Uma vez eu amei alguém, mais do que amo a mim mesma. Essa pessoa era tudo para mim. Melanie sempre foi a pessoa que faria tudo por mim e eu por ela. A dor que eu senti ao saber da sua morte ainda queimava em meu peito, tanto que as vezes era impossível respirar, como se eu estivesse vivendo a sua morte. Enquanto eu pensava nela, meu peito doía com a saudade.
Quando minha irmã gêmea, e melhor amiga morreu, era como se ela tivesse levado consigo uma parte de mim. Ela e eu sempre fomos ligadas e eu senti a dor dela quando ela morreu, mas naquele dia eu achei que era só o medo que ela sentiu na hora, ou que havia se machucado. Nunca se passou pela minha cabeça que ela tivesse sido consumida pelas chamas enquanto tentava me salvar. Eu sentia como se a culpa pela sua morte fosse toda minha. Eu não deveria tê-la deixado sair do quarto sem mim.
Cinco anos havia se passado desde a sua morte e a dos meus pais. Cinco anos havia se passado desde a minha morte.
A única coisa que eu queria era que a dor parasse. Que tudo o que eu sentia desde o dia em que eu acordei no hospital fosse embora. A tristeza, a solidão, o medo, as lágrimas que me vinham quase todas as noites antes de dormir desde aquele dia.
Ninguém nesse mundo seria capaz de tomar seu lugar na minha vida. Eu perdi a pessoa que eu mais amava na vida e agora me sentia incompleta, sentindo que faltava alguma coisa na minha vida para eu voltar a ser feliz. Como gêmeas idênticas, era como se dividíssemos o mesmo coração e agora faltava uma parte dele para que eu fosse completa novamente.
Eu me tornara uma pessoa fria por causa da dor. Eu não conseguia mais me obrigar a ter sentimentos, nenhum que não fosse a dor. Eu tinha um bom relacionamento com a minha tia pois morava com ela e não poderia fingir que ela não existia para sempre. Eu tinha uma amiga na escola, conversávamos todos os dias, ríamos e brincávamos, mas as vezes eu tinha que fingir que estava me divertindo, como se aquilo que eu tivesse fazendo não fizesse sentido algum e eu deveria estar fazendo alguma outra coisa, mas não sei o quê. Acho que eu deveria ter um propósito na vida, mas eu o perdi quando perdi parte da minha humanidade.
※※※※23 de outubro.※※※※
Acordei cedo e me arrumei para ir à escola. Prendi o cabelo em um rabo de cavalo, coloquei a primeira calça jeans que encontrei no armário, uma blusa azul, um All Star preto e branco e a corrente de prata com a chave do baú que, desde que eu viera morar com minha tia, estava ao pé da cama. Era um baú antigo que eu ganhara dos meus pais um ano antes do acidente que os matara. O baú tinha manchas negras nas bordas devido ao fato de que ele quase pegou fogo. A chave que estava no meu pescoço era uma lembrança da minha antiga vida, eu usava aquela chave para me lembrar de que por mais que tudo estivesse perdido sempre iria haver algo do meu passado, preso ao meu presente para me mostrar que eu ainda podia ter um futuro. Era o que aquela chave significava para mim. Isso e muito mais.
Me olhei no espelho. Não estava nada mau. Eu já estava pronta para ir para a escola naquela segunda-feira.
Tia Stella estava tomando café na bancada da cozinha quando desci as escadas. Ela olhou para mim e sorriu.
- Bom dia, Megan - disse ela. Seus cabelos castanhos estavam bagunçados e ela ainda estava usando pijama.
Dei um beijo no alto da sua cabeça e me sentei ao seu lado.
- Bom dia, tia.
- O que quer comer? Temos pães frescos, bolo de cenoura com cobertura de chocolate, suco, café e mamão.
- Só uma fatia de bolo, por favor - disse a ela, colocando eu mesma um pouco de suco em um copo enquanto ela colocava à minha frente o bolo de cenoura. - Hoje eu tenho que dar carona pra Sarah, o carro dela tá na oficina.
