O tom na voz de Leandro carrega uma mistura de preocupação e uma tensão que eu não consigo identificar completamente. Ele mantém os olhos fixos na estrada, mas há algo de inquietante na maneira como suas mãos apertam o volante, como se tentasse se agarrar a algum tipo de controle que escapa por entre seus dedos.
— Não vou desistir, Leandro. — Respondo com firmeza, minha voz cortando o silêncio abafado do carro. — Rafael é a nossa melhor chance, e você sabe disso.
Ele bufa, um som baixo e contido que mais parece uma explosão controlada. Não responde imediatamente, mas a linha de sua mandíbula fica mais tensa, e seus olhos escuros brilham com algo entre frustração e resignação.
— Você não entende o que está arriscando. — Ele finalmente fala, a voz grave como um trovão à distância. — Esse mundo… essas pessoas… Não é brincadeira, Isabela. Você acha que está no controle, mas eles… eles jogam sujo. Sempre.
Por um momento, o peso das suas palavras me atinge. Sei que ele está certo, mas já tomei minha decisão. Não posso recuar agora. Respiro fundo, tentando acalmar a pulsação que ainda parece acelerada desde o que aconteceu minutos atrás entre nós.
— Eu sei o que estou fazendo. — Digo, tentando soar confiante, mas meu tom não escapa à leve hesitação. — E eu não estou sozinha. Tenho você comigo, não tenho?
Leandro vira a cabeça rapidamente, seus olhos fixando os meus por um breve instante antes de voltar à estrada. Há algo no olhar dele que faz meu coração vacilar — uma mistura de raiva, medo e algo que eu não consigo decifrar.
— Você tem, sim. — Ele responde finalmente, sua voz mais baixa, quase um sussurro. — Mas não confunda isso com apoio cego. Se eu perceber que algo está fora do controle, eu vou te tirar de lá à força, nem que isso signifique jogar tudo para o alto.
Eu sei que ele fala sério. O tom de voz dele é uma promessa, e não uma ameaça. Apesar do nervosismo, há um calor reconfortante em saber que, apesar de tudo, ele está ao meu lado.
O resto da viagem segue em silêncio. A tensão entre nós é quase tangível, mas dessa vez, ela não é apenas causada pela missão. O beijo que compartilhamos paira como uma sombra entre nós, algo não dito, mas impossível de ignorar.
Quando finalmente chegamos ao ponto de encontro, ele estaciona o carro em uma rua deserta, iluminada apenas por um poste de luz que pisca intermitentemente. Ele desliga o motor, mas não faz menção de sair. Em vez disso, vira-se para mim, seus olhos encontrando os meus novamente.
— Última chance, Isabela. — Ele diz, o tom grave e carregado de sinceridade. — Você pode sair desse carro agora e deixar isso para lá. Não vou te julgar.
Eu engulo em seco, meu coração martelando no peito. A decisão já foi tomada, mas a intensidade de seu olhar faz minha confiança vacilar por um segundo. Ainda assim, mantenho minha postura e respondo com a mesma determinação de antes.
— Eu não vou voltar atrás, Leandro. Estamos nisso juntos.
Ele observa meu rosto por mais alguns segundos, como se procurasse alguma hesitação, algum sinal de dúvida. Quando não encontra, solta um suspiro pesado e balança a cabeça, abrindo a porta do carro.
— Que seja. Mas fique esperta. — Ele diz, saindo do veículo. — E lembre-se: no momento em que as coisas ficarem feias, você não hesita em recuar. Me prometa isso.
Ele me observa por um momento, impotente, antes de voltar a olhar para frente, entrando naquela nuvem densa de mau humor. Pela forma como ele aperta o volante, posso ver que está tenso, nervoso, quase violento. O som de seus dedos pressionando o couro do volante é quase audível, como se ele estivesse tentando segurar a raiva.
Estacionamos em frente à boate. O manobrista já chega rápido para pegar o carro, e assim que saímos, vejo as pessoas se aglomerando na entrada, algumas mais desinibidas, outras mais cuidadosas. Leandro me puxa para o lado, direcionando a caminhada até a entrada.
