Meus Sentimentos e Suas Crenças
Meus Sentimentos e Suas Crenças
Por: G. Rodrigues
Onde Tudo Começou

A noite começava a ganhar vida no salão principal do El Dourado, cenário da tradicional cerimônia anual do hospital. Era o ápice do ano para os profissionais da saúde, um momento de reconhecimento pelas batalhas diárias e pelas vidas transformadas ao longo do caminho. Luzes sofisticadas refletiam nos lustres de cristal, enquanto uma música suave preenchia o ambiente.

Os convidados trocavam sorrisos, brindes e abraços calorosos, celebrando com entusiasmo. E ali, em meio ao brilho da festa, estava a deslumbrante fisioterapeuta Carly Ramires. Seu nome ecoou pelos alto-falantes, chamando-a ao palco.

Ela caminhou sob os holofotes com um sorriso mecânico, recebendo o prêmio de excelência profissional. O troféu nas mãos não suavizava o incômodo em seu peito. "O que eu estou comemorando, afinal?", pensou. Enquanto descia os degraus, os cumprimentos pareciam distantes.

— Parabéns, Carly. Você merece! — diziam os colegas.

Mas por dentro, ela sabia: aquele reconhecimento não era suficiente.

À margem da festa, vestida com um clássico modelo rosê, Carly mantinha um sorriso gentil. Observava os colegas rindo, emocionados, abraçados aos seus entes queridos. Ela, no entanto, não conseguia compartilhar da mesma euforia. O sucesso não a tocava. 

A inquietação crescia conforme a noite avançava. Apesar de estar rodeada por profissionais incríveis, sentia-se distante, até mesmo como se fosse uma estranha entre os próprios colegas. A cadeira vazia ao lado demonstrava essa insatisfação. Experimentava a falta de alguém. Uma presença, um apoio ou mesmo familiares para compartilhar de suas conquistas. Aquilo lhe abraçava em uma fria solidão. Pegou sua bolsa clutch e caminhou até o banheiro. Diante do espelho, retocou o batom com mãos firmes, contornando os olhos azulados. Tentava se recompor, mas sua mente vagava. Será que é isso mesmo que eu quero? Vale continuar assim?

Deixou o toalete decidida a ir embora. Aquela noite, se tornara um lembrete cruel do que lhe faltava. Caminhou em direção à saída, ignorando as vozes e os flashes de sorrisos ao redor. Abaixou a cabeça, determinada a desaparecer dali. Foi quando aconteceu. Um esbarrão firme. Um ombro contra o seu. Uma fragrância amadeirada e sutil a envolveu. Ela ergueu os olhos e piscou, surpresa.

Diante dela, um homem. Olhar castanho, sereno, profundo — como se pudesse enxergar além da superfície.

— Me desculpe — murmurou ela, sem conseguir sustentar o olhar por muito tempo.

Ele assentiu, com um sorriso. Quando notou, já havia desaparecido na multidão. E, mesmo sem querer, Carly girou o rosto de volta, procurando-o. Tarde demais. Pegou um táxi para casa, repetindo mentalmente a imagem daquele desconhecido de blazer branco. Quem era ele?

No dia seguinte, a rotina voltava ao seu ritmo habitual. Chegou pontualmente no hospital. Mas algo a desconcertou ao cruzar um dos corredores, risos infantis ecoavam por um dos corredores. Carly seguiu o som, curiosa, até avistar o homem da noite anterior. Agora, ele vestia um jaleco azul com detalhes coloridos, rodeado pelas crianças da unidade de internação pediátrica. Ele interagia com leveza, arrancando gargalhadas sinceras dos pequenos. Transmitia uma energia viva e acolhedora

— Ele é atraente, de um jeito que não consigo explicar. — Comentou com a amiga, Deise, tentando soar casual.

Vez ou outra, Carly se pegava observando-o de longe, sentindo uma familiaridade estranha naquela cena. Mas queria afastar os pensamentos e seguir em suas atividades. Mesmo depois de se afastar, a imagem daquele sorriso descontraído permanecia nítida. Fixada nos pensamentos. Tinha algo ali que prendia sua atenção, embora não conseguisse entender.

No dia seguinte, recebeu uma mensagem pedindo que se dirigisse à emergência pediátrica. Ao entrar na sala, seu olhar encontrou o dele, mais uma vez. O mesmo homem da festa, do corredor... agora estava ali, de frente para ela. Seu coração acelerou.

— Amiga, você me ouviu? — A voz firme da Dra. Deise a trouxe de volta à realidade.

Deise era ortopedista, subdiretora do centro de trauma e emergência. Ela tinha uma habilidade e empatia destacável. Uma mulher de presença marcante, inteligente e confiante. Ao longo dos anos, tornara-se uma das amigas mais próximas de Carly.

— Sim, me desculpe, fiquei um pouco distraída. Pode repetir?

Deise cruzou os braços, analisando-a com um olhar clínico e sarcástico.

— O que foi que você viu aí, hein? Ah, deixa pra lá. Aquele ali é o novo pediatra. Ele é um talento raro e não estou falando só do currículo, se é que me entende. Aliás, vai entrar na fila de interesse?

