“Mariana?”
A moça tira os olhos da tela do computador e observa sua colega, Ruth, que segura nas mãos uma prancheta.
“O senhor Jones quer falar com você.”
A moça bufa audivelmente.
“Mesmo? O que ele quer?”
“Não sei. Mas ele me pediu para te passar esse recado. Depois do expediente, dá uma passadinha na sala dele.”
“Claro. Obrigada, Ruth.”
A mulher vai embora para tomar conta dos próprios afazeres. Mariana tenta se concentrar no trabalho à sua frente, mas não consegue.
O que o seu chefe queria? Desde que chegou na cidade e conseguiu o emprego, modéstia à parte, ela era a funcionária mais competente daquele escritório. Sempre chegou no horário, e quando necessário, ficava até mais tarde para ajudar algum outro funcionário.
Irritada, a mulher fez cara feia e resmungou:
“É melhor que seja uma oportunidade de promoção.”
Quando finalmente o relógio digital em cima da sua mesa lhe mostrou o horário de saída, Mariana finalizou suas atividades, colocou seu casaco, pegou sua bolsa e, ao invés de ir direto para casa e tomar um bom banho, caminhou a passos rápidos para o escritório de seu chefe.
A primeira e última vez que esteve lá foi para, com lágrimas nos olhos, implorar por um trabalho. Nem sempre Mariana foi dona de casa: ela fez cursos antes do casamento fracassado, e se saía bem com planilhas e formulários.
Depois de fazer um teste para que pudessem ver o quão bem ela poderia se sair, Mariana foi contratada. Aquilo a salvou de mais humilhações e apelos emocionais em outras empresas, já que ela precisava desesperadamente de um trabalho.
Ao chegar na porta de mogno da sala do presidente, Mariana sentiu um pequeno desconforto. Mas como ela já estava enjoando há tempos, já não fazia tanta diferença.
Ela bateu três vezes na porta e esperou pacientemente para que seu chefe a abrisse.
“Olá, Mariana, obrigado por vir”, ele disse ao atender.
A sala do senhor Jones ainda parecia a mesma: o mesmo cheiro de café com toques de cigarro, cortinas pretas ligeiramente sujas que fizeram Mariana espirrar da primeira vez em que esteve ali, a mesma mesa repleta de blocos de anotações e canetas sem tampa…
“Sente-se, por favor.”
Ela faz o que ele pede. O chefe de Mariana senta-se na própria cadeira, entrelaça as mãos e pergunta, sem rodeios:
“Porque não contou a mim que estava grávida?”
A mulher parece um pouco em choque. Antes que possa responder, ele continua:
“Sabemos o quanto tem se dedicado ao trabalho, Mariana, e sempre foi uma funcionária exemplar. Mas, como chefe, preciso ser informado sobre eventos significativos na vida dos meus colaboradores. Descobrir sobre sua gravidez por meio de terceiros não é a forma ideal de lidarmos com essa situação."
Mariana sente uma mistura de surpresa e incômodo com a abordagem direta de seu chefe. Ela reúne seus pensamentos e responde com calma:
"Desculpe, senhor Jones. Eu não tinha a intenção de ocultar minha gravidez, mas também não achava que era uma informação relevante para o trabalho. Além disso, ainda estava no início da gestação e queria ter certeza de que tudo estava bem antes de compartilhar."
O chefe acena com a cabeça, demonstrando compreensão, mas ainda com uma expressão séria no rosto.
"Entendo sua perspectiva, Mariana. No entanto, como líder da equipe, é importante que eu esteja ciente dessas situações para garantir um ambiente de trabalho adequado e para que possamos fazer os devidos ajustes, se necessário."
O homem alto, de cabelos escuros e encaracolados e olhos verdes fica de pé. Ele pega um café em sua máquina pessoal. Diziam pelos corredores que o chefe era realmente viciado, e se ficasse vinte e quatro horas sem café, ficava irritado e com muitos outros sintomas reais de abstinência.
“Não quero soar grosseiro, Mariana, mas já estava óbvio para muitos. As roupas largas, o enjoo, os vômitos de três em três horas. E também-"
A moça está fazendo cara feia. O senhor Jones percebe que ela olha para o copo de café na mão do homem.
“Me desculpe. Esse cheiro está te fazendo enjoar?”
Sem graça, a moça faz um sinal afirmativo com a cabeça.
“Bem, isso é desconcertante. Acho que seria mais prudente considerar algumas coisas… Você sabe. Sobre o seu trabalho.”
Mariana percebe que talvez não tenha considerado completamente as consequências de sua escolha de não informar antecipadamente sobre sua gravidez. Será que ele iria despedi-la?
A mulher precisa tomar um pouco de ar antes de forçar naturalidade e tranquilidade, ao menos na medida do possível.
"Compreendo, senhor Jones, e peço desculpas novamente pela falta de comunicação. Eu gostaria de assegurar que continuarei me dedicando ao trabalho da melhor forma possível e estou disposta a discutir quaisquer ajustes necessários durante a minha gestação para garantir a produtividade da equipe."
