Amélia tentava prestar atenção na estrada à sua frente, mas os pensamentos de seus filhos entravam na sua cabeça sem permissão. Os pensamentos de Mason eram constrangedores, ele não parava de pensar em Andrea. Pelos pensamentos de seu filho, ele ainda era virgem, mas não demoraria muito até que ele e Andrea se unissem. Ele não parava de pensar nos lábios da garota que deixara para trás. Os pensamentos de Jason, por outro lado, eram mais sanguinolentos do que os do irmão mais novo. Ele pensava em guerra, quando tudo o que os Hunters queriam era paz.
Ela freou de repente, as rodas do carro derrapando na rua de cascalho.
- O que há com vocês? - perguntou ela, virando-se no banco para encarar ambos os filhos.
Mason parecia perdido olhando pela janela, mas quando sua mãe falou ele a olhou. Ela estava linda como sempre.
- Você estava fazendo aquilo de novo? - perguntou Jason bloqueando seus pensamentos.
- Eu já disse que não consigo evitar, por isso preciso da ajuda de vocês.
- O que você ouviu? - quis saber Mason.
- Nem queira saber. Mas você e eu teremos uma conversinha mais tarde, entendeu? - Amélia se virou para frente e voltou a dirigir, sem querer imaginar seu filho perdendo a virgindade aos vinte anos de idade.
Ser uma telepata nem sempre era fácil. Na verdade, nunca era fácil. Ela tinha que praticar todos os dias autocontrole, mas sem ajuda era ainda mais difícil de fazê-lo.
Os dois lados da rua de cascalho eram rodeados de arvores grandes de troncos grossos. Havia vários tipos de árvores ali, mas nenhuma que Amélia soubesse o nome. Depois de meia hora dirigindo com cautela, eles enfim chegaram na cidade. Mason cochilava no banco de trás e Jason passara a ler um livro. Ainda estava escuro, mas Amélia continuou a viagem em direção à Sacramento, na Califórnia.
Mason bocejou. Ele ainda estava cansado e o banco do carro não era o mais confortável de se dormir durante uma viagem que eles poderiam ter feito de avião.
Jason ligou o rádio e colocou em uma estação que ele considerou aceitável. Ele também não queria ter acordado cedo para fazer uma viagem que ele também não queria. Ele sentia saudade de seus avós, mas sair no meio de uma semana de aulas para ir vê-los era burrice. Sua mãe poderia ter esperado o fim de semana para que ele não tivesse que perder nenhuma aula. Mas ela insistira em que todos tinham que ir. Por isso ele estava carrancudo aquela manhã.
Já fazia umas três horas que sua mãe estava dirigindo, parando uma vez apenas para Jason fazer xixi no mato. Eles já haviam atravessado a cidade e agora já estavam fora dela, rodeados por um completo nada. Assim que escurecesse eles teriam que parar em algum lugar para dormir. Jason poderia aguentar uma noite no banco de trás do carro, mas seu irmão e sua mãe não.
Ao meio-dia eles almoçaram o que conseguiram comprar em um posto de gasolina. Mason passou as duas horas seguintes se queixando de dor de barriga por ter comido tanta besteira, dizendo que o corpo dele não estava acostumado com aquele tipo de comida empacotada e cancerígena.
Jason trocou de lugar com o irmão por volta das quatro da tarde, deitando-se no banco de trás para uma soneca, enquanto Mason lia um livro e conversava com a mãe, fazendo-lhe companhia. Era meia noite quando Amélia parou o carro na frente de uma hospedaria. Ela estava exausta, seus filhos também. Assim que ela conseguiu dois quartos, os únicos disponíveis no local, todos caíram na cama e adormeceram. Jason teve que dividir a cama com o irmão caçula, o qual ele não gostou muito, pois seu irmão tinha o péssimo hábito de dormir sem roupa.
Amélia ficou com um quarto só para ela, para ter a privacidade que ela tanto merecia. Ela olhou pela janela antes de fechar as cortinas e apagar a luz do abajur ao lado da cama. Ela tinha dirigido o dia todo, suas pernas doíam e ela estava com dor de cabeça de tanto ouvir Mason reclamar. Mas ela não o culpava, eles poderiam ter feito aquela viagem de avião, seria muito mais rápido. Mas não é permitido armas nos aviões. E seu carro estava cheio delas.
Amélia teria que contar aos seus filhos mais cedo ou mais tarde o verdadeiro motivo de eles estarem indo para a antiga casa da família Collins. Miranda Collins, sua mãe, nem sabia que eles estavam voltando para a cidade. Nem ela nem seu pai, Dominic Baker Collins.
