— Entraremos juntos, e lá nos separamos. Caso consiga seu objetivo com o nosso alvo, me chame, e me apresente ao Rafael, como quem não quer nada. Eu tentarei me infiltrar. E lembre-se, você é Rebeca Silva, uma secretária desempregada, e eu sou Ricardo Félix, seu amigo de infância. Estou procurando emprego. Se ele perguntar como conseguimos o convite, já sabe o que dizer: uma amiga desistiu de ir à boate com o namorado e nos deu a vaga.
Eu suspiro, engolindo a ansiedade.
— Esta certo. E você tem tanta certeza assim que eu vou conseguir alcançar nosso objetivo?
Ele me observa com um olhar sério e profundo.
— Deus! Você ainda pergunta? Não percebe o quanto é bonita? E, mais, você é inteligente o suficiente para despertar a atenção de qualquer um. — Ele respira fundo, com um semblante que, apesar de preocupado, tem uma ponta de confiança. — Você vai conseguir.
— Se sou inteligente como diz, por que teme?
— Por isso mesmo... — Ele parece soltar um suspiro tenso, como se fosse uma luta interna, mas logo se recompõe.
Eu assinto, tentando manter a calma. Aperto minha pequena bolsa e avanço, seguindo pelo labirinto de pessoas até a entrada. Leandro está logo ao meu lado, com uma mão levemente pousada nas minhas costas, me conduzindo com firmeza e atenção.
Os seguranças, de olhos atentos e postura rígida, checam nossos convites e nos autorizam a entrar. O convite para a boate Éden Carioca, localizada em um dos pontos mais badalados da Barra da Tijuca, é extremamente caro e difícil de se conseguir.
A pressão de nossos investigadores, que mexeram os pauzinhos certos, foi crucial para garantirmos o acesso. O local é frequentado pela alta sociedade carioca, sempre lotado, e é necessário marcar com bastante antecedência para conseguir entrar.
Rafael é um cara bem-sucedido no ramo imobiliário e costuma gastar uma fortuna por ali. Ele é um dos clientes VIPs, e sabemos que usa o lugar para fechar seus negócios milionários. A boate serve como um ponto de encontro perfeito para aqueles que desejam manter as aparências e, ao mesmo tempo, realizar negócios.
Dentro da boate, o ambiente é escuro e pulsante. Estrelas gigantes e bolas metálicas pendem do teto enquanto garotas, com os seios expostos e biquínis minúsculos, se exibem no pole dance. A parede atrás do DJ brilha com luzes que piscam em tons de azul e vermelho, e outras luzes tremeluzem, iluminando a pista de dança em flashes de branco e dourado. As mesas estão à meia-luz, com lamparinas piscando, criando uma atmosfera carregada de tensão e desejos não ditos.
Leandro se afasta de mim e, instantaneamente, sinto um leve desamparo, embora saiba que ele está me vigiando a cada passo. Eu fico parada no meio do salão, a testa franzida, procurando por Rafael Souza. A boate está lotada, mas ele tem aquele brilho, algo que o destaca da multidão.
Dante, o irmão de Rafael, também frequenta o lugar de vez em quando, mas ele tem acesso livre. Não é como Rafael. Dante não precisa de convites, e é difícil saber quando ele está aqui. Se eu me encontrar com ele, as chances são de que ele só me usará para se divertir por uma noite e depois me descartará como se fosse apenas mais uma garota. Rafael, por outro lado, tem algo que eu posso usar, algo que posso manipular para infiltrar Leandro, ou até mesmo a mim mesma, de uma maneira mais estratégica.
De repente, ouço uma voz masculina ao meu lado direito:
— Olá!
Um jovem loiro, bronzeado, o típico "playboyzinho", da minha idade — uns 25 anos — me encara com um interesse que quase me faz revirar os olhos. O som potente do funk ecoa pelo salão improvisado, e a batida de “Ela é do Tipo” reverbera no chão, fazendo todo mundo se mexer no ritmo.
— Nunca te vi por aqui. É a primeira vez? — Ele pergunta alto, tentando se fazer ouvir por cima da música.
Eu o encaro séria, respondendo no mesmo tom, sem dar abertur.a:
— Sim.
Sem interesse em prolongar a conversa, desvio dele e começo a procurar Rafael Souza com os olhos, minha mente já planejando os próximos passos.
— Você está procurando alguém? — O loiro insiste, se posicionando ao meu lado, parecendo determinado a não me deixar em paz.
Eu respiro fundo, meu pensamento focado em Leandro Almeida, e respondo sem emoção:
— Sim, um amigo.
