Alma Gêmea
Alma Gêmea
Por: Lilly G.
Prólogo

Inglaterra, 1217 

O céu estava escuro e EIisabeth sabia que logo iria começar a chover, por isso suspendeu seu vestido e apressou os passos enquanto olhava ao redor para se certificar de que ninguém a seguia. Seu coração batia depressa e sua respiração aumentava o ritmo conforme se aproximava da antiga casa do ferreiro. Era lá onde ela marcara com Frederick e seu coração pulsava inseguro porque sabia que a essa altura não poderia desistir, caso contrário ele correria grande risco de ser preso ou pior, morto.

Sendo filha de nobres, Elisabeth nunca havia andando por essa parte mais humilde da cidade. Lembrava-se das orientações que ele a dera quando combinaram de fugir, mas não tinha mais tanta certeza se as estava seguindo corretamente. Estava com medo de se perder, com medo de andar sozinha a essa hora e acima de tudo, pensar na possibilidade de conseguir chegar de fato a casa do ferreiro e alguém os encontrar a apavorava.

De longe encontrou a velha cabana. O casebre de madeira parecia iluminar a floresta com esperança, contrastando com os pedaços de entulhos a sua volta. Ela sorriu e apertou os passos mais confiante. No mesmo instante a primeira gota de chuva caiu em sua clavícula, fazendo com que Elisabeth automaticamente olhasse para o céu sentindo, logo após, outras caírem lentamente por seu rosto. O céu havia se tornado mais sombrio desde que saíra de seu quarto. Ela conseguia afirmar isso, pois havia o olhado o dia inteiro devido a sua inquietude. 

Respirou fundo, não podia desistir agora. Andou mais alguns passos, sempre olhando ao redor para se certificar que não estava sendo seguida. Não notando nenhuma presença, chegou perto da cabana sussurrando enquanto espiava curiosa por dentro do espaço onde antes deve ter existido uma porta. 

- Frederick. Você está aí?

Nenhuma resposta. Deve ter chegado primeiro, pensou tentando se acalmar. Contudo, permanecer sozinha naquele local longe de sua casa a apavorava.

EIisabeth sempre teve o auxílio de outros indivíduos para tudo. Se alimentar, se vestir, caminhar e até mesmo tomar decisões importantes. Há alguns meses seus pais decidiram seu casamento. Decidiram que Augustus, um homem 15 anos mais velho e descendente de uma linhagem de nobres mais importantes que a sua, era uma garantia de vida perfeita. Todos achavam que ela era uma mulher de sorte. No entanto, ela não se sentia assim, pois seu coração já havia escolhido muito antes outra pessoa. Um servo da sua idade, de uma linhagem de servos considerados não importantes para seus amigos e familiares, mas que era uma das pessoas mais importantes em sua vida. O conheceu quando Frederick trabalhou para seu pai durante alguns dias. Precisou apenas desse tempo para que se apaixonasse por ele. Não era como imaginara que seria. Antes de qualquer sentimento havia uma amizade muito grande entre os dois, algo puro e verdadeiro muito além de qualquer outra coisa. Ela soube desde então que era com ele que queria passar o resto dos seus dias.

Dar as costas para sua vida perfeita com Augustus e aceitar a proposta imprudente de fugir com Frederick foi a primeira decisão que tomou sozinha na vida. Todavia, nunca se sentiu tão segura de ter escolhido o caminho certo.

“Foge comigo, e eu prometo te compensar pelos restos dos meus dias.” Ele disse no dia anterior.

EIisabeth sabia que Augustus desconfiava de sua proximidade com seu amado. Por essa razão, sabia que se fosse fazer algo, deveria ser o mais depressa possível.

“Diga-me onde e te encontrarei amanhã à noite.” Ela respondeu de imediato sem vacilar nenhum segundo. Não se importava com o que aconteceria, não iria se casar com um homem que não amava, não quando já amava outro.

Decidida a abandonar sua vida ao lado de Augustus, Elisabeth entrou na casa. O piso rangia feroz sob seus pés a cada passo que ela dava. 

