6: Ruína em Neon

MIA

Assim que me vesti com a nova persona, segui Becky pelo corredor, onde luzes fluorescentes vermelhas lançavam sombras ameaçadoras nas paredes. O lugar parecia vivo, pulsando com sons que me faziam querer fugir. De trás das portas, o que eu ouvia me embrulhava o estômago. Risadas, gemidos, gritos de desespero. O caos abafado daqueles quartos era sufocante. Não podia me permitir imaginar o que se passava lá dentro. O corredor, de repente, parecia apertado demais, e uma sensação de claustrofobia tomou conta de mim, me afogando em pavor.

— Mantenha a calma — murmurou Becky, apertando minha mão.

— Sem conversinhas — o segurança latiu, friamente.

O som dos nossos saltos no piso metálico da escada em espiral ecoava como um relógio que contava o tempo até algo inevitável. Quando descemos, o ambiente mudou, tornando-se ainda mais opressor. O segurança nos guiou até uma porta pesada, de onde eu já podia ouvir a música pulsante e risadas que soavam distantes, abafadas. Pela fresta da porta, flashes de luzes coloridas se misturavam ao som e ao cheiro de decadência.

A porta se abriu, e a cena que se revelou era de excessos. As luzes néon piscavam, hipnóticas, dançando por todo o salão. A fumaça de tabaco e o perfume barato pairavam no ar, criando uma atmosfera quase irrespirável. O som de risadas e conversas se misturava ao barulho de copos tilintando. Um ambiente vibrante e, ao mesmo tempo, sufocante. Olhei ao redor, absorvendo cada detalhe: as mulheres, com roupas provocantes, seus olhares distantes e cansados, como se a vida nelas já tivesse sido drenada. Um arrepio percorreu minha espinha.

Becky percebeu minha hesitação e se aproximou.

— Não tenha medo, Mia. Aqui, você pode ser qualquer coisa. Este lugar pode ser seu trono ou sua cela. A escolha é sua — ela disse baixinho, seus olhos fixos nos meus.

Ela soltou minha mão, movendo-se com uma confiança que eu ainda não possuía. Eu a observei se aproximar de um homem esparramado em uma poltrona. Ela se jogou no colo dele com uma sensualidade calculada.

Esse era o jogo que precisávamos jogar para sobrevivermos.

De repente, percebi uma figura masculina se aproximando, seus passos calmos e predatórios. Meu coração começou a martelar no peito, e quando ele finalmente estava próximo o suficiente para que eu pudesse ver seu rosto, meu sangue gelou.

Era Vittorio. 

Eu queria gritar com ele, despejar todo o ódio que fervilhava dentro de mim. Mas as palavras ficaram presas na minha garganta, sufocadas pela dor e pela raiva. Ao invés disso, permaneci em silêncio, observando o caos ao meu redor. As pessoas estavam completamente alheias ao que acontecia além das paredes da boate. O mundo delas não existia fora daquele ambiente decadente.

Quando Vittorio se aproximou, meu olhar foi cortante, frio, cheio de um ódio que eu sabia que nunca iria desaparecer.

— Ruiva? — ele perguntou, indicando a peruca que eu usava com um leve movimento de queixo. — Alguém te contou que tenho uma queda por ruivas?

— É claro, porque a grande motivação da minha vida é te agradar — retruquei, o sarcasmo pingando de cada palavra.

Ele passou os dedos pelos cabelos escuros, soltando uma risada seca, desprovida de qualquer humor.

— Continua atrevida, pelo visto — ele disse, os olhos avaliando cada reação minha.

Ergui as sobrancelhas, sem vontade de prolongar aquele jogo de provocações.

— O que você quer que eu faça? — perguntei, finalmente. Minha voz saiu baixa, carregada de um desafio que nem eu sabia de onde vinha. Não tinha tempo para farpas infantis, a realidade era que eu e meu pai estávamos completamente à mercê dele, e eu sabia disso.

Vittorio me olhou de uma forma diferente, como se fosse a primeira vez que realmente enxergasse quem eu era. Por um momento, senti um peso maior naquele olhar, mas logo ele retomou seu tom autoritário.

— Por enquanto, você vai trabalhar no bar e dançar no palco — ele disse com firmeza. — Espero que seja gentil com os meus clientes.

Minha respiração, que eu nem percebera estar segurando, saiu de uma vez, quase em soluços. As lágrimas começaram a arder em meus olhos, uma reação que eu não podia controlar. O medo e a incerteza de tudo que aquilo implicava me dominaram.

Pelo menos, por enquanto, eu estava a salvo de algo pior.

Uma lágrima solitária escapou, deslizando pela minha bochecha. Vittorio a secou com um gesto rápido, como se fosse apenas um detalhe insignificante.

— Vamos lá — ele disse, a voz mais baixa, mas ainda inflexível. — Vamos testar você.

Ele me pegou pelo braço, sem delicadeza, e me arrastou pelo salão como se fosse um objeto. Enquanto ele me conduzia, o som da música, das risadas e da decadência ao meu redor parecia se distanciar. Tudo o que eu sentia era o peso da nova realidade.

Durante todo o caminho, lutei para manter minhas emoções sob controle. Não iria chorar na frente daquele monstro outra vez.

— Vittorio, é um prazer ter você aqui — disse um homem loiro, próximo ao bar.

— Sou um homem ocupado — Vittorio respondeu, com frieza. — Preciso que cuide dessa aqui.

O homem assentiu, lançando um olhar avaliador para mim.

— Ela tem belas pernas, e essa roupa realça o corpo dela. Vai te render uma boa grana — ele comentou, me fazendo sentir o estômago revirar.

Vittorio me olhou, seus olhos percorrendo cada centímetro do meu corpo. Um sorriso lento surgiu em seu rosto, mas ele balançou a cabeça.

— Ela fica apenas no bar e dançando no palco, Mattia — Vittorio disse com firmeza.

— Como quiser — o homem respondeu, com um leve encolher de ombros. Seus olhos, então, encontraram os meus. — Estou precisando de ajuda para distribuir as bebidas pelo salão. Pegue a bandeja e comece agora.

Assenti.

Enquanto colocava os copos de tequila na bandeja redonda, ouvi uma conversa que me paralisou.

— Fiquei sabendo que aquele verme deu trabalho — Mattia disse a Vittorio. — Ainda bem que você o matou, ninguém merece lidar com devedores.

Minhas mãos começaram a tremer, e eu sabia exatamente de quem estavam falando.

Meu pai.

Vittorio o matou.

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