Ana Júlia.
Olho para o papel contendo as informações sobre o meu pai pela décima vez. Pelo relatório, é um homem de posses e muito rico. Mas isso é o de menos. Vejo logo abaixo no dossiê um número de telefone. Sentindo a minha tremular, eu pego o meu celular no bolso traseiro do meu jeans e ligo para o número. O telefone chama incansavelmente e a cada toque, sinto o meu coração bater violentamente. Penso em desistir, mas a minha teimosia não me permite. Ou seria a minha curiosidade? O telefone volta a chamar e o meu coração quase sai pela boca, quando alguém atende na segunda chamada.
— Residência dos Fassini, quem é? — A voz masculina inquire do outro lado.
— O senhor Fassini se encontra? — Procuro manter a minha voz o mais firme possível
— Deseja falar com o pai ou o filho? — pergunta. Eu hesito por alguns instantes.
— E... eu acho que o filho... — gaguejo e sinto a minha garganta ficar cada vez mais seca.
— Só um momento... Ah! Desculpe, quem deseja? — A pessoa pergunta e mais uma vez eu engulo em seco. O que eu devo dizer? Ah! Por favor, diga que é a filha dele? Não mesmo!
—Senhora? — O homem chama me despertando.
— Desculpe! Eu ligo em outra hora, obrigada! — Desligo sem esperar a sua resposta. O que devo fazer? Devo procurá-lo? E o que ele vai pensar? Meu Deus isso é loucura!
"Eu tenho que lhe contar uma coisa filha ... Eu tinha quinze anos quando fiquei grávida ...E ele tinha que ir para a faculdade ... Meus pais não podiam ficar comigo ...Eu tive que fugir."
Meu Deus, ele não sabe da minha existência. Nunca soube... Ele nunca teve a oportunidade de falar, de escolher. Penso levando a minha cabeça as mãos e respiro fundo. O que eu faço? Com as minhas emoções em frangalhos, pego o celular e torno a ligar. Dessa vez uma mulher atende.
— Residência dos Fassini, quem deseja?
— Boa tarde, me chamo Ana Júlia Alcântara e procuro o filho do senhor Fassini. —Tento manter a minha voz firme.
— Oh, me desculpe! O senhor Fassini acabou de sair daqui. Hoje foi o sepultamento da mãe dele e ele não está muito bem. Quer deixar recado? — Ela pede. Meu Deus! Sinto o meu corpo inteiro estremecer e ao mesmo tem saber o que dizer. A mãe dele acabou de falecer. A minha... Avó. Luís entra silencioso no escritório e noto a sua preocupação estampada em seu rosto.
— Querida, já tem horas que você está trancada aqui dentro. As crianças estão ficando preocupadas. — Diz se aproximando da minha mesa.
— Me desculpe! — sussurro.
— Não precisa se desculpar, está tudo bem? — Procura saber.
— Eu quero conhecê-lo, Luís — falo sem rodeios. Meu marido me encara espantado.
— Tem certeza, Ana?
— Não, mas eu quero conhecê-lo. Quero ter a certeza de que nunca me procurou porque realmente não sabia da minha existência ou se ele nunca quis me conhecer de fato. Preciso resolver esse pedaço da minha vida, Luís — peço quase sem voz e ele assente levando as mãos ao bolso.
— Ok, mas quero que saiba que eu estarei com você, não importa o resultado final disso tudo — diz sério e eu lhe dou um meio sorriso.
— Eu te amo! Obrigada por fazer isso por mim! — sibilo, saindo da minha cadeira e ele abre os seus braços pra mim. Eu deito a cabeça em seu peito e logo sinto um beijo cálido em meus cabelos.
— Sério? — Ele sorri. — Não está chateada por fuçar seu passado, sem falar com você?
— Não, no fundo eu queria fazer isso, porém nunca tive coragem de fato — confesso. Ele me aperta em seus braços e eu o aperto nos meus.