- Frederick– Chamou novamente, mais firme dessa vez.

Não houve resposta.

O barulho da chuva ficava mais forte e o vento trazia gotas geladas batendo como farpas em seu corpo que tremia de frio. Por dentro a casa parecia mais assustadora que por fora porque não conseguir enxergar quase nada. Pode ver que no chão havia uma mesa virada e que alguns objetos que não conseguia identificar no escuro balançavam nas paredes por causa do vento. Uma agitação começava a se formar em sua barriga enquanto a mulher percorria os cantos do cômodo. Pegou um dos objetos e seguiu mais para o interior da casa. O piso continuava a ranger insistentemente enquanto sua respiração ficava cada vez mais ofegante. Ela entrou em outro cômodo,. O barulho dos seus passos eram ensurdecedores no silêncio daquela casa, suas mãos tremiam e seus dedos seguravam tão firmes o objeto que doíam. Agora sentia um arrepio em sua nuca, uma sensação estranha percorria todo seu corpo e o barulho era cada vez mais alto, até que percebeu que não estava andando. Ela não estava sozinha.

Institivamente Elisabeth suspendeu o objeto na altura de seu ombro e se escondeu ao lado da passagem prestando atenção no barulho dos passos. Tentar se esconder no escuro ou atacar? Se esconder parecia mais seguro, porém quando percebeu que alguém entrou no cômodo entrou em pânico e saltou sobre o indivíduo.

- Elisabeth, para! – Gritou Frederick que havia caído no chão enquanto ela o batia com o ferro.

- Ai meu Deus, desculpe-me! – Gritou a mulher desesperada e ao mesmo tempo aliviada por ser ele.

Automaticamente seu corpo relaxou, o ferro caiu das suas mãos e ela o abraçou forte. Ele estava ali, ela estava ali, estavam juntos e nada mais importava. A mulher o ajudou a levantar, não podiam ficar ali muito tempo.

Lá fora a chuva permanecia muito forte. Eles se entreolharam. Seus olhares já diziam tudo sem nenhuma palavra precisar ser dita. Agora seria a parte mais difícil.  

A mulher queria sair o mais depressa possível daquela casa, pois estava assustada. Ela olhou novamente para a sala onde derrubou Frederick e sentiu o mesmo arrepio na nuca. Havia algo de errado com aquela casa.

Antes mesmo que pudesse avisar a Frederick, alguns homens entraram na casa os empurrando para dentro da sala. A mulher gritou e tentou se soltar o máximo que pode, mas eles eram muito fortes e ela não conseguia sair dali. Eles os jogaram no chão e os amarraram um ao lado do outro. O arrepio percorria todo seu corpo agora, ao passo que o pânico crescia dentro dela. Era como se tudo tivesse ficado mais frio de uma forma que ela não conseguia explicar. Seu instinto dizia que tinha algo muito errado com aquela sala.

Um dos homens, o que entrara por último, se aproximou dos dois segurando algo nas mãos. O homem parou na sua frente e acendeu o objeto, Elisabeth pode então ver seu rosto.

- Augustus.

- Então você achou que poderia fugir com esse servo morto de fome? - Comentou enquanto seu olhar demonstrava desdém. 

- Não faça nada com ela. A culpa foi minha, eu a obriguei. Prenda-me ou mate-me, mas não a machuque, por favor! – Implorou Frederick.

- Ah, mas você não precisa insistir. Eu vou matá-lo, sim.

- Não! – Gritei. – Por favor, eu me caso com você. eu juro. Deixe-o ir! Perdoe-me Augustus.

Ele a olhou como se pensasse no assunto, mas Elisabeth sabia que era tudo uma encenação para deixar a situação mais dramática. Ele iria matar Frederick e a culpa era dela. Tudo porque se apaixonara por um homem sabendo que não poderia ficar com ele. Porque insistiu em algo que nunca poderia acontecer.

- Perdoe-me, amor. Mas receio dizer que isso não vai acontecer. Ele irá morrer e você também.

