Uma semana depois...
Ao amanhecer, Lucie levantou, fez sua higiene pessoal e desceu para o pequeno jardim. Era uma bela manhã de sábado. Ao entrar no jardim, respirou fundo e deixou o ar fresco da manhã invadir seus pulmões. Tirou os sapatos para sentir a terra fresca sob seus pés, pois aquilo, de alguma forma, a revigorava. Adorava ouvir e sentir tudo ao seu redor: o zumbido das abelhas, o perfume das flores, a brisa suave da manhã envolvendo-a como o abraço de um amante afetuoso. Lucie sempre fazia aquilo quando se sentia triste, aflita ou precisava tomar uma decisão importante na vida. Ao olhar para a cozinha, viu Kassiani observando-a. Desde que era uma menininha, Kassiani sempre dizia que Lucie ficava ainda mais bonita quando estava próxima da natureza, embora nunca tivesse explicado o porquê. Lucie acenou e sorriu para ela. Kassiani retribuiu o gesto e voltou aos seus afazeres, deixando-a novamente sozinha em seu pequeno mundo. Sentou no banco do jardim e, com suavidade, tocou as flores. Elas eram belas e perfumadas, e ela amava apreciar sua beleza. Às vezes, desejava que todos os vizinhos as vissem, pois tinha orgulho delas. No entanto, por algum motivo que até hoje não entendia, o pai mandara construir um enorme muro em volta de todo o jardim, tornando impossível para qualquer um ver o que havia por trás dele. Apesar de adorar contemplar a beleza das flores, naquele momento, queria apenas senti-las, absorver suas boas energias. Afinal, sempre imaginou que todas as coisas vivas e belas que a natureza produz são capazes de trazer boas energias e paz. E, naquele momento, precisava desesperadamente dessas boas energias. Sua mente trabalhava freneticamente, pois, a partir daquele dia, estaria casada. O "querido noivo" decidira que o tão "aguardado casamento" seria naquela mesma noite. — Hoje, Lucie, é hoje o seu "grande dia" — pensou, nervosa. Mas não era o tipo de nervosismo que uma noiva deveria sentir. Era o tipo ruim, aquele que a deixava apreensiva e com um nó no estômago. Até aquele momento, nem sequer sabia como era a aparência do noivo. Nunca o vira, nem mesmo em foto. Já fazia uma semana desde que o pai se internara para se livrar do vício, e ainda não havia recebido nenhuma notícia de seu algoz. No entanto, essa calmaria só a deixara mais aflita. Até que, na manhã de sexta-feira, um entregador trouxe um pacote. Curiosa, Lucie abriu-o imediatamente. Dentro, havia um vestido de noiva, provavelmente de grife cara. No entanto, jamais teria escolhido algo tão revelador. De alças finas, totalmente aberto nas costas e com uma enorme fenda na lateral da coxa que ia até o final, o busto era tão exposto que a deixava extremamente desconfortável. O mais incrível foi que o vestido ficou perfeito em seu corpo, como se tivesse sido feito sob medida. Não precisou de nenhum ajuste! Junto com o vestido, havia um bilhete: — Seu vestido de núpcias, querida. Nem ouse pensar em não usá-lo. É meu presente de casamento. Espero vê-la hoje dentro dele. Abaixo está o local do nosso casamento. **Local:** Du Palais de La Méditerranée **Hora:** 22:30 Quando mostrou o vestido para Kassiani, ela franziu a testa. Porém, ficou ainda mais aborrecida com o bilhete, dizendo: — Pelo visto, esse monstro não tem consideração por ninguém. Acha que pode mandar nos gostos e vontades das pessoas a seu bel-prazer. Maldito! Lucie, relendo o bilhete, olhou para o vestido e pensou: — Surreal! Estou realmente recebendo o convite do meu próprio casamento? Seria cômico se não fosse a tragédia da minha vida! No entanto, apesar de estar profundamente preocupada com tudo aquilo, havia algo mais que a inquietava: seus constantes sonhos. Quase todas as noites, eles vinham à sua mente, criando