Clarisse Grigio
Adentro o quarto com o misto de sentimentos conflitantes em meu coração. No momento que o juiz de paz declarou que Alfonso e eu estávamos casados, quis que um abismo fosse aberto debaixo dos meus pés. Como se a ansiedade não fosse suficiente, precisava me preparar para a consumação do casamento. Deslizei as alças do vestido sem dificuldade pelos meus braços. Mesmo que agora o ideal fosse receber ajuda, não é de uma pessoa para me despir que necessito e pelo contrário, preciso de forças para seguir adiante. Encaro o anel de diamantes no meu anelar e o peso desse objeto faz o meu coração pesar. Não era dessa maneira que planejava encerrar esta noite, não, era para Nicolas e eu estávamos embarcando em uma viagem de lua de mel para Fernando de Noronha, mas agora, preciso encarar minha nova realidade. Nisto preciso focar de agora em diante. — Se acalme Clarisse… tudo dará certo! — digo em voz alta tentando me convencer que Nicolas agora é passado, mesmo que os meus planos fossem ser sua esposa, agora estou oficialmente casada com Alfonso e quando a notícia vier a público, duvido que Nicolas ou as outras pessoas entendam. Porém, não há mais nada que possa ser feito. Dizer essas palavras em voz alta me dão força para terminar de me desfazer o vestido de noiva que parece ter perdido a magia e brilho que tanto projetei neles. Mesmo que jamais esqueça esse momento, o tecido segue tendo um dia pertencido a minha mãe, por isso dobro com carinho e coloco-o no banco do banheiro. Deslizo o robe lilás pelo meu corpo e amarro o laço diligentemente enquanto minha mente divaga. Com os olhos fixos no céu, reflito sobre a vulnerabilidade da vida. Suspiro pesadamente e sinto o desejo de imortalizar aquele momento de calmaria, porém uma fragrância no local chama minha atenção. Por reflexo, viro o meu rosto e trombo a face com algo firme, porém, macio. — Humm. — murmurei ao sentir o peitoral de Alfonso rente a minha face. Suas mãos seguram com firmeza minha cintura e sinto a eletricidade percorrer todo o meu corpo. Pelo desconforto, desvio o olhar engolindo seco e murmuro: — Você chegou antes do combinado. — retruquei. Após a cerimônia consegui trocar algumas palavras com meu irmão, mas Gabriel não respondia minhas perguntas. Porém, como havia prometido, uma equipe de médicos surgiu deslocando o seu corpo para um dos quartos de hóspedes da mansão onde ele receberia tratamento. “Não há motivos para se preocupar, Clarisse. Gabriel ficará bem!” — tento convencer a mim mesma. Mesmo que o meu coração esteja aflito, ironicamente confiarei nas palavras ditas pelos médicos. Alfonso se mantém em silêncio e se afasta caminhando até próximo da porta onde se serve de uma bebida que parece ser vinho. Agora que ele está distante, posso observar o seu corpo por completo. Vestindo um robe preto com detalhes bordados nas bordas do tecido com linha branca, posso contemplar sua silhueta masculina. Seus cabelos densos e lisos como obsidiana estão parcialmente úmidos, assim como sua pele levemente bronzeada escorrem gotículas de água por sua pele. Abraço meu corpo quando Alfonso se aproxima novamente com dois copos em suas mãos. Sua atitude silenciosa, nada hostil e dissimuladamente carismática me causa irritação. Onde está aquele sorriso debochado e arrogante? Meu coração palpita pela ansiedade e meu rosto arde ganhando uma tonalidade avermelhada. — Beba. — Alfonso sugeriu erguendo o copo na altura da minha boca. Umedeço os meus lábios e decido aceitar. Viro o conteúdo do copo contra meus lábios de uma vez e o líquido desliza pela minha garganta fazendo me sentir estranha, mas não de uma forma negativa. — O-Obrigada. — sussurrei entregando o copo para Alfonso. Observo meu marido se afastar e voltar rapidamente. Cortando o espaço entre nós, Alfonso me encara prendendo o meu corpo entre ele e a cômoda atrás de mim. Uma brisa gélida entra pela janela da varanda do quarto onde estamos, aumentando a atmosfera tensa e excitante entre nós que mantemos os nossos olhos fixos um no outro. — Está nervosa? — sua voz soou como um enigma, mesmo desejando mentir, não fiz. — Um pouco… — sussurrei fitando seus lábios grossos e rosados umedecendo pela ponta da sua língua. Oscilando entre seus lábios e olhos, respirei fundo recuperando o fôlego — Quero consumar o nosso casamento. — ofeguei — A palpitação no meu peito está me torturando, assim como a tensão no meu ventre… eu só quero que esse formigamento acabe logo. — confesso esfregando minhas coxas uma na outra. Um sorriso sutil surgiu nos lábios de Alfonso, ele se aproximou cortando o espaço entre nossos corpos. Conforme o seu corpo se moveu eu quis perguntar o significado do seu sorriso, porém desisti preferindo fitar os movimentos do seu corpo. — Tem certeza disso? — Alfonso retrucou deslizando os dedos pelos meus fios. Sua canhota deslizou pela minha coluna