- De novo? - tia Stella revirou os olhos. - Ainda não entendo como ela conseguiu tirar a carteira de motorista.
Engoli um pedaço da fatia do bolo.
- Do mesmo jeito que eu. Seduzindo o cara que fez o teste – brinquei. Como a garota virgem que eu era, eu não conseguia seduzir ninguém, nem mesmo aquele velho careca que fez o teste comigo para tirar a carteira de motorista.
Sarah Davis morava apenas à alguns quarteirões da nossa casa. Eu a conheci assim que vim morar com minha tia cinco anos atrás. E ela também não seduziu ninguém, mas eu também não sabia como ela havia tirado a carteira de motorista sendo uma motorista ruim. Desde que fizera dezesseis anos, ela já havia batido o carro pelo menos três vezes.
Comi com minha tia como sempre fazíamos, escovei os dentes no banheiro conjugado com meu quarto, peguei minha mochila, voltei para o primeiro andar e me despedi de Stella. Fui para a garagem e entrei em meu Ford prata. Eu ganhara aquele carro no ano passado em meu aniversário de dezessete anos e ele ainda não tinha nem um arranhãozinho.
Buzinei quando cheguei na frente da casa de Sarah, ela me viu pela janela do seu quarto no segundo andar e levantou um dedo, indicando que estaria ali em um minuto. Enquanto eu a esperava aproveitei para trocar a estação de rádio, o que era algo que eu ouvia todos os dias no caminho para a escola. Quando achei a estação que eu queria aumentei um pouco o volume.
- “Casal dado como desaparecido. Beatrice Clark e Carter Lee estão desaparecidos desde o sábado à noite, quando foram vistos pela última vez em uma festa na casa de um amigo da família. Os pais de Beatrice e Carter estão espalhando cartazes por toda a cidade com a foto dos dois…”
Sarah bateu na janela do passageiro. Destravei a porta para ela e desliguei o rádio.
- Estava ouvindo notícias no rádio de novo? Não sei aonde você vê graça nisso - reclamou ela depois de entrar no carro e fechar a porta. Comecei a dirigir.
- Não é para achar graça, mesmo. Só gosto de ficar informada.
- Informada sobre o que? - questionou ela. Gente, por que ela não podia simplesmente concordar comigo pelo menos uma vez?
- Sobre o tempo por exemplo. Disseram que vai chover esse fim de semana – menti, sabendo que ela era chata e que não queria ficar ouvindo sobre pessoas desaparecidas àquela hora da manhã.
Sarah só voltou a falar quando já estávamos no estacionamento da escola.
- O professor Marshall me pediu para fazer um relatório de duzentas linhas para recuperar a nota da prova de história.
- Pelo menos ele está sendo bonzinho com você - argumentei, ou pelo menos tentei.
- Bonzinho? Faça você então um relatório sobre a Segunda Guerra Mundial para a próxima segunda - reclamou ela.
- Sabe que eu posso te ajudar. Basta pedir.
- Me ajuda!
- Com carinho!
- Por favor, Megan. Eu preciso da sua ajuda - disse ela fazendo biquinho e piscando os cílios. Dei risada enquanto saíamos do carro. Depois que fechamos a porta e demos a volta eu disse:
- Na minha casa. Hoje à noite.
Como era típico de Sarah, ela deu pulinhos e bateu palmas, dando risada.
Damos os braços uma à outra e andamos em direção ao prédio principal para começar aquela segunda-feira. Sarah e eu tínhamos apenas três aulas juntas, as outras três tínhamos que aguentar firmemente longe uma da outra. Como minha melhor amiga, Sarah me abraçou e se despediu de mim para ir para sua respectiva sala, como fazia todos os dias desde que nos conhecemos no meu primeiro dia de aula naquela escola.
Eu tinha que agradecer à Sarah por não ter me pressionado a contar o porquê eu estava mudando de escola no meio do semestre. Claro que eu contei pra ela. Um mês depois de nos conhecermos. Eu precisava de espaço e Sarah me deu isso. Ela não me fez milhares de perguntas como achei que faria quando contei a ela que meus pais haviam morrido em um acidente, um incêndio que também me tirou minha irmã gêmea.