— Entraremos juntos, e lá nos separamos. Caso consiga seu objetivo com o nosso alvo, me chame, e me apresente ao Rafael, como quem não quer nada. Eu tentarei me infiltrar. E lembre-se, você é Rebeca Silva, uma secretária desempregada, e eu sou Ricardo Félix, seu amigo de infância. Estou procurando emprego. Se ele perguntar como conseguimos o convite, já sabe o que dizer: uma amiga desistiu de ir à boate com o namorado e nos deu a vaga.Eu suspiro, engolindo a ansiedade.— Esta certo. E você tem tanta certeza assim que eu vou conseguir alcançar nosso objetivo?Ele me observa com um olhar sério e profundo.— Deus! Você ainda pergunta? Não percebe o quanto é bonita? E, mais, você é inteligente o suficiente para despertar a atenção de qualquer um. — Ele respira fundo, com um semblante que, apesar de preocupado, tem uma ponta de confiança. — Você vai conseguir.— Se sou inteligente como diz, por que teme?— Por isso mesmo... — Ele parece soltar um suspiro tenso, como se fosse uma luta inte
"Será que ele está envolvido na lavagem de dinheiro do irmão? Ou a imobiliária é só fachada para negócios mais sujos? É isso que estou aqui para descobrir."A música troca para uma batida ainda mais intensa, dificultando qualquer conversa. O loiro aproveita o momento e me convida:— Vamos dançar?Avalio rapidamente. Preciso passar despercebida, ser apenas mais uma convidada comum. Atrair a atenção de Rafael agora seria arriscado, mas parecer entrosada na festa é essencial.— Tudo bem.Fecho os olhos por um instante, tentando relaxar, e deixo meu corpo acompanhar a batida da música. A pista está cheia, os passos rápidos e os risos misturam-se à vibração elétrica do ambiente. De tempos em tempos, lanço um olhar discreto em direção à mesa de Rafael. Ele parece absorto na conversa, gesticulando de forma moderada, como quem expõe um argumento importante.Suspiro, voltando minha atenção à dança, enquanto o loiro ao meu lado me observa com um sorriso cada vez mais convencido. Retribuo com um
Ele me afasta, e seus olhos verdes, intensos e penetrantes, deslizam pelo meu rosto como lâminas afiadas, dissecando cada detalhe com uma precisão quase cruel. A sensação é avassaladora, como se ele estivesse tentando me decifrar por completo, arrancando segredos que nem eu mesma sabia que guardava. O peso do seu olhar queima minha pele, deixando-me exposta de um jeito que me faz querer fugir e, ao mesmo tempo, me atrai como um ímã.— Estou rindo de mim — murmuro, os lábios curvando-se em um sorriso travesso, mas há um nó na minha garganta, uma inquietação latente que não me deixa relaxar por completo. — Dançando com um desconhecido desse jeito.A risada dele, grave, profunda e envolvente, vibra em um tom baixo, quase um sussurro carregado de algo que não consigo nomear. Mas logo desaparece, sugado por uma tensão invisível, como se ele também sentisse o peso da atmosfera que se instala entre nós.— Você é diferente, mesmo. — Ele diz, e sua voz desliza por mim como uma carícia perigosa
Fico tentando manter a calma, forçando um sorriso tranquilo, mas a ansiedade ainda está clara demais.— Seu irmão? Desculpe-me, mas eu não sei quem você é, e não conheço seu irmão. Eu apenas dancei com ele, e ele não faz o meu tipo. — Tento soar casual, mas sei que falhei.Rafael apoia um braço no balcão, inclinando-se ligeiramente para mais perto de mim. O perfume amadeirado dele é diferente do de Dante, mais suave, mas ainda assim carregado de uma masculinidade inquietante.— Rafael Souza. — Ele se apresenta com um sorriso que me faz sentir como se estivesse sendo observada sob uma lente de aumento.— Rebeca Silva.— Interessante. — Ele diz, com o sorriso nos lábios, aquele sorriso intrigante, quase desafiador. — As mulheres costumam cair de joelhos pelo Dante, mas você parece... diferente.Dou de ombros, tentando afastar a tensão crescente.— Não preciso de bebida ou de homens como ele para me sentir bem.— Homens como ele? — Rafael pergunta, seus olhos azuis estreitando com uma cu