— Eu te amo, pequena! —sussurra, deixando mais um beijo cálido.
A noite, é difícil fechar os olhos, quando se está explodindo de ansiedade por dentro. Fiquei a noite inteira embolando na cama, pensando em como seria encontrá-lo? Em como ele reagiria ao me ver? Se ele me aceitaria como sua filha? Meu Deus eu passei toda a minha infância e adolescência sem um pai. Nós quase passamos fome. Minha mãe se matava de trabalhar para me dar o melhor na medida do seu possível e hoje eu descubro que eu podia ter uma... Uma família de verdade. Como teria sido a minha infância com ele? Como teria sido a minha vida com ele? Tenho muitas perguntas e não sei se realmente terei alguma resposta. São cinco da manhã quando eu resolvo sair da cama. Não vou conseguir dormir mesmo e daqui a algumas horas terei que ir trabalhar. Logo mais a noite prometi ir ao shopping com as crianças para o mais novo evento infantil que acontecerá. Vai ser bom, pelo menos poderei me distrair. Entro no banheiro me livrando da camisola de seda branca e tomo uma ducha rápida. Depois ponho uma roupa leve e sigo para fora do quarto, deixando o meu marido adormecido. Desço as escadas e vou direto para o escritório. Quando me aproximo da minha mesa, pego o meu mais novo projeto. Um hotel de luxo no Caribe e resolvo tracejar alguns parâmetros na planta. As horas se passam e eu não percebo que o dia já está totalmente claro lá fora. Luís entra no escritório e ao se aproximar, ele me beija rápido na boca.
— Dormiu bem? — indaga, avaliando o meu rosto.
— Sim — minto. — Como um anjo. — Sorrio.
— Mentirosa! — ralha, brincando com a ponta do seu dedo no meu nariz. — Conheço bem a minha esposa.
— Com fome? — Mudo de assunto.
— Faminto, senhora Alcântara. — Sorri tirando o papel das minhas mãos e me puxa para os seus braços, beijando-me outra vez. Sorrio quando o beijo termina.
— Vou pedir para Delia preparar algo para comermos — falo, me afastando um pouco.
— Até parece que precisa pedir — retruca com humor. — Vou ligar para o Max.
— Para quem?
— O detetive. Quero que ele encontre o seu pai e o traga até aqui — informa. Penso em dizer que não, mas eu simplesmente não posso. Por mais que eu tenha medo ou que eu não queira admitir. Eu quero conhecê-lo. E se eu tiver de receber um não, que seja aqui, na minha casa.
— Tá bem — digo finalmente e saio do cômodo. Depois do café da manhã, levo as crianças à escola. E sigo direto para o Caravelas & Hotelaria. Glória, minha assistente se aproxima sorridente e com uma xícara de café em uma bandeja.
— Bom dia, senhora Alcântara! —Ela diz com o seu jeito ansioso de sempre.
— Bom dia, Glória, como estão as coisas por aqui? — pergunto com o meu habitual jeito profissional. Ela dá de ombros e eu pego a xícara sobre a pequena bandeja, tomando um pequeno gole em seguida.
— Alguns novos projetos para analisar e para assinar se for o caso. — Sorrio e entro em minha sala com a minha assistente colada bem atrás de mim. me acomodo em minha cadeira, por trás da minha mesa e tomo mais um gole do café.
— Bom dia para a minha arquiteta preferida! — Marcos, o sócio e melhor amigo do meu marido diz entrando na sala, segurando um papel imenso na mão.
— Bom dia! O que é isso? — pergunto movida de curiosidade.
— Um hotel antigo e carente de obras — diz largando o cilindro em cima da minha mesa. Lanço-lhe um olhar curioso e sorrio abrindo o rolo de papel.
— Estamos trabalhando com restaurações agora? — retruco com surpresa, vendo um sorriso sarcástico surgir na sua face.