imagens surreais desde a primeira noite em que começou a sonhar. O pior era que nunca era realmente ela quem estava ali. Sempre se via no corpo e na mente da mãe, em meio a uma guerra horrível, onde mulheres eram mortas da forma mais terrível possível. Enquanto elas lhe pediam ajuda e comandos, Lucie ficava desesperada, sem saber o que fazer. Afinal, tudo aquilo era tão real que a perturbava. Lembrou-se também do momento mais crítico do sonho: quando estava ferida no braço, sentindo uma dor lancinante, sangrando profusamente, e percebendo que todas elas já pareciam totalmente perdidas e sem esperança. Foi então que uma criança linda e ruiva apareceu. Lucie achou incrível sua aparência. — Ela vestia um vestido infantil e usava uma espécie de capacete estranho, estava em cima de algo semelhante a uma prancha enquanto... flutuava?! Sim, não havia dúvida. A garota flutuava sobre elas, e não estava sozinha. Havia com ela um homem extremamente alto, forte e bonito. Ao se aproximar, a garota sorriu de forma fraternal. Lucie ainda se lembrava do que ela disse, com uma voz suave: — Você me chamou, Alexandra? — Sim, amiga, preciso... Ai, que dor! Ai, maldição! — disse Lucie, sentindo uma dor aguda no braço machucado. Porém, reunindo as últimas forças que lhe restavam, continuou: — Preciso desesperadamente da sua ajuda. Senão, jamais a incomodaria! Foi então que ouviu a moça chamada Eleni gritar e correr em direção à menina, dizendo de forma feroz: — Acabarei com você e seu amigo, m*****a bruxa! Ela e as outras poucas mulheres que ainda estavam vivas se armaram contra a menininha e seu parceiro, que estava atrás dela, atacando. Enquanto elas os derrubavam, Lucie gritou em desespero: — Parem! Parem agora! Não os machuquem! Eles são nossos amigos! Foi nesse momento que ela acordou, totalmente atordoada. E, mais uma vez, ficou sem entender absolutamente nada daquele sonho. Embora tivesse sonhado partes dessa guerra durante toda a semana, a partir de sexta-feira, os sonhos pararam. E aquilo a inquietava ainda mais. Esses sonhos, aliados ao fato de que teria que se casar naquela noite, estavam acabando com seus nervos. No entanto, ao entrar novamente no jardim, sentiu como se suas forças tivessem sido renovadas. Agora, poderia enfrentar sem medo aquele homem que se tornaria seu marido — aquele que Kassiani carinhosamente apelidara de: O Filho do Demônio! Lucie sentiu um calafrio percorrer sua espinha ao pensar no que a aguardava naquela noite. O jardim, que sempre fora seu refúgio, agora parecia um último suspiro de liberdade antes de ser engolida por um mundo sombrio e desconhecido. As flores, outrora símbolos de beleza e paz, agora pareciam sussurrar despedidas. Ela sabia que, após o pôr do sol, sua vida nunca mais seria a mesma. — Será que consigo sobreviver a isso? — perguntou-se em voz baixa, enquanto uma lágrima teimosa escorria por sua face. Kassiani, observando-a de longe, sentiu o coração apertar. Sabia que, por mais que tentasse proteger Lucie, havia algumas batalhas que a jovem teria que enfrentar sozinha. E aquela era uma delas. — O Filho do Diabo — murmurou Kassiani, com ódio e medo misturados na voz. — Que Deus cuide da minha menina.Quando ela e Kassiani chegaram ao endereço indicado no bilhete, foi de táxi. O "noivo" nem sequer mandara um carro para buscá-las em casa. Dentro do táxi, Lucie tentava se proteger com as mãos dos olhares luxuriosos do motorista, que, mesmo sem dizer uma palavra, olhava descaradamente pelo retrovisor para o seu decote. Sabia que isso aconteceria. Afinal, mesmo quando usava roupas discretas, chamava atenção. Às vezes, Lucie tinha a impressão de que havia algo nela — uma espécie de atração inexplicável que ela mesma não entendia. Não se achava tão bonita assim para justificar tanta atenção indesejada. Ao perceber seu desconforto, Kassiani chamou a atenção do motorista: — Por favor, senhor, preste atenção no trânsito! Pare de olhar para o que não é seu e faça seu trabalho! — falou ela, aborrecida. O homem, como se saísse de um transe, voltou a dirigir. No entanto, de vez em quando, ainda lançava olhares indiscretos em direção a Lucie. Ela agradeceu por a viagem não ter sido longa. Ao