A mulher de meia idade que não aparentava ter mais de vinte e cinco anos lembrou de quando sua mãe lhe explicara o por que seu pai havia ganhado o sobrenome da mãe ao invés do contrário. Sua família tinha vários Escolhidos na árvore genealógica. Sua mãe não fora uma, mas ansiava que Amélia fosse quando tivesse idade. E ela foi. Ou seja, a família de Miranda era mais importante do que a de Dominic.
Agora ela tinha uma responsabilidade nas mãos que ela achou que nunca teria que lidar. Não era tão ruim ser a Escolhida, nem difícil. Só que ela não gostava de todas aquelas mentes em volta dela. Como a telepata que era, ela ouvia tudo. E ela odiava. Todas as mentes de todo mundo, todas as pessoas pensando sem parar em assuntos que ela nem precisava saber, coisas que ela não queria saber. As vezes seu poder era útil, mas havia momentos que era perturbador demais.
As vozes a deixavam com dor de cabeça e as vezes ela não conseguia controlar e falava em voz alta o que ouvira da mente de alguém, deixando essa pessoa constrangida ou até mesmo com raiva. No início, Amélia arranjara muitos problemas, mas depois ela aprendera a controlar e só ouvir o essencial, apenas quando ela queria ouvir. Mesmo assim, às vezes, raramente, ela ainda entrava na mente de alguém sem querer, quando perdia a concentração.
- Mãe... está acordada? - a voz de Mason vinha do corredor. Amélia vestiu-se rapidamente e atendeu a porta. Seu filho estava com o cabelo bagunçado, usava uma regata branca e uma calça de moletom cinza.- Tudo bem? - perguntou ela ao filho.Ela percebeu que ele hesitou, mas enfim falou com a voz rouca.- Não consegui dormir.- Teve um pesadelo?Mason assentiu com um gesto de cabeça.- Quer dormir aqui? - perguntou ela.- Se eu não for incomodar. - Ele entrou e se sentou na beira da cama. Amélia se sentou do seu lado e pegou na sua mão.- Se importa se eu ver? - perguntou ela. Ele balançou a cabeça. Amélia se concentrou e entrou na cabeça do seu filho, sondando, vendo o que ele sonhara que o deixara tão abalado.O que Amélia viu a fez chorar. Era uma falsa lembrança. Mason havia sonhado com seu pai. Mas o
※※※※25 de outubro.※※※※ Na quarta-feira, tia Stella me encontrou no meu quarto ardendo em febre e não me permitiu ir à escola. Eu havia dito que não era nada, mas ela não me deixou nem mesmo falar. Me deu alguns remédios e me deixou dormir quase o dia todo. Eu não sabia o que causara o mal-estar, mas depois do meio-dia eu acabei pondo todo o almoço para fora. Tenho certeza de que não era intoxicação alimentar, mesmo assim tia Stella insistiu em me levar ao médico naquele dia. O médico disse que não encontrou nada de errado comigo e, portanto, eu estava bem. Ele me deixou ir dizendo que eu não precisava faltar a aula no dia seguinte, mas que se me sentisse ruim novamente era para procurá-lo de novo. Tia Stella ligou para Sarah depois que voltamos do médico. Eu já estava melhor, bem o bastante para pôr todo o assunto em dia das matérias que eu havia perdido. Sarah havia dito que as aulas haviam sido o mesmo de sempre, nada de importante havia ac
※※※※ Querido diário. Acabo de ter mais um pesadelo. Ultimamente eles andam mais frequentes. Quase toda noite eu perco o sono, as vezes é apenas insônia, mas as vezes são os pesadelos que não me deixam dormir. Quero muito falar com alguém sobre isso, mas eu não tenho muitas opções. Sei que se eu contar à tia Stella ela vai querer que eu volte a fazer terapia, mas eu não quero falar com uma estranha sobre meus sonhos, isso é particular. Eu só quero alguém para desabafar, alguém que realmente possa me ajudar. Sarah é minha melhor amiga há cinco anos, mesmo assim ela não entende quando eu falo dos meus sonhos pra ela. Sarah não é formada em psicologia, então não pode me ajudar (não que eu queira um especialista na área). Eu achei que já tinha superado a morte dela. Mas eu não consigo parar de sonhar com Melanie, e ultimamente os sonhos estão se tornando mais frequentes. À
