Eu imaginei que o assunto da conversa fosse exclusivamente sobre a forma que eu havia tratado aquele bandido do chefe dele, eu não imaginava que as palavras do meu pai estavam carregadas de desgraça e dor.
— Nós precisamos ter uma conversa séria, Ana.— Outra? O senhor não cansa de falar sempre a mesma coisa não?— Essa conversa é diferente, então sugiro que sente e me escute com atenção.Eu caminhei até a cama e me sentei, e ele sentou ao meu lado com uma tensão que eu nunca tinha visto antes.— Qual o problema pai?— Alguma vez na sua vida você já pensou que eu posso morrer a qualquer momento?— Eu penso nisso todos os dias.— E esse é o seu desejo?— É claro que não pai, se eu falo pro senhor abandonar essa vida obscura, é simplesmente por medo de perder você.— Mas acho que você vai precisar ir se preparando para essa realidade Ana.— Realidade? Que realidade? Você está falando que realmente irá morrer?— Recentemente eu descobri que eu tenho leucemia, e o quadro já está bastante avançado, o médico disse que pode tentar a quimioterapia, mas pelo estágio eu só estaria me dando um pouco mais de tempo de vida.— Não, não, você está bem, eu estou vendo que o senhor está bem, como pode estar doente se eu estou vendo você sem nenhum sintoma?Ele se levantou e começou a desabotoar a blusa, ele a tirou e eu rapidamente percebi a gravidade da situação, todo o corpo dele estava repleto de manchas roxas, eu coloquei a mão na boca e comecei a chorar.— Eu achava que isso era por conta das brigas constantes em que eu me meto, você sabe que esse meu trabalho tem muito disso, mas eu fui começando a me sentir muito cansado, e a minha vista começou a ficar turva, e hoje pela manhã o meu nariz sangrou enquanto você estava se arrumando pra ir pra universidade.— Esses sintomas são iniciais pai, esse médico está errado, existe tratamento, o senhor pode ficar curado, vamos procurar uma segunda opinião.— Ana, só hoje eu passei por três médicos, eu passei o dia fazendo exames, foi por isso que o Kall atendeu o meu celular.— Então mesmo sabendo que você pode morrer, mesmo sabendo que eu posso ficar sozinha no mundo, ele veio aqui me ameaçar? Que tipo de monstro esse cara é?— Ana, se eu morrer, esse cara será o único que poderá proteger você.— Não, eu não preciso de proteção, e o senhor não vai morrer pai.As lágrimas se intensificaram e ele tentou me acalentar, mas não existia dor maior do que saber que em breve eu não teria mais aquele abraço.— Ana, eu vou tentar ficar o máximo de tempo com você, mas quando eu morrer, o Kall será responsável por você.Eu me afastei dele bruscamente e me levantei inconformada.— Eu prefiro a morte a ter que conviver com um mafioso, o senhor não pode fazer isso comigo pai, eu não mereço tamanho castigo.— A decisão já está tomada Ana,eu não vou seguir em paz sabendo que você estará sem proteção.— Como o senhor quer que eu fique sob os cuidados de um homem que tentou arrancar a minha língua? — Ele não ia arrancar, ele só queria que você o respeitasse.— E ele quer o meu respeito tentando me impor medo?— Ana, eu sei que essa não é a vida que você quer, mas durante esses anos eu fiz muitos inimigos, e mesmo depois da minha morte, eles não irão deixá-la em paz, pois nesse mundo da máfia todos da família se tornam inimigos deles, e o Kall é o homem mais temido entre os mafiosos, estando com ele você ficará segura, então me prometa que você irá respeitar a minha vontade.— Mas pai…— Prometa Ana?!— Tudo bem, eu prometo.Ele me abraçou forte e eu me permiti desabar mais uma vez, pois se antes era difícil ter esperança de um futuro diferente, tão pouco eu teria depois daquilo.— Agora vamos jantar, vamos aproveitar melhor nossos momentos juntos.A comida desceu queimando pela minha garganta, e eu tentei não chorar novamente, mas por dentro eu estava destruída, não era como o sentimento de não ter tido uma mãe, era muito pior, pois eu já conhecia o sentimento de ter um pai, ele não era perfeito, ele era cheio de defeitos, mas era a minha única família, e depois dele partir, eu com toda certeza me afundaria na tristeza.— Não quero que você se martirize com isso, quero que você continue sendo essa menina forte que sempre foi.— Não dá pra continuar sendo forte sabendo do futuro que terei pai, agora eu vou pro meu quarto, eu preciso pensar.Eu me levantei, tomei a benção e segui pro meu quarto pra chorar mais.Eu já havia pensado em vários futuros diferentes, dos mais trágicos aos mais felizes, mas jamais passou pela minha cabeça ficar sob a guarda de um mafioso.