VITTORIO
— Por que a trouxeram? — perguntei, a voz gelada e implacável, interrompendo qualquer provocação que Mia pudesse estar prestes a soltar. Nos seus olhos perturbadores, um brilho de raiva faiscou, refletindo a tensão que pairava no ar.
— Vim para convencê-lo a esquecer a dívida do meu pai. Ele é...
— Deixei bem claro que era para trazerem apenas o Charles — interrompi, sem a mínima paciência. Vi suas mãos se fecharem em punhos, o rosto tenso, transbordando frustração.
Benício coçou a testa, visivelmente desconfortável.
— Compreendo, Vittorio, mas ela foi insistente.
Neguei com a cabeça, impaciente.
— Matasse ambos e o problema estaria resolvido. Vocês sabem que tenho assuntos mais importantes para tratar do que perder tempo com um viciado e sua filhinha.
Aquilo foi a gota d'água para Mia.
— Olha só, seu canalha! — ela disparou. Me virei lentamente para encará-la. Seu rosto, antes aparentemente calmo, agora estava vermelho de pura irritação. — Você tem assuntos mais importantes para resolver, certo? Que coincidência, eu também!
Cruzei os braços, deixando que o silêncio se estendesse por um segundo, absorvendo sua ousadia.
— Uma pobretona como você não me parece o tipo de pessoa que tem o dia ocupado — provoquei, um sorriso de escárnio nos lábios.
Mia deu uma risada seca, balançando a cabeça como se estivesse lidando com alguém estúpido.
— Vocês ricos é que não têm nada para fazer. Trabalho meio período e ainda estudo. Não sou uma riquinha mimada e arrogante como você.
— Mia — pronunciei seu nome com desdém, ignorando sua tentativa de me ofender. — Isso nem é nome de verdade. É nome de gato.
Ela revirou os olhos, impaciente.
— Ora, por favor, não seja infantil.
Antes que Mia pudesse responder, agarrei seu braço com força, o suficiente para fazê-la arregalar os olhos de dor. Um sorriso cruel se formou nos meus lábios.
— Garota, quando você nasceu, eu já havia dizimado mais homens do que você poderia contar — declarei friamente, deixando o tom pesado pairar no ar. — E agora você vem aqui com essa atitude ridícula. O que propõe? Que eu esqueça a dívida do seu pai?
Ela gaguejou, a firmeza que tentava exibir se esvaindo como areia entre os dedos.
— Eu…
Aproximei-me ainda mais de Mia, segurando seu queixo com firmeza. Ela tentou se soltar, mas não tinha chance contra a minha força; a garota era pequena e frágil demais para alguém como eu.
— Tenho sido mais paciente do que deveria, e normalmente, não sou assim — comecei, minha voz baixa e ameaçadora. — Tolerar por dois meses as promessas vazias de seu pai já foi um grande favor.
Pausei por um instante, apenas para ver a teimosia brilhar em seus olhos. Continuei:
— Então, considere-se sortuda por eu ainda não ter enfiado uma bala na cabeça do verme que te colocou no mundo.
O rosto de Mia empalideceu, e vi o brilho de lágrimas começando a se formar em seus olhos azuis. Por um instante, pensei que ela fosse desabar ali mesmo. Mas, para minha surpresa, ela engoliu em seco e endireitou os ombros com uma determinação que não combinava com sua aparência delicada. Afastei-me, apoiando-me no tampo da mesa de mogno, ignorando o prazer perverso que senti ao perceber o desconforto que havia causado.
— E então… quanto meu pai te deve? — Mia perguntou, abrindo sua bolsa com as mãos trêmulas.
Lancei um olhar para Charles, cuja expressão estava carregada de tristeza. Aquele homem me enojava.
— Filha, você não precisa pagar — ele finalmente falou, a voz fraca. — Vou dar um jeito.
Mia soltou um suspiro cansado, olhando para mim com uma mistura de resignação e raiva.
— Vamos ser práticos, pai. Preciso pagar, ou nós não sairemos vivos daqui — disse ela, com a voz rouca e os olhos cravados nos meus, repletos de ódio. — Quanto meu pai deve?
Peguei a pasta de Charles e consultei o valor.
— Dez mil dólares — respondi, direto ao ponto.
Os olhos de Mia se arregalaram, chocados com a quantia.
— Como alguém consegue gastar tanto assim? — murmurou para si mesma, quase incrédula.
— Mia… — Charles sussurrou, mas logo se calou.
— Papai, por que fez isso? — Ela perguntou, decepcionada. Contudo, o verme do seu pai não respondeu. Apenas olhou para os próprios pés, afundado em vergonha. — Esse dinheiro poderia ter sido investido no meu futuro, na minha faculdade.
