O dia havia sido cansativo e eu queria apenas me deitar e dormir, tudo o que havia acontecido parecia um delírio da minha cabeça do qual eu ainda não sabia o que pensar.
— Sr. Rosa.
Eu estava prestes a abrir a porta do meu quarto, me fechar e hibernar, mas a voz familiar do qual eu conhecia bem me chamou atenção.
— O que foi agora, Wallace?
— Você não dorme mais em seu quarto de funcionária — Ele apontou para o andar de cima.
— Eu não vou dormir no quarto de Antônio, eu me recuso!
— Tudo bem, então durma no quarto ao lado. É uma suíte bem grande, você não precisa dormir em um pequeno quarto, a casa inteira agora é sua agora!
— Eu só quero uma cama.
— E travesseiros de pena?
— O que? — Franzi a testa, mas larguei a maçaneta e o segui.
Ele me levou até o último andar, em um quarto grande e ao que parecia, feminino.
— Esse quarto... — Olhei para Wallace e então me virei para sair dele o mais rápido possível — Não, você ficou louco!
— Rosa, não saia daqui!
Parei de andar e o olhei confusa.
— Era a vontade de Antônio, ele sabia que não ia querer ficar com o quarto dele quando partisse, enquanto o de Cecília não havia apego emocional algum para você, além de ser o segundo maior quarto da casa — Ele ergueu um telefone e o botou em cima da cabeceira — Se não acredita em mim, o Sr Antônio deixou todas às suas exigências gravadas em um computador, esse celular contém as mesmas e também, algumas específicas para você!
Não sabia o que dizer, também não queria desabar na frente de Wallace, ele deixou o telefone e saiu.
Me aproximei do aparelho e o olhei, não, ainda não estava preparada. Peguei o telefone e o guardei na cabeceira da cama, olhei em volta, às cobertas não eram antigas, pelo visto o quarto era limpo regularmente mesmo que ninguém mais dormisse nele por anos. Como se não bastasse todo o dia em que eu tive, ainda precisava dormir em um quarto onde me fazia sentir ainda mais errada, como se estivesse invadindo o espaço de alguém, como se fosse um parasita.
Fui até o banheiro onde notei, era maior do que o quarto da minha casa, possuía uma banheira de hidromassagem, uma banheira, um box com chuveiro, pia, vaso. Até mesmo a forma como a água da torneira descia parecia elegante, havia mais luxo ali do que eu poderia sonhar.
Suspirei e tomei um banho rápido de chuveiro, então cai sobre a cama cansada e vasculhei minhas mensagens, eu não estava bem então Jonathan havia conversado comigo durante o dia inteiro, apesar de estar de serviço no navio e isso me trazia uma espécie de conforto, mesmo que não fosse presente, pelo menos parecia se preocupar.
— Queria estar com você, Rosa — abri um sorriso fraco. "Também queria que estivesse aqui" me virei para o lado me espreguiçando, meus olhos estavam pesados, difíceis de manter, então uma tristeza me invadiu e respirei fundo, teria que aprender a conviver com a dor do luto, não seria a primeira vez.
Acordei no susto, pulando da cama e me sentando.
— Sr. Rosa? — Era a voz de Wallace do outro lado.
— Minha nossa, eu dormi demais! — Me levantei da cama em um salto e gritei — Eu já vou!
O senhor Antônio devia estar furioso, procurei o guarda-roupa para trocar de roupas e o achei no canto, totalmente diferente de antes, franzi a testa e olhei em volta, para o ar condicionado, a televisão enorme em frente à cama king e às toalhas macias de linho e seda.
— Pode entrar, Wallace — Falei ainda em choque, eu não precisava correr para me arrumar ou levantar tão cedo, não estava atrasada para nenhum lugar e ninguém ficaria bravo comigo,
Por que o Sr. Antônio havia morrido.
A realidade me batia como um soco no fundo do estômago, botei os cabelos para trás da orelha imaginando que eu estava horrível e Wallace entrou com um carrinho trazendo consigo uma bandeja, um jarro e biscoitos e outras coisas.
— O que é isso?
— Seu café da manhã, Sr. Rosa.
— Wallace tenha clemência, eu ainda sou a mesma de antes, então acabe com essa formalidade agora, somos amigos, lembra?
Ele assentiu, mas ainda parecia manter a postura, o que me deixava irritada. Ele abriu a bandeja e olhei para tudo espantada.
— É muita coisa, não sei se consigo comer tudo. Coma comigo, Wallace.
— Eu não posso!
— Por que não?
— Por que... — Ele parecia procurar as palavras, era péssimo em mentiras — Por que eu tenho que ajudar Gisele, ela está me esperando.
Ele se virou rápido e me levantei inconformada.
— Nada disso, Wallace, sente-se comigo! — Falei puxando o seu braço como uma criança, ele tentava conter o sorriso e manter a postura, mas era difícil.
— Eu não posso, Rosa.
— Então eu também não vou comer! — Falei decidida — Vou mandar para a antessala dos funcionários. Eu posso fazer isso, não posso?