— Meu sócio e melhor amigo, o senhor seu marido, cismou com esse hotel — ralha se acomodando na cadeira a minha frente
— Hum, deixe-me ver. — Dou uma olhada minuciosa na planta e fico encantada com o que vejo. É um prédio antigo e pela data da planta, ele realmente deve estar bem acabado, sabendo que nunca passou por uma reforma antes. E pra chegar aos nossos padrões, teremos que praticamente reconstruí-lo. — É um belo lugar! — comento ainda olhando o tracejado.
— Seu marido disse o mesmo, eu particularmente não vejo nada demais. Mas se vocês veem, quem sou eu pra contradizer? — rebate, fazendo o meu sorriso se ampliar.
— Isso porque o senhor só entende da parte de construção. Você sabe que o Luís é que consegue ver com clareza o potencial do empreendimento — ralho e ele bufa de modo audível.
— É, e a verdade é que ele nunca errou. — Concorda.
— Viu? — Pisco um olho para o sócio do meu marido. — A noite estamos todos no shopping. E depois do evento, um musical com personagens infantis, deixamos as crianças se divertirem, enquanto eu e Luís ficamos sentados em um banco de praça os observando e de vez em quando aos beijos. Eu amo a minha família! E confesso que nunca cheguei a sonhar com uma realmente. É claro que pensei em ter filhos e em me casar, mas não imaginei que aos 28 anos tudo já estivesse em seus devidos lugares. Em um momento noto o Jonathan se afasta de sua irmã e do Caio e corre em direção das escadas rolantes.
— Não! — digo apreensiva, levantando do banco exasperada.
— O quê? — Luís pergunta levantando em seguida. Sem pensar duas vezes, eu corro na direção do meu filho, sem prestar a atenção nas pessoas que vem pela frente e esbarro brutalmente em um homem que me segura firme para que eu não vá ao chão. Nossos olhos se encontram e eles parecem... Familiar?
— Me desculpe, eu não a vi... — Ele para de falar quando olha o meu e parece empalidecer de repente.
— Você está bem? — pergunto me recompondo. Ele me olha por um curto espaço de tempo.
— Eu... eu... — Ele gagueja.
— Moço, está sentindo alguma coisa? — insisto.
— Peguei ele, amor. — Luís fala, parando ao meu lado com Jonathan em seus braços. O homem olha de mim para o meu marido e depois para o meu filho.
—É... me desculpe! —O homem diz, fazendo menção de sair, mas o seguro pelo braço.
— Espere, venha, eu pago uma água para o senhor. Está pálido! — Volto a nsistir, o levando para uma das mesas da praça de alimentação.
— Não precisa. —Ele resiste, se afastando. —Eu estou bem. — Respiro fundo e passando as mãos no meu jeans, volto a insistir. Eu não sei, só... Não quero que ele se vá.
—Tudo bem, me deixe pelo menos pagar um suco. — O convido. — A final eu quase o mato atropelado. — Faço graça e ele finalmente sorri. O sorriso dele também me é muito familiar. Penso.
—Tudo bem, se você insiste! — Concorda finalmente. Sorrio e ele imediatamente fica sério.
—Eu insisto. — falo desviando os meus olhos dos seus e Luís apenas assiste a nossa conversa sem nexo. Seu celular toca e ele põe o Jonathan no chão para atendê-lo. Ele se afasta a uma distância considerável e nós seguimos para uma mesa.
—Como se chama? — Ele pergunta.
— Sou Ana Júlia — respondo. Seu olhar por algum motivo ganha uma perplexidade que não sei mensurar. Ele parece engolir em seco.
— Me chamoEdgar... Edgar Fassani _ fala e eu paraliso no mesmo instante. Simplesmente nada em mim funciona. Estou em pleno estado de torpor.
— Você é... — Nem consigo concluir a minha frase.
— Eu sou o seu pai, Ana. — Meu coração para uma batida.
