Capítulo 3

Depois de superada a embriaguez, Joana lamentou ainda mais ter abandonado a festa. Deveria ter se refeito do mal estar e desfilado de braços dado ao noivo, mostrando a todos que em breve estariam casados.

Pensou em retornar à festa, mas, temendo o que seu noivo pensaria após a fuga, preferiu deixar que ele a procurasse.

Depois de um banho e trocar de roupa, restou-lhe aguardar até o retorno de sua família. Inquieta, desceu até a sala de estar e ficou andando de um lado para o outro até o retorno de seus pais e sua irmã.

— Essas estradas estão cada dia piores — ouviu Dalila reclamar mal-humorada ao entrar na residência seguida pelos pais. — Deveríamos ter pedido carona aos Castanhare.

— É só uma distância de quinze minutos, filha — Carmem, mãe delas, disse cansada da caminhada e mais ainda das reclamações da caçula.

— Estou suando e a caminhada não é fácil de salto alto — a jovem continuou a reclamar.

— Joana, o que deu em você para sair corrida da festa? — Irritado, Iago, pai delas, questionou assim que viu Joana.

Joana abaixou a cabeça, envergonhada por seu comportamento. Sempre sentiu que ao menor movimento poderia desagrada-lo e receber um olhar duro de desgosto, com sua atitude impulsiva era óbvio que o aborreceu.

— Desculpe-me, pai! Tive uma indisposição... — explicou sem se aprofundar no assunto. Mesmo sendo noiva de Adriano, seu pai odiaria saber que esteve aos beijos com o noivo na escuridão do jardim dos Orleans, e gostaria ainda menos em saber que fugiu para vomitar em um canteiro.

— Perdeu a chegada de Adriano na festa — Dalila disse alegremente.

Joana ergueu o rosto e fitou a irmã intensamente, sorrindo diante da referência ao seu noivo e a lembrança do beijo no jardim. Ficou ansiosa em saber se ele contou para sua irmã sobre o encontro deles. No entanto, observando seu pai de canto de olho, conteve a vontade de questiona-la.

Ao perceber que Dalila se abanava com as mãos, resmungando do calor e suor, Joana pensou em um pretexto perfeito para se retirarem da sala juntas.

— Depois dessa caminhada é melhor colocar roupas mais refrescantes — recomendou. — Vamos ao seu quarto escolher uma roupa melhor para que use após o banho.

— Verdade, meu vestido é adequado só para a festa que estivemos e não caminhadas — Dalila retrucou ainda irritada pelos pais não terem nem ao menos pedido para os Orleans mandarem o motorista levarem eles para casa. — Me sinto cozinhar e o suor de tanto dançar me incomoda há horas. Preciso mesmo de um banho — disse movendo-se para as escadas que levavam aos dormitórios.

Joana seguiu a irmã para o piso superior e, em vez de seguir para o próprio quarto entrou no de Dalila.

Olhando curiosa Joana atrás de si, Dalila compreendeu exatamente o que sua irmã pretendia com a estranha proposta de ajudá-la a escolher uma roupa.

Sua irmã era tão óbvia e tola. Nem sabia o que a esperava, comemorou com um sorriso maldoso ao lembrar como Adriano a comeu com os olhos.

~*~

Observando a irmã pegar as roupas que usaria após o banho, Joana sentou na cama arrumada e esticou nervosamente o lençol com a palma da mão por vários minutos em completo silêncio. Insegura como iniciar a conversa.

Apesar de terem somente três anos de diferença, entre elas havia um grande abismo. Enquanto Dalila transbordava vivacidade e ousadia, Joana sempre foi tímida e cresceu sendo ensinada a conter qualquer emoção mais intensa, ser responsável em tudo e tendo de moldar sua personalidade aos que os outros desejavam. Eram distintas até mesmo na aparência, cada uma sendo a mescla perfeita dos pais: Joana com os fios negros do pai e os olhos azuis da mãe; Dalila com o cabelo loiro-acobreado da mãe e olhos verdes do pai.

— Não preciso de ajuda para me trocar. Ou está aqui por outro motivo? — Dalila provocou impaciente com o silêncio de Joana.

Por um instante Joana encarou a irmã sem graça, pensando no beijo clandestino no jardim e na fuga por causa da embriaguez, provocada pelas bebidas oferecidas por Dalila, mas logo decidiu saber o que o noivo disse sobre ela.

— Adriano falou algo sobre mim quando conversaram? — Joana quis saber agarrando as mãos da irmã entre as suas, para que permanecesse ao seu lado até contar tudo.

— Só perguntou o motivo de não estar na festa. — "Passou mais tempo falando o quanto sou bonita", pensou Dalila se lembrando de quando conversara com Adriano, e nos olhares e elogios que recebeu ao longo das inúmeras danças compartilhadas.

Joana sorriu animada e Dalila a encarou com uma sobrancelha levantada, sem entender como alguém podia ficar feliz com tão pouco.

— Pensa mesmo em casar com ele? Não se veem há anos e só se falam por telefonemas e mensagens.

— Ele estava ocupado, mas agora está aqui e claro que me casarei com ele. — Com sinceridade Joana exclamou: — Estou contente que enfim nos casaremos e nunca mais estaremos longe um do outro. — Corou ao lembrar-se do beijo, de como foi tão bom após tanto tempo longe.

— Caramba! A casta e puritana Joana empolgada com seu homem, quem diria. — Dalila riu ao perceber o forte rubor que tomava conta da face da irmã com sua insinuação desdenhosa.

— Quando ele me levou no jardim foi tão especial — Joana confessou sentindo a face em chamas.

Dalila a fitou com uma sobrancelha arqueada.

— Adriano passou praticamente a festa toda ao lado da dona Kassandra — comentou, decidindo não acrescentar que quando não estava ao lado da mãe, estava do seu.

Seu comentário fez Joana levar os dedos aos lábios, lembrando-se do beijo.

— Ele me levou ao jardim pouco depois de chegar...

— Impossível! Esteve no jardim com outro homem — Dalila disse divertindo-se, pois estava claro que, como planejado, Joana caíra na armadilha que montou para se livrar dela na festa. — Diga-me, esse tal homem estava vestido com farda militar?

— Não... — Joana disse estranhando a pergunta.

— Pois bem, essa era a fantasia do Adriano — Dalila esclareceu.

Joana levantou-se angustiada. A beleza da intimidade compartilhada no jardim se perdendo ao perceber que deixou um desconhecido tocá-la e, pior, beijá-la.

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