O som das folhas balançando nas árvores era como música sobre os meus ouvidos, o céu estava corado, em tons de pastel vivos, a paisagem verde em abundância me lembrava de filmes antigos, o vento forte que chicoteava minhas bochechas não era incomodo.
Parei a cadeira de rodas e ajeitei a coberta sobre o colo de Antonio.
— Está bom, obrigada.
Sorri e voltei a segurar a cadeira, era uma ladeira íngreme, um ponto alto das colinas na Escócia, perto do castelo Edimburgo, não entendia por que Antônio havia decidido vir para cá, mas respeitava sua vontade, afinal, Antônio estava morrendo.
— De todos os lugares em que eu queria visitar o mundo, esse foi o único que faltou… Agora, me sinto realizado Rosa.
— Como é a sensação Sr Antonio?
— É boa, de paz e conquista, de satisfação, prazer… — Ele apontou para o campo aberto — Esse lugar… Muitos dos meus parentes foram enterrados aqui e é aqui que eu também quero ser enterrado.
— Não diga isso Sr.
— Não diga o que? A verdade? Eu estou morrendo Rosa, o câncer já se espalhou pelo meu corpo, eu disse a mim mesmo que não veria esse lugar até que estivesse perto e agora, eu sei que está.
Engoli as lágrimas que ameaçavam vir e olhei para frente e senti o toque de sua mão na minha.
— Não chore, menina. Eu ainda não fui.
— Não estou chorando.
Ele ergueu os olhos e olhou para mim.
— Você cuida de mim há sete anos, eu conheço quando está chorando.
Sorri.
— Existe algo que eu possa fazer por você? Algo que queira muito.
— Não, eu só quero descansar agora… — Ele fechou os olhos por um momento e então os abriu de novo dizendo — E os meus netos?
Balancei a cabeça negando e ele assentiu.
— Eu entendo, são todos ingratos!| — Antonio fechou os punhos com força — Todos eles! Renato só vem a mim quando precisa de dinheiro, mas eu sei que está viciado em apostas, Damon tem anos que não vejo seu rosto além dos escândalos no jornal e Edgar, ele é egoísta!
Franzi o cenho.
— Edgar não está na África? — Perguntei confusa.
— Sim, está — Disse ele suavizando a expressão — Mas não tem tempo para ver o próprio avô antes de morrer, tenho certeza de que assim que eu partir todos irão vir correndo atrás do meu dinheiro! Cecilia e Francisco nunca teriam deixado que eles chegassem a esse ponto, é uma pena que minha filha e seu esposo tenham morrido dentro daquele maldito carro!
— Eu queria ter a conhecido, o Sr fala tão bem dela.
— Vocês iriam se dar bem Cecília — Ele sorriu e me olhou nos olhos — Você me lembra dela, quer dizer, não em aparência. Mas é tão doce e gentil o quanto ela era… Não deixou que o dinheiro subisse à cabeça!
— Talvez ela esteja junto com minha mãe.
Antonio riu.
— Você realmente acredita em reencarnação Rosa?
— Se não acreditarmos em algo, para que vivemos?
Antonio ficou sério, parecia pensativo.
— Então nós nos veremos de novo um dia.
Sorri.
— Sim, até lá — Me inclinei um pouco olhando para a paisagem, sentindo a paz pairar sobre nós — Você vai estar feliz, em um campo como esse, ao lado de sua filha que tanto ama, não vai mais sentir dor ou ter preocupações, não existiam mais pessoas ingratas por que o dinheiro não será nada na vida após a morte então todos nós seremos iguais, seremos amorosos e gentis, seus netos voltaram a ser como crianças, com o coração puro por que não vai mais haver ganância ou cobiça…
Parei de falar percebendo que Antonio havia dormido, sorri e me voltei para o horizonte. Eu não sabia, mas aquela era a última vez que eu o via.
O jatinho pousou em Londres, no aeroporto de Heathrow onde um mordomo, empregadas e seguranças esperavam pelo corpo de Antônio, segurei apreensiva a minha mala vendo a quantidade de repórteres distantes, pelo outro lado do vidro.
— Rápido Rosa, entre — Disse Lorenzo o advogado de Antônio pegando a minha mala, franzi o cenho e o obedeci entrando dentro carro.
Lorenzo não demorou muito e entrou no carro, ele suspirou e se concertou na poltrona de trás, ao meu lado, o carro já estava em movimento quando ele me olhou rápido de cima a baixo.
