Por um momento, não era Elana sentada ali. Era Isadora, a protagonista do seu livro, sentindo o coração sair da rotina pela chegada de alguém inesperado. E, de algum jeito, era como se aquele personagem novo tivesse ganhado vida antes mesmo de ser planejado. Como se ele simplesmente... surgisse. Elana sorriu sozinha. Noah. Nome escolhido em segundos, mas que soava tão certo quanto o silêncio confortável que ela e Ryan haviam dividido naquela noite. Ela estalou os dedos, pronta para continuar. “Isadora não sabia o que esperar dele e, sinceramente, não fazia questão de descobrir tudo de uma vez. Às vezes, só o fato de alguém se sentar ao seu lado sem pressa já era o suficiente para aquecer uma noite inteira." Com um brilho leve nos olhos, Elana continuou digitando, os dedos ganhando ritmo, a inspiração fluindo com naturalidade. A figura de Gabriel, que sempre dominava as páginas com sua presença intensa e o passado entrelaçado ao dela, por ora, dava espaço a esse novo personagem. Nã
Gabriel soltou um sorriso torto, inclinando-se levemente para a frente. — Eu queria acompanhar mais de perto o que você está escrevendo. Estar por dentro da história da Isadora e do Adrian… sem surpresas, sem triângulos amorosos inesperados. Elana arqueou uma sobrancelha, largando o cardápio sobre a mesa. — Você quer acompanhar o livro… ou é porque a Giana te contou que me viu com alguém? A expressão de Gabriel se quebrou no mesmo instante. O leve sorriso desapareceu, substituído por um olhar confuso. — O quê? — Esquece. — ela disse rápido, desviando o olhar e pegando o copo d’água à sua frente. — Foi só um comentário bobo. — Não, espera. — ele se inclinou um pouco mais, agora com o semblante sério. — Com quem você estava? Ou melhor, onde viu a minha mulher? Elana estreitou os olhos, surpresa com a inversão repentina. — Sua mulher? — repetiu, quase em um sussurro. — Eu não disse que vi a Giana. Disse que talvez ela tenha te contado algo. Gabriel a encarou por um momento, o m
O som estridente de um copo se estilhaçando contra a parede preencheu a sala. O peito de Elana subia e descia rapidamente, o coração martelando no peito como se quisesse escapar da dor que a sufocava. Diante dela, Michael mantinha os braços erguidos, como se pudesse se defender das acusações que caíam sobre ele como uma tempestade. — Você acha que eu sou estúpida, Michael? — A voz dela saiu embargada, mas firme. — Eu vi as mensagens, eu vi as fotos. Não tem mais desculpas, não tem mais mentiras. Michael passou a mão pelos cabelos escuros, o rosto contraído em uma expressão de exasperação. — Elana, não é o que você está pensando... Ela soltou uma risada amarga. — Não? Então me explica, porque pelo que eu vi, você está com outra mulher! Faz tempo, não faz? — Seus olhos ardiam, mas ela se recusava a chorar. Não na frente dele. O silêncio que se seguiu foi a confirmação que ela precisava. Michael desviou o olhar, os ombros caídos em derrota. Ele não tinha nada a dizer. Nenhuma jus
Elana inspirou fundo, tentando recuperar o controle. Ela não podia se permitir desmoronar completamente. Já tinha chorado demais. Passou as mãos pelo rosto, secando as lágrimas, e endireitou os ombros. Precisava sair dali. Precisava ir para um lugar onde ainda houvesse um resquício de segurança, onde não se sentisse tão perdida e sozinha. Ligou o carro e saiu do estacionamento com as mãos firmes no volante, mas seu coração ainda estava em pedaços. A cidade passava por ela em flashes borrados pelas lágrimas remanescentes, e cada semáforo parecia um lembrete cruel de que sua vida estava em pausa, parada no momento exato em que descobriu a traição. Quando finalmente chegou ao prédio de Isabella, estacionou sem se preocupar se estava alinhada corretamente. Saiu do carro, pegou sua mala e atravessou o pequeno jardim que levava à entrada. Seus passos estavam pesados, e o cansaço emocional ameaçava derrubá-la a qualquer momento. Apertou a campainha e esperou, o coração batendo forte contr
