ANA
..Não é estranho? Ter nascido em uma família que você sabe que nunca será como as outras? Crescer sem mãe, sem irmãos e ainda ter o seu destino fora do seu próprio domínio?Eu tinha duas opções, ou eu me revoltava e fugia para um lugar longe de todo o drama que constantemente eu era submetida, ou eu aceitava a realidade dos fatos e me entregava ao acaso. E se por acaso eu morresse? Esse pensamento de morte era constante, afinal isso também poderia acontecer a qualquer momento.Seria muito bom se a gente pudesse escolher a família que iriamos nascer, se nós tivéssemos essa escolha muita gente optaria por não ter nascido, a minha escolha com toda certeza seria essa, afinal quem escolheria nascer tendo como família apenas um homem que era envolvido no mundo da máfia?A minha mãe morreu no meu parto, e às vezes eu me perguntava se ela teria aceitado a vida que o meu pai tinha pra dar pra nós duas, ou se ela teria fugido pra que eu pudesse ter uma vida normal, eu preferia acreditar que nenhuma mãe iria colocar em risco a vida da filha tendo outras opções para mantê-la em segurança.Eu achava que a vida era muito injusta comigo, e aquele era mais um daqueles dias em que eu seria obrigada a ir para a universidade e depois teria que ficar trancada em casa enquanto o meu pai saía pra fazer coisas ilícitas com o mafioso mais temido da Itália.— Bom dia pai.— Bom dia Ana, eu já estava indo mesmo acordar você, tome o seu café da manhã rápido pois eu terei que deixá-la na universidade mais cedo.— E quantos homens irão ficar de guarda na porta da universidade dessa vez?— O suficiente para mantê-la segura.— Mande os seus homens ficarem distante o bastante para ninguém perceber que eu tenho cães de guarda.— Então não se coloque em risco, fique onde eles possam ver você.Eu revirei os olhos deixando claro a minha insatisfação mas ele nem ligava mais pras minhas reações, ele simplesmente ignorava pra não ter que escutar de novo o que eu realmente pensava sobre o trabalho dele com um homem que eu nunca havia visto na vida mas que colocava a vida de todo mundo em risco.Eu terminei de tomar o café da manhã em silêncio e depois segui pro quarto pra me arrumar.Sabe o que mais doía naquilo tudo? Era que eu não podia nem ter um namorado, não podia conhecer uma pessoa que pudesse melhorar a minha vida pelo menos um pouquinho, eu vivia me perguntando se eu iria morrer virgem, ou se iria ter que fazer sexo com alguém na presença de seguranças, eu queria poder ser tocada por um homem e sentir prazeres que eu nunca senti, viver experiências que eu nunca vivi.— Ana? Já está pronta?— Sim.— Estarei esperando você no carro!Eu peguei todo o meu material e segui pro carro onde encontrei dois brutamontes com armamentos pesados e outro carro atrás da gente.— Quantos homens tem no carro de trás? — Quatro.— Eu já estou cansada disso.— Quem está cansado sou eu de ter que explicar pra você um milhão de vezes que tudo isso é pra sua segurança.— Eu não iria precisar disso se você escolhesse um trabalho dentro da lei.— Eu não vou entrar nesse assunto de novo.— Nós vamos ter que entrar nesse assunto quando eu me formar e escolher uma vida diferente dessa.— Você pode escolher ir pro outro lado do mundo Ana, mas os seguranças irão com você.Eu enchi os meus olhos de lágrimas mas escolhi ficar calada, afinal aquela conversa não iria dar em lugar nenhum.Eu cheguei na universidade e subi a escadaria com pressa, sem olhar pra trás, mas estava sob o olhar curioso dos alunos, pois aquele carro grande e de vidros escuros que sempre me deixava lá, chamava a atenção de todo mundo.Pra que eu pudesse frequentar a universidade, eu precisava seguir algumas regras, dentre elas era de não falar sobre a minha vida pessoal pra ninguém, e se alguém perguntasse, a ordem era para eu mentir, e eu sofria com o fato de precisar mentir para a minha melhor amiga, mas ela já estava desconfiando que eu guardava um grande segredo.Assim que eu a vi, eu percebi ela olhando pro carro que eu havia acabado de descer.— Bom dia amiga!— Quando você vai me levar pra andar naquele carrão?— Acho que você terá que esperar eu ter o meu próprio carro, Sam.— E de quem é aquele?