CAPÍTULO 1: COBIÇA DOS TEUS OLHOS (1)

Clarisse Grigio

No princípio custei a acreditar, contudo, isso realmente estava acontecendo? Encarei a mão solitária de Alfonso repousando no ar enquanto aguardava a minha resposta.

“Prometo acompanhar você até o altar” — refleti sem desviar os meus olhos do seu par de safiras que apesar da tonalidade, para mim, os seus olhos se assemelham a ondas durante uma tempestade em alto mar.

Levo algum tempo para decidir qual seria a melhor decisão a se tomar naquele momento, pois, independente da minha escolha nenhuma das alternativas era favorável e se tratando de Alfonso, não havia segurança de que no final, o resultado seria satisfatório para mim.

Respiro fundo e apertei o tecido do vestido em meus dedos.

— Que garantia tenho que você vai cumprir com sua palavra? — questionei por impulso, Alfonso sorriu torto.

— A sua única garantia é a minha palavra e como disse, sou um homem que cumpre suas promessas. — Alfonso retrucou. Seus músculos da face se contraem enquanto engulo seco tentando avaliar melhor o cenário. A contragosto, preciso concordar em aceitar sua proposta. Mesmo que houvesse motivos ocultos em suas palavras camufladas pela incerteza, esta é a minha oportunidade de sair do quarto e fugir.

Uma fagulha de incerteza esvai pelo vapor liberado pelos meus lábios.

— Muito bem, Alfonso… leve-me até o altar. — não vacilei em alcançar a sua mão, contudo, o arrependimento domina o meu corpo quando Alfonso decide reagir a minha iniciativa receosa. Reivindicando meu corpo para si, nossos corpos se chocam pelo ímpeto do movimento.

Os olhos afiados me encaram de uma forma opressora, contudo, nenhum de nós profere palavra. Os seguranças que estavam no quarto deixaram o local, de soslaio, acompanhei as sombras de moverem uma a uma até que restasse somente Alfonso e eu no quarto.

Não tenho consciência do período que nos mantivemos naquele conflito, porém, Alfonso foi o primeiro a deixar o quarto e eu o imitei, seguindo logo atrás dele.

“O que exatamente estou fazendo?” — questiono enquanto sigo os passos de Alfonso rumo ao destino desconhecido. Mesmo que já tenha estado na mansão, não tinha noção da profundidade e extensão do lugar, como a quantidade de corredores que mais se assemelham a um labirinto cujo objetivo é tragar o indivíduo em seus caminhos tortuosos e enigmáticos. Assim como a atmosfera opressora contribui para construção desse cenário desconfortável.

Os seguranças, assim como eu, seguem o trajeto traçado por Alfonso que caminha alguns metros à nossa frente. Conforme o meu corpo se move, tento não pensar muito em Alfonso, ao invés disso, busco disfarçadamente por alguma brecha para que eu possa correr, contudo, antes que eu pudesse me dar conta, os meus passos são interrompidos, pois havíamos chegado ao nosso destino.

Sem nenhum esforço Alfonso abriu as portas duplas à sua frente. Mesmo que no começo eu não estivesse verdadeiramente interessada nas palavras de Alfonso, a partir de agora, seria diferente. Se antes eu especulava que ele havia passado dos limites, agora tenho certeza, pois a imagem diante dos meus olhos são a prova viva que Alfonso havia estipulado todos os limites, possíveis e inimagináveis.

— O que significa isso? — foi uma pergunta retórica, eu sei, porém, foi feita sem consciência. 

A alguns metros à minha frente estava o meu irmão mais velho, Gabriel, de joelhos ao lado de um altar com dois homens mantendo-o no lugar. Minhas sobrancelhas caíram pelo desespero ao ver o seu corpo coberto por feridas e hematomas. Seu rosto, mesmo estando distante era possível perceber o corte em seu cílio, como os demais machucados que faziam o meu rosto virar para não contemplar. O cenário era perturbador e pela primeira vez na vida, temi pelos desdobramentos a seguir. Pois dependendo das minhas ações, tinha certeza que seria o fim do meu irmão como também o meu. Se alguma vez houve dúvidas, hoje já não existem!

Pelo pavor os meus joelhos vacilaram e meu corpo sucumbiu ao chão.

— Te disse ser um homem de palavra Clarisse e cá estamos. — Alfonso retrucou sem se afastar. Uma sensação ruim atinge o meu coração e levo minha mão ao peito — Recentemente descobri que o seu irmão estava roubando a minha fazenda e ironicamente, essa oportunidade surgiu como um presente em minhas mãos.