— Não, vim com um amigo.— Aquele que você estava dançando?Meu coração dá um salto no peito. Ele estava me observando antes. O calor da adrenalina percorre meu corpo.— Não. Eu o conheci aqui. Nem sei o nome dele. — Desvio os olhos, forçando desinteresse.Rafael me analisa, como se tentasse decifrar cada palavra minha.— Qual é a sua história? — Ele pergunta, inclinando a cabeça para o lado, intrigado.Eu hesito, mas logo sorrio, aproveitando a deixa para começar a construir a narrativa que preciso que ele acredite.— Por que quer saber?Ele dá um sorriso, um misto de diversão e mistério.— Como eu já disse, você não combina com esse ambiente. É como colocar um quadro da natureza em uma parede cheia de abstratos.Sinto o rubor subir ao meu rosto. Com um suspiro, decido usar a verdade para criar empatia. É mais fácil sustentar um disfarce quando ele se apoia em algo real.— Não gosto muito desse tipo de lugar — admito. — Só vim porque um amigo de infância insistiu. Ele acabou me deixa
Os olhos de Rafael Ferreira se estreitam, a curiosidade brilhando neles. Ele inclina o corpo um pouco para frente, interessado.— Então está procurando emprego?Seguro o olhar dele, lutando contra o nervosismo que cresce dentro de mim.— Sim. — Minto, a palavra saindo hesitante, mas firme o suficiente para não levantar suspeitas. Minhas mãos estão frias, e a tensão dentro de mim cresce a cada instante.Ele observa por um momento, como se ponderasse sobre a resposta. Depois, com um leve movimento de cabeça, continua.— O que sabe fazer?— Eu me formei em secretariado. — Outra mentira que desliza com facilidade, embora minha garganta pareça mais seca a cada palavra.Ele me encara, o silêncio entre nós estendendo-se. O ambiente parece diminuir, o som da música ao longe quase desaparecendo. É impossível decifrar o que se passa em sua mente, mas a sensação de estar sendo observada me deixa desconfortável. Rafael balança a cabeça devagar, como se estivesse refletindo sobre algo importante,
Rafael sorri, mas o gesto não atinge os olhos, que continuam carregados por algo entre a dor e a exaustão. Ele traga o cigarro com calma, soltando a fumaça como se quisesse aliviar o peso das lembranças que carrega. Sua voz sai rouca, baixa, carregada de mágoa e honestidade crua.— Eu e meu irmão, Dante, nascemos no Morro de Ouro. Crescemos no meio do caos. Minha mãe... ela era garota de programa antes de se envolver com meu pai. Quando se casaram, a vida virou um inferno. Ela se afundou no álcool, e ele, nos negócios ilícitos. Era violento. Um homem que achava que o respeito vinha na ponta da faca.Seus olhos perdem o foco, como se buscassem em algum canto distante um eco da infância roubada. A pausa que ele faz pesa, o silêncio preenchido apenas pelo som baixo da rua lá fora. É como se cada palavra fosse uma ferida que ele se obrigasse a reabrir.— Quando eles morreram, eu tinha 21 anos, e Dante, 19. O que restava de uma família se desfez, mas isso nos uniu. Pelo menos, por um tempo
— Preciso ir.Seu olhar segue o meu, e eu sinto o calor subir pelas minhas bochechas enquanto ele me observa. Há algo nele que é desconcertante, como se pudesse enxergar além do que eu demonstro.— Foi bom conversar com você. — Ele diz, sua voz baixa e controlada, mas os olhos se movem lentamente pelo meu rosto, quase como se tentassem gravar cada detalhe.— Eu também gostei de te conhecer. — Respondo, tentando soar casual.Levanto-me da cadeira.— Posso te levar em casa? — A pergunta vem carregada de intenção, mas não há como aceitar.— Não, eu vim com o “Ricardo” — digo, mencionando o nome falso do meu parceiro infiltrado. É então sinto a presença de Leandro ao meu lado, tão sólido e protetor, como sempre.— Podemos ir embora? — Leandro pergunta, sua voz firme, mas seus olhos analisando a cena com cautela.— Parece que você leu meus pensamentos. — Respondo, aliviada por sua chegada.Rafael se levanta também, seus movimentos lentos, quase calculados, e nos encara.— Espero vocês no s