Notei seu choque quando nosso olhar se cruzou. Não precisei invadir sua mente para saber que ele se perguntava o que eu fazia ao lado de sua noiva e claro, se havia contado para ela que o vi trepar com a cantora entre as cortinas.
— Olha quem resolveu aparecer. — Astryd disse sem muita empolgação quando Seth se aproximou da mesa. Então ele intercalou o olhar desconfiado entre a garota e eu. — O duque me fez companhia na sua ausência.
— Muito gentil da sua parte. — Ele respondeu com incômodo aparente e cerrou os dentes, evitando o meu olhar.
O mais irónico é que Seth não costumava evitar o meu olhar quando visitava o meu castelo e participava das orgias com Izevel e Keimon. Via a luxúria transbordá-lo, constantemente aguardando que eu me juntasse também.
— Darei um baile no meu castelo e adoraria a sua presença, senhorita Anghel. — disse para a garota, segurando a mão de Astryd para me despedir.
— No seu castelo? — Repetiu empolgada. O brilho de excitação tilintando em seu olhar. — Será um prazer!
— O prazer será todo meu! — respondi malicioso, intercalando indiscretamente o meu olhar entre Astryd e Seth.
Ele engoliu em seco e desviou, torcendo o lábio descontente com o convite que fiz a sua noiva. Um grande hipócrita, já que não se incomodava quando recebia o mesmo convite.
Despedi-me do casal e voltei em passos lentos para o balcão do bar que repousava outrora. Encostei-me no mármore e pedi uma dose dupla de bourbon ao barman, observando ao redor com atenção. Não havia mais o que tirar dali. Ao menos, não para mim.
Keimon, todavia, discordava. Ele estava numa mesa poucos metros à frente, conversando com os músicos da cantora.
Sutilmente, o demônio de cabelos longos e olhos negros, incitava uma briga entre eles. O álcool facilitava consideravelmente as coisas, ele sequer parecia usar de sua influência para atiçá-los. E fora discreto para jogar uma faca de lâmina extremamente afiada e brilhante na mesa deles.
O mais alcoolizado a pegou sem contestar e num ímpeto de fúria, deu uma série de golpeadas no músico ao seu lado, perfurando seu pescoço diversas vezes, até que a camisa social branca ganhasse a coloração vermelha do sangue abundante jorrando pelo buraco da ferida.
O terceiro músico, alheio ao ocorrido, fora surpreendido com uma cadeirada em suas costas pelo mesmo que atacou o primeiro com a faca. Antes que a briga ficasse pior do que já estava, Seth passou praticamente arrastando Astryd pelos braços para fora do estabelecimento. Ela parecia horrorizada com o que via, chegou a cobrir a boca e depois os olhos. Eu tive de conter a risada outra vez. Seu horror era autêntico.
A partir dali, iniciou-se uma briga violenta com todos os músicos da banda, transformando o bar numa baderna generalizada.
Izevel, assistia a tudo do outro lado do salão, sentada num sofá entre um casal. Eles acariciavam e beijavam a garota-demônio, hipnotizados pela sua áurea sexual. Mas a bagunça ao redor, acabou por despertar a outra mortal do transe.
O homem continuou tentando enfiar a mão por dentro de sua saia, alheio à balburdia, mas Izevel o rejeitou, empurrando-o para longe, como se tivesse perdido o clima. Não que ela precisasse de um.
Izevel levantou-se sem dar satisfação e seguiu até o balcão, encostando-se ao meu lado no bar.
— Humanos são tão... patéticos. — Cuspiu com desdém.
— Cuidado, Izevel. Não se esqueça de que está ao lado de um mestiço. — A lembrei, olhando-a de soslaio.
— Não, não esqueço. — Ela virou-se sensualmente na minha direção, agarrando a gravata por dentro do sobretudo negro que ia até os tornozelos. — Você não é metade deles, é inteiramente nosso. — Completou maliciosa, passando os dedos pelo meu pescoço, tentando me envolver em seu encanto.
Vadia de merda, ela sempre me drenava quando tinha a chance. Sexo nunca era apenas sexo com Izevel. Uma noite com ela, era o equivalente à três dias caminhando nos mármores do inferno; a garganta atingia uma aspereza dolorosa, como se tivesse engolido colheres de areia. Sua energia vital era sugada e toda e qualquer mínima vontade de existir, evaporava, junto com a sanidade.
Um mero mortal, manifestava um quadro de depressão grave na segunda visita da súcubo em seus sonhos. Grave o suficiente para que não houvesse socorro. Mestiços como eu, tinham a sorte de ter a mente regenerada após o ataque. Todavida, Izevel evitava sonhos. Ela preferia devorar a carne dos humanos após a foda. Prática favorita de quase todos os demônios, por sinal. Quase.
Eu preferia o sangue.
