07. Voltar para o Rio de Janeiro?

O relógio da imponente residência dos Vieira de Sá já marcava mais de duas horas da madrugada quando Max atravessou a porta principal, arrastando os passos preguiçosos pelo saguão silencioso. O cheiro amadeirado do charuto ainda pairava em suas roupas, misturado ao aroma doce de perfume feminino. A gravata estava frouxa, o colarinho aberto, e o cabelo negro desgrenhado, como se mãos delicadas tivessem acabado de se perder nele.

Ele cambaleou ligeiramente ao subir os primeiros degraus da escadaria, murmurando para si mesmo um palavrão baixinho quando o mundo girou por um instante. Mas não estava tão embriagado assim. Apenas o suficiente para não se importar com o fato de que, mais uma vez, voltava para casa sozinho.

— Finalmente — a voz firme de Eduardo o deteve antes que alcançasse seu quarto.

Max ergueu os olhos, piscando ao vê-lo sentado em uma poltrona no corredor, os cotovelos apoiados nos joelhos e um olhar severo no rosto sempre impecável.

— Ora, ora… Ficou com saudades, irmão? — Max soltou um sorriso debochado, inclinando-se contra o corrimão. — Não sabia que agora me esperava para me colocar na cama.

— Eu não espero por você, Max. Só não quero que transforme esta casa em um antro de libertinagem.

O tom de Eduardo era sério, mas Max apenas riu, um som rouco e preguiçoso.

— Libertinagem? — Ele deu um passo mais próximo, inclinando a cabeça com um brilho provocador nos olhos. — Curioso ouvir isso de você. Imaginei que estivesse ocupado… com outras coisas.

Eduardo estreitou os olhos.

— O que quer dizer com isso?

Max soltou um suspiro exagerado, passando uma mão pelos cabelos.

— Ora, todos sabemos que a doce Cecília é uma joia rara. Se eu estivesse no seu lugar, meu caro, já teria encontrado maneiras mais interessantes de passar as noites. — Ele riu, com um tom arrastado de malícia. — Ou será que está deixando a bela noiva esperando?

Eduardo se levantou de um salto, o maxilar tenso e as mãos cerradas em punhos ao lado do corpo.

— Tenha cuidado com suas palavras, Max. Cecília merece respeito.

— Respeito — Max repetiu a palavra como se fosse um conceito estranho. Aproximou-se mais, ainda com aquele sorriso insolente. — Espero que esteja dando a ela tudo o que uma mulher deseja… ou talvez ela acabe descobrindo que outros homens são mais… experientes.

O silêncio que se seguiu foi cortante. Por um momento, Max pensou que Eduardo o socaria — e, sinceramente, ele não se importaria. A dor física, pelo menos, era passageira.

Mas Eduardo apenas deu um passo para trás, o rosto fechado em uma máscara de fúria contida.

— Retornamos para o Rio de Janeiro na próxima semana para o pedido oficial. Se eu descobrir que você a incomodou de alguma forma…

— Acalme-se, irmão. — Max ergueu as mãos, em falso tom pacificador. — Ainda não toquei em nada que lhe pertence.

E, com isso, girou nos calcanhares, subindo o restante da escada sem se preocupar em disfarçar a risada baixa que escapava de seus lábios.

Ele não se importava em provocar Eduardo. Mas o que o incomodava, de verdade, era o fato de que, desde que conhecera Cecília, ele não conseguia tirá-la da cabeça.

E isso, mais do que qualquer outra coisa, era um problema.

***

Na manhã seguinte, o sol entrou impiedoso pelas janelas do quarto de Max, esparramando-se pelo tapete persa e alcançando seu rosto em uma ofensa dourada. Ele gemeu baixinho, enterrando a cabeça no travesseiro enquanto uma dor latejante se espalhava por sua têmpora.

A ressaca era uma velha conhecida. Mas naquela manhã, a sensação de irritação ia além do álcool que ainda percorria seu sangue.