— Quem? — Ele insiste, tentando puxar assunto, mas minha atenção já está longe.
É quando vejo Rafael. Ele está sentado em uma mesa discreta, próxima à entrada de uma área VIP. Acompanha-o um senhor mais velho, de cabelos grisalhos e olhar analítico. Rafael está relaxado, mas sua postura demonstra que ele não está ali apenas para diversão.
Ignorando o rapaz ao meu lado, pergunto diretamente:
— Você conhece Rafael Souza?
— Não pessoalmente. Mas sei que ele é bem conhecido no ramo imobiliário.
"Será que ele está envolvido na lavagem de dinheiro do irmão? Ou a imobiliária é só fachada para negócios mais sujos? É isso que estou aqui para descobrir."A música troca para uma batida ainda mais intensa, dificultando qualquer conversa. O loiro aproveita o momento e me convida:— Vamos dançar?Avalio rapidamente. Preciso passar despercebida, ser apenas mais uma convidada comum. Atrair a atenção de Rafael agora seria arriscado, mas parecer entrosada na festa é essencial.— Tudo bem.Fecho os olhos por um instante, tentando relaxar, e deixo meu corpo acompanhar a batida da música. A pista está cheia, os passos rápidos e os risos misturam-se à vibração elétrica do ambiente. De tempos em tempos, lanço um olhar discreto em direção à mesa de Rafael. Ele parece absorto na conversa, gesticulando de forma moderada, como quem expõe um argumento importante.Suspiro, voltando minha atenção à dança, enquanto o loiro ao meu lado me observa com um sorriso cada vez mais convencido. Retribuo com um
Ele me afasta, e seus olhos verdes, intensos e penetrantes, deslizam pelo meu rosto como lâminas afiadas, dissecando cada detalhe com uma precisão quase cruel. A sensação é avassaladora, como se ele estivesse tentando me decifrar por completo, arrancando segredos que nem eu mesma sabia que guardava. O peso do seu olhar queima minha pele, deixando-me exposta de um jeito que me faz querer fugir e, ao mesmo tempo, me atrai como um ímã.— Estou rindo de mim — murmuro, os lábios curvando-se em um sorriso travesso, mas há um nó na minha garganta, uma inquietação latente que não me deixa relaxar por completo. — Dançando com um desconhecido desse jeito.A risada dele, grave, profunda e envolvente, vibra em um tom baixo, quase um sussurro carregado de algo que não consigo nomear. Mas logo desaparece, sugado por uma tensão invisível, como se ele também sentisse o peso da atmosfera que se instala entre nós.— Você é diferente, mesmo. — Ele diz, e sua voz desliza por mim como uma carícia perigosa
Fico tentando manter a calma, forçando um sorriso tranquilo, mas a ansiedade ainda está clara demais.— Seu irmão? Desculpe-me, mas eu não sei quem você é, e não conheço seu irmão. Eu apenas dancei com ele, e ele não faz o meu tipo. — Tento soar casual, mas sei que falhei.Rafael apoia um braço no balcão, inclinando-se ligeiramente para mais perto de mim. O perfume amadeirado dele é diferente do de Dante, mais suave, mas ainda assim carregado de uma masculinidade inquietante.— Rafael Souza. — Ele se apresenta com um sorriso que me faz sentir como se estivesse sendo observada sob uma lente de aumento.— Rebeca Silva.— Interessante. — Ele diz, com o sorriso nos lábios, aquele sorriso intrigante, quase desafiador. — As mulheres costumam cair de joelhos pelo Dante, mas você parece... diferente.Dou de ombros, tentando afastar a tensão crescente.— Não preciso de bebida ou de homens como ele para me sentir bem.— Homens como ele? — Rafael pergunta, seus olhos azuis estreitando com uma cu
— Não, vim com um amigo.— Aquele que você estava dançando?Meu coração dá um salto no peito. Ele estava me observando antes. O calor da adrenalina percorre meu corpo.— Não. Eu o conheci aqui. Nem sei o nome dele. — Desvio os olhos, forçando desinteresse.Rafael me analisa, como se tentasse decifrar cada palavra minha.— Qual é a sua história? — Ele pergunta, inclinando a cabeça para o lado, intrigado.Eu hesito, mas logo sorrio, aproveitando a deixa para começar a construir a narrativa que preciso que ele acredite.— Por que quer saber?Ele dá um sorriso, um misto de diversão e mistério.— Como eu já disse, você não combina com esse ambiente. É como colocar um quadro da natureza em uma parede cheia de abstratos.Sinto o rubor subir ao meu rosto. Com um suspiro, decido usar a verdade para criar empatia. É mais fácil sustentar um disfarce quando ele se apoia em algo real.— Não gosto muito desse tipo de lugar — admito. — Só vim porque um amigo de infância insistiu. Ele acabou me deixa
