Tendo um importantes trabalhos nos próximos dias, Maximiliano passou a tarde na cabine de seu barco ancorado no porto de Sanmarino, se reunindo com dois marinheiros e seus amigos de confiança, Lucas Santos e Beto Alves. Encontravam-se iluminados somente pela luz fraca da cabine, as janelas e porta fechadas para que ninguém ouvisse o que combinavam dentro do barco, batizado de Diablo pelo falecido irmão de Maximiliano para provocar a população, e aumentando com isso à má fama da família. — O melhor seria passar o carregamento de madrugada, quando há menos vigilância — opinou Beto, segundo no comando do barco, o olhar atento no mapa precário que fez do local que roubariam em alguns dias. — E devemos ter alguém de dentro para nos dar cobertura. — Conheço um oficial que posso convencer a nos ajudar. É um cliente do Crista do Mar — Lucas indicou se referindo ao bar próximo ao porto. Mesmo não gostando de buscar aliados fora de seu círculo de amizade, Maximiliano decidiu que naquele caso
— Somos mais amigos que namorados desde o início... — Adriano continuou torturando o coração de Joana. Apertando os lábios para segurar o choro que embolava em sua garganta, Joana enrolou o indicador na corrente de seu camafeu, cujo interior abrigava uma foto deles abraçados, símbolo do amor deles. Amor que agora ele taxava como amizade. Sentindo a cabeça pesar uma tonelada, Joana sustentou orgulhosa o olhar na face de seu agora ex-noivo, que tinha plantado um sorriso gentil, diferente das palavras que quebravam a alma da jovem em pedaços. — Joana, lamento tanto não poder seguir com o casamento, mas... Como uma mariposa voando ao redor de uma lamparina, Joana tentava apartar o olhar dos lábios dele enquanto ele prosseguia em suas justificativas para dar fim ao noivado, mas, perturbada e inquieta, deu-se conta que era impossível. Inesperadamente, como se para tortura-la ainda mais, se viu lembrando o beijo no baile de máscaras e comparando-o. Os de Adriano sempre foram controlados
Com o coração destroçado e lágrimas molhando a face pálida, Joana sentia que sua vida não tinha mais sentido. Encontrava-se perturbada por três motivos: O fim do compromisso; por conseguir visualizar os olhares de pena em sua direção quando andasse pelas ruas da cidade; e pela decepção que viu na face séria de seu pai quando o anúncio foi dado. A muito se deu conta que decepcionou seu pai ao não nascer homem, como o desejo da maioria dos pais da cidade quando se tratava do primogênito. Agora acabou com a única felicidade que deu ao senhor Iago Savoia em vinte e quatro anos de existência: o noivado com Adriano. Para aumentar sua infelicidade, não só teria de ver Adriano com outra, como seria sua própria irmã. Dalila é que se tornaria a senhora Orleans, que ocuparia um lugar eterno no coração de Adriano, que até então pensou ser seu. — Porque a vida está sendo tão cruel? Não basta me deixar, ele quer minha irmã... — Joana lamentava em meio ao pranto. Lembrou-se de imediato do beijo n
Maximiliano ergueu-se de sua poltrona e olhou para a porta da velha cabana, em que Dalila estava parada no vão usando as roupas simples e o rosto quase oculto pela peruca de fios escuros e franja farta. — A reunião está finalizada — disse para os amigos, fazendo um gesto que eles entenderam de imediato que era deixarem os dois a sós. Beto e Lucas levantaram e partiram sem trocar uma única palavra com a mulher que entrou na cabana. Vagamente, Beto notou que era a mesma do mercado, só que com um disfarce para ocultar sua face. Logo que os amigos de Maximiliano abandonaram a cabana, Dalila fechou a porta, retirou a peruca, deixando-a no aparador e se aproximou dele com um sorriso luminoso nos lábios. Em instantes lançava seus braços em torno do pescoço forte do amante. — Vai sair em outra viagem? — Dalila perguntou ao reparar no mapa aberto na mesa. Segurando-a junto a si, Maximiliano encostou os quadris na mesa de madeira envelhecida, passando a mão de leve nas costas dela. — Meu b
