O silêncio após minha pergunta paira pesado no quarto, interrompido apenas pelo som constante “bip” ao meu redor. Sinto um frio percorrer minha espinha. A incerteza sobre minha visão é tão dolorosa quanto as contusões físicas. Minhas mãos, ainda trêmulas, se apertam com força no lençol.
— Não podemos confirmar o estado definitivo da sua visão neste momento — o Dr. Freeman responde, sua voz tranquila contrastando com o tom grave que não alivia a tensão. — A senhora sofreu um trauma considerável, e a extensão dos danos ainda precisa ser avaliada com mais detalhes.
— Quando… poderei retirar os curativos? Preciso ver como estou, onde estou… — Minha voz é apenas um sussurro desesperado.
— Entendo sua preocupação — ele responde, mexendo em algo ao meu lado. — No momento, os curativos são essenciais para proteger suas feridas e permitir que o processo de cicatrização ocorra sem complicações. Administrei um analgésico, isso deve ajudá-la a se sentir um pouco melhor.
— Preciso falar com meu marido. Por favor, espere… — peço, levantando o braço direito. Sem saber onde estou tocando, sinto minha unha pressionar algo e ouço um gemido de dor vindo dele. — Me… me desculpe. Machuquei você?
— Não, fique tranquila. Vou verificar se seu marido deixou algum recado e se podemos contatá-lo para você. Com licença.
Os passos do médico se afastam, e mais uma vez fico sozinha com meus pensamentos. Meu corpo treme, resultado da dor e do medo, e as lágrimas começam a escorrer sem controle, intensificando a ardência nos meus olhos. O desespero se instala, enquanto o vazio ao meu redor parece cada vez mais sufocante.
Algum tempo depois, imersa em lágrimas e soluços intermináveis, ouço o barulho da porta se abrindo novamente, e todo o meu corpo se alerta.
— Querida, graças a Deus você acordou — a voz reconfortante de Sebastian preenche o silêncio. Ele se senta ao meu lado, segurando minha mão com firmeza. — Tive tanto medo de perder você, meu amor.
— Sebastian… Seja sincero, por favor. Estou muito machucada? Há quanto tempo estou aqui? Foi grave? — Pergunto, sentindo as lágrimas queimarem meus olhos novamente. Ouço um suspiro pesado, e o aperto dele em meus dedos se intensifica.
— Você ficou inconsciente por dois dias. — ele responde em um tom baixo, cheio de culpa. — Infelizmente, a queda foi grave. Estávamos todos em estado de choque, e eu… me sinto tão culpado. Eu deveria ter sido mais cuidadoso, deveria ter subido aquelas escadas com você.
— Não, Sebastian… — Tento acalmá-lo, mesmo com minha própria angústia me consumindo. — Não é sua culpa. E a minha visão? O que eles disseram de verdade? O médico tentou me tranquilizar, mas sei que há mais.
— Eles… ainda não têm certeza, querida. — O aperto dele em minha mão se fortalece, como se tentasse me passar a força que sabe que vou precisar. — Evie, os traumas foram significativos. Os médicos estão fazendo tudo o que podem. Precisamos ter esperança, mas também nos preparar para todas as possibilidades.
— Possibilidades? — As palavras escapam em meio aos soluços. — Eu não quero ficar no escuro para sempre… Se for assim, prefiro que Deus me leve… Não quero… não quero!
— Não fale besteiras, meu amor. Estou aqui ao seu lado, como sempre estive. Vamos buscar outras alternativas, mas nunca, jamais, deseje a sua própria morte — ele diz, acariciando meus cabelos com delicadeza. Sua voz embarga, e ele continua: — Eu não existiria em um mundo sem você, Evie. Nunca mais fale isso.
— Me desculpe… me desculpe… Só estou assustada, Sebastian — confesso, sentindo meu corpo tremer novamente. — Quero sair daqui, estou com medo.
— Não tenha medo, meu amor. Estou aqui para te ajudar, para cuidar de você. Você não está sozinha, e nunca estará — ele diz, apertando minha mão com firmeza. — Agora, descanse. Você receberá alta em breve, eu prometo.
[…]
Três semanas se arrastaram desde o dia em que minha vida pareceu ter sido roubada de mim. Cada momento é um tormento, marcado por uma escuridão que me envolve cruelmente. Sinto-me como se minha existência agora se resumisse a esperar o tempo passar, uma sombra do que eu era. A sensação de inutilidade é quase esmagadora.
No final da tarde, enquanto estou deitada na cama do novo quarto, que agora fica no andar de baixo, o som familiar dos passos de Sebastian no corredor avisa de sua chegada. O barulho de algo sendo colocado ao meu lado me faz sentar lentamente. O aroma de camomila é o primeiro sinal do que ele trouxe.
— Olá, meu amor — ele me cumprimenta, dando-me um beijo calmo que traz um pouco de ânimo.