— Como sabe que..? — Tento perguntar e ele me dá um meio sorriso.
— Você é a cara da sua mãe. Seu sorriso, seu cabelo, a pele morena.. Meu Deus! Sua boca. Como podem se parecer tanto? — sussurra cada palavra com um tom baixo demais. Não contenho as lágrimas.
— Mamãe, por que está chorando? —Jonathan pergunta, saindo da sua cadeira para me abraçar. Eu abraço o meu filho e beijo o topo da sua cabeça.
— Era o detetive, Max, ele não conseguiu... — Luís para de falar quando ver as lágrimas que molham o meu rosto. — O que está acontecendo aqui? Ana porque está chorando? _ Ele inquire áspero, porém eu não consigo responder, apenas choro. Um choro silencioso e os meus olhos estão o tempo todo fixos no homem sério me olhando do outro lado da mesa. Desperto do meu estado de letargia, quando vejo o meu marido partir para cima do homem sentado a minha frente. Ele segura o Edgar com firmeza pelo colarinho bem arrumado e o põe de pé com um puxão violento.
— Luís? Luís, solta ele! Para, Luís! — peço aos gritos e consigo me encaixar entre os dois gigantes. Tanto o Luís quando o Edgar são extremamente altos e fortes. Luís se afasta ofegante e me encara confuso.
— Mas o quê? — ergunta perdido.
—´Querido, esse é o Edgar Fassini. — Consigo dizer. Os olhos confusos do meu marido vão para o homem atrás de mim.
— Como assim? — questiona extasiado.
— Eu posso explicar, se me der uma chance. — Edgar pede. Tanto o Luís, quanto eu encaramos o homem de aspecto sério e de rosto rude. Edgar Fassini é um homem de 45 anos, como diz no dossiê. Mas é um homem muito bem conservado. Não aparenta a idade que tem. Ele tem um corpo forte e malhado. Mesmo usando uma camisa de mangas compridas e um terno preto por cima, é possível notar isso. Ele tem parte dos seus cabelos grisalhos e uma barba cerrada muito bem feita. Seus olhos verdes são calmos e serenos, um contraste absurdo com o rosto quadrado que exibe uma carranca séria.
— Claro, podemos ocupar uma mesa e, — Tento sugerir, mas ele me interrompe.
— Não, Ana, eu prefiro um encontro mais formal. Sem todo esse túmulo de pessoas. Esse barulho do ambiente. Estou em um hotel em Copacabana. Será que podemos almoçar juntos amanhã — sugere.
— Não, eu prefiro que seja em minha casa — peço. — Se não houver problema pra você. — Ele sorri, parece satisfeito com o meu pedido.
—Com certeza, não há problema nem um. Posso levar um vinho? — indaga sugestivo. Sorrio.
— Claro, amanhã então? — pergunto, me pondo de pé. — Temos que ir, as crianças devem estar cansadas.
— São seus filhos? — inquire, olhando para os meus filhos, porém, eu tenho certeza que ele já tem essa resposta.
— Sim. — É tudo o que eu digo e ele assente e volta o seu olhar pra mim. Não consigo decifrar o seu olhar. Pelo jeito, Edgar não é um homem de demostrar suas emoções.
— Eles são lindos, Ana! — Abro um meio sorriso.
— Obrigada! Então, até amanhã!
— Com certeza. — Relutante sigo caminhando para fora do shopping, abraçada ao meu marido segurando a mão da minha filha. Luís segura a mão do Caio e esse segura a mão do Jonathan.