— Isso só pode ser um pesadelo, quando eu acordar nada disso será real.Entre soluços o sono me abraçou, mas na verdade o sentimento era de morte.O dia amanheceu e eu abri os olhos vendo os primeiros reflexos do sol entrando pela minha janela, o meu corpo estava moído e a minha cabeça estava dolorida, eu me mantive na cama e olhei pro teto e voltei a chorar me dando conta que aquela dor era mesmo real.Eu não tinha vontade de me levantar, na verdade eu não tinha mais nemvontade de viver.Eu ouvi batidas na porta, mas lembrei que eu nem cheguei a trancá-la.— Pode entrar pai.Ele abriu a porta lentamente e me analisou à distância.— Você não vai pra universidade hoje?— Eu quero ficar em casa se o senhor não se importar.— Ana, você ainda pode realizar sonhos, não é porque ficará sob os cuidados do Kall que você não poderá realizá-los.— Eu não quero falar sobre isso agora, pai.— Tudo bem, eu vou pra minha primeira sessão de quimio, me ligue se precisar de algo.Eu me levantei da cama na mesma hora e o encarei.— Porque você não me avisou antes? Eu vou com o senhor, eu não vou deixar você passar por isso sozinho.— Não é necessário que você vá comigo Ana, fique em casa.— Eu quero ir, por favor.— Tudo bem, mas se arrume rápido, eu tenho hora marcada.Eu me levantei, corri para o banheiro, fiz a minha higiene pessoal, me arrumei e entrei no carro onde o meu pai já está esperando com os capangas dele.Eu tinha muitas perguntas que gostaria de tirar com o médico dele, por isso eu insisti pra ir junto, eu queria saber ao certo quanto tempo mais o meu pai tinha de vida, e se realmente não existia nada a ser feito.Entramos em um local bastante estranho, sem movimento nenhum de pessoas, na verdade aquilo nem parecia um hospital, parecia mais um prédio abandonado.— Onde estamos pai?— Estamos em um lugar seguro Ana, eu farei a quimio aqui.— Mas isso nem é um hospital.— Não é um hospital, mas os melhores médicos do país estarão me tratando aqui, entenda que eu não posso ficar de bobeira em qualquer lugar.— Que vida incrível, a pessoa não tem direito nem de ficar doente.— Por favor, não vamos começar de novo com isso.Eu desci do carro junto com ele e de longe eu vi outro carro se aproximando.— Por favor, Ana, seja uma boa menina.— Ah não, eu não acredito que a pessoa naquele carro é o seu chefe sem futuro.O meu pai me jogou um olhar fuzilante e eu tentei manter a minha língua den
KALL..Temor, era exatamente isso que eu provocava nas pessoas, eu caminhei bastante por aquela estrada pra chegar onde eu cheguei, mas confesso que antes de eu andar por aquele caminho, o meu pai já havia construído a estrada.Eu era de uma família de mafiosos, o meu pai fez história antes de ser assassinado covardemente por seu inimigo, o próprio irmão, um traidor que queria a todo custo o poder, no entanto, quando o meu pai partiu, eu assumi a vida dele, os negócios dele e me tornei tão notável e temido quanto ele e eu passei a buscar por justiça, eu botei na cabeça que eu iria honrar o sangue dele.O meu pai tinha um melhor amigo e esse amigo era o braço direito dele, Lion Benevides nunca o decepcionou e sempre esteve ao lado do meu pai em todas a batalhas, então eu não poderia ter outra pessoa ao meu lado pra depositar toda a minha confiança, então o Lion tornou-se o meu braço direito também, porém eu o tinha como um pai também, pois muitas vezes ele agiu como tal.A nossa famí
O Lion foi fazer outros exames, buscar uma segunda opinião sobre o caso dele, e eu fui até a casa dele, um lugar que eu nunca entrei, mas que sabia muito bem o endereço.Assim que os seguranças me viram descer do carro, eles olharam entre si como se estivessem preocupados, mas aqueles homens eram pagos por mim e não pelo Lion, então eles me deviam obediência.— Cadê a garota?— Está dentro da casa senhor.Disse um deles.Eu não podia negar que estava curioso para conhecer a garota que teve a ousadia de me enfrentar, eu queria ter a certeza que ela manteria aquela coragem na minha frente.Quando eu entrei na parte interna da casa eu ouvi o som alto vindo do fim do corredor, eu segui por ele até chegar na última porta, eu entrei lentamente e não vi ninguém, eu dei alguns passos e notei que ela estava no banheiro, então eu fui até o som e o desliguei.Eu sabia que era só uma questão de tempo até ela ir ver o que tinha acontecido com o som, e em menos de um minuto eu ouvi o grito dela.Qu
