Ao despertar, noto que minha perna apresenta uma grande laceração. As veias adquirem uma coloração púrpura, assemelhando-se a raios durante uma tempestade, propagando-se lentamente pela extensão da minha perna. A dor é forte embora suportável, mas o cenário ao meu lado aparenta ser ainda mais doído. Meu tio Leoni encontra-se pendurado por dois cabos metálicos, um em cada pulso, inconsciente, ao nível das faces empaladas de animais. Em seu abdômen, a marca de Anemônia se espalha em igual intensidade àquela que possuo na minha perna.Eu me volto para ele, percebendo que meus tornozelos estão presos por duas correntes, fixadas ao chão. O ambiente possui uma atmosfera nebulosa, quase fumegante, que interfere na minha visibilidade, no entanto, é evidente onde estamos: no quarto secreto de Ryker.— Alys? — Chamo seu nome, buscando-a entre o que posso ver. — O que você fez?Por muitas horas, não recebemos resposta. Meu tio parece exausto, com um cansaço evidente. Ocasionalmente, ele desperta
A corrida até o esconderijo de Leoni estava se mostrando um desafio. O homem forte e pesado que eu carregava, gemendo de dor, superava minha força. Ele me atrasava tanto quanto a minha perna ferida, que impedia meus movimentos de serem mais rápidos. Parei brevemente, ciente de que não tinha meu telefone para ligar para Felicia, enquanto me concentrava nos sons da floresta.— Quem está aí? — Eu me viro para procurar, até finalmente localizar sua sombra escura entre os arbustos. — Eu já sei de toda a verdade.— Onde está meu irmão? — Tygon se aproxima, porém Calice posiciona as mãos em seus ombros, puxando-o para trás.— Você não irá para lugar algum, garoto. — Ela mostra suas presas. — Este homem precisa morrer.— Vocês não sabem do que estão falando. Ryker está enganando vocês também! — Eu declaro, com um olhar irritado, enquanto Leoni faz meu corpo cambalear. — Ele quer meu sangue para ressuscitar a sua falecida esposa.— Você está mentindo! — Clarice grita. Cuidadosamente, eu coloco
A recuperação dos movimentos do meu corpo ocorre de maneira gradual. Sinto-me como uma máquina viva, robótica, com músculos rígidos, incapazes de executar movimentos completos. Gradualmente, meus ossos estalam à medida que se fortalecem, retomando a sensação da fase anterior e induzindo um considerável desconforto. Agora, a nova etapa se funde com a anterior, deixando-me imobilizado e mergulhado em agonia. Nesse processo, transformo-me em algo semelhante a uma puma.— Um esconderijo subterrâneo. — Calice observou o local, que mal conseguia acomodar a todos nós. — Esperto, Leoni.— Como cobre seus rastros? — Tygon perguntou.— Isso não é da conta de vocês. — Felicia retrucava, meticulosamente examinando o abdômen lesionado de seu pai, que agora havia despertado. — Como está, pai?— Estou bem. — Ele fala sem muita dificuldade, esboçando um sorriso para ela e um olhar de preocupação para mim.— Cato?Aceno com a cabeça, assentindo de forma positiva, embora morda os lábios por causa da dor
O que existe entre o trovão e a tempestade?O som dos meus passos ressoava como trovões ao longe, ecoando pelas ruas inundadas. Cada passo fez meu calçado afundar nas poças, espirrando gotas que bailavam no ar, semelhante aos relâmpagos que cortavam o céu tempestuoso acima de mim. A água dentro do sapato tornava meus movimentos escorregadios, no entanto, eu resistia a cair, segurando firme o único descendente da minha família em meus braços.Correndo desesperadamente, o céu se iluminava com uma luz intensa, acompanhada pelo som perturbador do trovão que ressoava atrás de mim, como se os deuses estivessem decidindo o meu destino. Os lampejos de relâmpago serviam como um lembrete de quão vulnerável minha vida é perante as forças da natureza. Meu desespero era tão excessivo quanto a tempestade.Meus braços estavam doloridos de exaustão enquanto segurava o bebê, e seu peso parecia aumentar durante a viagem que realizei desde o início da tempestade. Meus músculos estavam rígidos e encharca