Elana sorriu de forma melancólica, porém aliviada de ter alguém que realmente se importe com ela. O telefone continuava tocando incessantemente, deixando Elana irritada. — Quem é? — Isabella pergunta, ao ver a amiga soltar o aparelho pela terceira vez. — Sei lá. É restrito. Provavelmente aquele imbecil do Michael ligando para me perturbar. Isabella bufou, pegou o telefone de Elana e atendeu sem hesitar. — Olha aqui, seu cretino! A Elana não quer falar com você! Some da vida dela, seu desgraçado! Eu juro que se você continuar ligando, eu mesma vou aí te socar até você se arrepender de ter nascido! Os olhos de Isabella se arregalam, quando ela ouve a voz do outro lado da linha. Com um sorriso sem graça, ela estica o telefone para Elana. — Não é o Michael. Elana franziu a testa, pegando o telefone hesitante. — Alô? Uma voz masculina, firme e profissional, soou do outro lado. — Boa noite, senhora Elana. Meu nome é Antony Shell, sou advogado da família Kingsley. Preciso falar
Com a escritura e as chaves em mãos, Elana cruzou o pequeno jardim da frente, onde a grama crescia de forma desigual. Pequenas flores ainda tentavam sobreviver em meio às folhas secas que se acumulavam nos canteiros. Seu olhar vagou pelo espaço, reconhecendo cada detalhe e ao mesmo tempo sentindo que aquele lugar não lhe pertencia mais. Parando diante da porta, passou os dedos pela madeira áspera antes de inserir a chave na fechadura. A maçaneta girou com um leve estalo, e a porta se abriu com um rangido baixo. O cheiro do interior da casa a atingiu imediatamente: um misto de poeira, madeira envelhecida e um perfume distante que lhe era estranhamente familiar. O coração de Elana deu um salto no peito. Ela entrou hesitante, os passos ecoando no piso de madeira. A sala ainda tinha os mesmos móveis, embora cobertos por lençóis brancos que acumulavam poeira. O sofá, onde sua mãe costumava sentar-se com uma xícara de chá, estava no mesmo lugar. A estante de livros ainda exibia os mesmos
Agora, anos depois, ela segurava aquela mesma carta em suas mãos. As palavras, ainda tão vívidas, traziam de volta um passado que ela tentou esquecer. Com a respiração entrecortada, ela deslizou os dedos pelo papel amarelado, sentindo as lágrimas arderem em seus olhos. [...]Elana ainda segurava as cartas nas mãos quando algo lhe chamou a atenção. No fundo da pequena caixa metálica, havia um amarrado de cartas diferente dos outros. O papel amarelado pelo tempo estava preso por uma fita vermelha desbotada, e o nome "Gabriel" fora escrito à mão na parte superior da primeira folha. Seu coração acelerou. Gabriel. Seu melhor amigo de infância e adolescência. A única pessoa que a fizera sentir que não estava completamente sozinha naquele mundo. Seus dedos deslizaram pela fita antes de desfazê-la com cuidado. Dentro daquele maço de cartas, escondiam-se palavras que ela nunca teve coragem de dizer em voz alta. Com um suspiro trêmulo, Elana puxou uma das cartas e começou a ler. “Meu querid
No meio do caminho, avistou um pequeno mercadinho de bairro. Sem pensar muito, entrou. As prateleiras eram estreitas, os produtos amontoados de maneira quase desorganizada, mas nada disso importava. Caminhou até a sessão de bebidas e pegou duas garrafas de vinho barato. O atendente, um senhor de idade com óculos grandes e uma expressão cansada, lançou-lhe um olhar de curiosidade, mas nada disse. Elana pagou rapidamente e saiu dali. Ao chegar em casa, trancou a porta e foi direto até a cozinha. Abriu os armários antigos, vasculhou as prateleiras cobertas de poeira, mas não encontrou uma única taça. Frustrada, soltou um suspiro exasperado e bateu a porta do armário com força. Pegou uma das garrafas e, sem paciência para cerimônias, girou a rolha e bebeu direto do gargalo. O vinho desceu forte, queimando sua garganta e aquecendo seu peito. Com o tempo, os goles se tornaram mais frequentes, e a sensação de torpor começou a tomar conta de seu corpo. A primeira garrafa estava pela metade