Ele balançou a cabeça assentindo e sorriu, quantas mais coisas eu poderia fazer para ajudá-los?
— Venha! — Falei puxando o seu braço de novo e assim voltando à mesma discussão.
Estávamos em birra, um contrariando o outro enquanto eu tentava o arrastar sem sucesso quando uma figura masculina apareceu na porta e tossiu para chamar atenção, parei na mesma hora e olhei para os olhos dele envergonhada.
— Acho que eu cheguei em uma péssima hora, vou voltar depois.
— Não, não estávamos fazendo nada… Quer dizer, Wallace é meu amigo, mas ele tem o dobro da minha idade, talvez o triplo.
Wallace franziu a testa e me olhou claramente descontente com o comentário e abri um sorriso amarelo percebendo que havia piorado as coisas.
— Boa apetite, Sra. Rosa.
Com um meneio de cabeça ele saiu do quarto me deixando sozinha com Renato, ele tinha a barba cerrada, os olhos castanhos escuros que eu havia dito ontem hoje pareciam mais claros, o seu perfume era doce e também forte, um tom amadeirado difícil de identificar, não sabia qual era o perfume, mas era gostoso.
A expressão seria dele, pareceu se desfazer quando olhou em volta, para o quarto, então entrou pela porta sem ser convidado.
— O que está fazendo? — Perguntei incomodada.
— Cale a boca!
— Não, eu perguntei o que estava fazendo! — Dei um passo para trás nervosa, eu nem mesmo conhecia aquele homem a vinte e quatro horas e ele já estava entrando pelo meu quarto — Você não pode entrar no quarto dos outros assim, eu vou gritar!
— Quarto dos outros? — Ele repetiu e então seus olhos pararam em mim, raiva? Não sabia descrever seus olhos — Esse quarto não é dos outros e também não é seu, esse é o quarto da minha mãe então, por que está nele?
Mesmo envergonhada, mantive meus olhos fixos nele. Não sabia o que dizer e a cada segundo podia sentir meu rosto esquentar mais envergonhada, me sentindo culpada, intrusa, como se eu fosse a vilã naquela casa. — Eu… eu… — Você? — Eu… Renato esfregou o rosto perdendo a paciência e caminhou pelo quarto. — Você acha que podemos chegar em nossas vidas e tirar tudo o que temos? Você sabe o que esse quarto significa para mim? — Não — Fechei os olhos percebendo que havia piorado a situação. — Assim não dá, eu não consigo manter uma conversa com você. Você é oportunista. Arregalei os olhos. — O que? — O que está acontecendo? — Perguntou Edgar da porta, ele cruzou os braços sério e alternou o olhar entre nós. — Essa garota ai — Ele apontou — Ela mal tomou a casa e já está no quarto da nossa mãe. — Edgar a mamãe odiava esse quarto, ela dizia que era mal assombrado, se você botou os pés aqui foi por três vezes, no máxi
Rosa Parei nos degraus e respirei fundo, consertei minha postura, não estava preparada para encará-los na mesa do almoço, mesmo assim dei um passo à frente. Os saltos eram exagerados e eu não sabia como andar com eles, ainda assim dei mais um passo à frente, descendo às escadas com calma, a casa estava silenciosa, olhei para os lados, tudo o que eu queria era voltar para o quarto e me deitar, ficar na cama de moletom e me remoer em minha dor, mas precisava cumprir o cronograma. Entrei na sala de estar e era como se meus olhos se enchessem, às lembranças pairavam em minha mente brotando involuntariamente a cada segundo que se passava, eram tantas recordações com o Sr Antonio naquela mesa, comíamos juntos algo que quase ninguém entendia, mas ele era um homem solitário e após meses de insistência, eu me sentei a mesa e passei a comer todos os dias com ele, desde então não percebemos quando haviamos esvaziado o prato, continuavamos na mesa conversando por um tempo enquan
Rosa Eu e Jonathan subimos as escadas, ele parecia impressionado com o quarto enquanto eu contava os últimos acontecimentos, Jonathan balançava a cabeça e dizia poucas palavras. Ele tocou em um dos quadros de António antigo do qual havia um barco ao fundo, em um mar turbulento. — Por favor Jonathan, não toque em nada, esse quarto não é meu! — Não é ? — Ele se virou e abriu um sorriso — Você tem noção da sorte que você tem? Agora essa casa inteira é sua, isso é tão incrível quanto absurdo! Ele se aproximou rápido da cama onde eu estava sentada e me deu um beijo rápido que me pegou desprevenida. — Jonathan… — Ele me beijou de novo, um beijo rápido, mas forte me impulsionando um pouco para trás — Jonathan, você ouviu o que eu disse? — Sim, você acabou de ganhar na mega sena! — Não — Falei segurando o rosto dele, tentando impedir que ele me beijasse de novo e ele me puxou pela cintura me aproximando mais de si, tirou a alça do meu vestido e beijou meu p
