Hoje é trinta de Janeiro de dois mil e treze, mal podia imaginar em tudo o que me aconteceu, meu coração está esfacelado, partido em pedaços, mesmo assim me obrigo a continuar firme.
O sol está se pondo e me sinto exausta, mas ainda tenho trabalho a fazer. Chego na casa do último paciente do dia, o preparo e explico pacientemente o que pretendo fazer porque preciso que ele compreenda e que confie em mim, minutos depois o coloco em pé.
— Isso mesmo! Venha, o Senhor consegue. – digo ao tentar disfarçar as lágrimas de alegria ao ver meu paciente dar seus primeiros passos, após um derrame que o deixou preso ao leito por oito meses.
O rádio está ligado, ouço uma música Corazón Partío do cantor Alejandro Sanz é uma canção eu adoro, mas que me leva direto ao passado e me faz lembrar de maus momentos.
Em dezembro de dois mil e doze, conheci um rapaz dois anos mais novo do que eu, fiquei perdidamente apaixonada por ele, seu nome era Victor Gustavo (sempre o chamava de Guh), era bem alto, branco, olhos e cabelos castanhos escuros, cabelos lisos, corpo na medida certa e um charme irresistível.
Foi uma paixão poderosa e arrebatadora, Guh me levou aos extremos da paixão, do prazer, lascívia, desejo, alegria, ciúmes, lágrimas... Até a mágoa e talvez o ódio. Intenso era a palavra que melhor nos definia em todos os momentos e em nossas ações, em um beijo, na cama ou em uma briga, mas nunca éramos mornos ou frios.
Essa paixão me cegou de tal maneira que eu não sentia falta dos meus amigos ou dos meus hobbies e influenciou até mesmo na minha rotina de trabalho, eu não via que isso não era saudável, achava que eu estava me estabelecendo.
Então era natural fazer uma escolha, a minha maior concessão, abandonei a dança porque Guh jamais aceitou me ver dançando com outro homem, ainda mais da forma como dançávamos, tive que tomar essa dolorida decisão pelo bem do nosso amor.
Sofríamos não só com a distância que nos separava, já que ele morava no Rio de Janeiro e eu em São Paulo e raramente nos encontrávamos, mas também com a opressora diferença de classe social (a família dele era rica e a minha pobre), além todas as suas incontáveis atitudes infantis e mentiras.
Demorou muito tempo até que a cegueira dessa paixão passasse, em nossa derradeira discussão, Guh me disse que sua mãe não aprovava nosso relacionamento e ele não podia lutar contra isso porque era fraco demais, foi a partir desse momento que percebi o quanto fui enganada e o tamanho da minha mágoa. Eu o amei tanto que fui capaz de aceitar cada um de seus defeitos e deslizes, mas cheguei à conclusão de que precisava por um fim a esse que julguei ser o maior amor da minha vida. Tinha que dar um basta neste relacionamento, já que o Guh jamais o faria, mesmo assim chorei amargamente.
Na tentativa de esquecer o meu amor pelo Guh, engatei uma “amizade” com outro rapaz mais novo do que eu, que se apresentou como Filipe. Dias depois, ele revelou que era de família indiana e que seu nome real era Gopal. Era baixinho, moreno, nariz grande, bem acima do peso, olhos e cabelos e castanhos escuros, realmente não era um homem atraente, mas parecia ser um rapaz sério e de boas intenções.
Decidi ser mais cautelosa e observar as atitudes dele, fiz questão de investiga-lo, logo descobri que não só ele mentia para mim, como tentava conquistar outras brasileiras com o mesmo tipo de conversa e ao mesmo tempo, usando de sua pose de bom moço e boa lábia. Pelo menos desta vez eu estava previnida, mesmo assim sofri por conta de tantas mentiras desnecessárias.
