Quando o carro parou em frente a uma casa que parecia ter saído diretamente de um filme de máfia, minha mente ainda estava a mil. A mansão era imensa, com colunas imponentes e luzes quentes iluminando a fachada, mas não havia como ignorar os seguranças estrategicamente posicionados. Eles estavam às claras, como se quisessem lembrar a todos que aquele lugar não era para ser invadido. Cada detalhe exalava poder, mas também perigo.
Leonardo – sim, foi assim que descobri o nome dele – desceu do carro com uma calma que fazia meu estômago revirar. Ele não era apenas um homem de terno; ele era uma força da natureza, e parecia saber exatamente o impacto que causava em qualquer ambiente. Enquanto eu lutava para não tropeçar ao descer do carro, ele me lançou um olhar curioso, quase divertido, como se estivesse esperando algo de mim.
— Bem-vinda à minha casa, Beatriz — ele disse, com um leve sorriso nos lábios. — Espero que você se sinta… segura aqui.
Segura? Não havia nada naquele cenário que gritasse segurança. Eu estava em um lugar desconhecido, cercada por estranhos armados, sob o comando de um homem que, pelo que eu havia percebido, poderia decidir o meu destino com um estalar de dedos. Mas, em vez de discutir, apenas assenti, porque algo me dizia que contestá-lo não era uma opção inteligente.
Dois homens enormes se aproximaram e ficaram ao meu lado, claramente à espera de instruções. Leonardo ergueu a mão, dispensando-os, e virou-se para mim.
— Você é minha convidada. Eles não vão incomodá-la, a menos que você dê motivo para isso. Agora, venha.
Entrei na mansão seguindo seus passos, tentando ignorar o olhar curioso dos seguranças. Por dentro, a casa era ainda mais impressionante. O piso era de mármore, os lustres brilhavam como joias, e cada móvel parecia ter sido escolhido a dedo para combinar com o ambiente. Tudo era impecável, mas também carregava um peso, como se cada canto contasse uma história que eu preferia não conhecer.
Ele me conduziu até uma sala ampla, onde uma lareira acesa iluminava o espaço com uma luz suave. As janelas eram enormes, mas as cortinas pesadas estavam fechadas, criando uma atmosfera de isolamento. Leonardo se sentou em uma poltrona de couro, cruzando as pernas com elegância, e fez um gesto para que eu me sentasse no sofá em frente a ele.
— Antes de mais nada, preciso que você entenda algo, Beatriz. Eu não costumo ser tão… benevolente. A maioria das pessoas que se encontram na sua posição não tem uma segunda chance.
Engoli em seco, sentindo um frio na espinha.
— Por que você me deu uma? — perguntei, minha voz mal saindo.
Ele apoiou os cotovelos nos braços da poltrona e juntou as mãos, olhando para mim com intensidade.
— Porque você é diferente. A maioria das pessoas que cruzam o meu caminho são falsas, interessadas apenas no que podem ganhar. Mas você… você é um livro aberto, Beatriz. E isso me intrigou.
Eu não sabia se aquilo era um elogio ou uma condenação. Antes que eu pudesse responder, ele continuou:
— A partir de agora, você ficará aqui. Você está sob minha proteção. Ninguém vai machucá-la, desde que você não me dê motivos para mudar de ideia.
— E quanto tempo eu vou… ficar aqui? — arrisquei perguntar.
Ele sorriu, mas novamente aquele sorriso não alcançou os olhos.
— O tempo que for necessário.
Eu queria protestar, queria dizer que aquilo era loucura, que ele não podia simplesmente me manter ali contra a minha vontade. Mas havia algo na maneira como ele me olhava que fazia minhas palavras morrerem antes de serem ditas. Leonardo não era o tipo de pessoa que você desafiava sem pensar duas vezes.
Naquela noite, fui levada para um quarto no andar de cima. Era maior do que o meu apartamento inteiro, com uma cama enorme e lençóis que pareciam mais macios do que qualquer coisa que eu já toquei na vida. Havia uma janela que dava para um jardim, mas, como esperado, havia também grades que me lembravam que eu não era exatamente uma hóspede.
Por horas, fiquei sentada na cama, tentando processar tudo o que havia acontecido. Era surreal. Em questão de horas, minha vida havia sido virada de cabeça para baixo. Eu não sabia quem era Leonardo, mas estava claro que ele era perigoso. Ainda assim, havia algo nele que me intrigava. Talvez fosse o contraste entre a frieza de suas ações e a maneira quase gentil como ele falava comigo.
Nos dias que se seguiram, minha rotina na mansão foi estranha. Eu não tinha permissão para sair do quarto sem ser escoltada, mas também não era tratada como prisioneira. As refeições eram servidas no meu quarto, e sempre eram pratos elaborados que me faziam sentir como uma rainha – ou como uma prisioneira mimada.
Leonardo me visitava com frequência, mas nossas conversas eram sempre enigmáticas. Ele gostava de me observar, como se estivesse tentando desvendar um segredo que nem eu mesma conhecia. E, aos poucos, eu percebi que também estava observando-o. Havia algo nele que eu não conseguia ignorar, algo que me fazia querer entender quem ele realmente era.