— Presumo que você não tenha essa quantia — falei, pegando a carteira da sua mão e vendo que a tolinha tinha apenas cinquenta dólares.
— Ei, me devolve isso! — Mia exigiu, estendendo a mão e pegando a sua carteira de mim.
— Você definitivamente não tem todo o dinheiro — respondi, fechando a pasta lentamente, sem tirar os olhos de Mia, que balançou a cabeça em negação.
— Você me daria um tempo para conseguir o dinheiro?
— Não — respondi sem hesitar, a voz firme como pedra. — E se vocês não podem pagar a dívida com dinheiro, então pagarão com a vida.
A frieza das minhas palavras a atingiu em cheio. Vi quando seu corpo desabou na cadeira, os olhos arregalados, incapazes de processar a gravidade da situação. O silêncio que se seguiu foi tão denso que poderia ser cortado com uma faca.
Um sorriso cruel se formou em meu rosto. Era exatamente isso que eu gostava de ver: desespero e medo. Uma lembrança clara de quem estava no controle.
VITTORIODe repente, o medo que preenchia o olhar de Mia desapareceu. Ela mordeu o canto do polegar, pensativa, e um brilho de astúcia surgiu em seus olhos.— Você não vai querer sujar suas mãos nos matando — ela disse, fazendo-me erguer as sobrancelhas.— Ah, não? — provoquei, curioso.— Claro que não. Devemos parecer como ratos para você, tenho certeza de que não vai querer se sujar com o nosso sangue — respondeu, com uma sagacidade inesperada.Um sorriso de desdém se formou nos meus lábios.— De fato, vocês são piores do que ratos. São vermes. Mas não se preocupe, querida, não serão minhas mãos que se mancharão. Meus homens cuidarão disso — falei, acenando para Benício, Giuseppe e outros dos meus soldados.Mia levantou-se, olhando para os homens que se aproximavam, prontos para arrastá-los para fora do meu escritório, como se fossem uma praga.— Você é um homem muito rico. Dez mil dólares devem ser como troco de bala para você — disse ela, com a voz trêmula de nervosismo. — Não pod
MIADe todas as coisas que idealizei para a minha vida, ser jogada em um clube para me prostituir estava em último lugar na lista. Ouso dizer que sequer estava na lista. Limpar cocô de pombo estaria acima disso.— O que vai acontecer comigo? — perguntei a Vittorio, o demônio que apareceu na minha vida e a destruiu por completo. — Vou morar nesse cassino?Vittorio negou com a cabeça, enquanto assinava alguns papéis de uma pasta azul.— De forma alguma — ele disse. — Você não teria serventia em um cassino, mas com uma saia de couro e um top brilhante, conseguiria muito dinheiro.Estremeci só de me imaginar com aquelas roupas.— Como quiser — murmurei. Olhei para o homem cujo rosto eu havia arranhado e franzi a testa para ele. — Algum problema?Um sorriso sinistro surgiu em seu rosto.— Nenhum — ele respondeu.Vittorio guardou os papeis na pasta e a deixou em cima da mesa. Seus olhos passaram por mim e ele soltou um suspiro.— Bom, meu trabalho aqui terminou. Preciso me encontrar com Mau
MIATentei abrir os olhos, mas a luz forte me atingiu de imediato, me forçando a fechar as pálpebras novamente. Pisquei, tentando me ajustar à claridade. Cada piscada aumentava a dor na cabeça, mas eu precisava saber onde estava. Respirei fundo e, finalmente, consegui focar o olhar ao meu redor.O lugar era pequeno e sufocante, com paredes de um bege antigo, descascadas em alguns pontos, revelando manchas de mofo e umidade. O cheiro era horrível, uma mistura de perfume barato e suor que me fez querer vomitar. As cortinas de veludo vermelho, gastas e sujas, pendiam das janelas minúsculas, bloqueando qualquer chance de luz natural. A única iluminação vinha de uma lâmpada no teto, piscando como se estivesse prestes a apagar a qualquer momento. Isso só deixava tudo mais sombrio e assustador.Olhei ao redor e vi camas de metal espalhadas pela sala, os colchões eram finos e nojentos, como se nunca tivessem sido limpos. Roupas estavam jogadas por todo lado — lingeries e sapatos de salto alto