— Como você está?
Fiquei quieta e ele assentiu.
— Entendo, não foi a melhor pergunta…
— Me desculpe, Sr Lorenzo, mas não quero conversar agora. Não consigo…
— Sinto muito pela sua perda, sei que era mais do que uma cuidadora e que tinha muito apreço ao Sr Antônio em sua vida, todos estão certos disso, foram sete anos. Mas é preciso te deixar ciente de algumas coisas antes de nós chegarmos à mansão.
— Isso é mesmo necessário? — Perguntei sem entender a importância que eu tinha naquilo tudo — Eu sei que terei que me mudar, mas pode esperar até o enterro?
— Não é sobre isso — Disse ele erguendo as mãos — Pelo contrario, você precisa ficar na mansão para o enterro! Era a vontade de Antônio que estivesse nele, mas os seus netos são… Um pouco difíceis de lidar.
Balancei a cabeça assentindo.
— Eu sei que são, mas eu não pretendo trocar mais de duas frases com eles.
— Creio que terá que trocar mais do que duas frases com eles Sra. Rosa.
Olhei nos olhos de Lorenzo confusa, mas dei de ombros. Não demorou muito e chegamos na mansão onde o mordomo carregou minhas malas, Lorenzo não deixou que eu fosse para o meu quarto, antes me chamou. O segui pelos corredores sem entender o por que ele queria a minha presença, sentia a necessidade de dormir, tinha certeza de que meus olhos estavam carregados pela noite em claro, queria ficar sozinha, precisava disso além de ter que recolher o resto das minhas coisas que havia ficado no quarto, era um alívio que duas malas já estivessem feitas, pois eu não tinha ânimo para fazer às outras.
Entrei no que parecia um escritório, Lorenzo se sentou à minha frente, atrás da mesa.
— Sente-se Rosa, por favor.
Balanço a cabeça assentindo e olhei para as cadeiras, eram quatro, escolhi uma do meio.
Olhei para o escritório em volta, não havia nada nele íntimo, nenhuma foto ou detalhe pessoal, era simples e sem graça.
— O que estou fazendo aqui, Sr. Lorenzo? Eu estou encrencada? — Perguntei me dando conta da situação, me inclinei para frente sentindo meu coração acelerar forte. — Eu já soube de boatos mesmo antes de chegar, eu ouvi um dos funcionários falar que a culpa foi minha, como se eu tivesse levado o Sr. Antônio para longe para matá-lo…
— Sr. Rosa por favor, acalme-se. Não é nada disso, mas antes de entrar em detalhes eu preciso esperar pelos demais participantes antes de dizer algo.
Balancei a cabeça assentindo e então ouvi o barulho alto da porta se abrindo, olhei para trás e um homem alto de pele amendoada entrou e se sentou na cadeira mais distante a minha, na outra extremidade, enquanto um deles se sentou ao meu lado e o outro, possuía uma barba cerrada e olhos penetrantes me olhou sério e pegou a cadeira ao meu lado a arrastando pelo cômodo, a botou na outra extremidade se afastando de mim.
Meu coração disparou ao reconhecê-los, eram os netos de Antonio, esfreguei minhas mãos nervosa e olhei para meus próprios pés, então para Lorenzo que culprimentava um a um até erguer o braço em um gesto para que me olhassem.
— Senhores Bonner, essa é Rosa Lemos Danzi a cuidadora do Sr Antonio Bonner.
— Olá Rosa — Disse o homem do meio que estava sentado à minha direita, ele acenou com um sorriso e sorri de volta, era Edgar o que havia ido para a África.
A sua pele era clara, no mesmo tom da de Damon, seu cabelo em dreads da cor azul e preto destacavam mais assim como as suas roupas largas e despojadas eram estilosas. Ele parecia o mais relaxado dos três.
Damon estava sentado à minha esquerda, ele fez um gesto leve com a mão que nem poderia ser considerado um comprimento, seu cabelo preto tinha a mesma tonalidade do cabelo de Renato, assim como a espessura, somente mudando o corte. Renato estava de braços cruzados ao lado de Damon e parecia ser o menos sociável, ele ajeitou o terno e fez um gesto para Lorenzo.
— Podemos começar logo Lorenzo? Eu vim de longe, ainda tenho compromissos hoje e… - disse Renato claramente impaciente.
— Você não pode sair Sr, hoje é o enterro do seu avô — Lorenzo estava com os olhos bem abertos, como se fosse difícil acreditar no que havia acabado de ouvir.