Naquela tarde, depois que eu voltei para casa, tive um tempo sozinha antes da minha tia chegar em casa. Tomei banho e coloquei uma roupa leve para ficar em casa. Peguei um dos livros da prateleira e me deitei na cama para ler um pouco. Orgulho e Preconceito, as páginas estavam gastas de tanto serem viradas e havia manchas de café em algumas folhas de quando, sem querer, eu derrubei café nele. Foram só algumas gotas e para minha sorte não havia borrado as letras. Eu li dois capítulos antes de pegar no sono.※※※※Sabe aquele momento que você está sonhando e sabe que está sonhando, mas que o sonho parece tão real que você começa a duvidar da sua própria percepção de sonho? Bom, era exatamente isso que estava acontecendo comigo naquele instante. Uns minutos antes de alguém me acordar, eu me vi dentro de um sonho o
Amélia acordou de repente, com o corpo coberto de suor. Seus pesadelos estavam cada vez piores. Eles sempre a levavam para aquele terrível dia que sua irmã morrera. Mesmo sem querer admitir, Amélia amava sua meia-irmã. E sentia muita falta dela. Mary fazia falta na família. Seus pais nunca mais foram os mesmos depois da morte dela e do marido. Mesmo Mary não sendo filha legítima de seus pais, ela estava na família desde muito pequena. Mary era só um bebê quando se juntou aos Collins. Amélia nasceu um ano depois disso, as duas cresceram e se tornaram mulheres lindas, Mary com seus cabelos castanhos e Amélia com seus gloriosos cachos negros. As duas não eram apenas irmãs, eram melhores amigas, mas a vida as separou. Como tudo que começa tem que acabar. Um barulho no elevador chamou a atenção de Amélia. Ela se levantou, colocou o hobby de seda preto e saiu do quarto. A porta do elevador, que dava para o interior de seu apartamento, se abriu. Kiyamet estava com suas trad
Mason dormia profundamente em sua cama no dormitório masculino. Ele dormia no quarto ao lado de seu irmão, Jason. Os dois eram muito parecidos fisicamente, mas completamente o oposto um do outro em se tratando de personalidade. Jason, por exemplo era sempre quieto e gostava de ficar na dele, andava com os amigos, mas dificilmente puxava assunto, era inteligente e muito bonito. Jason havia puxado vários traços de seu pai, mas os olhos e cabelos escuros eram da mãe. Mason também tinha os cabelos escuros, mas seus olhos eram castanhos claros com um leve toque de dourado e não pretos como os da mãe. Os dois irmãos eram grandes e fortes, devido aos treinamentos na Arena da Academia. Eram quatro horas da manhã ainda. Mason puxou os cobertores até o queixo e se virou de lado. Em seu sonho ele viu a garota por quem estava apaixonado desde que a conhecera aos quinze anos quando a mãe dela a levou até a casa onde ele morava com a mãe. Os cabelos louros de Andrea
Amélia tentava prestar atenção na estrada à sua frente, mas os pensamentos de seus filhos entravam na sua cabeça sem permissão. Os pensamentos de Mason eram constrangedores, ele não parava de pensar em Andrea. Pelos pensamentos de seu filho, ele ainda era virgem, mas não demoraria muito até que ele e Andrea se unissem. Ele não parava de pensar nos lábios da garota que deixara para trás. Os pensamentos de Jason, por outro lado, eram mais sanguinolentos do que os do irmão mais novo. Ele pensava em guerra, quando tudo o que os Hunters queriam era paz. Ela freou de repente, as rodas do carro derrapando na rua de cascalho. - O que há com vocês? - perguntou ela, virando-se no banco para encarar ambos os filhos. Mason parecia perdido olhando pela janela, mas quando sua mãe falou ele a olhou. Ela estava linda como sempre. - Você estava fazendo aquilo de novo? - perguntou Jason bloqueando seus pensamentos. - Eu já disse que não consigo evitar, por isso