Mariana respira fundo e tenta não pensar em vomitar. Ela está acostumada com o cheiro de café, mas de alguma forma, naquele momento, parece insuportável. Ela olha para seu chefe e força um sorriso.
“Você está bem?”, pergunta ele, dando a volta e indo até ela, apoiando a mão em seu ombro de forma amigável.
"Está tudo bem, senhor Jones. Apenas um pouco enjoada, mas vou ficar bem."
O chefe parece aliviado com a resposta e continua:
"Eu entendo que pode ser um momento delicado, mas quero que saiba que estamos aqui para apoiá-la. Se precisar de qualquer coisa, não hesite em falar comigo ou com a RH."
“Claro, senhor Jones. Obrigada por falar comigo.”
“Vamos discutir alguns detalhes sobre sua carga horária, esquema de folgas, licença maternidade… E por falar nisso, por favor, sei que a senhorita gosta de ficar depois da hora para ajudar os outros. Acho que não preciso dizer o porquê disso não ser mais uma opção.
“Não, senhor.”
Ela respira fundo. A ânsia de vômito está ficando cada vez pior.
Mariana precisa sair de lá antes que…
“Amanhã poderemos discutir isso com mais calma. Eu espero que sua gestação seja tranquila e-”
O chefe da moça para de falar na mesma hora.
Porque, em um rompante incontrolável, Mariana vomitou…
Bem em cima do terno caríssimo do homem.
Mariana tamborila os dedos em cima da mesa do escritório e olha para a tela em branco, sinal de sua fadiga e estresse.Aquilo sim era uma ironia, já que o escritório ficava na sua casa, e que supostamente, trabalhar dentro do lar era a solução adequada para mantê-la calma.Já fazia uma semana desde o terrível incidente na sala do senhor Jones, e toda vez que se lembrava do semblante de tristeza, choque, nojo e vontade de morrer que se passou no rosto do chefe, ela se sentia vermelha de vergonha.A consulta ao pré-natal daquela semana ainda iria acontecer. Mariana não queria saber o sexo do bebê. Só de saber que ele seria saudável, e que teria uma vida mais digna do que ela mesmo teve…A moça suspira. Ela se levanta e vai para o jardim observar as flores.Sua mãe havia sido muito mais generosa do que ela jamais pensou. Quando contou para ela o que o cafajeste de seu ex-marido havia feito, e em qual situação Mariana se encontrava, a mesma fez questão de deixá-la ficar com o imóvel que u
A primeira coisa que se passa na mente de Mariana é simplesmente levantar e ir embora, sem dizer uma única palavra.A segunda coisa é sorrir, acenar e mandar aquela velha para o inferno e, então sim, levantar e ir embora.Mas o nervosismo, a confusão e a hesitação fazem com que a moça simplesmente fique boquiaberta por alguns segundos antes de dizer:"Olá", responde Mariana, tentando manter a compostura, embora seus pensamentos estejam acelerados. Ela observa a expressão serena no rosto de Isabella. Como aquela mulher tinha a encontrado? Apesar de estar tentando manter a calma, Mariana quer muito segurá-la pela gola da blusa e sacudí-la enquanto a enche de perguntas.Isabella sorri gentilmente e diz: "Espero que não se importe por eu ter mantido o anonimato. Prezei pela minha segurança e também pela sua ao escolher esse método. Tenho acompanhado a situação difícil pela qual você está passando e senti que era hora de intervir."Mariana franze a testa, ainda processando a revelação. E
Maxwell Philips olha para Mariana com um sorriso sarcástico nos lábios. Seus olhos frios e penetrantes parecem analisá-la de cima a baixo, como se estivesse estudando um objeto de experimento."Surpresa em me ver aqui, cunhada?" ele diz, sua voz carregada de desprezo.Mariana tenta disfarçar a perturbação que sente ao ver Maxwell ali. Ela sabia que ele odiava Maximilian, mas não conseguia entender completamente os motivos. Agora, diante dessa situação inesperada, sua mente se enche de dúvidas e receios."O que você quer, Maxwell?" ela pergunta, lutando para manter a compostura.Maxwell dá um passo mais perto, seus olhos fixos nos dela. "Eu vim oferecer um acordo", ele responde com um tom sinistro. “Você já deve ter falado com a minha mãe.”Atrás dela, Isabella se aproxima e coloca uma das mãos na cintura.“Bem, filho, você sabe que eu sempre tento a diplomacia antes de tudo.”“E nós dois sabemos que Mariana sempre preferiu as coisas do jeito mais difícil, não?”, ele ri, cúmplice.Sent
