Capítulo Sete

Parei diante da porta, o coração batia violentamente no peito, enquanto eu tentava reunir coragem para entrar. Depois do dia caótico, claro que quando Henrique me enviou até ali, obedeci sem questionar, mas agora estava pagando por isso. Os sentimentos eram pesados e conflitantes, como se estivesse prestes a invadir um espaço proibido.

Mesmo assim, empurrei a maçaneta.

Os olhos vagaram pela sala, analisando cada detalhe, mapeando inconscientemente aquele local que me pareceu estranhamente íntimo. Matheus estava levemente inclinado para frente, com os cotovelos apoiados na mesa de mogno e um meio-sorriso nos lábios, enquanto os olhos estavam fixos apenas na mulher à sua frente.

Se portava de uma maneira diferente da que pude acompanhar nos últimos dias, parecia tão relaxado quanto quando nos encontramos naquele bar. Era cordial. A luz iluminava seu rosto, destacando seus traços mais marcantes, que pareciam suaves e expressivos, diferente de sua frieza assustadora.

Meus músculos travaram, mas não podia continuar ali, parada como uma boba hipnotizada. Forcei uma tosse, chamando a atenção dos dois, mas só queria mesmo recuperar minha voz.

— Com licença — aquela atenção estendeu sobre mim um desconforto palpável.

Matheus me encarou, por um momento pareceu vacilar, mas aquela denúncia de sentimento foi tão rápida que achei ser apenas um delírio da minha mente idiota. O homem se recostou na cadeira e, mesmo cruzando os braços, continuava despreocupado e receptivo, sereno.

— Julia. — A fluidez com a qual meu nome saiu da sua boca me deixou inquieta, com mil borboletas revoando pelo estômago. — Essa é a Marina, estávamos discutindo sobre nosso novo projeto, soube que ajudou Henrique com isso.

— Ah, não foi nada, senhor — gaguejei, me sentindo ainda mais ridícula que antes.

Marina se virou para me olhar, distribuindo um sorriso simpático e lhe cumprimentei com um tímido. Ainda me sentia deslocada, o desconforto crescia, enraizado, como nós apertados por todo meu interior. Era como se eu estivesse cometendo um crime, roubando o tempo, invadindo aquele cenário que não me cabia.

Alguma coisa estava errada, e não tinha nada a ver com Marina, mas sim com Matheus. Aquele não era o mesmo homem dos últimos dias, mas também não parecia esforço da sua parte se portar assim, nem existia qualquer esforço no seu ato de sorrir em minha direção.

Na primeira vez que nos encontramos no escritório ele era frio, distante. Mas, enquanto contava à Marina sobre o projeto e comentava comigo sobre o que se tratava, mal o reconheci. Sua leveza era desconhecida, me deixava ansiosa, mas a queria toda para mim.

Estava agindo como uma tola.

Apertei o papel que segurava entre os dedos, me sentindo culpada. Era eu quem o fez agir daquele jeito? Minha presença o incomodava? Era Marina quem o fazia estar leve e cordial como estava agora? Feliz? Matheus e Gabriel pareciam tão iguais agora, a frustração e o assombro me penetraram como vergalhões, eu estava estragando a vida de alguém de novo.

Matheus com toda certeza não queria estar perto de mim.

Sim, ele podia só querer a impressionar, querer que assinasse algum contrato importante. Mas meu interior dizia que devia existir uma questão maior, algo que não poderia entender em um momento tão breve e imerso em ignorância.

Por que eu me importava com isso?

Não era da minha conta.

Matheus não devia significar nada para mim.

Não devia significar nada.

Os fantasmas do meu passado giravam sorridentes ao meu redor, enquanto eu tentava os ignorar e prestar atenção nas palavras compartilhadas comigo.

Respirei fundo, tentando me segurar no fio elucidativo das minhas obrigações, focar no motivo real que me levara até ali. Matheus era um enigma, mas não podia desvendá-lo agora, não podia querer isso. 

Era sufocante qualquer tentativa de decifrá-lo.

Ajeitei os papéis nas mãos e me aproximei, sendo um tanto indelicada ao estendê-los em sua direção.

— Henrique precisa da sua assinatura — sentenciei, tentando manter a compostura enquanto o coração batia rápido a ponto de dilacerar meus ouvidos.

Matheus sorriu, pegando os documentos enquanto Marina conferia o celular, e a sala se manifestava num silêncio ansioso. Seus dedos roçaram de leve nos meus, por acidente, e tudo estremeceu. Enquanto lia algumas linhas e assinava, as rugas suaves de preocupação enfeitavam sua testa e impulsionavam as sobrancelhas para baixo, deixando-o com um semblante plácido e encantador.

Não conseguia deixar de perceber como sua expressão se fechava, perdida em pensamentos que eu nunca entenderia. Sério e profissional, aquele Matheus parecia uma versão ainda mais distante da realidade, naquele curto momento em que os minutos levaram séculos para passar.

Ele me chamou de volta, devolvendo os papéis para mim, e não nos tocamos desta vez. Os agarrei rapidamente, querendo que acabasse logo. 

— Obrigada — me afastei.

— De nada — sua resposta foi firme, mas quase sussurrada, como se quisesse confessar um crime mas não pudesse haver testemunhas.

Nossos olhares se sustentaram por um tempo desnecessário, formando uma tensão assombrosa, densa, que eu podia tocar e congelar os dedos. Queria dizer mais alguma coisa, mas apenas sorri e me despedi dele e de Marina. Girei sobre os calcanhares e os deixei, sem olhar para trás. 

O corredor agora parecia diferente, longo demais.

Enquanto caminhava, de volta para a sala do homem inescrupuloso para devolver os documentos, tinha plena ciência de que os pensamentos de Matheus estavam em mim; uma ilusão que me forcei a acreditar.

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