Capítulo Seis

Quinta feira à tarde, um trânsito infernal. Um percurso que faço normalmente em quarenta minutos, levei mais de uma hora pra chegar a Bayside. Estacionei o carro na garagem e já ouvi os latidos de Chase dentro de casa. Entrei e foi aquela festa.

– Oi meu amor.

Deixei as compras em cima da mesa e ele pulou no meu colo.

– Eu também tava com saudades de você.

Coloquei comida e água pra ele e fui tomar banho. Respondi as mensagens que tinham no meu celular e deixe carregando.

Até agora não tive nenhuma resposta de Dory Green sobre o antigo morador da casa. Ted já até me cobrou algum resultado, mas não tenho nada.

Depois do banho, vesti meu pijama confortável de algodão e fui preparar algo pra comer. Optei por uma salada leve e um chá gelado pra acompanhar. Fiz meu prato e fui comer assistindo TV. Chase deitou no tapete me fazendo companhia.

Estava assistindo ao noticiário quando bateram na porta e levei um susto. Estranhei o horário, pois já estava tarde. Chase latiu e foi até a porta, eu também levantei e fui até lá, antes de abrir, chequei no olho mágico e quase caí pra trás. Abri a porta imediatamente.

– Betthany?! – exclamei chocada. O que minha irmã está fazendo aqui a essa hora?! E aparentemente sozinha!   

– Oie mana.

– O que você ta fazendo aqui? Ta sozinha?

Ela assentiu triste e me afastei lhe dando passagem.

– Vem entra, ta frio aí fora.

Betty tirou a mochila das costas e o casaco pesado que usava, deixando a ambos no sofá.

– Quer um chá? Ta com fome? Alguma outra coisa? – perguntei a abraçando.

– Não maninha, não quero nada. Só me... Abraça.      

Ela me agarrou e começou a chorar chegando aos soluços.

– Meu amor o que foi? Ta machucada? Betty o que houve, como você chegou aqui?

– Eu... Vim sozinha...

Completamente surpresa, a afastei um pouco para olhar em seus olhos.

– Como é? Betthany Louise Marshall, você veio sozinha do Brooklyn até aqui?

– Sim, eu vim de Uber que é mais seguro.

– Minha irmã mesmo assim é perigoso! E se esse cara te levasse pra outro lugar e fizesse algo ruim com você?

– Desculpa. – pediu secando os olhos com a manga da blusa. – Eu nem pensei nisso, eu só queria... Sair daquela casa.       

– Vem senta aqui e me conta tudo. – puxei-a junto comigo para o sofá.

– Jessie eu não aguento mais a mamãe e esses surtos dela.

Sabia que tinha algo a ver com a minha mãe.

– Ela quer me prender, me privar do mundo igual fazia com você.

– Eu sinto muito Betthy, vem cá. – afaguei seus cabelos castanhos igual fazia quando ela era criança e acordava assustada no meio da noite por causa de um pesadelo.

– Eu não quero mais ficar lá.

– Eles devem estar preocupados, pense no papai coitado, deve estar louco atrás de você.

– Eu não quero voltar Jessie, por favor! Eu não quero brigar com a mamãe de novo, e isso sempre acontece quando estamos perto uma da outra.   

– Façamos o seguinte, você tem aula amanhã?

– Só os dois primeiros tempos, e não são matérias importantes.

– Ok, então você fica comigo esse fim de semana pra esfriar a cabeça.

– Sério mesmo? – seus olhinhos brilharam e limpei as lágrimas do seu rosto de boneca.

– Claro que pode meu amor, você é minha princesinha lembra? Mas vamos avisá-los que você está aqui, pelo menos ao papai.     

– Tudo bem. – Betty assentiu um pouco triste e levantei atrás do meu celular.

Tinham mais de dez ligações do meu pai, eu não ouvi chamar porque fica sempre no silencioso. Retornei e no segundo toque ele atendeu.

– Jessie querida!

– Oi pai.

– Filha, a sua irmã... Ela sumiu! Nós já procuramos por toda parte...

Ele tava desesperado.

– Pai calma, me escuta.

– Eu vou chamar a polícia, já fui atrás dela na casa de todos os amigos, mas nada!