Naqueles momentos solitários em meu quarto, eu refleti sobre a grande decepção amorosa, meu coração parecia arder de tanta dor, o choro era inevitável, mas ponderei sobre o que devia fazer naquele momento, não poderia ficar estagnada, precisava reagir. Que rumo tomaria então?
Levantei, enxuguei as lágrimas e caminhei até o espelho, observei meu reflexo e constatei que ali ainda estava uma mulher forte o bastante para seguir seu caminho, sozinha ou acompanhada. Foi nesse momento que tomei a decisão que mudou o rumo da minha vida definitivamente.
Decidi esquecer as desilusões do passado e reescrever a minha história...
— Não se preocupe, estou aqui para te segurar, descanse um pouco, por favor. – o paciente desequilibra e isso me serve para me tirar de dessa distração das lembranças do passado e me manter atenta a ele.
Checo seus sinais vitais e se está com alguma dor, faço uma breve massagem terapêutica.
— Pronto Senhor Antonio, já pode descansar. Até amanhã – me despeço do paciente e vou para casa.
Fevereiro de dois mil e treze.
Esta noite as músicas não acalmam o meu coração e não há livro ou sono capaz de silenciar a minha mente, a todo tempo só consigo pensar que minha decisão depende do próximo passo e eu sei exatamente qual é, mas eu não posso dá-lo a essa hora da madrugada.
Acordo mais cedo para entregar os relatórios de implantação de dois pacientes novos, por coincidência ambos são casos neurológicos graves, um caso de doença auto imune e outro caso de uma síndrome mais rara, ambos exigem abordagem e recursos especiais.
Relato os achados clínicos em detalhes e envio, meu senso de dever me faz procurar artigos científicos, cursos, palestras para manter-me atualizada sobre os aspectos da doença, tratamentos e protocolos da fisioterapia.
Costumo me atualizar frequentemente, mas não gosto de ter que viajar para isso. Vejo um congresso que me chama atenção pelos cursos e palestras oferecidas na primeira semana, é justamente o que preciso! Será no Rio de Janeiro e começará no dia do meu aniversário, estou tentada a ir, mas não quero viajar sozinha, é aí que tenho uma idéia um tanto louca.
Decido convidar minhas três grandes amigas para me acompanhar, elas podem passear enquanto estou no congresso, poderemos sair todas as noites e até teremos oportunidade de comemorar nossos aniversários, afinal faço aniversário no dia quinze de abril e a Carol no dia dezenove de abril.
Ligo para as meninas, sei que estou tomando essa decisão muito em cima da hora, mas só vou me inscrever no congresso se elas aceitarem ir comigo.
Carol e Mayara ainda trabalham na empresa de telemarketing, ambas aceitam meu convite de imediato, reclamam que só terão dois meses para guardar dinheiro para a viagem, sorte que elas já tem um pouco guardado.
Samara demonstra que está muito animada com o convite, até faz questão de dizer o que pensa em fazer durante essa viagem. Pergunto se terá o dinheiro para a viagem, ela afirma que sim, diz que vai conseguir o dinheiro com a avó ou com o pai. Tento entender como ela pode ter tanta certeza e pergunto qual será sua estratégia, a resposta me deixa chocada.
“Ah Weenny, vou fazer uma chantagem emocional, você sabe que sou ótima para fazer um drama. Vou falar que não aguento mais ficar com aquela velha, ela só reclama o dia todo e me faz de empregada. Invento uma desculpa qualquer, digo que vou fazer um curso, sei lá... Mas fique tranquila, minha avó ou meu pai vão dar o dinheiro para eu ir, conte comigo! Vamos nos divertir bastante, espero que tenham muitos homens gostosos por lá” - ela ri debochadamente.
Não concordo com o modo como ela pretende conduzir as coisas, mas não posso interferir em suas decisões, Samara sabe como penso.
Já tenho um bom dinheiro reservado e pretendo poupar uma quantia suficiente para pagar nossas comemorações de aniversário, felizmente ganho razoavelmente bem. Então confiante, volto ao computador e faço a minha inscrição no congresso.
