Capítulo 2

POV da Victoria

Uma Semana Antes

Vivendo minha melhor vida. É como eu me sinto enquanto observo o verde infinito do meu quintal, se estendendo em toda a vizinhança. Eu amava morar em um lugar tão cercado pela natureza, mesmo que o que para mim era sinônimo de paz e felicidade fosse visto como isolado e melancólico pela maioria das outras pessoas.

Na realidade, eu preferia desta maneira. Assim, a cidade grande ficava para gente de cidade grande, barulhentos, agitados e em um infinito mau humor. Eu estava muito mais feliz sentada em meu sofá enquanto apreciava o cenário refletindo sobre qual a próxima história que eu iria contar.

Como escritora, era meu dever contar histórias que prendessem a atenção dos leitores, despertasse interesse e os fizesse sentir uma montanha russa de emoções em cada capítulo com os confrontos dos personagens e carinhos trocados pelos meus casais. Não é como se eu não fosse determinada e dedicada. Eu me dediquei tanto que eu conseguia sobreviver somente com os valores recebidos pelos meus livros digitais independentes e meus quadros desenhados e pintados. Por preços ridículos e bem inferiores do que eu gostaria e pretendia? Bem, sim, mas eu estava me mantendo fazendo o que eu amava e isso já era excelente.

"Porque Victoria, todos os Evans moram em Las Vegas, todos os Evans tiveram o melhor ensino para estudar na melhor faculdade e se tornarem os melhores profissionais do mercado." Meu pai se preocupava, é claro, mas a calma inabalável de minha mãe o tranquilizava com sua compreensão comigo e com meus dons artísticos e literários. "Vic não é qualquer Evans, ela é nossa filha inspiradora." Mamãe costumava dizer.

Então quando eu resolvi me mudar para Florence ao completar dezoito anos, meu pai se resignou e mamãe disse que já esperava que eu seguisse por esse caminho, mesmo que fosse sentir muito a minha falta. Contando com o apoio emocional e financeiro dos Evans, estava passando meu segundo ano naquela casa fofa, grande demais para uma garota viver sozinha, então criei fortes laços com os meus vizinhos que moravam ao lado.

Um casal apenas cinco anos mais velho que eu, já estavam felizes e casados, tínhamos ideais semelhantes e nos visitávamos com frequência. Annie adorava tomar o café da manhã comigo enquanto debatíamos sobre como quando minhas histórias ficassem famosas, ela seria a responsável pela fotografia das adaptações para o cinema.

"Você está delirando!" Eu balançava a cabeça enquanto a respondia.

"Você vai ver, seu livro será o próximo "Crepúsculo" do mundo! Essa terra vai ser pequena para você, grande Evans!" Ela tentava me convencer.

"Por eu achar grande demais que eu prefiro me refugiar nas vidas dos personagens, mas agradeço por gostar tanto assim, Annie." Dou um sorriso mínimo levando a xícara aos lábios e bebericando o café.

"Eu amo. Mas acredito que para mulheres reservadas como nós que só queremos nos esconder atrás dos papéis ou das lentes da câmera, o preço do sucesso é justamente sair de uma pequena vizinhança quieta para os grandes holofotes. Acho que só assim receberemos o reconhecimento devido por nossos trabalhos e paixões." Ela reflete, possuía um pequeno vinco na testa enquanto se perdia em pensamentos.

"Eu já fugi de lá assim que pude, não possuo a menor pretenção de retornar. Não será preciso para nenhuma de nós, Annie, suas fotografias são preciosas pois revelam sua forma autêntica e encantadora de ver o mundo." Afirmo.

No ocorrido, eu relacionei o silêncio de minha amiga a concordância e suas próprias emoções, mas eu estava enganada. Eu gostava dessa vidinha, mas ela só era a minha vidinha perfeita mesmo com suas dificuldades porque Annie e por vezes, seu marido Frank faziam parte dela. Então é de se imaginar que eu não estivesse esperando pelo que estava por vir.

Ouço cinco batidas na porta da frente que me tiram de meus devaneios sobre meus futuros livros e me assusto ao ver que eram Annie e Frank. Ao abrir a porta, os cumprimento e deixo que entrem, pedindo para se sentarem no sofá em frente ao meu lugar.

"Os dois estão mais brancos do que a neve. O que aconteceu?" Pergunto, preocupada.

"Annie achou prudente lhe contar agora que o negócio já está fechado e não tem como voltar atrás, pois teve receio de que você conseguiria a impedir, convencendo a mudar de ideia." Frank começa.