– Pai fica calmo, a Betty ta aqui comigo.

– O que? Ela está bem? Me diga que ela está bem por favor Jessie!

– Ela está bem sim, chegou aqui ainda há pouco, fique calmo.

– Ai que alívio, muito obrigado Senhor, minha menina está bem.

– Está sim, fique tranquilo.

– Querida você pode trazê-la amanhã cedo quando vir para o seu trabalho? Eu vou buscá-la na editora.    

– Pai, a Betty me contou que ela e a mamãe discutiram.

Antes que o meu pai falasse alguma coisa, ouvi a voz da minha mãe ao fundo. Ela perguntava aos gritos e quando meu pai disse que minha irmã estava comigo, ela surtou e queria arrancar o telefone da mão dele.

Betty ouviu também e se encolheu abraçando Chase.

– Sharon eu já disse pra você ficar calma! Ela está bem!

– A culpa é da Jessie que influenciou a irmã a fazer isso!

Não vou negar, doeu ouvir aquilo. Minha mãe nunca aceitava ouvir a opinião de ninguém, ela sempre achava que era a única que tinha razão, e com isso acabou afastando as duas filhas.

– Jessie querida, me desculpe por isso.

– Tudo bem pai. Olha, deixa a Betty aqui comigo esse fim de semana, ela não tem aula amanhã. Ela precisa se acalmar, assim como a mamãe, melhor ficar longe por enquanto.

– Tudo bem querida, faça como você e ela achar melhor. Se precisar de algo, é só me ligar.

– Pode deixar pai. Beijo, te amo.

– Também amo você filha, dê um beijo na sua irmã por mim.

– Pode deixar, tchau papai.

– Tchau me anjo.

Meu pai era a melhor pessoa desse mundo. O cara mais sábio e mais gente boa que eu já conheci, também pra aturar o gênio da minha mãe, só assim mesmo.

– Resolvido, a senhorita fica aqui comigo esse fim de semana.

– Muito obrigada Jessie, de verdade. – ela pulou em cima de mim me abraçando.

– Betty me prometa uma coisa, que você nunca mais vai fugir de casa. Se quiser vir pra cá, me liga e eu vou te buscar, mas não faça mais isso.

– Eu prometo mana.

– Bom, eu vou preparar o quarto de hóspedes pra você e vou dormir, pode ficar aí vendo TV com o Chase, tem comida na geladeira, fique a vontade.

– Pode deixar.

– Boa noite princesa. – dei um beijo em sua testa e ela me abraçou apertado.

– Boa noite Jessie, e obrigada de novo.

Sorri pra ela e peguei sua mochila indo pra escada.

Deixei o quarto preparado e fui deitar, amanhã seria um dia cheio.

...

Sexta feira era uma correria na editora. Tínhamos que fazer um cronograma pra próxima semana que seria aniversário de dez anos da revista e precisávamos de reportagens mais que especiais. Ted me cobrou de novo sobre a autorização das cartas, mas até agora nada. Pensei em ligar pra Dory Green no almoço, mas não tive tempo. Mandei apenas uma mensagem rápida pra Betty perguntando como ela estava. 

– E aí Jessie.

– Oi Grey. – tentei manter meu bom humor.

– Pessoal vai pra um happy hour naquele barzinho da esquina, topa?

– Não posso, minha irmã veio passar o fim de semana comigo e tenho que ir embora, ela ta sozinha. 

– Ah que pena.

– Pois é né. – comentei tentando esconder o sorriso de satisfação enquanto arrumava minhas coisas. – Ah Grey, deixa eu te falar, uma amiga minha te viu em uma publicação na minha página do I*******m e me perguntou de você.

– Sério? – ele se animou todo, parecendo àqueles galos de briga. Sinceramente, o gosto da Gabby é questionável às vezes.

– Sim, e me pediu pra passar o número dela quando eu te visse de novo.

– Boa, passa aí.

Enviei o contato pra ele pelo W******p.

– Valeu Jessie.

– De nada, o nome dela é Gabriella. Agora deixa eu ir que minha irmã ta sozinha.

Entrei no carro e liguei pra Betty.