Eu fui resolver algumas questões importantes e depois fui pra casa, quando a noite chegou o Lion me avisou que precisava iniciar a quimio o mais rápido possível, então eu cuidei de tudo pra que ele pudesse fazê-la em segurança, no dia seguinte eu fui prestar o meu apoio a ele no local marcado, mas quando cheguei lá, eu vi que ele estava acompanhado da filha linguaruda dele que ficou revirando os olhos ao me ver.Apesar de eu perguntar se ela estava com problema nos olhos, eu imaginei ela revirando aqueles olhos enquanto cavalgava em cima de mim, eu sabia que o Lion estava confiante que eu iria cuidar da filha dele, e eu cuidaria, mas nada me impediria de sugar até a alma dela.Eu fui bem direto ao falar no ouvido dela que depois de um tempo ela ficaria completamente rendida a mim, e com toda certeza ela pensaria no que eu disse por dias, mas era essa a minha intenção, eu queria que ela fosse alimentada por pensamentos que talvez ela nunca tivesse tido.Depois que o Lion a levou para d
Ana..Pra alguém que já havia matado uma porção de pessoas era difícil acreditar que o Kall tinha um coração, mas o meu pai também havia matado, talvez mais do que o intocável Kall, então eu sabia que ele era um homem bom, ao menos pra mim, mas quando o Kall atendeu imediatamente ao pedido do meu pai e organizou tudo pra nos tirar do país eu fiquei levemente mexida, mas não o suficiente pra demonstrar aquilo que eu estava pensando ou sentindo, eu ainda acreditava que ele jamais seria capaz de se infiltrar nos meus pensamentos de uma forma que eu não pudesse controlar.Fomos levados pra costa africana, e existia seguranças em todos os cantos da propriedade, um helicóptero pra emergências e um hiate.O lugar era realmente um espetáculo de tão lindo, e me transmitia uma sensação de paz, embora eu soubesse que estava no meio de uma grande tempestade.No dia seguinte que chegamos ao local, o celular do meu pai tocou, mas ele não estava perto pra atender, eu olhei a tela do celular e vi q
kall..Um dos meus homens foi me avisar que a mulher que eu solicitei já havia chegado.— A traga até mim.— Sim senhor.Quando ela entrou no quarto eu notei uma certa semelhança entre ela e a filha do Lion, ela não era tão linda quanto a Ana, mas os cabelos castanhos quase loiros, o tamanho dos seios, e os lábios rosados eram bem parecidos.A venda nos olhos não me permitia ver mais detalhes do rosto dela, mas não importava, afinal eu nunca mais comeria aquela mulher outra vez.— Como você se chama?— Nathaly.— Você sabe onde está, Nathaly?— Não, mas me ofereceram um valor muito alto pra estar aqui.— E você não teve medo de ser levada pra um lugar que você não conhece pra encontrar um completo desconhecido?— Não é a primeira vez que passo por isso, eu já estou acostumada com essa vida.— Então você não vai se importar com isso aqui, não é?Eu a segurei pelo pescoço a encostando na porta e enfiei a outra mão por dentro da calcinha dela.O fato dela estar de saia facilitou muito
Os meus homens conseguiram sobreviver, apesar de um deles precisar fazer fisioterapia depois de se recuperar da cirurgia, mas enquanto eles estavam sendo operados, conseguimos localizar o helicóptero que estava sobrevoando a casa.— Senhor, o helicóptero pertence a uma empresa privada que aluga helicópteros para fins comerciais.— Mas é claro, já era de se esperar algo assim, afinal quem iria querer ser descoberto? Qual é o nome do proprietário da empresa?— Ele se chama Enzo Marazzo, tem 42 anos e aparentemente não tem nenhum envolvimento com o crime.— Aparentemente eu também não tenho, no entanto...— O que devemos fazer?— Eu quero saber se tem esposa, filhos, mãe, pai, onde moram, que lugares frequentam, quero fotos, nomes, tudo.— Sim senhor, iremos providenciar essas informações.Eu me retirei e fui pro meu escritório, a minha cabeça estava explodindo, e eu estava furioso, mas a minha intuição dificilmente falhava, algo me dizia que o dono da empresa me daria as respostas que
Ana..Durante o jantar o meu pai me entregou uma sacola de uma loja e quando eu abri vi que se tratava do meu novo celular.— Obrigada pai, mas não precisava ser um tão caro.— Dinheiro nunca foi problema Ana.— Não gosto de saber que minhas coisas são compradas com o dinheiro do crime.— Não vamos ter essa conversa na hora do jantar Ana.— Você falou com o problemático do Kall sobre as minhas faltas?— Sim, ele vai resolver da melhor maneira possível, não se preocupe.— E sobre o meu futuro?— Nós também conversamos sobre isso.— E então?— Você irá morar com ele até o fim do seu curso, após isso ele irá comprar uma casa e um carro pra você e...— Eu não quero nada que venha dele.— O dinheiro será meu, mesmo não estando vivo, o meu dinheiro irá manter você.— Eu quero trabalhar pra manter as minhas próprias coisas.— Você não está ajudando Ana, se você quer ter uma vida normal, terá que facilitar.— Tudo bem, depois que ele comprar a casa e o carro, como será?— Você irá morar soz