– Droga! – Esbravejei quando tropecei em algo, mas me segurei em uma árvore antes de cair. Tirei meus sapatos e continuei correndo segurando o vestido dos dois lados para não tropeçar na bainha. Meus cabelos soltos voavam com a coroa em cima da cabeça sem sair. Eu enxergava a floresta com o reflexo do luar que batia nas árvores e no chão. Minhas emoções se intensificavam: raiva, medo, cansaço, confusão...
Vi as tochas da aldeia que estava praticamente vazia por causa da festa de coroação, corri para a cabana em que o Lúcius encontrava-se, abri a porta e arfei quando vi que a cama estava vazia.
Cadê o Lúcius?
Sai do quarto e olhei ao redor o procurando, mas não vi nada além das casas e da floresta ao redor.
Fechei os olhos e tentei farejá-lo, mas seu cheiro estava muito fraco. Fiquei frustrada.
Então usei a ligação de sangue que temos para procurá-lo do mesmo jeito que usei quando eu briguei com o Betha Lucas e procurei o Lúcius em frente à fronteira das duas tribos.
Abri os olhos e olhei para o lado da cabana, corri entrando na floresta novamente.
Ele estava indo em direção à minha casa que morei com o Dindo que era próxima ao castelo.
– Droga! – Xinguei de novo por ter perdido meu tempo vindo até a aldeia.
Correndo novamente, minha vontade era de me transformar em loba para correr mais rápido, mas não quero ficar nua.
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Já ofegante, olhei ao redor do jardim de rosas vermelhas que construí, mais a frente estava a casa do meu tio reformada, arregalei os olhos quando olhei entre o jardim e a porta de entrada.
– Lúcius? – Sussurrei incrédula vendo-o em pé na minha frente, de costas para mim.
Aproximei com passos lentos e os olhos fixos nele, parei do seu lado que continuava olhando para a casa. Ele foi se virando lentamente na minha direção e olhou para mim com o semblante neutro, não esboçava nenhuma emoção, mas estava estranho.
– Karolina... – Falou meu nome baixinho. Quando escutei sua voz, me emocionei e no impulso dei um sorriso genuíno de felicidade e o beijei.
Nossos lábios estavam colados e meus braços estavam em volta do seu pescoço, mas... Espera...
Abri meus olhos para saber por que ele não me correspondia.
Lúcius olhava para mim com ódio! Seu rosto magro estava contorcido de fúria. De repente senti sua mão na minha garganta impedindo a passagem do ar. Arregalei meus olhos.
– Como ousa usá-la contra mim?! – Ele falava entredentes. – Como ousa aparecer com o rosto dela? Estou farto dos seus joguinhos, das suas alucinações! Como ousa aparecer aqui com o rosto da Karolina? Desrespeitá-la! Quem você pensa que é? – Grunhiu. Em seguida, senti meu corpo no ar sendo arremessada por ele.
Mesmo magro e fraco, Lúcius ainda possuía a força de um Alfa, um líder, uma fera.
Gemi com o impacto nas costas, e as sobrancelhas franzidas em confusão. O que diabos está acontecendo?
Ouvi seus passos se aproximarem, mas ele parou e começou a respirar de forma irregular, com a boca aberta, como se estivesse cansado, e de fato, estava, além disso, ele ainda estava fraco.
– Lúcius, sou eu, a Karolina. – Falei enquanto me sentava. Lúcius me encarou com os olhos brilhando de ódio e sorriu para mim com desdém.
– Você precisa muito mais que isso para me enganar. – Ele continuava falando baixo e grosso.
Enganá-lo? Ele pensa que eu sou outra pessoa se passando por mim? E por que o Lúcius não acredita que sou eu? O que fiz para ele achar isso?
Pensa, Karolina, pensa...
Claro! O beijo! Eu nunca tinha a iniciativa de beijá-lo, sempre era ele, eu só o correspondia. Levantei a cabeça para encará-lo novamente.
– Lúcius, eu te beijei por euforia, você ficou em coma mais de um mês, então tive o impulso de te beijar, principalmente depois da nossa última conversa, lembra?
Levantei-me devagar, com as mãos na frente tentando me aproximar, ele permanecia na defensiva.
– Na cabana, onde você dizia que era nosso quarto, você estava bebendo cerveja e eu me sentei ao seu lado. Eu te dizia que não gostava da sua nova versão, você se lembra disso?
