Capítulo Três

Terminei de ler a carta com os olhos marejados. E imaginando o quanto essa moça chamada Claire era sortuda por ter um amor como esse. Ao todo eram cinco cartas, enviadas entre os meses de janeiro a novembro de quarenta e quatro. Naquela época o serviço de entrega de cartas era bastante limitado, o fato de que os regimentos viviam mudando de lugar também não ajudava, até separar por local, batalhão, eram meses de espera. 

Ávida por mais daquela história, coloquei todas em ordem cronológica e enchi de novo a taça com o vinho...

França, 25 de janeiro de 1944

Inesquecível Claire...

... Não faz nem um mês que nos casamos e já sinto tua falta como se houvessem se passado vários anos. A saudade é um martírio e as doces lembranças que guardo comigo são um alento para esse coração sofrido. Não passa um só dia sem que eu não pense em você, não me lembre do som da sua doce voz, não me recorde do seu sorriso maravilhoso.

Mande-me notícias de meus pais e minhas irmãs, e diga-lhes que estou com muitas saudades. E anseio por rever a todos logo.

Com todo o meu coração, sempre seu, Ronald.

            Todas elas começavam com “Inesquecível Claire...” e eu não pude imaginar nada mais romântico. A carta que eu tinha lido primeiro era a segunda a ter sido enviada, quando eles já tinham alguns meses de casados. Já passava da meia noite, mas estava cada vez mais curiosa e não conseguia parar...

França, 19 de julho de 1944

Inesquecível Claire...

... Meu amor, você não podia me dar uma notícia melhor! Eu vou ser pai! Estou em êxtase, maravilhado, encantado e louco para ver o rostinho do nosso filho, ou filha. Peço-lhe que me mande uma foto sua quando já estiver com a barriga avantajada para que eu a veja assim, nem que seja em um retrato.

Estou de volta à França, pois as forças estão concentradas na Normandia para expulsar os nazistas e ganhar território, até agora correu tudo na mais perfeita ordem.

Meu amor, peço-lhe que continue rezando por mim e pelo meu batalhão, e reze também para que esta guerra acabe.

Eternamente seu, Ronald.

            Eles tiveram um filho! Uma criança nascida desse amor

            Meus olhos ardiam e eu bocejava várias vezes durante a leitura, em grande parte por causa do vinho, mas eu não queria parar agora, queria saber o que tinha acontecido ao Ronald, a Claire e principalmente ao seu filho...

Alemanha, 27 de outubro de 1944

Inesquecível Claire...

... Fico feliz em saber que nosso filho está bem e que todos estão felizes com a sua chegada. Pelas minhas contas, está chegando a hora do parto e só Deus sabe o quanto eu gostaria de estar aí, ver o bebê nascer, olhar para o seu rostinho e agradecer por esse presente. Meu coração aperta de saudades de você e dele, que ainda não conheço, mas já amo mais que a minha própria vida.

Meu amor, nós conseguimos invadir as fronteiras do Eixo, conquistamos a cidade alemã de Aachen, é uma grande vitória, pois pela primeira vez, um território alemão vai ser controlado pelos Aliados, todos estão vibrando com esse fato. Libertamos muitos moradores daquela terra de ninguém, e eles no agradeceram imensamente, não nos viram como inimigos, mas nos chamam de anjos salvadores. Isso reanimou minhas forças para continuar prosseguindo.

Desejo-lhe que tenha um bom parto e traga nosso filho ao mundo com saúde e nunca se esqueça, eu a amo mais que tudo.  

Para sempre e todo sempre, seu Ronald.

            Peguei a última carta com mãos trêmulas, ela tinha sido enviada por Roland apenas um mês depois da outra...

França, 28 de novembro de 1944

Inesquecível Claire...

... Escrevo-te cheio de saudades e com o coração aflito por estar longe de você e de nosso filho, eu ainda não sei se é menino ou menina, não sei o nome e nem com quem ele se parece. A última carta que eu escrevi ainda não chegou até você, mas eu não pude esperar uma resposta sua para lhe dizer que eu a amo, eu a venero e eu enlouqueço um pouco a cada dia que estou longe de você.

Essa noite eu tive um sonho maravilhoso. Nele, nós estávamos juntos, eu, você e nosso filho que era um menino, gosto de acreditar que este sonho foi-me um aviso sobre ele ser um menino, mas ao mesmo tempo, me pego pensando se um dia ele não vai ter de enfrentar os mesmos perigos e provações que eu enfrento hoje, e nesse momento desejo de todo o coração que tenha sido uma menina.

Meu regimento voltou para a França para libertar a cidade de Metz, onde soldados alemães se recusam a render-se.

Eu estou cansado, não aguento mais essa guerra, tudo que mais sonho é poder voltar para os seus braços e esquecer todos os horrores que eu vi e ouvi nos campos de batalha. Poder criar nosso filho e lhe dar muitos irmãozinhos. Depois de tomar essa cidade, vou pedir uma dispensa alegando cansaço físico e mental, a guerra está praticamente ganha, só falta os nazistas se renderem, ou então serão massacrados um a um.

Amo-te mais que tudo. Nada nunca irá me fazer esquecê-la, minha adorada e inesquecível Claire.

            Li a última frase aos prantos. Um medo irracional me tomou ao imaginar que por algum motivo, eles não ficaram juntos, que Ronald não pode conhecer o filho. Apesar de não ler as cartas enviadas por Claire ao seu amado, eu não ouso duvidar que ele era totalmente correspondido nesse amor, e que ela era tão intensa e apaixonada quanto ele em suas palavras.

            Deitei no sofá e reli as cartas, imaginando os cenários descritos, o horror que ele viveu na guerra e sentindo aquela mesma saudade que ele sentia da esposa.

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