CAPÍTULO 9

Ana

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Pra alguém que já havia matado uma porção de pessoas era difícil acreditar que o Kall tinha um coração, mas o meu pai também havia matado, talvez mais do que o intocável Kall, então eu sabia que ele era um homem bom, ao menos pra mim, mas quando o Kall atendeu imediatamente ao pedido do meu pai e organizou tudo pra nos tirar do país eu fiquei levemente mexida, mas não o suficiente pra demonstrar aquilo que eu estava pensando ou sentindo, eu ainda acreditava que ele jamais seria capaz de se infiltrar nos meus pensamentos de uma forma que eu não pudesse controlar.

Fomos levados pra costa africana, e existia seguranças em todos os cantos da propriedade, um helicóptero pra emergências e um hiate.

O lugar era realmente um espetáculo de tão lindo, e me transmitia uma sensação de paz, embora eu soubesse que estava no meio de uma grande tempestade.

No dia seguinte que chegamos ao local, o celular do meu pai tocou, mas ele não estava perto pra atender, eu olhei a tela do celular e vi que era o Kall e decidi atender, eu poderia ter chamado o meu pai? Poderia...Mas eu não iria perder a oportunidade de confrontar ainda mais o cara que achava que tinha o poder do mundo nas mãos.

Eu nunca considerei que o meu gênio forte fosse de fato um problema, muito pelo contrário, o meu gênio me ajudava a não fugir de confrontos, ele me obrigava a encarar os problemas de frente e a jamais baixar a minha cabeça pra ninguém, eu sempre soube respeitar quem realmente merecia respeito, mas jamais me renderia a imposição de ninguém.

Deu pra notar o quanto eu conseguia deixar o Kall desestabilizado, e eu me divertia com o fato de saber que eu o deixava louco, e depois de ter sugado toda a paciência dele, o meu pai chegou e tirou o celular da minha mão, mas nada me impediu de continuar a atingi-lo mesmo que distante do celular.

Quando o meu pai encerrou a ligação, ele me olhou com aquela cara de sempre, e eu sabia que escutaria outro sermão.

— Precisava disso, Ana?

— Eu não fiz nada demais, apenas expressei a minha humilde opinião.

— Guarde a sua humilde opinião com você quando o assunto for o Kall.

— O Kall precisa entender que eu não vou ser a marionete dele quando eu estiver morando com ele.

— Você é igualzinha a sua mãe.

A simples menção sobre a minha mãe me fez paralisar, eu não sabia quase nada sobre ela, e todas as vezes que fiz perguntas sobre como ela era pro meu pai, ele sempre dava um jeito de desconversar.

— Como ela era?

— Ela era impulsiva, não sabia controlar a língua, assim como você, aquilo me deixava maluco.

— Por que você nunca fala sobre ela?

— Vamos mudar de assunto?

— É sempre a mesma coisa pai, o que aconteceu de tão grave que você não consegue falar dela pra mim por cinco minutos?

— Ela partiu, e eu odeio lembrar disso, por isso evito discutir com você, porque quando você está com raiva, age e fala como ela, e isso me faz lembrar de coisas que eu gostaria de esquecer.

— E qual o problema em lembrar pai?

— Você não entenderia.

— Então porque você não tenta me explicar?

— Vamos deixar isso quieto Ana, agora vá se arrumar, vamos dar uma volta de iate, afinal estamos aqui pra aproveitarmos os meus últimos dias.

Eu respirei fundo tentando não chorar, ele estava certo, precisávamos aproveitar, e eu queria fazer daqueles dias os melhores dias que já tivemos.

Eu coloquei um biquíni, uma saída de banho e um chapéu, fomos pro Iate acompanhados de quatro homens armados que ficaram me devorando com os olhos quando tirei a saída e fiquei só de biquíni.

— Vamos pular na água pai?

— Vai você primeiro.

Ele me jogou na água sem piedade e começou a rir.

— Seu velho covarde.

Falei logo depois de voltar a superfície.

Ele pulou na água e ficamos nadando um pouco, até ele começar a tossir e espirrar sangue.

— Pai? Eu gritei assustada.

— Calma Ana, isso é normal pra minha condição, vamos voltar pro Iate, eu estou com falta de ar.

Quando subimos no iate novamente, ele pegou a toalha se enxugou e se sentou.

— Você precisa de um médico pai? Eu posso ligar pro Kall e...

— Não é preciso, ele já disse que mandaria médicos amanhã, e não existe nada que se possa fazer agora, a tendência é só piorar Ana, eu preciso que você esteja preparada pra isso.

Eu enchi os meus olhos de lágrimas e não aguentei segurá-las, elas começaram a cair e o meu pai me encarou com um olhar de culpa.

— Eu sinto muito por essa dor que você está sentindo minha filha.

— Eu não quero perder o senhor, eu odeio essa droga de vida.

— Não fale isso, um dia você será uma excelente professora, e terá a vida que sempre sonhou.

— Como? Você mesmo disse que eu iria ficar sob a guarda do Kall.

— Eu vou conversar com ele Ana, eu vou pensar em uma forma de você ter uma vida boa sem correr grandes riscos.

— Você promete?

— Eu prometo.

Eu o abracei e chorei muito enquanto ele alisava os meus cabelos, eu sentia a dor de estar prestes a perdê-lo, mas também sentia alívio por saber que ainda existia uma chance pra mim.

— Agora vamos voltar pra casa, eu estou me sentindo com fome e cansado.

Quando chegamos em casa eu me lembrei de um detalhe que havia passado despercebido por mim, eu estava com a cabeça tão cheia de problemas que esqueci que estava sem celular e que também não havia informado a universidade sobre a minha ausência nas aulas.

— Ah droga, como posso ter esquecido disso?

— Esquecido de quê?

— Eu quebrei o meu celular, preciso de um novo, e também não informei a universidade sobre a minha ausência nas aulas.

— Como você quebrou o seu celular?

— Eu joguei ele na parede.

Ele ficou me encarando tentando assimilar aquela reação a mim, pois aquela era a primeira vez que eu havia descontado a minha raiva em um objeto.

— Não me olha assim, a culpa foi sua.

— Minha?

— Sim, você ficou brigando comigo por causa daquele...Deixa pra lá, só de falar dele eu já fico indignada.

— Eu vou mandar alguém providenciar um celular pra você, e sobre a universidade eu vou falar pro Kall resolver isso.

— O Kall vai resolver isso como? Ele não é meu pai e é novo demais pra justificar a minha ausência como se fosse o meu tutor.

— Não há motivos pra se preocupar, Ana.

— Pelo visto, é tudo muito fácil de ser resolvido estando nessa vida.

— Não é que seja fácil, só somos práticos.

— Eu só espero que essa praticidade não me coloque em uma posição ruim diante do reitor.

Eu fui pro meu quarto tomar um banho pra esfriar a minha cabeça, mas a verdade era que nada conseguiria me deixar mais tranquila diante de tudo aquilo que eu estava sendo obrigada a aceitar.

Eu não gostava nem um pouco de todo o poder que o meu pai estava dando ao Kall sobre a minha vida.

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