O confronto Horas antes do encontro com a Ana. Passei a noite em um bar e entre um copo e outro, eu via a imagem da Rose projetada na minha frente. Ela era tão pequena, tão meiga. Resolvo que não é hora de sentir pena de mim e sim, é hora de correr atrás do tempo perdido. Faço sinal para o garçom e deixo uma nota de cem largada sobre a mesa. Saio do bar me sentindo meio tonto, mas bem capaz de voltar para casa. Subo na moto e acelero ganhando o asfalto quase sem movimento. Minutos depois, deixo a moto na garagem e vou para dentro do meu antigo quarto, onde passei a minha infância, mas que agora já não me sinto em meu lugar. Essas paredes guardam muitas mentiras. Como eles puderam? Na sala, encontro o meu pai sentado em um dos sofás lendo o jornal."Esse confronto seria algo inevitável."Penso. Ele percebe a minha presença e deixa o jornal de lado. Os olhos claros e frios me encaram duramente e neles não um pingo de arrependimento.
— Doug, peça que arrume a minha mala — peço ao garoto quando o encontro do lado de fora da casa. — Vai viajar, senhor Fassini? — indaga com uma curiosidade quase infantil. — Acho que isso não lhe diz respeito! — O repreendo fazendo-o engolir o seu sorriso. — Viu o meu pai? — questiono ríspido. — No escritório, senhor. — O garoto me responde com seriedade e eu assinto entrando na casa. Entro no escritório calado, com as mãos no bolso e um olhar altivo. Encontro Enrico sentado em sua cadeira e a sua frente há um copo cheio de uísque. Uma dose tripla, pura e sem gelo. Seu olhar está perdido, desfocado. Ele parece abalado. Finalmente o vejo vulnerável, confirmando que ele é um ser humano e não uma máquina, como sempre se mostrou ser. — Veio aqui dar o tiro de misericórdia? — inquire bebendo uma quantidade generosa da sua bebida. Calado, eu acendo um cigarro e dou uma boa tragada, soltando uma fumaça espeça que se espalha pelo ambiente. — Está fumando agor
Espero impaciente que o elevador chegue logo ao térreo e quando as portas duplas finalmente se abrem, eu saio como um raio para o lado de fora do hotel. No carro, ensaio algumas palavras para dizer a minha filha. Porra! O que dizer para uma filha que você nunca conheceu? Que você se quer sabia da sua existência? De qualquer forma, o que tenho para lhe dizer será impactante, tanto para mim quanto para ela. O carro para no estacionamento do shopping e eu saio do veículo movido pela ansiedade, o medo e o nervosismo. São os sentimentos que me assolam agora. Sigo para a escada rolante que me levará ao segundo andar do imenso e movimentado prédio, na grande maioria crianças acompanhadas de suas famílias. Respiro fundo. A porra do tempo não anda. Parece que estou dando um passo para frente e dois para trás. Ponho os meus pés na segunda escada rolante com o coração galopando freneticamente. Porra, não posso enfartar sem conhecê-la. Pego o lenço no bolso lateral e enxugo o suor que começa a
Descobertas dolorosas. Me sinto como um animal enjaulado andando de um lado para o outro dentro desse apartamento. Já fiz tudo o que pude para ocupar o meu tempo e a minha mente enquanto aguardo o horário combinado para esse encontro. Mas confesso que estou acordado desde as cinco da manhã. Fiz uma corrida matinal, malhei quase duas horas na academia do hotel, tomei um banho demorado e mergulhei no trabalho, mas parece que a porra do relógio não está colaborando comigo. A noite já não foi tranquila como eu esperava que seria. Simplesmente tive que secar uma garrafa de uísque para poder apagar literalmente e aqui estou eu, andando no meio do amplo quarto de hotel, com uma garrafa de sauvignon em uma mão e um buquê de rosas vermelhas na outra. As suas preferidas.Penso movido pelo amor adolescente que um dia senti por ela. Volto a olhar o meu relógio de pulso e bufo irritado quando vejo que ainda são dez da manhã. Começo a repassar na minha mente as perg