Não tendo aulas a dar no sábado, trancada em seu quarto, mesmo ainda não tendo documentos para a viagem, Joana fez uma pequena mala para sua estada na casa dos Orleans em Portugal. Depois passou algumas horas verificando na internet cursos que poderia fazer lá, de forma a ocupar seu tempo e atenção longe dos problemas de sua casa. Tendo crescido diante dos olhos zelosos de sua madrinha, mãe e das professoras religiosas, sabia outras línguas e podia se adaptar perfeitamente ao novo ambiente. Sua mãe bateu na porta, avisou que iria para a missa e perguntou se ela queria ir junto. Necessitando de um pouco de paz, avisou que iria. Aproveitaria para informar as freiras de sua partida, de forma que arranjassem uma pessoa para ficar em seu lugar na escola e nas atividades que executava. Mesmo temendo o momento da confissão, também queria falar com o padre, colocar um pouco de sua amargura para fora. Deitou de costas na cama e, fitando o teto, levou os dedos aos lábios. Teria de contar so
Cansada de carregar o peso da rejeição sozinha, e ciente de que o padre era seu elo com o Criador, Joana contou sobre o beijo no baile, como achava que estava sendo castigada por causa dele e narrou com dor no coração a troca feita por Adriano. Como esperado, ao fim de sua confissão ouviu o padre repreendê-la severo: — Se afastar das pessoas que te amam, apenas para não ver a felicidade de sua irmã é pecado de soberba. — Creio que acabaria saindo da cidade algum dia se não fosse o compromisso... — afirmou trêmula e sem convicção na voz melodiosa. — Joana, sabemos que isso não é verdade — repreendeu o sacerdote. — Está encoberta pelo orgulho e essa não é a melhor forma de superar as dores. — É certo que cometi alguns pecados... Incluindo da soberba... Estou arrependida, mas para obter paz, necessito de mudança. — Sentiu os olhos arderem, a garganta travar e uma lágrima solitária descer devagar por sua face. — Rezarei pela sua paz, minha jovem — comunicou o padre. — E, como penitênc
Em seu pequeno escritório no centro de Sanmarino, o advogado Donato Herrera examinava uma pilha de documentos sobre sua escrivaninha. De tempos em tempos passava os dedos entre os fios brancos de seu cabelo distraidamente, os olhos castanhos concentrados no caso que recebeu de uma humilde família, que temia ser despejada. Sua atenção foi retirada da papelada pela campainha. — Pode entrar, está aberta! — Donato comunicou sem tirar a atenção do que fazia. — Bom dia, senhor Donato! O advogado levantou o olhar e abriu um sorriso ao reconhecer Adriano Orleans. De imediato, levantou-se emocionado diante de sua inesperada visita, impressionado mais uma vez pelas semelhanças entre o jovem e seu amigo falecido. — Como está? — Bem. Cheio de trabalho desde que voltei da capital. Mas, enfim, terminei tudo que tinha por lá e me estabelecerei definitivamente em Sanmarino. — Alegra-me. E em que posso ajudá-lo? Sentaram-se e Adriano aguardou que o advogado servisse café para ambos antes de ini
Seguindo para o porto, Maximiliano tinha o semblante carregado, um alerta mudo que era melhor não atravessar seu caminho. Visto por todos como um contrabandista da pior espécie, era um homem com coração coberto de rancor por todos da classe alta de Sanmarino, em que nasceu, cresceu e foi maltratado dia após dia até aprender a revidar com unhas e dentes. Seu ódio era ainda maior pelos Orleans, que um dia lhe estenderam a mão só para depois humilha-lo e roubá-lo. Apertou ainda mais os punhos ao lembrar seu passado com os Orleans, como aceitou a ajuda deles após a morte cruel de seus familiares. ~ Seu pai era amigo de infância de Nicolas Orleans, dessa forma diversas vezes foi levado a fazenda Recanto Dourado brincar com Adriano. Mas nada disso foi de grande importância para ele até a morte de sua família. Sentado em um banco de madeira, em um canto afastado dos curiosos que cercavam o salão de sua casa, onde o preto só não se destacava mais que os quatros caixões no centro, ele que