Ainda tenho uma ligação importante para fazer, não há mais ninguém que me impeça de retomar o meu sonho e meu maior prazer, mesmo temendo que ele não aceite meu pedido e minhas justificativas, eu ligo.
É a hora de enfrentar tudo de cabeça erguida, o erro foi meu, não deveria ter feito a vontade do Guh.
Ele atende ao segundo toque, como de costume.
— Alô, Weenny? – sua voz não demonstra muito ânimo.
— Sim, sou eu. Você quer conversar comigo? – pergunto envergonhada.
— Por que eu não iria querer?
— Eu liguei porque eu preciso te pedir perdão pelo modo que agi, pela decisão intempestiva que tomei, por abandonar... – ele me interrompe.
Conversamos por algum tempo, nos encontraremos quando ele retornar à São Paulo.
Depois daquele dia com minha mãe as coisas ficaram mais fáceis, minha mãe estava me ajudando muito. Decidi sair do emprego que eu estava e consegui o emprego dos meus sonhos na empresa dos meus sonhos, estava indo tudo bem, já estava até fazendo faculdade de engenharia civil, Flavio realmente era um assunto que tinha decidido deixar no passado.Fui para casa um pouco mais aliviada, mas como diz o ditado “felicidade de pobre dura pouco”. Flavio entra em contato comigo novamente, no primeiro momento levei um baque, já estava paquerando outro rapaz que trabalhava comigo.Flavio insistiu muito para me ver, dizia que precisava resolver um assunto e precisava da minha ajuda. Ele me pegou no ponto fraco, não conseguia negar ajuda a ninguém, ainda que fosse meu maior inimigo me pedindo ajuda, nunca iria recusar. Continuou insistindo por dois dias, então resolvi me encontrar com ele
Me dedico inteiramente à fisioterapia nesses dois meses, trabalhando cerca de treze horas por dia, inclusive fins de semana e feriados, preenchendo intermináveis relatórios e prontuários à noite, dormindo pouco.Admito que nas poucas horas vagas me exercito para que meu corpo não sinta tanta falta da dança quanto a minha alma sente.Certo dia aproveito a ausência de uma dos meus pacientes e ligo para Carol e Mayara, imagino que estejam na pausa do almoço.As duas se alegram ao ouvir a minha voz e logo tratam de contar a novidade, estão terminando de cumprir o aviso prévio, o que me faz lamentar por saber que estão desempregadas.— Não lamente! Essa é uma chance de encontrarmos algo melhor, acredite nisso. Essa viagem surgiu como uma grande oportunidade em nossas vidas, primeiro vamos descansar, depois Deus é quem sabe. – Carol diz, Mayara co
Finalmente chegou o mês de abril e com ele a nossa viagem, e a despedida da empresa também. Nessas horas que vemos que a vida não acontece exatamente como planejamos.No começo do mês de março recebemos a notícia que iriam reduzir o pessoal da equipe, e meu nome entrou na lista dos dispensados. Então duas semanas antes da viagem será o último dia na empresa. Foi bom enquanto durou, amizades foram feitas, lições aprendidas, mas agora é hora de seguir em frente e relaxar um pouco nessa viagem que está a caminho.Está chegando o dia da nossa viagem, minha mãe me chama pra conversar.― Filha estou preocupada com você.― Por que mãe?― Estou sentindo você muito abatida, você não sorri mais como antes, não tem mais ânimo pra nada, não vejo mais você falando com as suas amigas. Só de