— Oi, querido. Como foi seu dia? — pergunto. Sebastian hesita por um momento, e posso sentir que algo não está certo. Ele se senta ao meu lado, passando a mão pelo meu cabelo de forma reconfortante. — O que há de errado, Sebastian?
— Prometi não te preocupar com negócios, mas… — ele responde, ainda hesitante. — O conselho da empresa está cobrando um posicionamento sobre quem assumirá a liderança enquanto você estiver… impossibilitada. Prefiro que você decida isso. Podemos ver alguém que…
— Não precisamos ver ninguém, meu amor — interrompo-o rapidamente. — Não há ninguém melhor do que você para assumir meu lugar. Peça ao Sr. Thompson que prepare os documentos necessários. Você precisa assumir, pelo menos até que eu… — Pauso, engolindo o nó na garganta. — possa voltar.
— Tem certeza, Evie? Isso significa que tomarei a maioria das decisões — ele diz, num tom baixo. Mesmo sem vê-lo, sei que a hesitação está estampada em seu olhar por mencionar isso.
— Confio em você, querido. Mais do que em qualquer outra pessoa — concluo, forçando um sorriso. Ele me dá um beijo na testa, puxando-me para seus braços. — Faça isso. Por mim, por nós.
Desde que tudo aconteceu, há um mês, algumas pessoas fazem questão de perguntar como estou, mas a ausência das minhas amigas é dolorosa. Dizem ser nas dificuldades que descobrimos quem realmente se importa, mas jamais pensei que minhas próprias confidentes me abandonariam. O único que realmente tem se preocupado é Sebastian.Hoje, como tem sido em todos esses dias, meu marido entra no quarto com uma energia que parece tentar iluminar a escuridão que me envolve. Ele abre as cortinas, cantarolando, e logo ouço seus passos se aproximando da cama. Quando escuto o som familiar da bandeja sendo colocada ao meu lado, um sorriso involuntário se forma em meus lábios.— Bom dia, querida — Sebastian me saúda com um beijo suave. — Dormiu bem?— Bom dia, meu amor. Sim, mas senti falta de você. Não percebi quando chegou ontem. Por que se levantou tão cedo?— Fiquei até tarde resolvendo algumas coisas da empresa e, quando vim para o quarto, te vi dormindo tão serenamente que preferi dormir no quarto
“Henry Blackwood”As cinco semanas desde meu retorno de Genebra passaram rapidamente, mas a irritação que sinto desde a apresentação da proposta da Majestic não diminuiu nem um pouco. A imagem de Evie Ashford, com seus cabelos loiros, olhos esverdeados e corpo escultural, permanece gravada em minha mente, uma lembrança de como essa jovem CEO irritante conseguiu me desafiar mais do que eu esperava.Desde então, venho me esforçando para manter a cabeça fria, torcendo para que aquela proposta tenha sido apenas uma coincidência infeliz. Mas a verdade é que a situação não me dá paz. Sempre valorizei o controle e a certeza de estar no comando. Agora, a sensação de traição e desconfiança paira sobre mim.O dia se arrasta interminavelmente, e o peso das notícias que recebo torna a rotina mais um castigo do que um dia produtivo. A página do computador aberta diante de mim tira meu fôlego. A proposta da Majestic Ashford venceu a disputa. O que me deixa irado não é apenas o fato de terem vencido
Levanto o olhar e vejo minha noiva entrando na sala com um sorriso suave nos lábios. Impecável como sempre, o vestido cinza-claro abraça suas curvas tentadoras, e o cabelo castanho cai em ondas suaves, emoldurando seu rosto delicado.— Henry, está tudo bem por aqui? — Harper pergunta, lançando um olhar curioso para os papéis espalhados sobre a mesa. A desordem contrasta com a habitual organização a que ela está acostumada.— Está tudo bem. Apenas lidando com alguns problemas do trabalho — respondo, tentando soar casual.— Você sempre resolve tudo tão bem. Tenho certeza de que logo isso passará.— Espero que sim. O que te traz aqui? — pergunto, vendo-a se aproximar. Ela me dá um beijo, senta-se no meu colo e passa os braços ao redor do meu pescoço.— Vim te lembrar que hoje é o coquetel anual da Associação Empresarial, lembra? — responde, enquanto seus dedos deslizam suavemente pelo meu pescoço. — Sabia que você se esqueceria.— Pensei que tinha deixado claro que não estava interessado
