Os olhos de Rafael Ferreira se estreitam, a curiosidade brilhando neles. Ele inclina o corpo um pouco para frente, interessado.— Então está procurando emprego?Seguro o olhar dele, lutando contra o nervosismo que cresce dentro de mim.— Sim. — Minto, a palavra saindo hesitante, mas firme o suficiente para não levantar suspeitas. Minhas mãos estão frias, e a tensão dentro de mim cresce a cada instante.Ele observa por um momento, como se ponderasse sobre a resposta. Depois, com um leve movimento de cabeça, continua.— O que sabe fazer?— Eu me formei em secretariado. — Outra mentira que desliza com facilidade, embora minha garganta pareça mais seca a cada palavra.Ele me encara, o silêncio entre nós estendendo-se. O ambiente parece diminuir, o som da música ao longe quase desaparecendo. É impossível decifrar o que se passa em sua mente, mas a sensação de estar sendo observada me deixa desconfortável. Rafael balança a cabeça devagar, como se estivesse refletindo sobre algo importante,
Rafael sorri, mas o gesto não atinge os olhos, que continuam carregados por algo entre a dor e a exaustão. Ele traga o cigarro com calma, soltando a fumaça como se quisesse aliviar o peso das lembranças que carrega. Sua voz sai rouca, baixa, carregada de mágoa e honestidade crua.— Eu e meu irmão, Dante, nascemos no Morro de Ouro. Crescemos no meio do caos. Minha mãe... ela era garota de programa antes de se envolver com meu pai. Quando se casaram, a vida virou um inferno. Ela se afundou no álcool, e ele, nos negócios ilícitos. Era violento. Um homem que achava que o respeito vinha na ponta da faca.Seus olhos perdem o foco, como se buscassem em algum canto distante um eco da infância roubada. A pausa que ele faz pesa, o silêncio preenchido apenas pelo som baixo da rua lá fora. É como se cada palavra fosse uma ferida que ele se obrigasse a reabrir.— Quando eles morreram, eu tinha 21 anos, e Dante, 19. O que restava de uma família se desfez, mas isso nos uniu. Pelo menos, por um tempo
— Preciso ir.Seu olhar segue o meu, e eu sinto o calor subir pelas minhas bochechas enquanto ele me observa. Há algo nele que é desconcertante, como se pudesse enxergar além do que eu demonstro.— Foi bom conversar com você. — Ele diz, sua voz baixa e controlada, mas os olhos se movem lentamente pelo meu rosto, quase como se tentassem gravar cada detalhe.— Eu também gostei de te conhecer. — Respondo, tentando soar casual.Levanto-me da cadeira.— Posso te levar em casa? — A pergunta vem carregada de intenção, mas não há como aceitar.— Não, eu vim com o “Ricardo” — digo, mencionando o nome falso do meu parceiro infiltrado. É então sinto a presença de Leandro ao meu lado, tão sólido e protetor, como sempre.— Podemos ir embora? — Leandro pergunta, sua voz firme, mas seus olhos analisando a cena com cautela.— Parece que você leu meus pensamentos. — Respondo, aliviada por sua chegada.Rafael se levanta também, seus movimentos lentos, quase calculados, e nos encara.— Espero vocês no s
Leandro passa a mão pelos cabelos curtos, um gesto quase frenético que revela sua frustração.— Quero que no sábado você invente uma desculpa e desista desse emprego.Meu coração dispara, e a indignação me faz reagir sem pensar.— Não! — digo, com firmeza.Leandro avança na minha direção, os olhos brilhando com algo entre raiva e desespero. Por um momento, penso que ele vai me tocar, mas ele para a poucos centímetros de mim, sua presença intimidante como sempre.— Você não percebe que está tirando minha paz de espírito?Dou um passo à frente, diminuindo a distância entre nós, e fito seus olhos com uma tentativa de suavidade. Seguro sua mão, apertando-a levemente.— O que você viveu no passado não pode afetar o seu presente. Você ficou traumatizado, Leandro, e eu entendo isso, mas não pode deixar isso controlar tudo.Ele balança a cabeça, soltando um suspiro pesado. Sua voz sai angustiada, quase cortante.— Confesso que isso pesa, sim. Mas é muito mais que isso. Você não entende! — Seu