"Me contar o que? O que eu seria contra? De que negócio está falando?" Disparo.

"Evans, querida, por termos essa amizade tão linda que eu me sinto angustiada por ter de deixá-la sozinha aqui. Sei que será contra e estou lhe contando porque não quero que se sinta sendo... Deixada para trás." Annie explica sem revelar nada.

Engulo em seco e franzo as sobrancelhas, esperando que continuem. Não começamos nada bem.

"Eu consegui uma oportunidade incrível e imperdível em Los Angeles para fazer parte da equipe de um novo filme. O diretor de fotografia aprovou meu currículo e realizei a entrevista on-line. Nos mudamos amanhã." Annie informa.

"Espera, o que? E você não me falou porque achou que eu seria egoísta e mesquinha de não ficar feliz por você? Isso é ótimo! Uma oportunidade imperdível para você!" Respondo genuinamente feliz por minha amiga.

"Realmente, a oportunidade que Annie sonha e busca desde que nos conhecemos no colegial." Frank complementa.

"Não entendo porquê não me contaram antes. Eu sempre torci pelo sucesso de vocês e agora não tenho nem tempo para me despedir." Lamento, confusa pela conduta do casal.

Porque nos apegamos, querida. Não é fácil deixar amizades para trás e ir para longe em prol dos sonhos. Mas é necessário." Annie suspira. "Não foi nada fácil esconder isso de você, quase deixei escapar algumas vezes, mas não quis que sofresse antecipadamente como eu estava.

"E por que acharam que eu iria os impedir de ir? Para ficarem presos aqui comigo só pela amizade? Que tipo de amiga vocês acham que eu sou?" Pergunto enquanto enrolo e desenrolo a barra do meu casaquinho, sentindo o nervosismo crescendo.

"Não, querida, é só porque..." Annie começa a falar, sem jeito, mas o marido a interrompe.

"Victoria, sejamos realistas, não tem uma parte sua que se sinta decepcionada consigo mesma por não ter a mesma oportunidade de Annie? Por se resignar em viver aqui ao invés de buscar crescer? Preferir se esconder e fugir do lugar e da família privilegiada que te auxiliaria? A troco de que?" Frank me encara com olhos gélidos e Annie se encolhe ao seu lado, com a cabeça baixa, sem coragem de olhar para mim.

"Perdão?" É a única palavra apressada que consigo forçar a sair da minha boca. Respiro fundo, sentindo o peito pesado pela mágoa e vontade de chorar. Eu valorizava muito a amizade e companhia de Annie, jamais a veria da forma que estava sendo vista.

"Annie temia que você sentisse inveja, Evans. Preferimos contar só depois do contrato ser assinado e da venda da casa ser fechada, assim nada poderia dar errado. Pelo sucesso e pelo dinheiro." Frank continua sendo direto e frio.

"Inveja? Se eu quisesse fama e dinheiro eu teria mesmo continuado em Las Vegas com meus privilégios! Tudo que eu fiz foi ser grata por ser acolhida por vocês ao morar ao lado e apreciar sua amizade. Vocês dois estão sendo tão absurdos!" Elevo o tom de voz, a forçando a sair para demonstrar minha posição.

Porque não basta somente você perder seus amigos pela distância de forma abrupta, tem que perder a amizade que tinha com eles. Pessoas são mesquinhas, seja no bairro mais pacífico dos Estados Unidos ou no meio de cidades grandes visitadas pelo mundo todo. Parece que minha melhor companhia são personagens fictícios e plantas mesmo, que seja!

Levanto e vou até a porta com passos apressados, fingindo que todos os momentos divertidos e conversas agradáveis com Annie não estavam sendo remoídos na minha mente naquele instante. A ofensa de seu marido e saber sua visão verdadeira sobre mim havia me atingido em cheio.

"Podem ir embora." Mando, abrindo a porta.

Precisava ficar sozinha. Eles obedecem, mas antes, Annie para em minha frente e diz:

"Eu sinto muito. Fiz o que julguei necessário. Espero que um dia possa entender. A casa já está vendida, espero que seu novo vizinho possa lhe fazer companhia." Ela sorri com os olhos tristes.

Eu nada respondo, apenas fecho a porta e decido que independente de quem fosse esse novo vizinho e dono da casa ao lado, nunca iria me fazer companhia e se pudesse nem ao menos iria saber quem eu era. Mas eu não poderia estar mais enganada.

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