Nesse momento um indivíduo surgiu no fim da sala. Ela não sabia dizer se era homem ou mulher, já que seu rosto era deformado e uma capa cobria todo o resto do corpo. Todos os pelos do seu corpo se eriçaram instantaneamente. Aquela coisa possuía uma energia que Elisabeth nunca havia sentido antes. Uma coisa maligna que só estava esperando a ordem para matá-los.

- Você precisa disso para nos matar? – Desafiou Frederick. – Talvez se você tivesse mais atitude, ela não quisesse ter vindo comigo.

O rosto de Augustus se contorceu de ódio, suas mãos começaram a tremer enquanto ele as estendia e socava Frederick.

- Pare! Você vai matá-lo! Por favor, diga-me o que preciso fazer!

O nariz dele sangrava e seu rosto estava inchado. Elisabeth sabia que ele estava com muita dor e se Augustus não parasse, ele morreria.

- Augustus! – Tentou novamente.

Ele se levantou e parou diante dela. Não conseguia distinguir seu olhar. Ódio? Decepção? Não, era outra coisa, quase um triunfo. Ele sabia que tinha vencido.

- Eu não preciso de você, Elisabeth. Eu posso ter qualquer mulher que eu quiser, qualquer uma faria qualquer coisa para se casar comigo, eu não preciso que faça nada. Eu amei você, eu tentei de tudo para que você me amasse também, mas você escolheu esse morto de fome que não tem nada para te oferecer. Eu me pergunto o que foi que ele te deu que eu não te dei? Diga-me! Eu não quero que você me dê nada porque eu sei que você já deu a ele. Eu nunca vou ter você. Você nunca vai me amar como o ama.

- Eu posso tentar. – A doía enganá-lo e doía mais ainda dizer isso na frente de quem ela realmente amava.

- Você não vai. Eu não quero alguém que nunca vai ser minha. Eu já consultei Dorger. – disse apontando para a figura de capa. - E só há três destinos para nós. Ou eu o deixo viver e você encontra um jeito de fugir com ele, ou eu o mato, me caso com você, mas você nuca me amará, ou eu decido por nós três. Dorger!

A mulher congelou, pois sentia que fosse o que fosse, seria pior que a morte. Ela sabia que quando Dorger, seja lá o que fosse, se aproximasse com aqueles olhos brancos se revirando em suas órbitas, desejaria nunca ter fugido.

- Elisabeth – pronunciou Augustus – eu não quero que você morra. Todavia, como isso de fato acontecerá, eu vou garantir que vocês dois nunca fiquem juntos, nem aqui, nem em outra vida por toda eternidade. Por isso o invoquei.

"Vocês morrerão e voltarão. Meu amor, você terá até a primeira aurora do seu vigésimo quinto aniversário para encontrá-lo. Ele será sua alma gêmea, mas tudo que puder impedir que você descubra isso acontecerá. Ele saberá disso, você não, e se você não conseguir descobrir que ele é sua alma gêmea até o tempo estipulado, vocês dois morrerão."

A figura de capa se aproximou do casal. Levantou suas mãos magricelas e pressionou suas unhas longas e escuras no peito deles.

- Feito! – Sussurrou Dorger. Sua voz era tenebrosa e seu hálito apodrecido queimava a pele da mulher. Suas unhas pressionaram com mais força seu corpo e uma dor insuportável surgia enquanto rasgava sua pele. Seu sangue escorria pelas mãos de Dorger fazendo um grito se formar por sua garganta. Ela não conseguiria suportar aquilo. Não poderia morrer assim.

- Feliz vigésimo quinto aniversário, querida! – Desejou Augustus.

Sua cabeça girava, tudo parecia lento, ela estava enfraquecendo. Eram segundos que pareciam uma eternidade. A mulher gritou, não aguentava mais, doía demais. Frederick então segurou sua mão e ela o olhou. Seu rosto estava borrado, mas era ele. E ela soube naquele momento, que o que quer que acontecesse, eles se encontrariam novamente e ela faria todo o possível para achá-lo.

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