Capítulo 07

Acompanhamos de perto a trajetória da Líder enquanto carregava seu filho consigo, ela estava um pouco ferida devido à luta que teve dentro da caverna, mesmo com dores, ela continuava alimentando e cuidado do seu filhote, mas quando ele pegava no sono, ela chorava.

Vi de perto ela brincar com seu filho durante o dia, o ensinava a colher alimentos, a louvar o deus deles, ela passava os costumes e tradições para ele, mesmo com a mancha negra da tragédia do seu povo, eles pareciam estar cada vez mais superando o luto e conseguindo seguir suas vidas juntos, como mãe e filho unidos sempre, porém quando a noite chegava, eles se escondiam e usavam ervas ou lama para camuflar seus cheiros dos predados que saíam para caçar na escuridão: Os lobos.

Como num passe de mágica, o tempo foi passando, mãe e filho seguindo suas rotinas juntos, sem se esquecerem das precauções que tomavam à noite, e durante o dia, eles sentiam-se seguros. O filho cresceu, mas ele continuava jovem, esses seres viviam mais tempo que as outras raças, portanto era normal. Ele começou a fazer alguns serviços sozinho, sem a ajuda da sua mãe, colhia os alimentos enquanto ela limpava o ambiente em que iam passar a noite, eles não ficavam no mesmo lugar por muito tempo, sempre movimentavam-se, o que era algo triste porque eles sabiam que nunca mais teriam um lar.

E eu, como mãe, sei o quão é ruim ficar à mercê na floresta com uma criança, sempre fugindo, mas lá no fundo, desejando encontrar um lar para botar minha filha e dar a ela tudo que merece. O mundo é cruel, não somente para mim, mas para qualquer um que queira lutar contra o destino apenas para fazer feliz quem amamos.

A mãe estava forrando o chão com palhas para eles dormirem, de repente ela parou e olhou na direção que seu filho tinha ido colher frutas, seu semblante neutro mudou completamente para medo, ela começou a correr desesperadamente enquanto cantarolava, esse canto era o meio de comunicação deles, do mesmo modo que fazemos quando assoviamos para chamar nossa tribo.

Olhei apreensiva para a Deusa que permanecia calada ao meu lado, mas ela estava com as sobrancelhas franzidas. Fomos à direção em que eles tinham ido, meu coração começou a palpitar, eu fiquei inquieta, a Deusa engoliu seco e com o movimento de mãos, chegamos ao local em que estava o filho, a mãe não havia chegado. Ele permanecia colhendo os frutos alegremente, até que um barulho foi escutado e quando olhou para trás viu um grupo de machos com lanças feitas de madeira, mas não eram os lobos, eram os humanos. Eles haviam evoluído, não andavam mais em quatro patas, estavam vestidos e eram mais inteligentes, eles queriam abdicar o direito de domínio e essa raça na frente deles, mesmo sendo somente um animal jovem e inofensivo, era uma ameaça.

A mãe não previu que outra raça iria evoluir e, diferente dos lobos, eles seriam diurnos, ambos não estavam preparados para o futuro. O filho correu, deixando cair seus frutos no chão, mas em vão. Uma lança foi arremessada e pegou na sua perna, o imobilizando, ele gritou de dor, medo e agonia, seu sangue escorria pela perna manchando o chão. Os humanos desferiram golpes em todo o corpo do jovem, mesmo ele já preso e caído.

– Aberração! – Gritavam.

– Monstro!

– Comida! – Todos se alegraram quando disseram essa palavra e pegaram o jovenzinho pelos braços, ele estava com hematomas pelo corpo todo, sangue saía pela sua boca cortada, mas ele ainda permanecia um pouco acordado, o que era pior ainda, pois consciente, ele sentia toda a dor no corpo.

Eu implorava em pensamento para que ele desmaiasse, seria menos doloroso.

Os humanos o carregaram como se fosse uma caça, minutos depois a mãe chegou ao local, mas só encontrou os frutos caídos e pisados no chão e, para seu horror, sangue por todo o lado. Em desespero, ela seguiu a trilha de sangue do seu próprio filho, porém eles já estavam longe dali. A fêmea não desistiu e quando anoiteceu, ela finalmente encontrou o local onde seu filho estava.

Os humanos haviam partido e o que deixaram para trás foi uma fogueira pouco acesa e ao redor da fogueira, estava algumas partes do corpo do jovem mutilado e sua cabeça bem no meio enfiado em uma estaca como um troféu, o restante do corpo serviu como alimento seus assassinos.

A mãe quando viu seu único filho morto e mutilado, gritou e caiu no chão em agonia, chorava em lamentos, agora ela estava sozinha.

A fêmea gritava de joelhos olhando para a cabeça do seu filho, baixei meus olhos para o chão e engoli o nó que se formou na minha garganta. Era triste. Devastador. Não podia fazer nada, muito menos modificar o passado. Só pude ficar ao seu lado, mesmo ela não me vendo, eu tentei consolá-la, mas era inútil.

****

A fogueira quase não tinha mais brasa, não sei quanto tempo se passou, os soluços da líder foram diminuindo, mesmo assim ela permanecia no chão, até que se levantou.

– Temos que ir agora, Karolina. Segure minha mão! – A Deusa parou ao meu lado com a mão esticada, mas eu me esquivei.

– Por quê? O que vai acontecer? – Perguntei.

– Quando voltarmos ao presente, eu te direi, mas temos que sair daqui agora! – O timbre da voz dela aumentou. Franzi as sobrancelhas e voltei a observar a Líder que estava tirando a cabeça do seu filho da estaca e colocando no chão, e com o sangue do seu próprio filho, ela começou a fazer um pentagrama invertido ao mesmo tempo em que falava algum tipo de oração.

– O que ela está fazendo?

– Ela está chamando o deus deles e dando como oferenda o sangue puro e inocente do seu filho.

Fiquei estupefata com aquilo.

A Deusa tentou pegar na minha mão novamente, mas não deixei.

– Karolina! – Ela falou zangada.

– Não! Preciso entender o que está acontecendo, preciso de respostas! – Eu disse determinada.

– Não podemos mais ficar aqui! É perigoso! Ele está vindo e é mais forte que eu!

– Ele quem? – Perguntei frustrada.

– Ele, Karolina, o Deus Satânico deles. – O semblante da Deusa era de medo.

– O quê? Eles são adorados do... – Minha voz morreu enquanto víamos o fim do ritual.

– Sim... – A Deusa murmurou. – Lúcifer...

Augusta Andrade

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