O aperto de mão entre nós dura um pouco mais do que o necessário, enquanto nossos olhares permanecem fixos. Sebastian mantém um sorriso presunçoso no rosto, como se estivesse desfrutando de uma piada interna. Meu maxilar se tensiona, mas mantenho a expressão neutra. Ao meu lado, Harper se mexe desconfortavelmente, seu olhar alternando entre mim e Sebastian, como se tentasse decifrar a estranha dinâmica que paira no ar.— Vocês… realmente se conhecem? — Harper pergunta. Solto um riso seco, desviando brevemente o olhar para ela antes de responder:— Está com algum problema auditivo, querida? — pergunto, deixando clara a ironia na minha voz. Harper pisca algumas vezes, como se processasse a pergunta, enquanto Sebastian, à minha frente, tenta esconder um sorriso.— Não precisa ser rude, Henry — ela murmura, desconfortável, soltando meu braço com um leve movimento. — Só achei… estranho.— O que há de estranho? Mas, respondendo à sua pergunta, sim, já tivemos o desprazer de nos cruzar algum
“Sebastian Morgan”Henry e eu começamos nossas trajetórias no mesmo nível: sem herança, sem famílias ricas. Tudo o que conquistamos foi fruto de trabalho duro e inteligência. Mas, de alguma forma, o destino sorriu mais para ele. E, claro, quando minha empresa finalmente desmoronou, ele foi o primeiro a se oferecer para comprá-la.Ver o homem que começou ao meu lado comprando o fruto do meu esforço foi devastador, mas o pior é a constante lembrança do meu fracasso. Henry nunca perde uma chance de esfregar isso na minha cara. O que ele não imagina é que os tempos ruins também começarão para ele, assim como foram para mim.Meus olhos seguem Harper enquanto ela anda pelo salão após a saída de Henry. Quando nossos olhares se encontram e ela sinaliza discretamente para o jardim, esboço um sorriso confiante.— Com licença, senhores. — digo, olhando para James antes de lançar um olhar aos outros homens que nos cercam. Tentando parecer convincente, aponto para o meu copo vazio. — Vou pegar out
“Evie Ashford” Os compromissos de Sebastian na empresa me deram a certeza de que ele chegaria tarde, como de costume. Sem nada além da companhia esporádica das empregadas, restou-me tentar ocupar a mente. Após passar o dia inteiro em silêncio, exceto pelos audiolivros que me distraíram nessas longas horas, ouvi sua voz na sala, abafada pela distância. Foi então que decidi segui-la. Com a privação da visão, meus outros sentidos parecem ter se aguçado, e a audição é um deles. Tateando as paredes enquanto caminhava pelo corredor, ouvi novamente a voz de Sebastian, agora em um sussurro. Um incômodo me atingiu no peito, fazendo-me franzir as sobrancelhas. Algo parecia diferente. — Sebastian, você está aí? — pergunto, tocando a última parede. Sinto o espaço ao meu redor quando finalmente entro na sala. — Oi, meu amor — ele responde rapidamente, ofegante. Levanto a sobrancelha. Afinal, o que está acontecendo aqui? — Está tudo bem? — Sim! — meu marido diz, aproximando-se. Sinto sua mão
Sinto meu coração disparar, enquanto a raiva e o ciúme crescem dentro de mim. Com as mãos trêmulas, finalmente chego à porta da sala. Sebastian percebe minha presença e, em um instante, sua voz alegre se torna mais suave.— Bom dia, querida! — diz ele, se aproximando rapidamente. Antes que eu possa reagir, sinto seus lábios tocarem suavemente minha testa em um cumprimento. — Estava te esperando acordar. Venha, sente-se.Sem me dar tempo de protestar, ele segura meu braço e me conduz até o sofá. O incômodo dentro de mim só cresce com a presença de Kim, uma amiga íntima de Sebastian. Ele sabe o quanto minha condição me deixa desconfortável até mesmo entre conhecidos. Então, por que a trouxe aqui, sabendo que isso não me agradaria?— Oi, Evie. — ouço a voz de Kim novamente, desta vez acompanhada de um leve toque em minha mão. — Desculpe se te acordamos. Estávamos colocando a conversa em dia e acho que nos empolgamos um pouco.— O que você está fazendo aqui? — pergunto, ignorando sua desc
Já se passaram algumas semanas desde que permiti que Kim ficasse. No começo, sua presença era quase imperceptível. Se não fosse pelas refeições, eu nem notaria que havia alguém além de mim na casa. Ela respeitava meu espaço, nunca forçando sua presença enquanto eu me agarrava à minha necessidade de independência.Com o tempo, no entanto, as coisas começaram a mudar. Kim se aproximou de maneira sutil — um copo de suco aqui, um comentário sobre o clima ali. Ela descrevia o dia lá fora, mesmo sabendo que eu não podia ver. De alguma forma, isso me tocava.Agora, estamos sentadas na varanda. O ar fresco da tarde balança meus cabelos, e Kim, como de costume, descreve o céu, o brilho do sol, as nuvens preguiçosamente se movendo no horizonte. Ela faz isso com tanto cuidado que, por um instante, é como se eu pudesse enxergar novamente.— O céu está tão limpo hoje, Evie — comenta Kim. — Quase não vejo nuvens. É um daqueles dias perfeitos, sabe? Onde um banho de piscina cairia muito bem.Ela con