Certa noite, enquanto eu estava sentada perto da janela, olhando para o jardim iluminado pela lua, ele entrou no quarto sem aviso. Ele fazia isso com uma naturalidade irritante, como se aquele espaço não fosse meu – o que, tecnicamente, era verdade.
— Você parece pensativa — ele disse, aproximando-se. — Algum problema?
Olhei para ele, tentando esconder minha irritação.
— Problema? Não, tudo está ótimo. Estou presa em uma casa estranha com um homem que não conheço e que, aparentemente, lidera… bem, seja lá o que for que você lidera. Por que haveria algum problema?
Ele riu, um som baixo e inesperado.
— Você tem coragem. Gosto disso.
— Não é coragem — rebati. — É desespero.
Ele ficou em silêncio por um momento, me observando com aquele olhar intenso que fazia meu coração acelerar. Então, ele se aproximou mais, parando tão perto que eu podia sentir seu perfume amadeirado.
— Beatriz, quero que você entenda algo. Tudo o que estou fazendo é para protegê-la. Mas não confunda minha proteção com fraqueza. Se você me trair, não haverá uma segunda chance.
Engoli em seco, sentindo o peso de suas palavras. Ele deu um passo para trás e sorriu, como se tivesse acabado de encerrar uma discussão trivial.
— Boa noite, Beatriz.
E, com isso, ele saiu, me deixando sozinha com meus pensamentos. Enquanto o som de seus passos desaparecia no corredor, percebi que estava entrando em um jogo perigoso. E, pior ainda, começava a me perguntar se eu queria mesmo sair dele.
Não sei dizer exatamente em que momento as coisas começaram a mudar. Talvez tenha sido naquela noite em que Leonardo entrou no meu quarto e deixou suas intenções claras: ele não toleraria traições. Ou talvez tenha sido o simples fato de eu estar convivendo com ele diariamente, mesmo que a maioria das nossas interações fossem cercadas por um misto de mistério e intenções não ditas. O fato é que, aos poucos, eu percebia que minha vida nunca mais seria a mesma.Nos dias que se seguiram àquela conversa, minha "rotina" na mansão começou a se tornar, de certo modo, previsível. Acordava com o som suave de batidas na porta; um dos funcionários da casa trazia meu café da manhã, sempre impecável, em uma bandeja de prata. Passei a explorar o quarto em busca de algo que me fizesse sentir menos sufocada. Encontrei livros antigos em uma prateleira no canto, romances clássicos e alguns textos sobre filosofia. Era melhor do que ficar encarando as grades da janela.Leonardo, no entanto, continuava a s
Os dias passaram, e minha convivência com Leonardo tornou-se um jogo silencioso de provocações e mistérios. Eu sabia que ele estava tentando me estudar, me entender, como se eu fosse um quebra-cabeça que ele queria resolver. Mas a verdade era que eu também o observava. E quanto mais eu o fazia, mais percebia que, por trás da fachada de poder e controle, havia algo mais profundo, mais sombrio.Naquela noite, o silêncio da mansão foi quebrado por uma movimentação incomum. Eu estava deitada, olhando para o teto, quando ouvi passos apressados do lado de fora do quarto. Levantei-me imediatamente e fui até a porta, abrindo-a apenas o suficiente para ver o corredor. Três homens passaram por ali, armados, suas expressões tensas.Meu coração acelerou. Algo estava acontecendo.Antes que eu pudesse pensar no que fazer, Leonardo apareceu ao final do corredor. Diferente de sua postura habitual, ele parecia sério, determinado, como se estivesse prestes a entrar em uma batalha. Quando nossos olhares
A tensão da noite anterior ainda pairava sobre a mansão. Leonardo havia desaparecido pela madrugada, e eu passei as horas seguintes em claro, tentando processar tudo o que havia acontecido. O homem misterioso, a ameaça velada, a maneira como Leonardo se colocou entre nós... Nada daquilo fazia sentido, mas uma coisa era clara: eu estava mais envolvida do que deveria.Levantei-me sentindo o corpo pesado pelo cansaço. O sol já despontava no horizonte quando decidi sair do quarto. As coisas pareciam mais calmas agora, os corredores vazios, o som distante de empregados retomando suas rotinas. Mas a sensação de que algo estava errado continuava me perseguindo.Desci as escadas e fui até a cozinha, onde encontrei Carla, uma das funcionárias da casa, preparando o café da manhã.— Bom dia, senhorita Beatriz — disse ela com um sorriso simpático.— Bom dia, Carla. Leonardo está por aí?Ela hesitou por um instante antes de responder.— Ele saiu cedo, mas não disse para onde.Aquilo não era novida