— Ela faleceu a oito anos, um câncer no colo do útero a matou. Não foi fácil tudo o que passamos. — Eu imagino —falo, soltando uma respiração audível — confesso que tinha esperança de vê-la. Nós passamos por tanta coisa juntos ou melhor dizendo, separados. Eu não entendo porque nunca me procurou. Todos esses anos eu nunca soube de você. — Eu só descobri a sua existência no dia de sua morte. Depois eu passei por tantas coisas que... — Ana sorri sem vontade. Linda! Minha filha é linda! Queria ter assistido a sua infância, ter escutado as suas primeiras palavras. Deus, eu perdi tudo. Não me restou nada! — A pouco tempo pensei nela de uma forma mais intensa e me lembrei das suas palavras no leito de morte. Não deu tempo ela me falar muita coisa então... — Minha bebê seca as lágrimas que escapam dos seus olhos. —Contei para o meu marido o que ela me disse. Luís resolveu investigar por conta própria e meu Deus..! —Ela sussurra as últimas palavras. —Quando eu descobri o seu
Quando tudo começou. Acordo me sentindo especialmente mais leve esta manhã. Lá fora os pássaros cantam sobre as copas das árvores frutíferas, que se balançam ao vento ao pé da janela do meu quarto. O sol brilha radiante e seus raios chegam a invadir o cômodo através das paredes de vidro livres das cortinas blecaute. Me mexo na cama espaçosa e sinto o volume da caixa que ficou esquecida em cima do colchão e percebo que adormeci agarrado ao álbum que ganhei de presente da minha filha e agora ele está caído ao meu lado, largado de todo jeito. Com uma respiração profunda me sento no colchão macio, sentindo uma expectativa diferente cair sobre mim. Pela primeira vez em anos não sinto o rancor, a amargura e nem toda aquela raiva que comandava a minha vida fria e solitária. Eu estou particularmente feliz e isso me faz sorrir. É uma felicidade diferente. Eu tenho um novo motivo para sorrir e pensando assim, saio da cama exultante e tomo um banho demorado. No espaçoso closet
Na sequência da brincadeira tomo três shotes, o que me deixa um pouco zonzo e mais leve também. A bebida arde dentro de mim e, ao mesmo tempo me deixa animado. Às onze não sou de ninguém ou devo dizer, sou de todas. Rio. Estou no meio da agitação da música eletrônica e com cinco meninas que estão totalmente na minha. Pena que não posso levá-las para casa, meu coroa me mataria se soubesse. Meus olhos param em cima da menina simples, sentada em um dos banquinhos do bar, olhando com curiosidade tudo o que acontece ao seu redor. Ela está maravilhada, apenas observando o movimento, quando um cara se aproxima. Ai eu paro tudo. A dança, o chamego e minha atenção esta toda em cima nela. Saio da pista de dança deixando as meninas para trás e caminho para perto do casal desproporcional. "A pirralha e o cara maduro." Não mesmo! Onde está Morgana nessas horas? Me perguntei aborrecido. — Eu já disse que não! — A escuto dizer quando me aproximo do balcão. — Q
Cheguei em casa um pouco mais da meia noite e como sempre, subi pela árvore, caminhei pelo telhado e cheguei a minha janela. Me desfiz das roupas e tomei uma ducha rápida. Por fim, vesti um short folgado e espalhei alguns livros e folhas pela cama. Uma maneira de enganar os meus pais e de fazê-los pensar que eu passei a noite com a cara nos livros. Me deitei no meio dos materiais e encarei para o teto do quarto. Me peguei pensando em uma certa morena, pequena e de olhos graciosos. A dança, o toque, nossos lábios se tocando. Porra! A maciez, o calor, o beijo. Ouço ao longe as vozes femininas sussurrando pelo corredor da casa e fecho os olhos, fingindo dormir. — Vocês deviam pegar mais leve com o menino. Os rapazes da idade dele gostam de sair e de se divertir. — Mariaju diz entrando no quarto. — Você sabe como é o pai dele Mariajú. Irredutível quando o assunto é a educação do filho. —Minha mãe retruca. Abro uma brechinha de olho e as vejo retirar