Rosa Sai do terraço me sentindo vitoriosa, com um sorriso nos lábios, sabia que agora Damon estava com ainda mais raiva de mim, mas entre às desavenças e o desejo deles de me diminuir a qualquer custo eu estava chegando a um ponto onde me sentia sufocado, não tinha mais lágrimas para chorar ou cabeça para suportar, entre os cochichos dos meus colegas de trabalho e o olhar penetrante e julgador de Renato que insistentemente jogava piadas quase sempre que me via, Damon também não facilitava, era mais sutil, porém, tinha o mesmo desdém de todos da casa. Fazer com que todos gostassem de mim nunca foi tão difícil… Suspirei e parei em uma das janelas do corredor sentindo um nó em minha garganta, notei pelo lado de fora da janela e logo depois do grande gramado que se estendia a muitos metros, que atrás dos muros estavam abarrotados de jornalistas, todos pelos quais havia me prendido naquelas paredes, sem que eu pudesse sair para espairecer nem mesmo no quintal, pois sabia que logo
Rosa — A Sra. Rosa — Wallace me olhou de cima a baixo — Suas roupas. Olhei para minhas roupas, mas elas não estavam fora do lugar, me sentia envergonhada como se tivesse sido pega de surpresa e olhei para os olhos dele. — O que tem minhas roupas? — Elas estão amarrotadas, quer que eu as leve para as passar? — Agora? — Franzi a testa — O Sr. Antonio às vezes pedia para que passassem a roupa dele no meio do dia… Wallace balançou a cabeça assentindo. — E nesse tempo ele ficava como? Pelado? — De roupão, em sua sala de descanso. Balancei a cabeça assentindo, parece que havia coisas sobre a rotina de Antônio que eu não sabia. — Não é preciso, eu vou tomar um banho e me deitar. Já estava saindo quando Wallace chamou meu nome de novo, parei e olhei para ele. — Diga. — Isso é para você — Ele ergueu a mão revelando uma carta. A segurei, então olhando para ele e para ela a abri com cuidado para não rasgar o conteúdo de de
Rosa Ainda era muito cedo quando abri os olhos e perdi o sono. Deixei Jonathan dormindo na cama e caminhei pela casa perambulando pelos corredores que eu conhecia bem, mas que agora, de alguma forma, pareciam diferentes. Eu havia acordado pensativa, com tantas coisas acontecendo eu não sabia como agir, o que pensar, o que fazer. Todos pareciam contra mim, tudo parecia sufocante, eu ainda estava com um milhão de memórias que me vinham e iam pela mente durante o dia do Sr Antônio que foi como um pai para mim e todos os meus colegas e alguns que eu considerava amigos, viraram às costas para mim. Caminhei pelo campo e parei perto de um pequeno lago bonito, era frio e a neblina deixava tudo parecendo ainda mais monótono. Foi quando vi Jonathan dirigindo como um louco em um carrinho de golfe e gritando, vindo em minha direção. — O que é isso? — Perguntei incrédula e balancei — Parece uma criança. — É divertido — Disse ele saindo do carrinho de golfe, ele botou a mão e
Rosa Na mesa do jantar o silêncio reinava, Edgar havia pintado os cabelos de vermelho a uma hora atrás fazendo com que Renato o olhasse com desdém e Damon risse do seu novo visual. Ninguém me olhava e quando olhava era com desdém, mas Jonathan parecia ser ignorado completamente por eles. Era algo bem melhor do que o que eu estava passando. — Você também irá à festa Damon? — Como? — Perguntou Damon me olhando surpreso. — Você foi convidada? — Perguntou Renato com indignação. Alternei o olhar entre eles. — Sim, eu fui. Edgar esboçou um riso contido e me olhou com olhos travessos. — Você não vê, né Rosa? — Não vejo o que? — Ninguém te conhece, ninguém quer você lá, ganhou destaque por causa do nosso avô, mas se você for, será motivo de piada! — Wallace disse que… — O Wallace que diz é o nosso Wallace, o mordomo? — Perguntou Renato e balancei a cabeça assentindo — O que ele sabe? — Ele era o braço direito do Sr Antônio
Rosa Assim que vi todos saírem a passos rapidos, me permiti desabar. Olhei em volta e senti como se meu peito estivesse sendo esmagado a cada segundo mais, doía, como aquela sala nunca me doeu antes. Estava impregnado em cada cômodo, cada canto às lembranças de Antônio, eu havia aprendido a amar aquele Senhor como se fosse minha própria familia, a familia que eu não tinha e agora a dor era inegável, assim como a mesa quebrada parecia ser o fim do ciclo de algo que nunca mais voltará a ser como antes. Me abaixei e peguei um caco de vidro de um prato quebrado no chão. — Rosa, deixe isso que os empregados iram limpar amanhã — Pediu Jonathan tocando em meu ombro. Balancei a cabeça negando. — Não dá para deixar isso — Falei na certeza de que logo ia desabar em lágrimas. — Rosa, você não é mais funcionária daqui. Vamos sumir e tomar um banho, deitar, eu te faço uma massagem. O dia foi estressante, deixe que os criados limpem a… — Criados? — O questionei