— É do chefe do meu pai, agora vamos entrar.Ela sorriu e começou a tagarelar sobre o cara que ela estava afim de ficar, e mais uma vez eu me vi pensando se algum dia eu iria poder falar sobre um garoto com ela.A aula começou e eu tentei me concentrar na matéria, eu acreditava que o estudo fosse a única coisa que podia me salvar daquela vida.Quando eu escolhi fazer pedagogia eu pensei que além do meu amor por crianças, eu poderia ensiná-las a serem seres humanos dignos de confiança, que eu iria poder ensiná-las nos primeiros anos de suas vidas a ficarem longe do crime, das drogas e de pessoas como o meu pai e o chefe dele, que o estudo deveria ser o aliado delas na conquista de uma vida digna e justa, eu tentava não ficar desacreditada disso, afinal eu havia tido estudo, no entanto isso não impediu que eu tivesse uma vida limitada pelas escolhas do meu pai.Eu nunca perguntei quais foram os motivos pelo qual o meu pai havia escolhido aquela vida, pra mim nada justificava seguir por aquele caminho, pra mim tudo era questão de escolha, eu podia simplesmente acordar no dia seguinte e escolher denunciá-lo pra polícia, mesmo sabendo que logo depois eu iria ser morta a mando do tão temido mafioso.Afinal quem ele era? Eu me perguntava sobre isso constantemente.Das vezes que pesquisei na internet só apareceu o nome dele e nada mais, não existia um rosto, eu não sabia nem se aquele era realmente o seu verdadeiro nome. Quem era Kall Bellini? Era novo ou velho? Ele tinha família ou era solteiro? Eram perguntas que o meu pai nunca me respondeu, ele sempre falava que eu não precisava saber daquelas informações.A aula terminou e eu chamei a Sam para almoçarmos no refeitório da própria universidade, mas não demorou muito até o meu celular começar a tocar, eu olhei pra tela e decidi atender logo antes que os cães de guarda decidissem me procurar.— Onde você está? A aula já acabou.— Eu vou ficar mais um pouco aqui, eu estou no refeitório com uma amiga, vamos almoçar juntas.— O seu pai não nos passou essa informação.— Eu estou passando agora, até mais.Eu desliguei o celular para que nenhum deles voltasse a me perturbar.— Quem era?— Era o motorista.— As vezes eu tenho a impressão de que você esconde coisas de mim, eu praticamente não sei nada da sua vida.Eu abaixei a minha cabeça e tentei segurar a enorme vontade de falar a verdade.— Eu estou certa, não estou?— Você vai acreditar se eu disser que está errada?— Sinceramente? Não!— Então não adianta a gente conversar sobre isso.— Tudo bem Ana, eu não vou insistir nesse assunto, mas saiba que eu estou aqui pra qualquer coisa que você
Ele arqueou a sobrancelha, segurou o cordão que estava no pescoço e o enrolou no dedo indicador, eu fiquei sem voz e analisei cada movimento dele como se ele estivesse prestes a me devorar, ele deu dois passos em minha direção, e eu dei dois pra trás.— Você não parece tão corajosa quanto foi na ligação.A ficha finalmente caiu sobre quem era ele, então os meus pés se solidificaram no mesmo lugar se recusando a continuar demonstrando medo, mas ele continou andando em minha direção até ficar a um passo de distância de mim.— Então além de intrometido você é invasor? Quem deu permissão pra você entrar na minha casa?— Quem disse pra você que eu preciso de permissão para fazer algo?— Você pode ter poder e autoridade sobre o meu pai, mas não tem poder sobre mim, aqui é o meu lar, e eu não vou deixar você se sentir dono do meu espaço, você me entendeu?Ele soltou um sorriso como se estivesse se divertindo com toda a situação, mas eu me mantive séria pra ele entender que eu não estava brin
Eu imaginei que o assunto da conversa fosse exclusivamente sobre a forma que eu havia tratado aquele bandido do chefe dele, eu não imaginava que as palavras do meu pai estavam carregadas de desgraça e dor.— Nós precisamos ter uma conversa séria, Ana.— Outra? O senhor não cansa de falar sempre a mesma coisa não?— Essa conversa é diferente, então sugiro que sente e me escute com atenção.Eu caminhei até a cama e me sentei, e ele sentou ao meu lado com uma tensão que eu nunca tinha visto antes.— Qual o problema pai?— Alguma vez na sua vida você já pensou que eu posso morrer a qualquer momento?— Eu penso nisso todos os dias.— E esse é o seu desejo?— É claro que não pai, se eu falo pro senhor abandonar essa vida obscura, é simplesmente por medo de perder você.— Mas acho que você vai precisar ir se preparando para essa realidade Ana.— Realidade? Que realidade? Você está falando que realmente irá morrer?— Recentemente eu descobri que eu tenho leucemia, e o quadro já está bastante