Os olhos de Rafael Ferreira se estreitam, a curiosidade brilhando neles. Ele inclina o corpo um pouco para frente, interessado.— Então está procurando emprego?Seguro o olhar dele, lutando contra o nervosismo que cresce dentro de mim.— Sim. — Minto, a palavra saindo hesitante, mas firme o suficiente para não levantar suspeitas. Minhas mãos estão frias, e a tensão dentro de mim cresce a cada instante.Ele observa por um momento, como se ponderasse sobre a resposta. Depois, com um leve movimento de cabeça, continua.— O que sabe fazer?— Eu me formei em secretariado. — Outra mentira que desliza com facilidade, embora minha garganta pareça mais seca a cada palavra.Ele me encara, o silêncio entre nós estendendo-se. O ambiente parece diminuir, o som da música ao longe quase desaparecendo. É impossível decifrar o que se passa em sua mente, mas a sensação de estar sendo observada me deixa desconfortável. Rafael balança a cabeça devagar, como se estivesse refletindo sobre algo importante,
Rafael sorri, mas o gesto não atinge os olhos, que continuam carregados por algo entre a dor e a exaustão. Ele traga o cigarro com calma, soltando a fumaça como se quisesse aliviar o peso das lembranças que carrega. Sua voz sai rouca, baixa, carregada de mágoa e honestidade crua.— Eu e meu irmão, Dante, nascemos no Morro de Ouro. Crescemos no meio do caos. Minha mãe... ela era garota de programa antes de se envolver com meu pai. Quando se casaram, a vida virou um inferno. Ela se afundou no álcool, e ele, nos negócios ilícitos. Era violento. Um homem que achava que o respeito vinha na ponta da faca.Seus olhos perdem o foco, como se buscassem em algum canto distante um eco da infância roubada. A pausa que ele faz pesa, o silêncio preenchido apenas pelo som baixo da rua lá fora. É como se cada palavra fosse uma ferida que ele se obrigasse a reabrir.— Quando eles morreram, eu tinha 21 anos, e Dante, 19. O que restava de uma família se desfez, mas isso nos uniu. Pelo menos, por um tempo
— Preciso ir.Seu olhar segue o meu, e eu sinto o calor subir pelas minhas bochechas enquanto ele me observa. Há algo nele que é desconcertante, como se pudesse enxergar além do que eu demonstro.— Foi bom conversar com você. — Ele diz, sua voz baixa e controlada, mas os olhos se movem lentamente pelo meu rosto, quase como se tentassem gravar cada detalhe.— Eu também gostei de te conhecer. — Respondo, tentando soar casual.Levanto-me da cadeira.— Posso te levar em casa? — A pergunta vem carregada de intenção, mas não há como aceitar.— Não, eu vim com o “Ricardo” — digo, mencionando o nome falso do meu parceiro infiltrado. É então sinto a presença de Leandro ao meu lado, tão sólido e protetor, como sempre.— Podemos ir embora? — Leandro pergunta, sua voz firme, mas seus olhos analisando a cena com cautela.— Parece que você leu meus pensamentos. — Respondo, aliviada por sua chegada.Rafael se levanta também, seus movimentos lentos, quase calculados, e nos encara.— Espero vocês no s
Leandro passa a mão pelos cabelos curtos, um gesto quase frenético que revela sua frustração.— Quero que no sábado você invente uma desculpa e desista desse emprego.Meu coração dispara, e a indignação me faz reagir sem pensar.— Não! — digo, com firmeza.Leandro avança na minha direção, os olhos brilhando com algo entre raiva e desespero. Por um momento, penso que ele vai me tocar, mas ele para a poucos centímetros de mim, sua presença intimidante como sempre.— Você não percebe que está tirando minha paz de espírito?Dou um passo à frente, diminuindo a distância entre nós, e fito seus olhos com uma tentativa de suavidade. Seguro sua mão, apertando-a levemente.— O que você viveu no passado não pode afetar o seu presente. Você ficou traumatizado, Leandro, e eu entendo isso, mas não pode deixar isso controlar tudo.Ele balança a cabeça, soltando um suspiro pesado. Sua voz sai angustiada, quase cortante.— Confesso que isso pesa, sim. Mas é muito mais que isso. Você não entende! — Seu