Ele me olhou rapidamente, quase imperceptível, da cabeça aos pés e estreitou os olhos, seu semblante era de raiva, desprezo e nojo. Senti-me péssima em vê-lo me encarando assim. Olhei para meu corpo e não tinha nada demais, só meu vestido.
Vestido... Sim! Claro! Ele sabe que eu não gosto de usar vestidos.
– Lúcius, eu não gosto de usar vestidos, mas esse aqui é por causa da minha coroação. – Falava com as mãos na barriga.
Ele franziu o cenho um segundo antes de voltar ao normal, provavelmente ficou confuso por eu saber o que ele estava penando.
Lúcius tem passado todo esse tempo se apegando aos mínimos detalhes para não ser enganado por quem?
– Cale a boca! Você não é ela! – Aumentou o volume da voz. Parei de tentar me aproximar. Fiquei angustiada.
– Lúcius, me escuta! – Minhas mãos estavam levantadas em súplica. – Eu sei que te desprezava, que te odiava, mas...
– Me odiava? – Ele zombou. – Então quer dizer que essa outra Karolina não me odeia? Hahahahaha... Você é muito patético tentando imitá-la!
Suspirei e baixei meus braços.
– Lúcius... sou eu... a Karolina... – Ele continuava com o mesmo semblante. – E-Eu te odeio... – Falei derrotada. – E vou te odiar pelo resto da vida... – Murmurei e olhei para o chão. – Mas eu também me odeio... – Engoli seco. – Me odeio porque te amo...
O Lúcius está completamente conturbado e eu não sei lidar com essa situação.
– K-Karolina? – Levantei o rosto e o vi com as sobrancelhas franzidas, confuso.
– Sou eu, Lúcius. – Falei apontando as mãos para mim.
– É você mesmo? – Perguntou. Balancei a cabeça afirmando. – Me prove.
– M-Minha comida favorita é churrasco... – Comecei a falar várias coisas aleatórias. – A primeira vez que me beijou eu o mordi que tirei sangue dos seus lábios... éééé... Quando você tentou transar comigo pela segunda vez dormimos juntos na cabana e mesmo sem conseguir fazer nada comigo, você passou o dia inteiro acordando entre risos e murmurando porque eu te perguntei o que era transar... Q-Quando a Ayla fugiu do Bruthus, ele ficou arrasado e você ao invés de dizer alguma palavra de consolo, o chamou de cão sem dono na frente de todos e eu que estava servindo-o não consegui controlar o riso, pensei que fosse me repreender, mas você riu junto comigo, foi a primeira vez que o vi sorrindo... Eu sou a única pessoa que acha engraçado seu humor negro, Lúcius... – Disse.
– Desgraçado! Como você consegue imitá-la tão bem? – Seus olhos voltaram a brilhar de raiva. Lúcius avançou para mim novamente.
Respirei fundo controlando o choro que queria sair.
– Lúcius! Por favor! Sou eu! – Dizia angustiada enquanto dava passos para trás, eu não queria ter uma luta com ele. – E-eu amo a Lua. Amo admirar a Lua. Eu passava noites chorando escondida no escuro enquanto admirava o luar. Por favor! – Minhas sobrancelhas estavam franzidas de tristeza e ele mesmo fraco tentava me golpear.
– CALA A PORRA DESSA BOCA, SEU FILHO DA PUTA! – Ele gritava quase chorando desesperado, tentando me acertar.
Eu sabia que ele não ia parar, então pensei na noite da cabana, na noite em que ele se ajoelhou diante de mim e jurou lealdade depois de eu ter dito que o amava.
Segurei seus dois pulsos que estavam no ar tentado me acertar, o olhei com os olhos brilhando minha cor vermelho escarlate e falei num rugido:
– Ajoelhe-se perante a mim, Alfa! – Tentei ter autoridade com ele, assim como tenho com os demais.
Lúcius ficou paralisado, sua boca estava aberta e ele olhava para mim perplexo.
– Seus olhos... – Murmurou. – Eles estão brilhando... Brilhando... Ninguém consegue fazer brilhá-lo... só... só ela... a Karolina... – Lúcius sussurrava para ele mesmo.
– Lembra-se da noite em que você estava chorando por ter matado as pessoas que gostava quando tinha dez anos e eu apareci com meus olhos brilhando te trazendo paz naquele mar de sangue e pessoas mortas? – Soltei seus pulsos e coloquei as mãos no seu rosto. – Você pensou que eu fosse um demônio e você tem razão, eu sou um demônio, sou seu demônio do bem. – Dei um pequeno sorriso para ele.