— Maldito Eduardo… — murmurou para si mesmo, relembrando a conversa da noite anterior. Sempre tão correto, tão rígido. E agora, tão cheio de posse em relação ao compromisso.

Um pensamento incômodo atravessou sua mente. Cecília.

Era tolice, claro. Havia conhecido tantas mulheres ao longo dos anos — beldades casadas, viúvas entediadas, debutantes imprudentes. Todas eram passageiras. Por que, então, o sorriso tímido daquela moça o incomodava tanto?

O bater firme na porta interrompeu seus devaneios.

— Entre — resmungou, esperando ver o criado com o café forte que tanto precisava.

Mas, em vez disso, Eduardo cruzou a soleira com sua postura impecável, o olhar de quem já estava acordado e pronto para enfrentar o mundo horas antes.

— Dormindo até tarde novamente, Max? — Ele parou ao pé da cama, os braços cruzados. — Não que eu esperasse outra coisa.

— Que surpresa, irmão. Já está dando sermões antes mesmo do desjejum? — Max se espreguiçou preguiçosamente, um sorriso malicioso brincando em seus lábios enquanto se sentava. — Ou veio me convidar para um passeio em família?

— Viemos para São Paulo pelo simples motivo de agilizar tudo em nossas terras para recebermos a nova senhora dessa casa. — Eduardo ignorou o tom de deboche. — E não vou permitir que sua preguiça ou irresponsabilidade interfiram nos meus planos.

Max revirou os olhos, recostando-se nos travesseiros.

— Não me diga que pretende mesmo se ajoelhar diante do velho Joaquim e pedir a mão da doce Cecília.

— É claro que sim. — O tom de Eduardo era firme, decidido. — Não vim aqui para brincar, Max. O compromisso fortalece as relações entre nossas famílias, e Cecília…

— É adorável. Sim, já ouvi. — Max interrompeu, entediado, mas uma pontada incômoda surgiu em seu peito. — Mas não vejo por que tenho que prolongar minha estadia. Já cumpri minha obrigação ao acompanhá-lo.

Eduardo ergueu uma sobrancelha, desconfiado.

— Não vai voltar ao Rio comigo?

— E me sentar em jantares enfadonhos enquanto você recita poesias para sua futura esposa? — Max bufou, esticando as pernas nuas sob os lençóis. — Não, obrigado. Tenho outros interesses por aqui.

— Interesses, ou apenas mais escapadas irresponsáveis?

— Por Deus, Eduardo! — Max riu, balançando a cabeça. — Por que essa pressa em se amarrar? O mundo está cheio de prazeres, você deveria experimentá-los.

Eduardo estreitou os olhos, a irritação evidente.

— Nem todos desejam passar a vida se embriagando ou seduzindo esposas alheias. Alguns de nós têm responsabilidades.

— Responsabilidades — Max repetiu a palavra como se fosse uma ofensa. — Eu tenho responsabilidade comigo mesmo, e com mais ninguém.

Por um momento, o silêncio se estendeu entre os dois irmãos. Eduardo o observava com aquele olhar de julgamento que Max tanto odiava — como se ele fosse um caso perdido, um erro que a família precisava suportar.

Max suspirou, levantando-se da cama em um movimento preguiçoso, vestindo sua camisa de seda completamente amassada.

— Diga-me, Eduardo… Você está mesmo tão encantado assim com Cecília, ou está apenas cumprindo seu dever como herdeiro obediente?

— O que eu sinto não é da sua conta. — A voz de Eduardo soou gelada. — Mas o que você faz, Max, é da conta de todos nós. E eu não quero ter que limpar a sua bagunça outra vez.

Ele se virou, deixando o quarto sem esperar resposta.

Max soltou um suspiro pesado quando a porta se fechou atrás dele.

Ficar em São Paulo parecia a decisão mais sensata no momento.

Afinal, por que ele deveria correr de volta ao Rio de Janeiro para testemunhar a felicidade perfeita de Eduardo ao lado da jovem Monteiro de Alcântara?

E, além disso, ele nunca lidava bem com tentações.

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