Capítulo

Mariana

Quando entrei em casa, o cheiro familiar de café me envolveu, e pude ouvir a risada suave de Karina vindo da sala. Ela estava lá, como sempre, me esperando com a paciência de uma amiga que se importa, cuidando da minha pequena, Isabela, enquanto eu estava no médico. Isabela estava com ela no sofá, brincando com um ursinho de pelúcia, feliz e tranquila, sem perceber a tempestade que estava se formando na minha vida.

Karina levantou-se e me cumprimentou com um sorriso acolhedor, mas logo percebeu que meu humor estava longe de ser bom. Não precisei dizer nada. Ela sabia.

— Como foi? — ela perguntou, a preocupação evidente na voz.

Eu respirei fundo antes de responder, sentando-me no sofá ao lado dela. O olhar de Karina era como uma âncora, me mantendo ali, me fazendo sentir que não estava sozinha. Mas, no fundo, eu me sentia. Eu estava sozinha nessa batalha, sem saber como ia enfrentar o tratamento, como conseguiria cuidar de Isabela e lidar com essa doença ao mesmo tempo.

— O diagnóstico não é bom, Karina — respondi, tentando manter a voz firme, mas a angústia era inegável. — Eles acham que é terminal.

Ela ficou em silêncio, olhando para mim, como se estivesse tentando absorver o peso das minhas palavras.

— Meu Deus, Mari... — ela sussurrou, colocando a mão sobre a minha. — E agora, o que vai fazer?

Eu olhei para Isabela, que estava ali, com os olhos brilhando, sem entender nada sobre o que estava acontecendo. Ela era apenas uma criança, uma bebezinha com poucos meses de vida, e o meu mundo estava prestes a desmoronar.

— Eu não sei, Karina. Eu não sei como vou pagar o tratamento. — Minha voz falhou, e uma lágrima escorreu pelo meu rosto. — O governo oferece ajuda, mas é tudo tão demorado. E as parcelas do tratamento, mesmo parcelando, não batem com a minha renda. Eu não sei o que fazer.

Karina apertou minha mão, mas sabia que ela também não tinha todas as respostas. Nós duas sabíamos como a vida era difícil, e eu não queria pedir mais do que ela já fazia por mim. Ela sempre esteve ao meu lado, cuidando de Isabela quando eu precisava, me ajudando a lidar com tudo, mas eu não queria sobrecarregá-la.

— Mari, você sabe que pode contar comigo para o que precisar. — Karina olhou para mim com sinceridade. — Eu sei que o dinheiro não é muito, mas se precisar de alguma coisa, eu vou fazer de tudo para ajudar.

Mas eu sabia que ela não tinha muito também. Ela trabalhava como auxiliar administrativa, e, assim como eu, o dinheiro mal dava para cobrir as contas do mês. Eu não queria ser um peso para ela.

Fechei os olhos por um momento, tentando controlar a pressão no peito. O que me assustava não era apenas o tratamento, mas a ideia de que eu poderia deixar Isabela sozinha no mundo. Quando o pai dela me abandonou, eu me tornei a única pessoa em quem ela podia confiar. E agora, com o câncer, tudo estava ainda mais difícil.

— Eu só quero dar o melhor para ela, Karina. — A voz saiu baixa, quase um sussurro. — Ela merece uma vida boa, sem tudo isso. Não sei como vou pagar o tratamento até o fim. Nem sei se vou conseguir. Eu... eu não quero que ela passe por isso.

Eu não sabia o que mais dizer. Era tudo tão desesperador, tão incerto. Mas Karina não deixou de me apoiar. Ela foi até a cozinha e trouxe uma xícara de chá para mim, algo simples, mas reconfortante. Isabela estava brincando no chão, agora com um brinquedo de plástico, totalmente alheia à dor que sua mãe estava carregando.

Fiquei ali por alguns minutos, em silêncio, observando Karina interagir com Isabela, tão cuidadosa, como uma segunda mãe para minha filha. E então, o peso da minha situação voltou com força. Eu não sabia como ia fazer para cobrir o tratamento. Eu estava sozinha nessa luta. O pai de Isabela, aquele cafajeste, nunca esteve presente para ajudar. Quando descobri que estava grávida, ele me abandonou, dizendo que era casado e não podia se envolver. Na época, eu era tão jovem, só uma menina trabalhando em telemarketing, sonhando com uma vida melhor, iludida pelas promessas dele. Ele foi tudo o que eu quis ouvir, até o momento em que a verdade me esmagou.

Eu tinha 19 anos, e ele era charmoso, parecia ter o mundo aos seus pés. E eu, iludida, acreditava que podia mudar minha vida ao lado dele. Mas tudo caiu por terra quando contei que estava grávida. Ele me disse que não podia ficar comigo porque já era casado. O mundo que eu tinha construído se despedaçou naquela hora. Eu fui embora, grávida e sem rumo, me mudando para a cidade, decidida a fazer o melhor para mim e para a nossa filha, eu estava perdida porque já estávamos juntos há alguns anos, quando eu engravidei.

Hoje, com Isabela em meus braços, eu via tudo de maneira diferente. Eu me tornei a mulher que eu precisava ser, forte o suficiente para enfrentar qualquer coisa. Mas esse câncer era algo que eu não sabia como combater sozinha.

Olhei para Karina, que estava ali, me apoiando. Ela sabia que eu tinha que lutar sozinha, mas que isso não significava que eu não tivesse ajuda. Ela estava ali, e isso me dava um pouco de alívio. Mas o que fazer agora?

— Obrigada, Karina — falei, com a voz embargada. — Eu vou dar um jeito. Eu preciso de tempo. Eu preciso cuidar de você, Isabela, e a mamãe vai dar um jeito, eu prometo.

Ela me abraçou, apertando-me contra ela, e, por um instante, senti que poderia respirar novamente. Mas a batalha estava apenas começando. Eu só precisava de tempo, tempo para encontrar uma solução e tempo para dar o melhor para a minha filha.

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