— Você não acredita realmente que vai conseguir algo com isso, não é? — Debochei, puxando a gravata dos dedos da garota de cabelos vinhos e olhos amarelos. Ela atentou-se.
— Já consegui tantas vezes. Você se recupera rápido, devia usufruir mais disso. — Sugeriu como se realmente se importasse com o que eu ganhava, e não ela.
Arqueei uma sobrancelha em desdém.
— O que conversava com aquela humana suja? — Sua fala soou mais agressiva do que o habitual. Ela não simpatizava com a maioria deles, não se importava em ter de matá-los. Mas os puros, como Astryd Anghel, a irritavam ainda mais.
— Ora, Izevel. O que te faz pensar que é da sua conta? — Debochei. Izevel fechou a cara no mesmo instante, enfurecida com a resposta.
— Poderia levá-la para os fundos do bar de uma vez se a queria tanto. — Resmungou.
— Os fundos estavam ocupados por Seth e pela nossa deliciosa cantora. Você não viu?! — Expliquei. Ela revirou os olhos. — O que você acha que sou, um destruidor de lares? — Debochei.
Capítulo dois.Astryd Anghel. O caminho de volta para a mansão da minha família fora silencioso. Me perdi em pensamentos, relembrando da conversa com o estranho misterioso. Bem, não tão estranho e misterioso assim. O Duque era conhecido entre a elite Romena, mesmo que eu nunca o tivesse encontrado pessoalmente. Pouco se sabia sobre sua vida pessoal, mas sua fortuna e influência eram tão comentados quanto sua beleza de tirar o fôlego. Os cabelos claríssimos, ondulados e levemente bagunçados, mais os olhos cinzas com pigmentos em vermelho, tinham seu charme, mas, o que roubava a atenção de fato, era sua forma excêntrica e elegante de se vestir, junto à sua pose arrogante e o ar de superioridade, como se soubesse todos os segredos da humanidade e que, de alguma forma, era superior a todos nós.Seth estacionou o carro na frente da mansão e desligou o motor, virando-se na minha direção.— O que conversava com o duque? — sondou, tentando ocultar sua insegurança, mas não teve sucesso com iss
Assustadoramente, mamãe começou a engasgar e gargalhar ao mesmo tempo. Eu prendi o fôlego. Não podia ter uma crise tola de pânico agora, tinha que ajudá-la. Corri na direção da mamãe e toquei em seus ombros, tentando trazê-la para o sofá. Não fora fácil, ela tropeçava em seus próprios pés.— Mamãe, o que houve? — A coloquei sentada na poltrona mais próxima, me abaixando em sua frente. — Alguém machucou você? — ela gargalhou mais alto e assentiu, balançando a cabeça sem parar. — Q-uem? Quem fez isso com você? — limpei a garganta e perguntei assustada.— A mesma que fará com você. — respondeu sombria. Eu me arrepiei inteira e meus músculos tensionaram. Aquilo soou como uma ameaça. Para o meu desespero, ela começou a chorar copiosamente logo após, sem parar de jorrar sangue pela boca, mas não havia nenhuma ferida. Aquilo não fazia sentido. O que estava acontecendo com ela?— Fique aqui, está bem? Vou chamar o médico. — Avisei, me levantando depressa e correndo para fora do cômodo.Escorr
Virei três copos em sequência. Foi tão rápido que a ardência sequer me incomodou. Caminhei então para a área da piscina, sentando-me sozinha numa das mesinhas cobertas na parte mais isolada do clube.— Outra vez sozinha, senhorita Anghel? — Ouvi a voz do duque à minha frente.Ele estava impecável, como na noite anterior. Agora seu terno não era negro, mas branco, e por baixo dele, usava uma camisa social da mesma cor, sem gravata e com alguns botões abertos, num visual um pouco mais despojado, mas ainda, extremamente elegante. Não usava luvas dessa vez.— É o que parece. — Dei de ombros, abrindo um sorriso fraco.— Se importa? — Puxou uma das cadeiras na minha frente e respondi com um sinal negativo, então ele se sentou. — Estou começando a achar que é uma mulher solitária. — Declarou.Você nem imagina. Ele arqueou as sobrancelhas como se escutasse o que eu pensei.— Posso fazer alguma ideia. — Então respondeu, me surpreendendo.— Ideia do que? — cerrei os olhos.— De quão solitária é