– Karolina... – Murmurou. Eu balancei a cabeça confirmando.
Lúcius começou a relaxar os músculos tensos, então eu o abracei e senti seus braços passarem pela minha cintura lentamente. Dei um suspiro de alívio.
À medida que o Lúcius se acalmava nos meus braços, percebi que ele se tremia muito, sua respiração tornou-se desregular até que ele caiu no chão tão rápido que só pude perceber quando o vi caído nos meus pés.Vendo aquele homem que antes era forte, musculoso e que tinha uma áurea poderosa, agora não passava de uma pessoa esquelética e fraca, mais fraca que uma criança. Ele deve ter usado muito do restante de suas forças para conseguir vir até aqui e me derrubar no chão, e a adrenalina da raiva que também estava presente, agora se dissipou.Ajoelhei-me ao seu lado e segurei sua cabeça no meu colo.– O que está acontecendo comigo? – Sussurrou ofegante.– Você só está fraco, mas eu posso te ajudar.– Me ajudar?! – Ele franziu o cenho. – Por favor, me mate! – Suplicou.– O quê!? Não! – Disse perplexa.– Eu não aguento mais! Por favor, Karolina, me mate!– Lúciu, e-eu não posso te matar, não depois de você finalmente estar de volta! Deixe-me ajudá-lo.Ele balançou a cabeça em negação.– Po
Ele me de um selinho demorado, e com a língua pediu passagem, cedi, ele estava sendo bem delicado e calmo dessa vez, até que nosso beijo se aprofundou enquanto sugávamos os lábios um do outro, lambendo. Lúcius me apertou mais contra seu corpo e soltou um gemido baixo na minha boca, era mais de alívio do que excitação. Passei a mão pela sua nunca e depois acariciei seus cabelos, eu estava extasiada e feliz por tê-lo de volta, por ter conseguido salvar sua vida, era como se nosso beijo profundo fosse a prova concreta de dizer para nós dois que estava tudo bem. Nossas respirações ficaram ofegantes, mas nenhum queria interromper o beijo, ao contrário, nos apertávamos mais ainda enquanto eu permanecia sentada nos seus braços.Com as mãos no seu cabelo e outra na nuca enquanto ele me segurava forte pela cintura, buscamos ar nos pulmões enquanto nos abraçávamos de olhos fechados.Até que ele respirou fundo, seus pensamentos o consumiam, ele parecia estar sofrendo por algo. Lúcius estava estr
Ainda no meio da floresta e longe de todos, eu permanecia sentada, chorando e soluçando. Eu queria muito não sentir isso, esses sentimentos confusos me deixavam sufocada e o único modo de desabafar era entre lágrimas. Como o Lúcius pôde fazer isso comigo? Na minha cabeça é que ele tem algum motivo por trás da rejeição, mas o quê? E eu estou disposta a enfrentar qualquer coisa por ele, já passei esses meses tentando me manter forte enquanto o Lúcius permanecia em coma, tentei esquecer tudo que passei enquanto era sua escrava, todo o rancor e ódio que tinha. Chorei mais forte de cabeça baixa. Funguei e lembrei daquela coisa que possuiu o Lúcius. Foi por causa daquilo que ele não me quis? E o que foi aquilo? Limpando minhas lágrimas, fiquei de frente à Lua, juntei minhas mãos e comecei a falar umas palavras antigas que meu tio ensinou quando eu era criança. “O Sol é teu brilho, a floresta tua escuridão, o sangue estampado na tua Lua é o mesmo do teu coração. Eu vim da terra, mas
– Esses lobos são diferentes, eles não são tão grandes e fortes como o de costume. – Falei para a Deusa Daiana enquanto os observava. – Estamos em uma época antes do Victor Stevens, o Supremo Alfa que trouxe sabedoria e força para seu povo, que unificou as raças ao invés de lutar, que os aprimorou transformando esses meros lobos em lobisomens, transformando todos vocês em metade lobo e metade homem. Essa matilha que você vê na sua frente, não passa de seres ferozes e um tanto irracionais. – Ela me guiava na direção deles enquanto falava. – E que animal é esse que eles estão perseguindo? – Perguntei. – Eles são os que comandavam o mundo antes de vocês e de qualquer humano. – Eles que estavam acima da cadeia alimentar antes de nós? – Sim. Continuamos seguindo-os e paramos a alguns metros de distância quando os lobos alcançaram aquele ser. O animal, com seus braços longos, era ágil, veloz e forte, no entanto, os lobos estavam em bando e rapidamente o mobilizaram. Comecei a escutar o