MIAAssim que me vesti com a nova persona, segui Becky pelo corredor, onde luzes fluorescentes vermelhas lançavam sombras ameaçadoras nas paredes. O lugar parecia vivo, pulsando com sons que me faziam querer fugir. De trás das portas, o que eu ouvia me embrulhava o estômago. Risadas, gemidos, gritos de desespero. O caos abafado daqueles quartos era sufocante. Não podia me permitir imaginar o que se passava lá dentro. O corredor, de repente, parecia apertado demais, e uma sensação de claustrofobia tomou conta de mim, me afogando em pavor.— Mantenha a calma — murmurou Becky, apertando minha mão.— Sem conversinhas — o segurança latiu, friamente.O som dos nossos saltos no piso metálico da escada em espiral ecoava como um relógio que contava o tempo até algo inevitável. Quando descemos, o ambiente mudou, tornando-se ainda mais opressor. O segurança nos guiou até uma porta pesada, de onde eu já podia ouvir a música pulsante e risadas que soavam distantes, abafadas. Pela fresta da porta,
MIAMeu pai estava morto, e Vittorio era o assassino. Tive certeza disso assim que nossos olhares se cruzaram.Engoli o choro com força, apertando a bandeja até meus dedos doerem. Com passos firmes e decididos, caminhei pelo salão. A cada sorriso falso que eu forçava, a cada impulso de me encolher e chorar, um pensamento me mantinha em pé: meu plano de fuga.Eu não ficaria ali. Não com meu pai morto.— Venha — a voz de Becky me puxou de volta à realidade, sua mão segurando meu braço com urgência. — Vittorio quer ver como você se sai na dança.Sem pensar duas vezes, peguei as últimas cinco tequilas da bandeja e engoli de uma só vez, como se fosse água. O líquido queimou minha garganta, mas levou junto a vergonha e a timidez que costumava sentir. O álcool se misturava ao ódio que corria nas minhas veias, inflamando a coragem que antes eu não tinha.Eu seria a ruína de Vittorio, o Diabo.A música reverberava por toda a boate, uma batida pesada que parecia pulsar dentro de mim. A luz verm
MIAElijah sorriu, sua expressão se iluminou com a possibilidade de uma dança particular. Ele se inclinou para mais perto, e eu me deixei levar pela adrenalina da situação, alimentando meu plano de fuga.— Onde podemos fazer isso? — perguntei, olhando para Vittorio, desafiando-o silenciosamente. Era uma forma de cortar as amarras que ele tentava me impor, um ato de rebeldia que alimentava meu desejo de vingança.Vittorio hesitou, avaliando a cena diante dele. Sabia que, ao me deixar ir, ele estava permitindo que eu me aproximasse do perigo, que eu fizesse minhas próprias escolhas. Em um lugar como aquele, a liberdade tinha um preço, e eu estava disposta a pagá-lo, mesmo que isso significasse flertar com o abismo.— No andar de cima — ele finalmente disse, a voz baixa, mas firme. — Não se esqueça de quem você é, Mia.Aquelas palavras ecoaram em minha mente, mas, em vez de me intimidar, me motivaram. Eu não era mais a mesma garota que ele conheceu. Compreendi que, naquele mundo, você ou
VITTORIOA ousadia de Mia me incomodava mais do que eu estava disposto a admitir. A garota assustada que havia chegado desapareceu. Agora, ela parecia ter encontrado uma confiança nova, uma audácia que cresceu depois do mal-entendido sobre a morte de Charles.Eu planejava contar a verdade para Mia, mas apenas no momento certo. Sabia que havia algo muito maior e mais perigoso por trás de suas ações. A forma como ela aceitou dançar para Elijah me parecia uma provocação calculada, e a sensação de que estava sendo manipulado corroía meu orgulho. Nem o gosto ardente do uísque que descia pela minha garganta era capaz de acalmar o desconforto que tomava conta de mim.Para piorar, Don Mauricio resolveu aparecer na minha boate. Ele tinha um talento único para surgir nos momentos mais inoportunos, sempre com aquele olhar de quem tinha visto tudo. Estava lá para garantir que eu não tomasse mais nenhuma decisão importante sem sua bênção. Sentado no meu escritório, eu sentia o peso do julgamento n
MIADepois que o impacto de ter matado alguém se dissipou, o desespero de ser pega se instalou como uma sombra opressiva. Eu sabia que precisava sair daquele lugar o mais rápido possível. Se Vittorio descobrisse o que eu fiz, com certeza seria morta, assim como meu pai fora.A primeira coisa que fiz foi pegar o dinheiro de Elijah e juntá-lo com toda a grana que haviam colocado no cós da minha saia. Embolei todo o dinheiro e enfiei dentro do meu top. Para meu alívio, a porta estava trancada; eles demorariam um tempo até conseguirem entrar no quarto.Eu precisava encontrar uma maneira de fugir sem que soubessem para onde eu tinha ido. E eu iria usar a única câmera naquele quarto a meu favor.Caminhei a passos largos até a janela, que, infelizmente, estava fechada, mas tinha um vid