhor conhece ele? - Sentei lentamente. Meu pescoço estava duro.

- Trabalhei com ele muito tempo, aí ele casou com uma moça daqui, e veio embora.

Não conhecia nada mesmo, meu pai olhava atento para o celular, parou o carro e o desligou.

— Pai.. – Ia dizer que ficar parado em São Paulo não era nada bom. Ainda mais para dois caipiras.

Com o fazedor de côco na mão comece a olhar em volta. Precisa que estávamos sendo observados. E foi aí que algum filho da mãe deu uma batida na janela, bem do meu lado, quase me fez soltar a bexiga.

— É ele, vamos ...

O infeliz estava rindo.

Depois que bateu na porta e me fez pular. Marcus correu de volta ao carro e deu sinal para a gente segui-lo. De manhã cedinho é meio frio, então me enrolei na minha coberta quentinha e peguei no sono de novo.

— Eita menina preguiçosa.

(***)

Na minha inocência achei que o apartamento seria uma coisa pequena e cheia de baratas. Mas era lindo, grande, pelo menos por fora. A entrada era toda em piso salmão. Tinha elevador, porteiro, vasos enormes com planta, parecia um hotel. O amigo do meu pai estava esperando a gente com aquele sorriso besta.

Um homem alto, moreno, cabelos lisos com algumas mechas brancas.

— Olha, menina você cresceu hein!

— Oi, Marcus, muita gentileza sua, mas sei que não cresci muito.

Marcus riu tão alto, que até o porteiro veio ver. Que vergonha.

— Vamos lá, para a sua nova casa, espero que goste.

Era no último andar, e o único no andar. Ele contou que tinha dividido o apartamento com paredes de gesso, já que era há cobertura, e não tinha necessidade de uma coisa tão grande para o único filho dele, que mal ficava em casa.. Aliviada por ter de entrar ali sozinha notei duas portas lado a lado.

— A outra parte eu deixei pro meu filho. Ele é meio temperamental sabe. - Ele me deu uma piscadinha.

Bom, já deu pra ter uma noção do meu novo vizinho, que além de chato devia ser esses meninos magrelos e revoltados de faculdade.

Ele nos mostrou cada canto do meu novo lar.

— Espero que não fique brava, eu a esposa compramos coisas para você.

Realmente o apartamento era um mini luxo.

— Agradeço Marcus, não precisava ser tão chique assim.

— Imagina, fiz por você o que o seu pai faria pelo meu filho. – Ele bagunçou o meu cabelo. — Agora vamos comer alguma coisa. Preparamos um almocinho lá em casa.

Meu pai nem olhou na minha direção, já foi aceitando e me largando para trás. Fomos no carro dele. Um maravilhoso  SUV preto.

A casa era linda, enorme, com muros altos todo em pedras, algumas partes pintados na cor vermelha. O portão preto automático era enorme. Lá dentro dois cachorros pretos grandalhões vieram pulando até ele.

- Oi meninas, cade a Paula?

Aqueles cachorros, tipo mini pôneis foram correndo buscar a dona da casa.

A esposa era linda, uma senhora bem chique dos olhos claros e cabelo totalmente brancos cortados Chanel,, e bem educada.

Veio na minha direção de braços abertos.

— Como você está linda, tenho umas fotos sua, você era tão fofinha. Entra, vamos comer alguma coisa vocês devem estar com fome. — Ela sorriu para mim, e eu? Me encolhi.

Como se não fosse possível dentro da casa era mais lindo ainda. A casa toda tinha detalhes de madeira antiga, a sala de jantar, tinha uma mesa tão grande que cabia as duas famílias juntas.

— Marcus ligou paro o nosso filho, mas ele não vai conseguir chegar a tempo, depois ele passa lá pra dizer um oi. - Ela pegou na minha mão por cima da mesa e apertou. Que mulher chique.

Nossa que pessoa mais mal-educada, todo filho de rico é feio, e mimado. Deve ter vergonha, ou nojo de dois pobres entrar na casa dele.