Com coragem e totalmente aborrecida, Lucie encarou Leon e disparou: — Está louco? Ou por acaso é bipolar? Se estou usando essa coisa ridícula, foi porque você me obrigou! Ou já esqueceu o seu "maravilhoso" bilhete, indicando que esse era o seu presente de casamento? — O quê? Eu lhe enviei essa coisa? — ele perguntou, franzindo a testa. — Sim, e posso provar! — respondeu ela, sem hesitar. Então, seguiu até onde Kassiani conversava com a mãe de Leon. Sussurrou algo ao ouvido da governanta e voltou até ele, entregando-lhe o bilhete que havia chegado com o vestido. Ao ler, Leon olhou para a porta de entrada do cassino, como se estivesse procurando alguém. Lucie acompanhou seu olhar, mas não havia ninguém lá. Ele franziu a testa, e seu olhar se encheu de ódio. Ela o ouviu murmurar entre dentes: — Maldito! Como ele ousa? Sempre querendo se divertir às minhas custas! — O quê? Do que está falando? — perguntou Lucie, intrigada com seu comportamento. — Nada, Lucie. Esqueça esse maldito bi
Quando desceram, o salão principal já estava organizado com cadeiras e o local onde o juiz celebraria o casamento. Apesar de simples, tudo foi preparado com bom gosto e sofisticação. Lucie notou que havia poucas pessoas presentes — talvez uma dúzia. Não sabia se eram amigos da família ou parentes, mas, naquele momento, não havia tempo para apresentações. O casamento começou, e o juiz proferiu as palavras. Ambos disseram os votos. Apesar de estarem se casando, Leon não a encarava nos olhos. Lucie acreditou que fosse pela forma como o havia desafiado minutos antes, com relação ao vestido. Aparentemente, aquele homem era terrivelmente sensível ao ser contrariado e ainda estava aborrecido com ela. "Não consigo entender Leon. Ele muda de opinião tão rápido assim? Meu Deus, e se esse homem tiver dupla personalidade?" — pensou Lucie, assustada. Enquanto refletia, passou a analisá-lo melhor. Notou que não havia se enganado: Leon era acostumado a ter tudo o que queria com um simples est
Dona Laurent, que até então parecia prender o fôlego, aproximou-se de Lucie e disse: — Querida, eu jamais imaginei que essa mulher fosse aparecer e causar todo esse caos. Provavelmente, ela se aproveitou por ser cliente VIP do cassino e enganou os seguranças. Desculpe, meu anjo. Se ela soubesse o que Lucie realmente pensava naquele momento. Enquanto tomava um gole de champanhe e olhava para a porta por onde Charlotte havia saído, pensou: ”Maldição, por que ela não entrou antes? Dessa forma, teria impedido o casamento e me poupado desse destino sombrio!” No entanto, ao olhar novamente para Leon, que agora era seu marido, percebeu que nada nem ninguém teria conseguido impedir aquele casamento. Em seu semblante, havia uma resolução incrível. Algo que, ao mesmo tempo que a assustava, também a fascinava. E, como se lesse seus pensamentos, Leon se aproximou e disse: — Nunca ninguém impediria o nosso casamento, meu amor. Nem mesmo a louca da Charlotte. Você agora é minha, e ninguém vai t