Que correria hoje, chego em casa as dezoito hora tenho que viajar as cinco para as dez para o Rio. Passo um torpedo pro pessoal pra ver quem já está pronto, local de encontro e outros detalhes. Tomo um banho coloco uma blusa leve porque São Paulo é terra da garoa. O celular toca é o Eduardo. — Fala Edu. — Oi cara no Rio está frio igual aqui? Levo uma blusa? — Boa pergunta, não faço idéia, vou levar camisetas e bermuda além da blusa vai que de praia. — Você tem noticia das meninas? elas já estão prontas? Não pode atrasar! —¨I meu¨ , não faço idéia , elas nunca atrasam é o preço da beleza. Risos. Desligo o telefone, vou até a cozinha tomar um café. Sento por alguns segundos e penso olha aonde a dança esta me levando, uma profissão tão descriminada em nosso país, onde homem não pode dançar. Lembro de ver musicais antigos com meu pai e hoje vou sair pra uma especialização de dança, ritmo de paises am
Chegamos a uma boate, um lugar requintado, com uma moderna pista de dança, jardim ao ar livre, pessoas bonitas, comida cheirosa. Faço questão de elogiar o bom gosto das meninas.Samara sugere que procuremos uma mesa para nós antes que não haja mais nenhuma disponível, aceitamos sua sugestão e observamos atentamente o ambiente, cada uma olhando em uma direção, me surpreendo ao me deparar com Victor Gustavo, minha grande paixão do passado, ele está sentado ao lado de sua irmã Marília, Gopal e outra moça que desconheço.Tento disfarçar desviando o olhar, mas é tarde demais, Victor levanta e vem em minha direção, enquanto sinaliza gentilmente para eu me aproximar dele, por educação ou por mórbida curiosidade eu vou, faço questão de levar as meninas comigo.― Boa noite. Weenny, você está t
— Estamos todas prontas vamos?- May pergunta já bem ansiosa.— Vamos sim. Quem vai chamar o carro?— Deixa que eu chamo. – falo já saindo do quarto.Chego à recepção e pergunto por Rodrigo.— Só um instante senhora, ele já está vindo.— Obrigada.Assim que agradeço aguardo mais alguns segundos e ele aparece na recepção, como estou de costas para ele, o mesmo não me reconhece.— Em que posso ajudar senhora?- ele pergunta.Me viro devagar e consigo pegar o momento exato que ele abre a boca e me olha com admiração de cima baixa, como alguns costuma dizer por ai “dando uma conferida no material”, que particularmente acho que extremo mal gosto.— Carol, como você está linda, mais do que já é.— Obrigada Rodrigo. - digo me aproximan
Depois de um domingo bom, na parte da manhã as avaliações, sol e praia a tarde, descansar é o que resta.Acordo às oito horas da manhã na segunda, desço para tomar café, os outros ainda descansavam.Quando estou na metade da xícara de café, desce a Michele.— Bom dia Claudio - diz ela.— Bom dia Michele - respondo e a convido para sentar.Não obrigado pensei que teria mais de nós por aqui.— Não estou só, respondo.— Eu estava falando com as meninas pra gente sair a noite.— Para onde, não conhecemos nada.— No folder que seu Gilberto deu, tem uma boate, e ele falou que é a melhor do Rio de Janeiro.— Aí sim, até que fim uma coisa diferente, boate, música, bebidas e meninas, eu topo.— Beleza vou subir e falar c
No enlevo que estou, esqueço dos que estão ao meu redor, segundos depois desperto.― Quero que conheça algumas pessoas. Estas são as amigas que vieram comigo, Samara, Carol e Mayara. Esses são os amigos que eu não via há algum tempo e que moram aqui mesmo, Victor e sua irmã Marília, Melissa e Filipe. – digo enquanto nos afastamos.― Esse é o Eros Myron. – olho para meus amigos e faço a devida apresentação.Eros cumprimenta gentilmente as mulheres com um beijo na mão e os homens com um firme aperto de mão. Conheço Gustavo e Gopal o suficiente para saber o ódio que estão sentindo, noto que Marília está segurando os impulsos raivosos do irmão.― Senhor, tudo está preparado conforme solicitou, é aquela mesa. – diz a garçonete para Eros, enquanto aponta para uma enorme mesa a d