Como imaginei, Leonard não resistiu à tentação de me seguir. Contive a risadinha nervosa e continuei caminhando despretensiosa pelo clube em direção do hotel. Os corredores pareciam labirintos, era fácil se perder ali dentro, mas não para mim, que o conhecia com a palma da mão. Frequentava aquele clube desde criança, lembro-me de brincar e correr por todo ele enquanto meus pais bebiam e jogavam no cassino.Encostei na parede entre os banheiros para tentar me esconder de Leonard, mas por algum milagre, ele havia chegado lá primeiro. Uma de suas mãos cobriram minha boca e a outra me puxou pela cintura, colidindo minhas costas contra o seu peito. Ele se recostou na parede atrás, fazendo com que sumíssemos de vista.— Privado o suficiente pra você agora? — Sussurrou no meu ouvido, roçando seus lábios na minha orelha. Outra vez me arrepiei, mas agora o motivo era seu hálito quente perto demais.Virei-me bruscamente na sua direção e o empurrei contra a parede, o afastando de mim.— Acho que
— Acalme-se, quero um momento a sós com você. — Apontou para a cama.— Então abra a porta! — exigi, me recusando a sentar. Pelo contrário, me mantive o mais longe possível da cama.Ele riu pelo nariz e revirou os olhos, sentando-se na cama indiferente ao meu desespero.— Me disseram lá embaixo que já está de casamento marcado. Os boatos são verdadeiros?Semicerrei os olhos, atenta.— Receio que sim.— Uma pena. — Ele suspirou, encostando as costas no apoio da cama. — Pretende levar isso para frente?— A não ser que tenha uma ideia melhor para me salvar, temo não ter saída. — Disse com deboche, mesmo que ansiasse para que ele tivesse algum plano de resgate mirabolante.Como se ele se importasse...— Por que a pergunta? Você já sabia que eu estava noiva. Vai me dizer que agora se importa com o meu status de relacionamento?— Não me importo. — Disse simplista. Pelo menos era sincero... Um pouco sincero demais. — Mas me importo com o seu bem-estar. — Completou pensativo. — Bem, mais ou me
— Acalme-se, quero um momento a sós com você. — Apontou para a cama.— Então abra a porta! — exigi, me recusando a sentar. Pelo contrário, me mantive o mais longe possível da cama.Ele riu pelo nariz e revirou os olhos, sentando-se na cama indiferente ao meu desespero.— Me disseram lá embaixo que já está de casamento marcado. Os boatos são verdadeiros?Semicerrei os olhos, atenta.— Receio que sim.— Uma pena. — Ele suspirou, encostando as costas no apoio da cama. — Pretende levar isso para frente?— A não ser que tenha uma ideia melhor para me salvar, temo não ter saída. — Disse com deboche, mesmo que ansiasse para que ele tivesse algum plano de resgate mirabolante.Como se ele se importasse...— Por que a pergunta? Você já sabia que eu estava noiva. Vai me dizer que agora se importa com o meu status de relacionamento?— Não me importo. — Disse simplista. Pelo menos era sincero... Um pouco sincero demais. — Mas me importo com o seu bem-estar. — Completou pensativo. — Bem, mais ou men
Acordei em meu quarto, na mansão Anghel. Percorri o olhar por todo o ambiente, tentando reconhecê-lo o mais depressa possível e confirmar se aquilo havia sido apenas um sonho ruim.Com dificuldade, me levantei da cama, recebendo as memórias de todo o ocorrido da noite passada. Um frio na espinha percorreu meu corpo e corri na direção do banheiro.Arranquei todas as minhas roupas, conferindo onde estavam os hematomas. E não havia mais nenhum. Exceto uma pequena cicatriz no formato de uma estrela no pulso.No modo automático, vesti-me e sentei na cadeira da cômoda para pentear os cabelos. Meu olhar estava perdido, era como se eu fosse uma hóspede no meu próprio corpo.Eu me sentia completamente... Oca.Atentei-me ao colar desconhecido ao lado da escova de cabelo, só então, reparei na carta que o acompanhava.Quebrei o selo do envelope e retirei a carta de dentro dele... Ela estava completamente em branco.Uma interrogação formou-se na minha cabeça. Quem mandaria uma carta em branco?Ant
Capítulo três.Leonard Scorpius. Joguei o cigarro dentro da lareira, sentindo o olhar de Keimon sobre mim. Ele estava na sua forma de lobo, analisando-me silenciosamente sentado pouco à frente com uma postura impecável como se fosse um cão adestrado. Até parece. Vira-lata dos infernos, a sua obediência equivalia a de uma miniatura humana, birrenta e pavorosa, popularmente conhecidas nessa dimensão como crianças. Não havia muitas delas no inferno. Eram entediantes demais para pararem lá.— O que você quer? Está começando a me incomodar! — resmunguei, ajeitando as luvas curtas de couro sobre as mãos.Ele latiu e saiu do ambiente, deixando-me, finalmente, em paz.Não precisava dos seus julgamentos. Eu sabia o que estava fazendo.Ajudar os humanos não fazia parte da minha tarefa. Eu sei. Nunca os ajudaria de bom grado. Keimon devia saber. Eu os condenava ao fogo eterno, não os poupava.Ninguém que cruzava meu caminho era poupado, nunca. Mas esses demônios estúpidos não me deram alternativ