Acompanhamos de perto a trajetória da Líder enquanto carregava seu filho consigo, ela estava um pouco ferida devido à luta que teve dentro da caverna, mesmo com dores, ela continuava alimentando e cuidado do seu filhote, mas quando ele pegava no sono, ela chorava. Vi de perto ela brincar com seu filho durante o dia, o ensinava a colher alimentos, a louvar o deus deles, ela passava os costumes e tradições para ele, mesmo com a mancha negra da tragédia do seu povo, eles pareciam estar cada vez mais superando o luto e conseguindo seguir suas vidas juntos, como mãe e filho unidos sempre, porém quando a noite chegava, eles se escondiam e usavam ervas ou lama para camuflar seus cheiros dos predados que saíam para caçar na escuridão: Os lobos. Como num passe de mágica, o tempo foi passando, mãe e filho seguindo suas rotinas juntos, sem se esquecerem das precauções que tomavam à noite, e durante o dia, eles sentiam-se seguros. O filho cresceu, mas ele continuava jovem, esses seres viviam mai
No momento em que a Daiana parou de falar, ouvi um estrondo vindo debaixo do chão bem ao centro daquele pentagrama invertido feito de sangue. A terra começou a se mover e um buraco se abriu, de lá saiu garras pretas, deformadas e horríveis. Vi chifres saindo de dentro do buraco, em seguida de uma cabeça de bode, corpo de homem e patas também de bode, tudo negro, e um fedor de enxofre exalava nele. Gritos de tormento eram escutados vindos daquela coisa, e em segundos, ele ficou em pé com suas patas horrendas, olhando fixamente para a fêmea ajoelhada. A áurea daquele ser era a mais perversa que já senti na vida, ele era a maldade personificada e eu só conseguia sentir muito, muito medo. Até a Deusa ao meu lado, que a vejo como alguém divino e poderoso, estava paralisada com a presença dele. – Não... se... mova... – Ela sussurrou com a voz trêmula. Meu corpo tremia todo, o coração faltava sair pela boca e eu prendi a respiração. Não sei o que ele pode fazer se descobrir nossa presença,
– KAROLINA! – Daiana gritou e esticou o braço para pegar minha mão, eu a segurei. Uma luz forte cor dourada surgiu atrás de nós duas enquanto fugíamos, mas a fumaça preta atravessou por essa luz como se a estivesse cortando, nossas mãos foram separadas e eu fui atingida por algo invisível extremamente poderoso, então caí de costas para o chão, fiquei em posição fetal agarrada aos meus joelhos de tanta dor. Forcei meus olhos a abrirem e quando consegui, a dois metros de distância estava Daiana caída de bruços com os cabelos esparramados no chão, ela estava inconsciente. Ele a atacou diretamente, eu só peguei um pouco do seu golpe por estar bem perto da Deusa, ela que recebeu quase tudo. Tentei me levantar, mas meu corpo não correspondia, comecei a tossir fortemente, senti um gosto metálico sair pela minha boca e cuspi o sangue no chão. Comecei a me rastejar para perto da Deusa, eu tinha que acordá-la, ela era nossa única chance de sair daqui. Antes que eu a alcançasse, uma fumaça ne
Ainda de joelhos na floresta, eu permanecia perdida em meus pensamentos, tenho que saber por onde começar, não posso mais ignorar os assuntos dos humanos, tenho que ir o quanto antes e principalmente, preciso preparar meu povo e ajudá-los a deter o futuro catastrófico de todos. Olhei para minhas mãos brancas e unhas vermelhas. – Se eu tenho esse poder divino, o que posso fazer com ele? Também consigo ter visões do passado e futuro como quando eu apareci para o Lúcius em sonho, mas como fiz aquilo? E o Lúcius... Não consigo acreditar que ele me rejeitou porque não me ama, ele ama, eu sei que sim, mas preciso descobrir o motivo por trás de sua rejeição. Suspirei. Como eu precisava sentir seu abraço agora, passei tanto tempo acreditando que nunca mais o veria acordado, e agora com a ausência da Daiana me sinto mais sozinha ainda. Não posso contar para ninguém as coisas que presenciei, as pessoas iriam achar que sou louca, mas preciso treiná-las e alertá-las contra um inimigo que só