Quando Lucie encarou Leon, ele estava parado de braços cruzados, observando-a com um olhar profundo e luxurioso. Ela não fazia ideia de quanto tempo ele estava ali. Com um olhar assustado, ela perguntou: — Par Dieu, Leon! O que você está fazendo aqui? Ele sorriu de forma extremamente sensual, como se fosse o próprio demônio em pessoa, e então pediu desculpas: — Pardon, chérie. Te assustei? Ela apenas sacudiu a cabeça, enquanto ele a encantava com aquele maldito sorriso. "Droga, por que Leon tem que ter esse sorriso avassalador?" pensou Lucie, irritada consigo mesma. — "Ele deve usar isso sempre que quer seduzir uma mulher. Quantas promessas ele terá feito àquela pobre moça que apareceu no casamento, chorando desesperada?" Enquanto refletia, Leon se aproximou lentamente, como um predador cercando sua presa. Lucie percebeu que, apesar do frio, ele estava sem camisa. "Que corpo perfeito..." — pensou ela, mas rapidamente desviou o olhar, envergonhada. Ao se aproximar, Leon v
Lucie gritou, sua voz ecoando pelo quarto como um trovão. A raiva fervia em suas veias, mas algo dentro dela lutava contra sua própria vontade. Seu corpo, traiçoeiro, respondia aos toques brutos de Leon de uma forma que a envergonhava e a aterrorizava. — O que está acontecendo comigo? — pensou, desesperada. — Estou gostando disso? Sou uma louca? Uma masoquista? Leon, no entanto, parecia alheio à sua luta interna. Seus lábios e mãos exploravam seu corpo com uma voracidade animal, sugando, lambendo e mordiscando os bicos de seus seios com uma intensidade que misturava dor e prazer. Lucie nunca havia feito sexo antes, nunca havia conhecido os limites do próprio corpo. Mas agora, sua sanidade mental estava à beira do colapso. Ela percebeu que não era apenas a sensualidade de Leon que a dominava. Havia algo mais profundo, algo dentro dela, como se seu próprio corpo estivesse sendo consumido por um desejo irracional, primitivo. Seu corpo queria se entregar, mas sua mente lutava ferozmente
Ao levantar o olhar, Lucie deparou-se com uma criatura colossal a pouco mais de trinta centímetros de distância dele. O coração disparou em seu peito, e ela sentiu um frio cortante percorrer sua espinha. Instintivamente, sentou-se no chão e empurrou-se para trás, até que suas costas colidiram com a grossa casca de uma árvore. A criatura, no entanto, não se moveu. Permaneceu ali, imóvel, como uma estátua viva, observando-a com olhos que brilhavam como brasas douradas. Lucie fitou a criatura, tentando processar o que via. Assemelhava-se a uma corça, mas era como se a natureza tivesse decidido criar uma versão majestosa e sobrenatural do animal. Ela lembrava-se de ter estudado sobre corças comuns em algum momento de sua vida. Sabia que eram animais pequenos, com no máximo um metro e meio de altura e pesando menos de quarenta quilos. Mas a criatura diante dela era diferente. Era enorme, quase do tamanho de um cavalo adulto, com uma presença que emanava poder e mistério. E não era apenas
Então a corça percebeu que Lucie havia se perdido dela, por isso voltou. E quando a viu outra vez, incentivou Lucie a segui-la novamente. E assim ela, voltou a correr atrás dela, sem nem ao menos saber porque estava fazendo aquilo. Porém, por algum motivo, acreditou que aquele animal, era única chance para sair viva daquele lugar tenebroso. Mas enquanto corria se assustou novamente, pois ouviu um grande pio seguido de um guincho ensurdecedor, e algo passou por sobre ela batendo asas, devido ao susto ela correu na direção contrária a que, a corça tomava, e enquanto olhava para a enorme coruja que passou sobrevoando sobre ela, nem sequer observou onde pisava foi então que ela tropeçou em uma grande raiz, e caiu no que parecia uma enorme descida semelhante a um barranco. Lucie protegeu com as mãos, sua cabeça e seu rosto, porém bateu o corpo no que parecia ser um tronco de uma enorme árvore. E ainda zonza, e sentindo falta de ar, muita dor, e uma forte pontada na costela, ela levantou