Dominic comia o jantar em silêncio, ele não era muito de falar, nem mesmo com a filha. A única pessoa com quem ele falava estava tomando banho no segundo andar, e iria demorar pelo menos mais meia hora até descer novamente, deixando a cozinha num silêncio estranho. Por sorte Dominic não quebrara a perna, mas estava mancando desde que acordara naquela manhã e estava usando uma bengala para conseguir se equilibrar. Seu rosto já estava melhor apesar da aparência cansada, mas ele ainda gemia de dor do ferimento da bala em sua barriga. Amélia se remexeu na cadeira e continuou comendo, sentada de frente para o seu pai, seus filhos estavam a sua direita e o lugar vago ao lado de seu pai pertencia à sua mãe, mas ela não estava com fome. Jason pigarreou. - Então, vovô… Como o senhor está? - Bem - respondeu Dominic. Curto e grosso. - Sabe que Mason pode ajudar. A ferida se cicatrizaria e não doeria mais… - Não, obrigado. Mason ch
Dominic estava calmo, ou pelo menos aparentava. Ver seu neto de joelhos à sua frente fez lembranças ruins voltarem a atormentá-lo. Ele não queria se lembrar de Michael. Ou mesmo de Mary. Mas ele tinha que fazer isso. Estava assustando Jason, claro. Seu neto nunca o tinha visto usar seu poder, e agora estava vendo-o usar contra ele. Mas seu poder iria fazê-lo esquecer daquela conversa toda, como se nada tivesse acontecido. Normalmente Dominic só usava seu poder em humanos que o pegava no flagra matando vampiros, ele nunca usara seu poder contra outro Hunter. Muito menos em alguém da família. O poder de Dominic era uma variação da telepatia, mas ao invés de ler pensamentos, ele conseguia acessar memórias, apaga-las, embaçá-las ou muda-las como bem queria. Ele tinha muitos anos de treinamento para conseguir controlar o seu poder. E tudo o que ele queria era acessar as memórias de Jason para saber o que o trouxera ali. “Mãe!” Gritou Jason mentalm
※※※※Querido diário.Os pesadelos têm piorado. A cada noite que se passa eu acho que estou ficando louca. Não sei o que está acontecendo comigo. Tenho medo. Sinto saudades. As lembranças de alguém que já viveu me atormentam. Por que ela não pode me deixar em paz para viver minha vida? O que ela quer de mim?Preciso de ajuda. Não alguém com quem conversar, mas sim, alguém que acabe de uma vez por todas com esses sonhos. É impossível, eu sei. Mas eu não quero ter que recorrer à ajuda psicológica novamente. Da primeira vez já foi um pesadelo ter que falar para uma estranha sobre o acidente e o que aconteceu comigo depois disso. A verdade é que eu nunca superei. Acho que nunca vou superar. É doloroso demais. Só de pensar nas coisas que Melanie e eu poderíamos ter f
Miranda puxou Amélia pelo braço até uma saleta, deixando Dominic sozinho no quarto com os meninos. Amélia só foi com sua mãe pois sabia que seu pai não tentaria mais machucar seu filho, nenhum deles. Nem tentar apagar ou vasculhar nenhuma memória. - Por que você não nos contou sobre Jason? - disparou Miranda depois de trancar a porta. - Ele me pediu que não contasse a ninguém da família. Alguns dos amigos dele da Academia sabem, mas eles não comentam com ninguém pois sabem do problema de Jason. - Que “problema”? Amélia respirou fundo, desviou os olhos por um segundo e voltou a olhar para sua mãe. - Ele não sabe usar o poder dele. O semblante de Miranda se contorceu de medo e ressentimentos. Fragmentos de pensamentos escorregaram para dentro da cabeça de Amélia e ela viu e pode entender o motivo do medo de sua mãe. - Ele ainda tem tempo para aprender a controlar - adiantou-se Amélia dando um passo para frente. Sua mãe a
※※※※31 de outubro.※※※※ Passei a noite de Halloween em casa, trancada em meu quarto. Tia Stella ficou de entregar os doces a todas as crianças que batessem em nossa porta. A noite foi tranquila, apenas alguns adolescentes idiotas gritando nas ruas feito loucos enquanto eu tentava ler um bom livro no conforto do meu quarto. No fim da noite, não resisti e fui até a cozinha comer o que restara dos doces. Para minha sorte, Stella não havia enfeitado a casa com abóboras, teias de aranhas, esqueletos e outras coisas, como as outras casas, senão eu sabia que a tarefa de limpar tudo depois iria ficar toda para mim. Sarah havia me convidado para ir à uma festa, mas eu disse a ela que preferia ficar trancada no meu quarto o resto da semana a me encontrar em um lugar com várias pessoas desconhecidas, das quais eu tinha certeza de que não iria gostar. Ela, como sendo minha melhor e única amiga, me entendeu, mas ficou me mandando fotos a noite toda, para tentar, e