— Me respeita! Infelizmente a fila tá grande, isso não me interessa.  — Carly resmungou, fingindo indignação.

Elas seguiram tentando conter as risadas.

— Até parece. Como se eu não conhecesse o seu tipo. — Provocou Deise, beliscando o braço da amiga.

— Para! Você tá fazendo a gente passar vergonha, Deise.

— Relaxa, doutora. Vamos lá, vou te apresentar oficialmente para ele. E se tudo correr bem, vocês vão trabalhar juntinhos.

O nervosismo tomou conta, misturado com uma estranha empolgação. Carly sabia que precisava manter o foco. Não podia parecer impressionada, ou pior, despreparada.

— Oi, sou o Dr. Pedro Castello. Mas dispense as formalidades. — Ele se apresentou, estendendo a mão com um sorriso amigável.

— Carly, prazer. — Ela respondeu, dando um sorriso sutil, ao tentar controlar o impulso de olhar para a mão dele.

Ela fez isso para certificar que ele não era comprometido. O toque foi breve, mas diferente de qualquer outro, causando um efeito diferente do habitual. Ela reparou novamente naquele sorriso, sentindo uma conexão inesperada. Um sorriso escapou, mesmo sem permissão. Após, seguiram quietos as instruções de Deise. Ao final do expediente, a curiosidade falou mais alto. Procurou o nome dele nas redes sociais, mas o perfil da conta era privado. 

— Tô parecendo uma stalker — murmurou, sozinha.

Mais tarde, Deise compartilhou o que sabia: Pedro havia estudado em outros países, era fluente em três idiomas, tinha diversas publicações científicas e participava de projetos sociais. Ele era academicamente brilhante. E parecia inalcançável.

— Como eu vou conquistar um homem desses? — Carly suspirou, meio em tom de brincadeira, meio em desespero real.

Mas o que mais a intrigava era a postura reservada. Pedro parecia alheio a elogios, insinuações ou olhares. Sempre educado, mas… distante.

Com o passar dos dias, trabalhando lado a lado, os dois se aproximaram. Ele parecia ser diferente. Nada de conversas paralelas ou troca de olhares. A tratava com indiferença, não lhe dava muita atenção. E, como se não bastasse, ele era impecável. Mesmo assim, com as crianças… ele era outro. Leve. Brincalhão. Inspirador. Os pais confiavam nele. As crianças o amavam. "Ele realmente não percebe ou finge que não vê?", ela se perguntava.

Ela só pensava em como ele conseguia ser divertido e carismático, apesar do gelo que lhe dava. Expressava uma paz que refletia um caráter acolhedor. Mas, paralisou ao perceber que seus sentimentos estavam tomando um rumo perigoso. Não queria arriscar tudo e se machucar outra vez. Era melhor fugir e esquecer dos seus sentimentos. Então, dias depois, pediu para retomar ao atendimento traumato-ortopédica. Evitar Pedro era a melhor escolha.

Meses se passaram. Ela manteve distância, evitando cruzar com ele nos corredores. Até que, num dia comum, precisou cobrir o turno de uma colega da emergência. Para chegar à sala, teve que passar pela pediatria. Quando ela menos esperava, percebeu alguém interrompendo sua passagem. E foi lá, no meio do corredor, que a voz familiar surgiu.

— Carly! Quanto tempo... Por acaso, está se escondendo de mim? — Perguntou, em tom descontraído, enquanto digitava algo em seu tablet. — Será que pode me ajudar aqui por um instante?

Ela notou as crianças que o cercaram, vibrantes.

— Ebá! Dr. Pê chegou! Vamos mostrar os desenhos?

Carly revirou os olhos, brincando consigo mesma:

Dr. Pê… só se for P de pedra. Aff...

Ela se incomodou, devolvendo o tablet e resmungando, tentando se acalmar. Minutos depois, Pedro surge no corredor risonho.

— Doutora, escapou de novo! Bela companheira você, hein? 

— O que deu em você? Quem você pensa que é? — Disparou ela, irritada. — Eu tenho sentimentos… quer dizer, compromissos! Horários!

Pedro arqueou uma sobrancelha, sem se abalar.

— Não tenho tempo para dramas, mas você está em dívida comigo, doutora. — Ele resmungou, — mulheres, são complicadas. — E foi embora, sem esperar por uma resposta.

— Que grosso! Sério que eu não percebi isso antes?! — Murmurou Carly, sentindo o sangue ferver.

Após um longo dia de expediente, partiu para casa em tranquilidade. Assim que chegou, passou direto para o quarto, jogando-se na cama macia, fitando o teto, com um suspiro profundo.

A raiva havia passado, ela se viu refletindo sobre qual o motivo que a levou a se incomodar tanto com Pedro. Por que ele vinha implicando agora? A ousadia dele lhe incomodava e, ao mesmo tempo, despertava algo novo. Surgiu um fio de esperança. Mas ela considerou que: O príncipe virou sapo, realmente imperfeito. No momento, ela não sabia se queria fugir dele ou correr para perto. Só tinha certeza de uma coisa: Pedro ocupava mais espaço em sua mente do que ela gostaria de admitir.

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