Às palavras de Lorenzo fizeram com que houvesse silêncio no ambiente, Lorenzo se sentou de novo e abriu uma pequena caixa preta do qual todos prestaram atenção, era apenas o local onde guardava o seu óculos, ele o tirou e limpando com paciência ele o pôs sobre o rosto fazendo com que todos parecesse decepcionados, então ele pegou uma pasta a ponto com delicadeza em cima da mesa, ele olhou para nós e disse:
— Vamos dar início ao testamento do Sr Antonio.
— Eu sabia — Disse Renato, quase como um sussurro ao meu lado, ele estava sorrindo? Franzi a testa incrédula, só então me dei conta de que era um testamento. — Testamento? — Me inclinei sobre a cadeira — O que eu tenho haver com isso? — Sim, Sr. Lorenzo o que ela tem haver com isso? — Perguntou Renato do outro lado, até agora se mostrava o mais comunicativo dos três — Ela foi apenas a cuidadora do nosso avô! — E também, como uma filha para ele. — Nós somos como filhos para ele! — Disse Damon do meu lado, assim como Renato ele falava de mim como se eu não estivesse do seu lado. — Vocês foram no aniversário dele? Mês passado ou ligaram para saber como estava indo a doença? — Perguntou Lorenzo de forma ousada, quando houve apenas o silêncio de novo ele continuou — O Sr Antônio deixou a coleção de carros importados para dividirem como bem entenderem entre vocês três. — Eu não quero, podem dividir vocês dois — Disse Edgar no
Quando abri os olhos estava em um quarto, cercada por três homens. Me levantei rápido me sentando na cama. — O que é isso? O que aconteceu? — Perguntei olhando em volta, a minha cabeça doía então botei a mão sobre ela. — Fique deitada, Sr. Rosalina, o médico está vindo você bateu a cabeça. — Disse Lorenzo. Assenti e me deitei na cama. — Então tudo foi um sonho. Ouvi um riso distante do outro lado do cômodo, era Renato ele me olhava com desdém. — Não, nada foi um sonho. Estava lendo o testamento quando você desmaiou e batendo forte a cabeça na mesa do escritório.Olhei para Edgar e Damon e senti meu rosto esquentar enquanto a vergonha se apossou de todo o meu corpo. — Ela está acordada, pode continuar a ler agora. — Disse Renato, ainda impaciente. — Acho melhor esperarmos ela se recuperar. — Não! — Falei rápido — Eu quero ouvir, preciso saber por que ele me escolheu… Lorenzo assentiu e puxou uma cadeira em um can
O dia havia sido cansativo e eu queria apenas me deitar e dormir, tudo o que havia acontecido parecia um delírio da minha cabeça do qual eu ainda não sabia o que pensar.— Sr. Rosa.Eu estava prestes a abrir a porta do meu quarto, me fechar e hibernar, mas a voz familiar do qual eu conhecia bem me chamou atenção.— O que foi agora, Wallace?— Você não dorme mais em seu quarto de funcionária — Ele apontou para o andar de cima.— Eu não vou dormir no quarto de Antônio, eu me recuso!— Tudo bem, então durma no quarto ao lado. É uma suíte bem grande, você não precisa dormir em um pequeno quarto, a casa inteira agora é sua agora!— Eu só quero uma cama.— E travesseiros de pena?— O que? — Franzi a testa, mas larguei a maçaneta e o segui.Ele me levou até o último andar, em um quarto grande e ao que parecia, feminino.— Esse quarto... — Olhei para Wallace e então me virei para sair dele o mais rápido possível — Não, você ficou louco!— Rosa, não saia daqui!Parei de andar e o olhei confusa
Mesmo envergonhada, mantive meus olhos fixos nele. Não sabia o que dizer e a cada segundo podia sentir meu rosto esquentar mais envergonhada, me sentindo culpada, intrusa, como se eu fosse a vilã naquela casa. — Eu… eu… — Você? — Eu… Renato esfregou o rosto perdendo a paciência e caminhou pelo quarto. — Você acha que podemos chegar em nossas vidas e tirar tudo o que temos? Você sabe o que esse quarto significa para mim? — Não — Fechei os olhos percebendo que havia piorado a situação. — Assim não dá, eu não consigo manter uma conversa com você. Você é oportunista. Arregalei os olhos. — O que? — O que está acontecendo? — Perguntou Edgar da porta, ele cruzou os braços sério e alternou o olhar entre nós. — Essa garota ai — Ele apontou — Ela mal tomou a casa e já está no quarto da nossa mãe. — Edgar a mamãe odiava esse quarto, ela dizia que era mal assombrado, se você botou os pés aqui foi por três vezes, no máxi