- Mãe... está acordada? - a voz de Mason vinha do corredor. Amélia vestiu-se rapidamente e atendeu a porta. Seu filho estava com o cabelo bagunçado, usava uma regata branca e uma calça de moletom cinza.- Tudo bem? - perguntou ela ao filho.Ela percebeu que ele hesitou, mas enfim falou com a voz rouca.- Não consegui dormir.- Teve um pesadelo?Mason assentiu com um gesto de cabeça.- Quer dormir aqui? - perguntou ela.- Se eu não for incomodar. - Ele entrou e se sentou na beira da cama. Amélia se sentou do seu lado e pegou na sua mão.- Se importa se eu ver? - perguntou ela. Ele balançou a cabeça. Amélia se concentrou e entrou na cabeça do seu filho, sondando, vendo o que ele sonhara que o deixara tão abalado.O que Amélia viu a fez chorar. Era uma falsa lembrança. Mason havia sonhado com seu pai. Mas o
※※※※25 de outubro.※※※※ Na quarta-feira, tia Stella me encontrou no meu quarto ardendo em febre e não me permitiu ir à escola. Eu havia dito que não era nada, mas ela não me deixou nem mesmo falar. Me deu alguns remédios e me deixou dormir quase o dia todo. Eu não sabia o que causara o mal-estar, mas depois do meio-dia eu acabei pondo todo o almoço para fora. Tenho certeza de que não era intoxicação alimentar, mesmo assim tia Stella insistiu em me levar ao médico naquele dia. O médico disse que não encontrou nada de errado comigo e, portanto, eu estava bem. Ele me deixou ir dizendo que eu não precisava faltar a aula no dia seguinte, mas que se me sentisse ruim novamente era para procurá-lo de novo. Tia Stella ligou para Sarah depois que voltamos do médico. Eu já estava melhor, bem o bastante para pôr todo o assunto em dia das matérias que eu havia perdido. Sarah havia dito que as aulas haviam sido o mesmo de sempre, nada de importante havia ac
※※※※ Querido diário. Acabo de ter mais um pesadelo. Ultimamente eles andam mais frequentes. Quase toda noite eu perco o sono, as vezes é apenas insônia, mas as vezes são os pesadelos que não me deixam dormir. Quero muito falar com alguém sobre isso, mas eu não tenho muitas opções. Sei que se eu contar à tia Stella ela vai querer que eu volte a fazer terapia, mas eu não quero falar com uma estranha sobre meus sonhos, isso é particular. Eu só quero alguém para desabafar, alguém que realmente possa me ajudar. Sarah é minha melhor amiga há cinco anos, mesmo assim ela não entende quando eu falo dos meus sonhos pra ela. Sarah não é formada em psicologia, então não pode me ajudar (não que eu queira um especialista na área). Eu achei que já tinha superado a morte dela. Mas eu não consigo parar de sonhar com Melanie, e ultimamente os sonhos estão se tornando mais frequentes. À
Dominic comia o jantar em silêncio, ele não era muito de falar, nem mesmo com a filha. A única pessoa com quem ele falava estava tomando banho no segundo andar, e iria demorar pelo menos mais meia hora até descer novamente, deixando a cozinha num silêncio estranho. Por sorte Dominic não quebrara a perna, mas estava mancando desde que acordara naquela manhã e estava usando uma bengala para conseguir se equilibrar. Seu rosto já estava melhor apesar da aparência cansada, mas ele ainda gemia de dor do ferimento da bala em sua barriga. Amélia se remexeu na cadeira e continuou comendo, sentada de frente para o seu pai, seus filhos estavam a sua direita e o lugar vago ao lado de seu pai pertencia à sua mãe, mas ela não estava com fome. Jason pigarreou. - Então, vovô… Como o senhor está? - Bem - respondeu Dominic. Curto e grosso. - Sabe que Mason pode ajudar. A ferida se cicatrizaria e não doeria mais… - Não, obrigado. Mason ch