A revelação de Leonardo ainda ecoava na minha mente. “Agora, você aprende a se proteger.” Aquilo parecia uma sentença de morte disfarçada de conselho. Eu nunca havia segurado uma arma na vida, nunca havia brigado com ninguém além de discussões bobas com minha irmã quando éramos crianças. Mas ali estava eu, sendo informada de que minha sobrevivência dependia de aprender as regras de um jogo que eu nunca pedi para participar.Eu deveria estar assustada. E estava. Mas havia algo mais, algo que eu não conseguia ignorar: raiva.Raiva porque minha vida havia sido arrancada de mim. Raiva porque Leonardo parecia pensar que podia decidir meu destino. Raiva porque, no fundo, uma parte de mim queria ficar.— Quando começamos? — Minha própria voz me surpreendeu.Leonardo arqueou a sobrancelha, analisando-me como se eu fosse um experimento que ele não sabia se daria certo.— Agora.Ele se virou e saiu da sala, esperando que eu o seguisse. Minhas pernas estavam pesadas, como se quisessem me trair e
EMeu coração martelava no peito enquanto meus olhos não desgrudavam do homem amarrado à cadeira. O cheiro de sangue, misturado ao suor e ao medo impregnado no ar, fazia minha garganta se fechar. Eu queria desviar o olhar, mas não conseguia. Não quando Leonardo estava ali, segurando a faca com uma naturalidade que me arrepiava.— Isso não é um jogo, Beatriz. — Sua voz era calma, mas carregada de um peso que me fazia sentir como se estivesse sufocando. — Se quiser sobreviver, precisa entender o que acontece quando alguém trai a confiança errada.O homem amarrado gemeu, balançando a cabeça freneticamente. Seu rosto estava inchado, o olho esquerdo completamente fechado devido à surra que havia levado. Seu lábio tremia, e quando olhei para suas mãos, vi que algumas unhas estavam arrancadas. O estômago revirou, e me forcei a respirar fundo.— O que ele fez? — Minha voz saiu mais firme do que eu esperava.Leonardo olhou para mim, avaliando minha reação, e depois se voltou para o homem.— Ele
O cheiro de sangue ainda impregnava minhas narinas quando saí daquela sala, mas era a sensação dentro de mim que me assustava mais do que qualquer outra coisa. Meu coração ainda batia forte, mas não por choque. Não por horror.Era algo diferente. Algo mais sombrio.A primeira vez que testemunhei Leonardo matar alguém, senti que meu mundo estava desmoronando. Mas agora… agora eu compreendia.Não era um jogo.Era sobrevivência.Caminhei pelos corredores da mansão, minha mente ainda processando tudo. Meus passos ecoavam pelo chão de mármore frio, e meu corpo parecia pesado, como se carregasse o peso de uma decisão que eu ainda não entendia completamente.Então, ouvi passos atrás de mim.Virei-me, e Leonardo estava lá. Ele sempre parecia estar.— Está fugindo? — sua voz era tranquila, mas seu olhar me avaliava como se tentasse decifrar cada pensamento meu.— Não. — Minha resposta foi firme.Ele ergueu uma sobrancelha, curioso.— Então, por que saiu tão rápido?Parei por um instante, reuni
Eu sabia que pedir para Leonardo me ensinar significava cruzar uma linha da qual não poderia voltar. Mas, quando as palavras saíram da minha boca, não havia hesitação. Algo dentro de mim já havia aceitado a mudança, já havia entendido que meu destino não era mais meu para decidir.O problema era que Leonardo não fazia nada pela metade.No dia seguinte, acordei com uma batida na porta do meu quarto.— Levante-se. — A voz de Enzo soou do outro lado. — Você começa hoje.Meu coração pulou no peito.Joguei as cobertas para o lado e me levantei rapidamente. Meu corpo ainda estava cansado da noite anterior — a conversa com Leonardo ficou martelando na minha mente por horas antes que eu finalmente conseguisse dormir. Mas agora não havia tempo para dúvidas.Vesti uma calça jeans e uma blusa preta simples, prendendo o cabelo em um rabo de cavalo antes de sair do quarto.Enzo estava me esperando no corredor, os braços cruzados e a expressão fechada.— Tem certeza de que quer fazer isso?Assenti.
Depois daquele primeiro dia de treinamento, minha rotina mudou completamente.Não havia mais manhãs preguiçosas ou momentos de silêncio para pensar na vida que deixei para trás. Meu mundo agora era feito de tiros disparados contra alvos, socos mal calculados que doíam mais em mim do que em Enzo, e lições intermináveis sobre como ler as pessoas antes que elas pudessem me enganar.Leonardo observava tudo à distância.Ele nunca interferia nos meus treinamentos, nunca me corrigia ou incentivava. Mas eu sentia sua presença. Sempre que eu errava um tiro ou hesitava antes de atacar, sabia que ele estava lá, avaliando cada movimento.E, por algum motivo, isso me fazia querer me esforçar ainda mais.★Naquela noite, o jantar foi diferente.Eu já estava acostumada a comer sozinha ou ao lado de Enzo e alguns dos capangas de Leonardo. Mas, desta vez, quando entrei na sala de jantar, vi que só havia dois lugares postos à mesa.Leonardo estava sentado à cabeceira, um copo de vinho na mão, me observ