Mariana se encolhe no canto do beco, tentando controlar sua respiração acelerada e abafar os soluços de choro. Ela se agarra à esperança de que as vozes e passos que ouve não sejam de Maxwell ou Isabella, mas o medo a consome, e ela não pode deixar de temer o pior.Os ruídos se tornam mais altos, indicando que as pessoas estão se aproximando rapidamente. Mariana pressiona uma das mãos contra a boca para conter qualquer som que possa traí-la. Seu coração bate forte em seu peito, e a tensão aumenta a cada segundo.De repente, um vulto passa pelo beco, e Mariana prende a respiração. Ela se encolhe ainda mais, tentando se fundir às sombras, esperando que não seja vista. Os passos param bem próximos ao seu esconderijo, e a moça fecha os olhos, esperando o pior."Você viu alguém correndo por aqui?", pergunta uma voz masculina."Não, não vi ninguém", responde outra voz, feminina. "Provavelmente só foi nossa imaginação. Esse beco é meio escuro e dá um arrepio."Mariana não reconhece as vozes,
“Não gosto disso, Mariana.” Caminhando ao seu lado, estava James, o homem que a encontrou no dia em que a moça descobriu a traição; o homem que havia salvado sua vida. Ele repete com mais ênfase:“Não gosto nada disso!”“Eu sei, James, eu também não. Mas acredite em mim, é o único jeito.”“Mariana-”“Vai ficar tudo bem.”“Como vai ficar tudo bem? Porque do nada sua ex-sogra e seu ex-cunhado querem se aproximar de você? Você mesma me disse que-”“Sim, James, mas você precisa confiar em mim. Eu sei o que estou fazendo, não vai acontecer nada de mal comigo.”“Se não vai acontecer nada de mal com você, então porque você se sentiu na obrigação de me trazer como testemunha?”Mariana para de andar. Os dois estão há minutos de chegarem no parque, o local do encontro combinado entre Mariana, Isabella e Maxwell.“Você confia em mim?’“Eu-”“Confia ou não?”Vencido pelo cansaço, James suspira profundamente antes de responder:“Sim.”“Obrigada.”Mariana dá um abraço apertado no amigo. Os dois vo
Sozinho dentro da enorme e cada dia mais solitária casa, o empresário Maximilian Philips, jogado no chão com uma garrafa de uísque ao lado, olha para o teto.O candelabro é radiante, imponente e por si só já demonstrava todo um luxo que, um dia, o homem fizera questão de ostentar.Mas agora, o que era aquilo além de um punhado de vidro lapidado com lâmpadas em seu interior?Max toma mais um gole de uísque.A nova empregada, Lanis, bate duas vezes na porta antes de entrar;“Senhor Philips, o senhor tem visita.“Mande embora”, ele retruca. Sua voz está pastosa devido ao consumo excessivo de álcool.“Mas, senhor Phillips, é a-”“Já mandei mandar embora!”“Sim, senhor.”É claro que depois do divórcio, mulheres apaixonadas por ele, que sempre o desejaram e suspiravam quando o mesmo passava pelos corredores, iriam atrás dele como abelhas iam para o mel.Mas Maximilian não queria nenhuma delas.O zangão tinha perdido sua abelha-rainha. E pior: por causa de seu próprio mal-caratismo.Cambalea
Duas semanas se passaram desde o terrível encontro no parque.Duas semanas se passaram após Isabella entrar mais uma vez em contato, e dizer que estava tudo pronto para o nascimento de Elena e Hector.Ou seja, tudo estava pronto para Mariana e James saírem de cena.A moça chorou e implorou para que o amigo que recuasse, que não fizesse isso consigo. Ele tinha uma carreira brilhante, amigos que gostavam dele. Mas desde o início ele sempre deixou claro que, por Mariana, ele iria até o fim do mundo.Afinal, o mesmo deixou a cidade natal para ficar mais próximo da amiga, menos de um mês depois que a deixou na rodoviária.A notícia falsa já havia sido forjada. Todos estavam comentando sobre o crime horrível cometido alguns dias antes, onde um grupo desconhecido de criminosos sequestrou, torturou e destruiu as vítimas de forma tão horrível, que mal dava para reconhecer os corpos.E quase ao mesmo tempo, Elena, uma secretária de uma empresa fantasma, comprava um belo apartamento no canto mai
Para a sorte eterna de Isabella Philips, a roupa escura e sofisticada, as luvas negras e o chapéu com grinalda que cobria boa parte de seus olhos, escondiam a verdadeira expressão que, às vezes, teimava em surgir em seu rosto: um sorriso de triunfo. Ao redor, muitas pessoas. A maioria eram antigos conhecidos e parentes de Mariana. A mãe dela, uma mulher que Isabella sempre achou fraca e bastante cafona, tinha desmaiado e não voltou mais. "Cuidado, mamãe”, um homem sussurrou em seu ouvido. Ela reconhece imediatamente a voz de Maxwell. “Lembre-se que estamos tristes e terrivelmente chocados com a perda repentina da nossa pobre Mariana.” “Você nunca deixa de reparar em nada, não é?” “Acredito que esse seja um dos meus maiores dons.” O irmão de Maximilian também tem dificuldades para manter uma expressão tristonha, mas é claro que ele jamais admitiria isso. O caixão está fechado no centro da enorme câmara, e cortinas azuis parcialmente fechadas estão ao seu redor, onde o funeral acon