Eu tinha muitas perguntas que gostaria de tirar com o médico dele, por isso eu insisti pra ir junto, eu queria saber ao certo quanto tempo mais o meu pai tinha de vida, e se realmente não existia nada a ser feito.Entramos em um local bastante estranho, sem movimento nenhum de pessoas, na verdade aquilo nem parecia um hospital, parecia mais um prédio abandonado.— Onde estamos pai?— Estamos em um lugar seguro Ana, eu farei a quimio aqui.— Mas isso nem é um hospital.— Não é um hospital, mas os melhores médicos do país estarão me tratando aqui, entenda que eu não posso ficar de bobeira em qualquer lugar.— Que vida incrível, a pessoa não tem direito nem de ficar doente.— Por favor, não vamos começar de novo com isso.Eu desci do carro junto com ele e de longe eu vi outro carro se aproximando.— Por favor, Ana, seja uma boa menina.— Ah não, eu não acredito que a pessoa naquele carro é o seu chefe sem futuro.O meu pai me jogou um olhar fuzilante e eu tentei manter a minha língua den
KALL..Temor, era exatamente isso que eu provocava nas pessoas, eu caminhei bastante por aquela estrada pra chegar onde eu cheguei, mas confesso que antes de eu andar por aquele caminho, o meu pai já havia construído a estrada.Eu era de uma família de mafiosos, o meu pai fez história antes de ser assassinado covardemente por seu inimigo, o próprio irmão, um traidor que queria a todo custo o poder, no entanto, quando o meu pai partiu, eu assumi a vida dele, os negócios dele e me tornei tão notável e temido quanto ele e eu passei a buscar por justiça, eu botei na cabeça que eu iria honrar o sangue dele.O meu pai tinha um melhor amigo e esse amigo era o braço direito dele, Lion Benevides nunca o decepcionou e sempre esteve ao lado do meu pai em todas a batalhas, então eu não poderia ter outra pessoa ao meu lado pra depositar toda a minha confiança, então o Lion tornou-se o meu braço direito também, porém eu o tinha como um pai também, pois muitas vezes ele agiu como tal.A nossa famí
O Lion foi fazer outros exames, buscar uma segunda opinião sobre o caso dele, e eu fui até a casa dele, um lugar que eu nunca entrei, mas que sabia muito bem o endereço.Assim que os seguranças me viram descer do carro, eles olharam entre si como se estivessem preocupados, mas aqueles homens eram pagos por mim e não pelo Lion, então eles me deviam obediência.— Cadê a garota?— Está dentro da casa senhor.Disse um deles.Eu não podia negar que estava curioso para conhecer a garota que teve a ousadia de me enfrentar, eu queria ter a certeza que ela manteria aquela coragem na minha frente.Quando eu entrei na parte interna da casa eu ouvi o som alto vindo do fim do corredor, eu segui por ele até chegar na última porta, eu entrei lentamente e não vi ninguém, eu dei alguns passos e notei que ela estava no banheiro, então eu fui até o som e o desliguei.Eu sabia que era só uma questão de tempo até ela ir ver o que tinha acontecido com o som, e em menos de um minuto eu ouvi o grito dela.Qu
Eu fui resolver algumas questões importantes e depois fui pra casa, quando a noite chegou o Lion me avisou que precisava iniciar a quimio o mais rápido possível, então eu cuidei de tudo pra que ele pudesse fazê-la em segurança, no dia seguinte eu fui prestar o meu apoio a ele no local marcado, mas quando cheguei lá, eu vi que ele estava acompanhado da filha linguaruda dele que ficou revirando os olhos ao me ver.Apesar de eu perguntar se ela estava com problema nos olhos, eu imaginei ela revirando aqueles olhos enquanto cavalgava em cima de mim, eu sabia que o Lion estava confiante que eu iria cuidar da filha dele, e eu cuidaria, mas nada me impediria de sugar até a alma dela.Eu fui bem direto ao falar no ouvido dela que depois de um tempo ela ficaria completamente rendida a mim, e com toda certeza ela pensaria no que eu disse por dias, mas era essa a minha intenção, eu queria que ela fosse alimentada por pensamentos que talvez ela nunca tivesse tido.Depois que o Lion a levou para d
Ana..Pra alguém que já havia matado uma porção de pessoas era difícil acreditar que o Kall tinha um coração, mas o meu pai também havia matado, talvez mais do que o intocável Kall, então eu sabia que ele era um homem bom, ao menos pra mim, mas quando o Kall atendeu imediatamente ao pedido do meu pai e organizou tudo pra nos tirar do país eu fiquei levemente mexida, mas não o suficiente pra demonstrar aquilo que eu estava pensando ou sentindo, eu ainda acreditava que ele jamais seria capaz de se infiltrar nos meus pensamentos de uma forma que eu não pudesse controlar.Fomos levados pra costa africana, e existia seguranças em todos os cantos da propriedade, um helicóptero pra emergências e um hiate.O lugar era realmente um espetáculo de tão lindo, e me transmitia uma sensação de paz, embora eu soubesse que estava no meio de uma grande tempestade.No dia seguinte que chegamos ao local, o celular do meu pai tocou, mas ele não estava perto pra atender, eu olhei a tela do celular e vi q