– Oie maninha. – sua voz soou alegre.

– Oi princesa, como vocês estão? Você e o Chase.

– Estamos ótimos não é garoto? – ouvi o latido dele e dei risada.

– Que bom, eu já saí do trabalho, daqui a pouco tô chegando aí. Pede uma pizza pra gente, tem dinheiro embaixo do pote ao lado do micro-ondas.

– Adorei essa ideia, metade mussarela e metade calabresa?

– Sempre, beijinhos daqui a pouco tô aí.

– Beijinhos.      

Cheguei em casa trinta e cinco minutos depois e fiquei chocada. Betthany tinha feito uma faxina caprichada, tudo estava limpo e brilhante. Deixei a bolsa no sofá e fiquei olhando admirada.

– Oie. – minha irmã desceu a escada sorridente com Chase atrás dela. – Eu não tinha nada pra fazer, então... – estendeu os braços indicando ao redor e sorriu.

– Uau! Eu gostei.

– E dei banho no Chase também.

– Maravilha, amanhã podemos passar o dia juntas nos divertindo.

– Foi o que eu pensei mana, vai tomar banho, a pizza já deve ta chegando.

– Não precisa falar de novo.

Devoramos a pizza quase toda enquanto assistíamos uma série na Netflix. Eu particularmente não estava entendendo muita coisa, não era o meu tema favorito, mas Betthy explicava e eu tentava não rir, pois ela ficava brava.

– Jessie, eu conheci uma pessoa.

Olhei pra ela que estava deitada de bruços balançando as pernas.

– Ai que ótimo minha irmã, fico feliz. Quase não vejo você falando de garotos.

Sua carinha parecia preocupada e fiz um carinho em seu rosto.

– O que foi Betthy?

– Eu tenho medo.

– Medo de que?

– De acontecer o mesmo que... Aconteceu com você.

Eu não gostava muito de relembrar aquele assunto, preferia deixá-lo enterrado no passado.

– Nem todo mundo é igual minha irmã, e você ainda tem tanto pra viver, daqui a pouco tá indo pra faculdade. Não se apegue a isso e viva o que tiver que viver, faça o que tem vontade.

– Obrigada pelo conselho, de verdade.

– A gente não deve desistir nunca Betthany, por mais que tenhamos sido feridos, machucados, jamais devemos desistir e deixar de acreditar.  

– Você é a minha pessoa favorita no mundo Jessie.

– E você é a minha, vem cá.

Ficamos na sala até tarde, conversando, falando bobagem. Ela pediu pra dormir comigo como nos velhos tempos e eu não tive como recusar.

...

Estava naquele sono leve e senti uma lambida no rosto que me acordou de vez.

– Sai Chase. – virei pro lado tentando dormir novamente, mas ele pulou em cima de mim e tentava puxar minha coberta. – O que foi filho? Tem comida pra você.

E só então eu notei que tinha alguém batendo na porta. Sentei na cama e olhei a hora no celular, quase dez da manhã. Betthany dormia ainda e levantei com cuidado para não acordá-la.

Vesti um robe enquanto descia a escada e tentei ajeitar o cabelo. Espiei pelo olho mágico e vi as costas largas de alguém, parecia ser um homem. Um pouco desconfiada abri a porta e o estranho se virou pra mim me deixando de boca aberta.

Ele devia ter um metro e oitenta de altura mais ou menos, era forte, dava pra notar pelos ombros largos. Os cabelos e a barba eram castanhos claros, os lábios rosados, porém o que me impressionou foram os olhos, tão azuis quanto o céu e tinha um jeito intenso de encarar. Ele estava sério e decididamente, não era um homem que gostava de brincadeiras. As roupas eram casuais e ele tinha as mãos dentro dos bolsos dianteiros da calça jeans.

– Pois não? – perguntei me sentindo um pouco intimidada por sua presença imponente.    

– Jéssica Marshall? – sua voz era grave e rouca, chegava quase a ser uma carícia.

– Sim. – murmurei ainda encantada com aqueles olhos.

– Eu vim pegar as cartas de minha avó, Claire Wright-Jones.

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >

Capítulos relacionados

Último capítulo