IsabelaLeandro desliza os dedos pelos meus cabelos, cobrindo a parte de trás da minha cabeça, então descansa sua testa contra a minha.— Você é tão teimosa! — Ele me diz perto da minha boca. Se ele mover um centímetro, nós nos beijaríamos.Ele solta um suspiro angustiado. Isso me angustia também.— Não queria te amar, mas te amo. — Sua voz soa deliciosamente rouca e incrivelmente sexy, me provocando arrepios. — Não posso, eu sei... Mas eu sei que o verdadeiro amor não faz exigências, ele se doa gratuitamente e segue viagem. Saiba que eu morreria por você.Eu respiro fundo.O que ele quer afinal?Que eu desista de tudo por ele?LeandroEu não consigo parar de olhar para a boca dela... Seus lábios carnudos e macios... Quero como louco senti-los contra os meus... Inteiramente...Seu perfume de maçã me enlouquece.Beijar essa boca linda é o que eu preciso fazer nesse momento. Uma reação natural de meu corpo. Ele clama por ela e eu não consigo pensar quando ela está assim tão perto de mim
No dia seguinte entro no departamento, Leandro está conversando com Carlos. Logo que ele sente minha presença, seus olhos voam para mim. Ele está sexy, como sempre. A camiseta branca justa no corpo, colete e preso a ele uma bandoleira carregando duas pistolas semiautomáticas 9 mm. Sua expressão está fechada, "desgostoso", essa é a palavra que se encaixa com ele e não preciso falar com ele para entender o motivo.Ele, no mínimo, estava remando contra por eu ter me infiltrado na casa de Rafael Ferreira. Mas sem sucesso, percebo isso quando vejo agora o sorriso que Carlos está me dando, e agora entendo melhor seu mau humor.Meu chefe se move em minha direção.— Meus parabéns. Ótimo trabalho.— Obrigada. E obrigada por ter confiado em mim.Leandro se aproxima de nós.— Leandro, acerte os detalhes com sua parceira. E Isabela, quero o relatório de ontem à noite.— Está certo. Pode deixar.Depois que ele sai, Leandro me encara. Ele está abatido. Eu suspiro.— Que detalhes são esses que quer
— Rivalidade. Acho que é isso.Mas, no instante em que essas palavras deixam minha boca, um desconforto me atinge. É injusto pintar Leandro dessa forma. Eu completo, sem hesitar:— A verdade é que era para ele se infiltrar, e não eu.Tânia estreita os olhos, pensativa, e comenta:— Antes de você chegar, ele se exaltou muito com Carlos. Ele queria tirar você desse trabalho de qualquer jeito. Argumentou que você não está preparada.Sinto o peso dessas palavras enquanto amasso o copinho de café e o jogo no cesto.— Eu percebi. Vou voltar para a minha mesa. Preciso terminar o relatório.Tânia, no entanto, não se dá por vencida. Ela segura meu braço levemente, inclinando-se para murmurar no meu ouvido:— Leandro parece que gosta de você.Eu meneio a cabeça, negando de imediato.— Impressão sua.Ela arqueia uma sobrancelha, intrigada.— Querida, é mais do que rivalidade. Pelo que ouvi da discussão, ele se preocupa com você.Solto uma risada seca, sem humor. Meu olhar se cruza com o dela enq
No dia seguinte, acordo tarde. Depois de dar uma geral no apartamento, começo a organizar minhas malas. Reservo um compartimento secreto para guardar o celular que Leandro me deu, garantindo que fique bem escondido.Agora, a próxima missão: escolher um vestido. Dou um sorriso enquanto observo meu guarda-roupa. A verdade é que não tenho muitas opções. Nunca investi muito na minha aparência; minha prioridade sempre foi o conforto e a funcionalidade. Meu estilo é dominado por calças, camisetas, jaquetas e camisas práticas. Vestidos? Apenas três.Um deles já foi usado, restam duas opções.Felizmente, desta vez, não preciso impressionar Rafael Ferreira, o que é um alívio. Já cumpri meu objetivo principal: consegui me infiltrar. Não preciso me preocupar em seduzir ninguém. Meu papel agora é profissional, e a aparência não precisa ser um fator decisivo.Mesmo assim, enquanto olho as opções, penso em Dante. Quando peguei o caso envolvendo Ferreira, li sobre o histórico criminal de Dante. Ele