Passamos bastante tempo lá, tivemos o pré-almoço, depois a churrascada a lá pobre, um café da tarde bem farto, e nada do Marcelo. Quando o relógio estava marcando oito horas da noite, meu pai começou pedir para ir embora. Gente do interior, dorme com as galinhas.

Depois de muito insistir, Marcus e a esposa nos deixaram em minha nova casa. Ficamos dando tchauzinho com a mão feito dois trouxas até o carro sumir na rua. Respirei fundo e segui meu pai para dentro. Subimos pelo elevador em silêncio. A porta abriu e nós saímos para o corredor vazio.

— Pai, tomara que não tenha assombração nesse lugar Você sabe né? Aquele maldito filme o edifício Joelma nunca mais vai sair da minha mente.

— Podia te assombrar mesmo, fofoqueira. Aquela sua gritaria na madrugada fez a sua mãe brigar comigo quase a noite toda. – Ele me olhou atravessado.

— Tenho medo né. Imagina, acordar e ver que já partiu?

—Deixa de conversa afiada e abre logo essa porta, preciso aliviar a barriga, tomar um banho e dormir. Amanhã tenho estrada de novo.

— Beleza.

Assim que girei a chave a porta se abriu, sem ranger como uma risadinha diabólica, só abriu e nós entramos. Anda ficava maravilhada com a minha nova casa.

Mesmo partido no meio, o apartamento ainda era grande. A parede que nos separava era feita de gesso e cheia de pequenos quadros. Meu pai passou por mim e foi entrando na frente, abrindo todas as portas, como se tivesse um tarado escondido.

— Pronto, ninguém.

— Pai, deixa disso, e depois que você for embora?, Vou ter que me acostumar sozinha.

— Deixa de besteira. - Ele me repreendeu. — Tem o vizinho também. Se gritar ele vem aqui.

- Hum. Duvido. – Revirei os olhos. — Vai deitar que eu, vou ficar acordada só mais um pouquinho.

— Depois, cama viu. - Meu pai me beijou na testa, e foi fazer seu ritual, isso mesmo, ritual noturno.

Eu fiquei andando pelo apartamento. Tudo novo, estoque de comida, salgadinhos, sorvete, e muita outras gordices que eu quase não comia, mas que eram uma delícia.

Aí eu caí na real. Como meu pai tinha trabalhado com ele? Se meu pai era, pobre, sem estudos, e o Marcus era rico, tinha tantas faculdades, que deu para enfeitar grande parte da parede da sala dele.

A curiosa compulsiva que habita em mim falou mais alto. Fui quase correndo pelo corredor, abri a porta de uma vez;

— Ai menina, tá doida, quer me matar de susto?

— Pai quero te fazer uma pergunta.

— Sabia que uma hora ou outra você ia me perguntar isso, então a resposta é ; nos conhecemos desde os oito anos de idade. Meu pai trabalhou pro pai dele, depois o pai dele pagou para estudarmos juntos, mas eu não consegui acabar os estudos. Depois eu trabalhei com ele. Mas um dia ele conheceu a esposa, e quis ir embora. E deixou as terras dele pra mim. Como presente de irmão para irmão.

—Mas pai, como o senhor conseguia pagar meus estudos e cursos?

— Tati, como você acha? Nunca nem soube o valor de nada, Marcus que pagou tudo, para você ter um futuro brilhante, já que eu não consegui. Por isso que eu e sua mãe pegamos no seu pé com a escola. - Ele parecia envergonhado. 

— Mas ele não tem um filho?

— Sim, quatro anos mais velho que você, é um bom moço, você vai ver. Por isso que ele paga pra você, porque para ele seria uma injustiça. O filho dele ter, e você não. Por isso filha, quero te pedir uma coisa...

— Se não for casar com o filho dele tudo bem.

— Promete que vai estudar, vai se formar, e vai se esforçar pra ter notas altas?

— Prometo pai...

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