Cansada de carregar o peso da rejeição sozinha, e ciente de que o padre era seu elo com o Criador, Joana contou sobre o beijo no baile, como achava que estava sendo castigada por causa dele e narrou com dor no coração a troca feita por Adriano. Como esperado, ao fim de sua confissão ouviu o padre repreendê-la severo: — Se afastar das pessoas que te amam, apenas para não ver a felicidade de sua irmã é pecado de soberba. — Creio que acabaria saindo da cidade algum dia se não fosse o compromisso... — afirmou trêmula e sem convicção na voz melodiosa. — Joana, sabemos que isso não é verdade — repreendeu o sacerdote. — Está encoberta pelo orgulho e essa não é a melhor forma de superar as dores. — É certo que cometi alguns pecados... Incluindo da soberba... Estou arrependida, mas para obter paz, necessito de mudança. — Sentiu os olhos arderem, a garganta travar e uma lágrima solitária descer devagar por sua face. — Rezarei pela sua paz, minha jovem — comunicou o padre. — E, como penitênc
Em seu pequeno escritório no centro de Sanmarino, o advogado Donato Herrera examinava uma pilha de documentos sobre sua escrivaninha. De tempos em tempos passava os dedos entre os fios brancos de seu cabelo distraidamente, os olhos castanhos concentrados no caso que recebeu de uma humilde família, que temia ser despejada. Sua atenção foi retirada da papelada pela campainha. — Pode entrar, está aberta! — Donato comunicou sem tirar a atenção do que fazia. — Bom dia, senhor Donato! O advogado levantou o olhar e abriu um sorriso ao reconhecer Adriano Orleans. De imediato, levantou-se emocionado diante de sua inesperada visita, impressionado mais uma vez pelas semelhanças entre o jovem e seu amigo falecido. — Como está? — Bem. Cheio de trabalho desde que voltei da capital. Mas, enfim, terminei tudo que tinha por lá e me estabelecerei definitivamente em Sanmarino. — Alegra-me. E em que posso ajudá-lo? Sentaram-se e Adriano aguardou que o advogado servisse café para ambos antes de ini
Seguindo para o porto, Maximiliano tinha o semblante carregado, um alerta mudo que era melhor não atravessar seu caminho. Visto por todos como um contrabandista da pior espécie, era um homem com coração coberto de rancor por todos da classe alta de Sanmarino, em que nasceu, cresceu e foi maltratado dia após dia até aprender a revidar com unhas e dentes. Seu ódio era ainda maior pelos Orleans, que um dia lhe estenderam a mão só para depois humilha-lo e roubá-lo. Apertou ainda mais os punhos ao lembrar seu passado com os Orleans, como aceitou a ajuda deles após a morte cruel de seus familiares. ~ Seu pai era amigo de infância de Nicolas Orleans, dessa forma diversas vezes foi levado a fazenda Recanto Dourado brincar com Adriano. Mas nada disso foi de grande importância para ele até a morte de sua família. Sentado em um banco de madeira, em um canto afastado dos curiosos que cercavam o salão de sua casa, onde o preto só não se destacava mais que os quatros caixões no centro, ele que
Baltasar comia tranquilamente enquanto Dalila aguardava impaciente o retorno de Maximiliano a sua cabana. — Onde Maximiliano se enfurnou? — A jovem exigiu saber com as mãos plantadas na cintura. Lamentando que a garota não tivesse ido embora meia hora atrás, quando informou que Maximiliano tinha saído para resolver seus assuntos no porto, deixou de lado o espeto de linguiça para responder as questões da atual amante do capitão. — Como disse, está cheio de trabalho com a próxima viagem — comunicou sem tirar os olhos do espeto que sustentava a poucos centímetros da boca. — Mas você disse que eram coisas rápidas — resmungou irritada com a falta de notícias. — Também disse que podia se demorar — Baltasar retrucou antes de se entregar ao prazer de levar a comida à boca. — Assim que chegar, informo que esteve aqui atrás dele — garantiu com a boca cheia. — Pois diga para ele que não virei essa noite. Dando uma última olhada para o homem sem esconder seu enojo e falta de paciência com a
