Capítulo Cinco

A manhã seguinte começou, tão agitada como sempre. A luz fria da manhã entrava pelas paredes de vidro do escritório moderno, as mesas em fileiras estavam organizadas — dentro do possível —, cada uma com sua própria pilha de documentos. O ar-condicionado soprava, zumbindo solenemente, um ruído relaxante naquele ambiente sem vida, se misturando ao som dos teclados que eram pressionados com maestria por todos os trabalhadores.

Quando cheguei à minha mesa, o estômago chegou a embrulhar com a visão de Henrique mexendo nas minhas coisas e conferindo ele mesmo a pilha de documentos deixada por mim no organizador.

— Até que enfim — disse, mas sem olhar na minha direção. — Tem até o meio-dia para revisar esse contrato, ouviu? Estou cheio de coisas, não terei tempo de revisar de novo seu trabalho, seja prolífica o suficiente para manter seu lugar aqui.

Quase revirei os olhos, enquanto segurava a vontade de fazer ele mesmo engolir os malditos papéis.

— Sim, senhor — disse suavemente, absorvendo a calma que não me cabia.

Ele foi embora, e achei que meu trabalho do dia seria tranquilo, ledo engano. Henrique voltou incontáveis vezes para me interromper, ligou para pedir coisas irrelevantes como cafés e guardanapos e para comentar detalhes e “erros” de trabalhos anteriores.

O contrato era importante, ele queria me ver errar.

Por algum motivo, queria me desestabilizar e garantir que as coisas não fossem suaves para mim.

Eu estava por um fio.

A convivência e o tom de voz de Henrique me recordavam algo que eu queira muito esquecer. Não eram apenas seus comentários ríspidos, suas críticas infundadas ou sua aparente loucura e impaciência. Era o que ele parecia representar, sua autoridade sem justificativa, sua moral sufocante. 

Ficava me recordando algo que me quebrava aos poucos, enquanto as horas daquela manhã pareciam não querer terminar.

Terminei a revisão e, quando chegou meio-dia, corri para o refeitório.

Queria respirar.

Carla sorriu ao me ver, mas pareceu notar o quanto eu estava abatida e se compadeceu, com as sobrancelhas juntando num tom preocupado.

— Ainda bem que sobreviveu, as meninas comentaram que Henrique está mais pé no saco do que sempre — comentou, pegando uma bandeja na pilha.

— Nem me fala, achei que não iria chegar a hora do almoço — suspirei.

Tentei relaxar, aproveitar a companhia, tentando absorver a percepção de como Carla tornava aquele ambiente mais leve.

— Não quero te assustar, mas o último assistente de Henrique pediu demissão no mesmo dia, então você está indo bem — contou, enquanto enchia a boca de comida.

— Não é nenhuma surpresa, já quase grampeei a língua dele e não eram nem dez da manhã — resmunguei.

— Ninguém aqui tem coragem de enfrentá-lo, porque é um lunático surtado, então só o CEO podia fazer algo assim.

— Ótimo — ironizei. — Agora tenho que lidar com um lunático e com um CEO frio e calculista que não cuida nem dos próprios funcionários.

Carla arqueou uma sobrancelha.

— Você tem algo contra o Matheus?

Com pressa, meneei a cabeça em negativa.

— Não é nada, só acho que ele deveria mesmo fazer alguma coisa sobre isso.

— Não parece ser só isso, o que não quer admitir? Parece mesmo incomodada.

— Não estou incomodada — declarei, cortando um pedaço do frango com mais violência do que devia.

— E eu sou a rainha da Inglaterra — Carla riu, encarnado as gotas de molho que mancharam a mesa. — Se precisar falar sobre isso, estou aqui.

— Certo, muito obrigada, se eu lembrar de algo podemos conversar sobre isso.

Pisquei e ela riu de novo.

Gostava dela, porque não fazia perguntas difíceis e a coisa que eu menos queria agora era descobrir porque Matheus me deixava tão incomodada.

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