envolvendo minha cintura com possessividade — Tem certeza que não está nervosa? — Alfonso beijou meu ombro e se afastou para me encarar — Posso me mostrar um homem extremamente paciente se for necessário. Posso te tratar com carinho e beijar seus pés se você pedir. Basta que você peça… Clarisse. Como Alfonso distribuiu as palavras, fez meu corpo eriçar e minha mente embalar no ritmo da sua voz rouca e arrebatadora. Se antes o meu corpo formigou de desejo, agora estremeço com o seu sussurro rouco rente os seus lábios nos meus. — Faça isso. — implorei completamente entregue em seus braços fortes. O seu cheiro inundou minhas narinas nublando minha mente pelo desejo. Sedento pelo toque da minha pele, o seu rosto deslizou por todo o meu corpo conforme suas mãos dedilharam minha pele. — Está confiante a este ponto? Interessante. — Alfonso provocou. O encarei. — Estou. — minha resposta fez o seu sorriso aumentar. Suas mãos deslizaram pela lateral do meu rosto e emaranhavam-se no interior do meu cabelo. O movimento não se resumiu em aprofundar os dedos na raiz do meu couro cabeludo, como também aproximar os nossos rostos até Alfonso selar os seus lábios com os meus. O ato não correspondeu às minhas expectativas, pelo contrário, as superou. Seu beijo foi como o despertar de uma explosão de sensações que eu não estava preparada para sentir. Cada toque de seus lábios nos meus parecia dissolver as barreiras que eu havia construído e momentaneamente, o mundo ao nosso redor desapareceu. As dúvidas que me atormentavam, o peso do anel em meu dedo, a culpa e a dor que eu carregava se tornaram insignificantes diante da intensidade daquela conexão. Por hora, me entregaria ao momento sem me importar com as possíveis consequências na minha vida e no meu coração.[ALGUNS MESES ANTES]Clarisse GrigioAmanheceu nublado como no dia anterior. Por um instante posso desfrutar dessa sensação refrescante antes de retornar a rotina. Com os meus olhos fechados, aprecio os segundos, antes que eu retorne para a minha programação original.A brisa aconchegante que vem do corredor esvoaça os meus fios que caem como cascata em meus ombros. Por impulso, pego uma das minhas mechas e as levo até o nariz, um ato simples que sempre me faz pensar no meu amado, Nicolas.— Crianças, o intervalo terminou! — escuto uma voz bem distante, provavelmente da coordenadora do turno da manhã anunciando o final do recreio das crianças. Sorrio pensando nos pequenos que sempre retorcem a face em frustração e volto a caminhar pelo local.Cumprimento algumas crianças que me reconhecem enquanto sigo o meu caminho rumo a sala dos professores. Porém, antes que eu consiga girar a esquerda observo uma movimentação estranha, como um vulto alguns metros à minha frente.Impulsionada pela
Clarisse Grigio— Clarisse? — Sabrina me chamou. Eu a encaro e os seus olhos estão repletos de curiosidade e expectativa.— N-Nada. — desconversei levantando da cadeira. Era hora de ir embora ao invés de dar lugar a rumores que nada tem a ver comigo ou com a minha família — Preciso ir para casa, até amanhã meninas.Me despeço como o habitual enquanto envio uma mensagem para Nicolas, mas ele não responde. Provavelmente por estar envolvido com os assuntos do escritório de contabilidade do seu pai.Após a formatura eu consegui arrumar um trabalho como professora na escola do fundamental I, enquanto Nicolas seguiu os planos da família que é atuar como contador, dando seguimento aos negócios do seu pai que possui uma empresa de contabilidade no centro de Campos.Peço um carro no aplicativo que rapidamente chega e me deixa em frente a minha casa. Um prédio comercial de quatro apartamentos que consigo pagar dividindo as despesas com o meu irmão.Quando os nossos pais faleceram, ficamos eu e
Clarisse GrigioAcordo de repente com uma sensação angustiante em meu peito. Levo minhas mãos até o rosto para ter certeza que o realmente o local onde estou é real.— Foi um sonho. — digo em voz alta tentando me convencer de que as sensações ainda presentes em minha pele e em minha mente não são reais.Eu estava presa completamente absorta nas mãos de homens estranhos. Eles me levavam para um lugar muito longe e frio, eu não queria estar lá e por mais que eu quisesse gritar, eu não tinha voz para clamar por socorro.Levanto e rapidamente adentro o banheiro do meu quarto. Ligo o chuveiro deixando a água gelada cair por todo o meu corpo, lavando os meus fios longos que cobrem meus ombros como um véu.A água gélida cai sobre minha pele como pequenos cubos de gelo, levando embora consigo o medo incrustado em minha pele por conta do pesadelo vivido.Não demoro mais do que o suficiente debaixo da água, pois preciso trabalhar. Pesadelos vêm e vão, mas não posso deixar que isso atrapalhe a m