A imponente estrutura vibrava com euforia; uma cúpula colorida, repleta de vida e luzes cintilantes. No centro do picadeiro, o apresentador, um homem de energia contagiosa, anunciava entusiasmado a minha chegada. Eu podia ouvir a plateia, tomada por uma tempestade de emoção, explodindo em aplausos e exclamações, ansiosa pela próxima atração. Dentro de mim, a sensação de nervosismo crescia como um arranha-céu. O trapézio, a poucos passos de mim, era mais do que um mero equipamento de circo; era o meu refúgio.Cada salto e pirueta não apenas marcava o limite entre a glória e a queda. Um simples erro poderia ser fatal. Os músculos das minhas mãos tremiam, mas eu tentava dominá-los com a respiração, procurando acalmar o coração acelerado à medida que a cortina do picadeiro se abria para o meu grandioso ato. A verdadeira força não estava nos músculos que segurariam o trapézio, mas na mente que se entregaria aos movimentos aéreos livres realizados pelo meu corpo.Mas o que ocorre quando a s
Me matar?Por quê ali, naquele instante? Não é o nosso primeiro encontro. Ele teve a oportunidade de me matar muito antes, lá, no internato. Por quê só agora?Enquanto a maioria dos jovens se divertia no pátio jogando basquete, eu preferia me exercitar nas arquibancadas, executando movimentos circulares com meu corpo. Esses alongamentos me permitiam explorar a tensão muscular, aliviando as dores dos ferimentos que sofria.Quando um movimento na quadra distanciou o percurso da bola de basquete a atingir minhas costas, Ashton mandou que eu a jogasse de volta, mas eu o ignorei.— O filhotinho de leão é medroso, não é? — Ele se aproximava, rindo com os outros, zombando do meu pingente, como sempre faziam. — Ou será que ele é só um gatinho?Eles começaram a me encurralar. Além de Ashon e Malthem, três jovens de um dormitório diferente colaboravam, me impulsionando de um lado para outro. Naquele momento, eu era a bola de basquete deles.— Se continuarem a me empurrar, terão que limpar a bos
Tabitha, ainda envolvendo seu corpo com as serpentes, se sentia desconfortável e temia pela segurança das cobras. Contudo, sua confusão não superava a da plateia, que iniciava um caos na arquibancada. O sussurro de pânico se intensificava em vozes de desespero.Os espectadores na arquibancada iniciavam uma confusão, buscando apressadamente a saída por todas as direções. As crianças, tomadas pelo pânico, choravam assustadas. Alguns tropeçavam e caíam, ferindo-se nas escadas da arquibancada. Eles deveriam estar surdos. Eu havia alertado que estavam seguros dentro do picadeiro, e agora, paradoxalmente, tentavam escapar na direção do perigo.— Tem uma onça ou n&atil
O aroma da chuva fresca que acompanhava o pingente com a figura de um leão; seguido pelas sardas no rosto de Felícia que apareciam quando ela, de forma tímida, inclinava a cabeça ao me ver; as pancadas e golpes que recebi na região das costelas dos garotos do orfanato; Leoni me observando com seus olhos de cor laranja no pátio; o momento em que Elliott me introduziu ao fascinante mundo do circo; as covinhas que ficavam ocultas pelos cabelos encaracolados de Alys na universidade; o sabor único do bolo de Maya que provocou vômito em todos naquele dia; a vez que permiti que a píton se enrolasse em meu pescoço; os treinos intensivos que Hero exigia no trapézio; o dia em que encarei a plateia pela primeira vez. Dizem que, ao morrer, sua vida passa diante de seus olhos como um filme. Foi o que aconteceu.Caminhava pelas vias sombrias, fugindo daquele pesadelo. Possivelmente, estava lidando com uma crise de exaustão, o famoso burnout. Corria ocasionalmente olhando para trás