Audaz, da mesma forma que escapuliu de casa, Dalila entrou de forma sorrateira na residência de sua família, atravessando a porta da varanda de seu quarto e fechando-a com aborrecimento. Depois de não encontrar seu amante ainda teve de dar explicações a idiota da amiga de Joana, exasperou-se tirando o disfarce e o guardando embaixo do colchão. Abriu o guarda-roupa e escolheu uma blusa de alcinhas, a seda branca se ajustava aos seus seios destacando-os, também pegou uma calça de alfaiataria azul-céu justa e sandálias leves. De joias escolheu um colar simples e brincos pequenos. Queria estar elegante e linda para o caso de seu futuro marido a visitar. Batidas suaves à fez destrancar a porta para abri-la. Não se surpreendeu ao encontrar Paula apavorada. Essa reação da servente era frequente após cada encontro secreto que tinha com Maximiliano. — Dalila, seus pais já retornaram da igreja. Por sorte não perguntaram de você — informou a jovem após entrar no recinto e trancar a porta. — O
Certas coisas nunca mudariam, pelo menos não na opinião de Joana. Ignorando o quanto seu pedido seria cruel e sabendo que Joana seria incapaz de se recusar, Dalila praticamente arrastou a irmã mais velha até seu quarto para ajudá-la na escolha da melhor roupa para jantar na casa dos Orleans. Mesmo odiando, orgulhosa, Joana engoliu qualquer expressão de desagrado e incomodo e aceitou, embora o fizesse de modo aleatório, sem sequer olhar para qualquer uma das peças que a irmã lhe mostrava cheia de empolgação. — Estou bonita? — Dalila quis saber dando uma volta em torno de si mesma para que Joana pudesse ver cada detalhe do traje escolhido. — Sim! — Foi sua resposta simples e curta. Dalila sorriu com cinismo e perguntou fazendo uma pose sensual: — Acha que Adriano vai gostar do meu visual? O vestido curto na cor rosa, tinha um espetacular decote nas costas e terminava bem acima dos joelhos. Não era o tipo de roupa que Joana usaria, nem que seus pais e sua madrinha aprovariam, mas a
Joana pulou para longe, um grito baixo de susto vencendo a rigidez dominando todo seu corpo. Mesmo sentindo as pernas trêmulas, conseguiu dar alguns passos vacilantes para longe do homem que a agarrou. Com a expressão paralisada pelo susto, Joana fixou seus olhos azulados sobre o intruso. Ambos se encaravam em silêncio, Joana com medo e Maximiliano com curiosidade. Novamente por um engano do destino, sem máscaras ou disfarces, naquele momento ocorreu o encontro de dois mundos. De um lado a pureza de Joana, criada em meio aos cuidados e restrições dos pais e de sua madrinha. Do outro, um homem temido que por vezes viu a pior face dos seres humanos. — Você?! O que faz aqui? — Joana questionou ao reconhecê-lo como o homem que viu na praia dias antes. Maximiliano observou a jovem de cima a baixo, também a reconhecendo do inusitado encontro da praia. Percebendo seu erro, Maximiliano deslizou seus olhos negros pelas vestes, face pálida, cabelos negros presos em um coque austero e com f
Ansioso, Adriano andava de um lado para o outro, aguardando impaciente a chegada dos Savoia para o jantar. — O que aconteceu com Dalila e sua família? — Questionou para sua mãe que o observava do sofá. — Eles deveriam estar aqui para jantar conosco há meia hora. — Talvez tenham se atrasado por causa da Joana. Ou nem venham... — Por quê? Pensei que já tínhamos resolvido essa situação. Joana foi bem compreensiva quando expliquei meus motivos para não seguir com o casamento. — Filho, para todos foi um golpe terrível, principalmente para Joana — esclareceu Kassandra segurando a mão do filho. — Quando soube que você retornou a cidade, ela pensou que o casamento seria celebrado rapidamente. Com sua negativa ficou desolada, ao ponto que ofereci envia-la para nossa casa em Portugal. — Em uma derradeira tentativa de fazê-lo desisti comentou: — Filho, pense melhor. Você e Joana estão juntos há tanto tempo... — Não tenho o que pensar, mãe. — Adriano a interrompeu, um sorriso bobo se moldand