Clarisse GrigioEnquanto me perdia em pensamentos, a lascívia se infiltrou em minha mente como uma sombra indesejada, despertando uma curiosidade ardente que eu mal conseguia compreender. O meu coração palpitante se afundou no cenário à minha frente. Levo minha mão aos lábios por impulso, pensando se era assim que me sentia ao estar nos braços de Nicolas. A sensação de querer explorar o desconhecido se tornava um pensamento intrusivo, dançando entre a inocência e o desejo. Eu me perguntava como seria sentir a pele de Nicolas contra a minha, o sussurro de suas palavras carregadas de promessas e a eletricidade do seu toque incendiando todo o meu ser. Por que eu não tenho esse tipo de experiência com ele? Nós não deveríamos ter esse grau de intimidade? Será que o meu corpo não é atrativo o suficiente para Nicolas?O mero pensamento me assolou por completo.Em minha mente, uma luta interna entre o desejo reprimido e a pureza que eu tanto tentava preservar pareceu se perder por conta de
Clarisse Grigio— Clarisse! — Isabella abriu os braços correndo na minha direção. O nosso abraço foi tão prazeroso que fez parecer que nós não nos encontrávamos há anos.— Isa… eu também senti saudades. — proferi quase sem fôlego pelo seu abraço de urso.— Vem! Eu estava esperando você chegar, tenho algo para te contar… — Isa proferiu com uma voz baixa e misteriosa.— Mas… e a livraria? Só tem nós duas aqui? — Isabella assentiu caminhando até a porta do local — Amiga, mas e os seus pais? — questionei preocupada. Mesmo que a loja seja um empreendimento pessoal, não quero que ela se prejudique com a minha presença.— Relaxa amiga, a loja é minha e eu fecho quando quiser. — Isabella retrucou piscando um dos olhos.Maneio a cabeça em sinal de negação, mas isso não é o suficiente para parar Isabella Baltazar. Após virar a placa indicando — fechado para almoço! — seguimos para o interior da livraria.— Como foi a viagem até São Paulo? Conheceu o seu honorável web namorado? — perguntei cheia
Alfonso AlbuquerqueCom um olhar desdenhoso, me encosto na parede, observando a cena diante de mim como um espectador entediado em um teatro de excessos.A atmosfera pulsa com a energia frenética dos corpos se entrelaçando, mas para mim, tudo não passa de um espetáculo repetitivo e previsível. A minha arrogância transborda em cada movimento, como se a minha simples presença fosse suficiente para elevar a banalidade da presente orgia a algo mais intrigante.Enquanto os gemidos e risos ecoam ao meu redor, eu me sento como um príncipe em um reino de plebeus, alheio à entrega desenfreada que me cerca, pois estou perdido em meus próprios pensamentos sobre o que realmente tem valor.Atravesso os corpos ao meu entorno, conforme caminho rumo a varanda do térreo. A lua resplandecente reina diante da noite profunda e estrelada. O céu em sua profundidade esconde a verdade escondida nas mentes dos meros mortais durante o crepúsculo.— Senhor. — a voz de Rys me desperta dos meus devaneios — Devo e
Clarisse GrigioA escuridão envolvia o meu corpo como um denso manto, e eu estava perdida em um pesadelo que parecia se estender para sempre. Corria por um corredor interminável, cada passo mais pesado que o anterior, enquanto a sensação de que alguém me seguia se tornava cada vez mais opressiva. Densas lágrimas escorrem por todo o meu rosto conforme o eco de passos atrás de mim ressoava em meus ouvidos e uma onda de pânico se arrasta pela minha espinha. O ar estava denso, quase impenetrável e o meu coração batia descompassado, como se quisesse escapar do meu peito. Eu olhava para trás, mas a escuridão parecia engolir tudo, impossibilitando ver quem — ou o que — estava me perseguindo. Então, de repente, um barulho ensurdecedor cortou a névoa do meu sonho, como um trovão em um céu claro. Meu corpo estremeceu, e eu acordei com um sobressalto, o coração ainda acelerado, enquanto o eco do estrondo reverberava em minha mente. O som vinha da sala, uma batida forte e insistente que me fez s
Nicolas AbreuO relógio na parede marcava os últimos minutos do meu expediente, e a luz suave do pôr do sol filtrava-se pelas persianas, lançando sombras longas sobre a mesa de trabalho. O cheiro do café frio ainda pairava no ar, misturado ao odor de papéis amarelados e a leve essência de notas de contabilidade, que sempre me lembravam dos dias intermináveis passados naquele escritório. Olhei em volta, observando o caos organizado de relatórios e formulários que dominavam minha mesa, cada um deles representando horas de trabalho árduo e a pressão constante de atender às expectativas do meu pai. Era um ambiente que, embora familiar, começava a se sentir sufocante, como se as paredes estivessem se fechando ao meu redor. A ideia de deixar tudo isso para trás me fazia sentir uma mistura de alívio e culpa; enquanto muitos sonhavam em herdar o legado da família, eu ansiava por algo diferente, algo que me permitisse respirar livremente. Com um último olhar para a tela do computador, onde as