Rosa Parei nos degraus e respirei fundo, consertei minha postura, não estava preparada para encará-los na mesa do almoço, mesmo assim dei um passo à frente. Os saltos eram exagerados e eu não sabia como andar com eles, ainda assim dei mais um passo à frente, descendo às escadas com calma, a casa estava silenciosa, olhei para os lados, tudo o que eu queria era voltar para o quarto e me deitar, ficar na cama de moletom e me remoer em minha dor, mas precisava cumprir o cronograma. Entrei na sala de estar e era como se meus olhos se enchessem, às lembranças pairavam em minha mente brotando involuntariamente a cada segundo que se passava, eram tantas recordações com o Sr Antonio naquela mesa, comíamos juntos algo que quase ninguém entendia, mas ele era um homem solitário e após meses de insistência, eu me sentei a mesa e passei a comer todos os dias com ele, desde então não percebemos quando haviamos esvaziado o prato, continuavamos na mesa conversando por um tempo enquan
Rosa Eu e Jonathan subimos as escadas, ele parecia impressionado com o quarto enquanto eu contava os últimos acontecimentos, Jonathan balançava a cabeça e dizia poucas palavras. Ele tocou em um dos quadros de António antigo do qual havia um barco ao fundo, em um mar turbulento. — Por favor Jonathan, não toque em nada, esse quarto não é meu! — Não é ? — Ele se virou e abriu um sorriso — Você tem noção da sorte que você tem? Agora essa casa inteira é sua, isso é tão incrível quanto absurdo! Ele se aproximou rápido da cama onde eu estava sentada e me deu um beijo rápido que me pegou desprevenida. — Jonathan… — Ele me beijou de novo, um beijo rápido, mas forte me impulsionando um pouco para trás — Jonathan, você ouviu o que eu disse? — Sim, você acabou de ganhar na mega sena! — Não — Falei segurando o rosto dele, tentando impedir que ele me beijasse de novo e ele me puxou pela cintura me aproximando mais de si, tirou a alça do meu vestido e beijou meu p
Rosa Sai do terraço me sentindo vitoriosa, com um sorriso nos lábios, sabia que agora Damon estava com ainda mais raiva de mim, mas entre às desavenças e o desejo deles de me diminuir a qualquer custo eu estava chegando a um ponto onde me sentia sufocado, não tinha mais lágrimas para chorar ou cabeça para suportar, entre os cochichos dos meus colegas de trabalho e o olhar penetrante e julgador de Renato que insistentemente jogava piadas quase sempre que me via, Damon também não facilitava, era mais sutil, porém, tinha o mesmo desdém de todos da casa. Fazer com que todos gostassem de mim nunca foi tão difícil… Suspirei e parei em uma das janelas do corredor sentindo um nó em minha garganta, notei pelo lado de fora da janela e logo depois do grande gramado que se estendia a muitos metros, que atrás dos muros estavam abarrotados de jornalistas, todos pelos quais havia me prendido naquelas paredes, sem que eu pudesse sair para espairecer nem mesmo no quintal, pois sabia que logo
Rosa — A Sra. Rosa — Wallace me olhou de cima a baixo — Suas roupas. Olhei para minhas roupas, mas elas não estavam fora do lugar, me sentia envergonhada como se tivesse sido pega de surpresa e olhei para os olhos dele. — O que tem minhas roupas? — Elas estão amarrotadas, quer que eu as leve para as passar? — Agora? — Franzi a testa — O Sr. Antonio às vezes pedia para que passassem a roupa dele no meio do dia… Wallace balançou a cabeça assentindo. — E nesse tempo ele ficava como? Pelado? — De roupão, em sua sala de descanso. Balancei a cabeça assentindo, parece que havia coisas sobre a rotina de Antônio que eu não sabia. — Não é preciso, eu vou tomar um banho e me deitar. Já estava saindo quando Wallace chamou meu nome de novo, parei e olhei para ele. — Diga. — Isso é para você — Ele ergueu a mão revelando uma carta. A segurei, então olhando para ele e para ela a abri com cuidado para não rasgar o conteúdo de de