O amargor em minha garganta fez a minha saliva deslizar com dificuldade. 

— Oportunidade? — rangi os dentes erguendo minha cabeça para encará-lo mesmo de joelhos ao chão — Você está dizendo que o estado do meu irmão é o fruto dessa oportunidade?

Alfonso pareceu divagar por alguns segundos e assentiu abaixando o corpo diante da minha face.

— Você se lembra daquela noite? — Alfonso segurou meu queixo com certa força. Seu polegar apertou meu queixo com prescrição, marcando bem o local — Me recordo de ter deixado claro o meu desejo por você e que não mediria esforços para ter você.

— Seu… 

— Por bem, ou por mal. — liberando o meu queixo, Alfonso se afastou.

Acompanhei seus sapatos italianos, um após o outro, Alfonso caminhou se aproximando de Gabriel.

A atmosfera angustiante ao meu redor me engoliu.

Em meus ouvidos não conseguia ouvir nada além da voz rouca de Alfonso.

Meus lábios tremeram conforme minha mente me afligia com as memórias de todos os esforços de Alfonso nesses últimos meios e agora, ao chão contemplava o meu irmão que mal conseguia respirar.

Parado de costas para mim e com as mãos aos bolsos, Alfonso encarava o estado deplorável de Gabriel.

Havia algo que pudesse ser feito? Conclui que não.

Durante o percurso até a mansão me lembro de ter respirado fundo e observar que o veículo seguia pela estrada sem movimentos bruscos, resultando na única resposta: ninguém estava seguindo o veículo, nem Nicolas ou a polícia. Ou seja, ninguém virá nos salvar.

Recolhendo as migalhas do meu orgulho eu as engolir uma a uma.

Em silêncio desviei o meu olhar de Gabriel, pois caso contrário, não conseguiria fazer o que precisava ser feito.

Parada ao lado de Alfonso, observei ele fazer sinal para um dos seus seguranças da mansão que, parado a porta deixou o lugar.

— Estou satisfeito que você tenha optado pela melhor escolha. — sua voz soou como sarcasmo aos meus ouvidos.

— Depois disso quero que liberte o meu irmão, afinal terá o que tanto deseja. — retruquei forçando os meus lábios a se manterem fixos no lugar, assim como as lágrimas para não deslizarem como cascatas.

De repente a porta à nossa direita é aberta surgindo um homem alto de fios brancos que eu infelizmente conhecia perfeitamente bem. O senhor Edgar arregalou os olhos conforme se aproximava do altar à nossa frente, porém o olhar de Alfonso o fez seguir em silêncio.

— Devo aguardar mais alguém ou posso dar início à cerimônia? — Edgar questionou com hesitação, sua voz ecoando no silêncio carregado da sala. O ar estava pesado de emoções não ditas e o peso do momento me pressionava como uma tempestade prestes a eclodir.

De soslaio percebi Alfonso me encarando, seu olhar cheio de intensidade, mas não lhe dei o prazer de corresponder ao seu movimento. Em vez disso, tentei reunir a coragem necessária para enfrentar o que estava por vir. O coração batia descompassado e uma onda de incerteza invadiu minha mente.

— Entendo. — Edgar engoliu em seco e abriu a pasta em suas mãos, suas folhas amareladas refletindo a luz fraca do ambiente. — Vamos dar início à cerimônia de casamento entre Alfonso Albuquerque e Clarisse Grigio.

Aquelas palavras reverberaram em meu peito como um sino de alerta. Uma mistura de ansiedade e expectativa me envolveu e o que deveria ser um momento de alegria parecia mais uma armadilha. O que realmente significava dizer “sim” a Alfonso? Enquanto Edgar começava a recitar as palavras formais, meu olhar vagou novamente para Alfonso. Havia algo em seu sorriso que não me parecia certo, uma sombra de segredos que pairava entre nós.

E naquele instante, enquanto a cerimônia prosseguia, uma pergunta inquietante surgiu em minha mente: será que eu realmente conhecia tudo sobre Alfonso ou havia algo além dos rumores? Quem realmente era o homem com quem estava prestes a me unir? Será que havia algo mais obscuro escondido? A sensação de que algo estava prestes a acontecer me deixou em alerta. Afinal, em um mundo onde as aparências podem enganar, eu precisava estar pronta para o inesperado.

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