O motor do Ford Ranger rugiu suavemente quando Guilherme começou a manobrar para fora da garagem. De pé na calçada, Tábata observava, ainda perdida nas implicações da conversa que tiveram na cozinha. Segurava a vassoura, que pegou para limpar a calçada, mas seus pensamentos estavam fixos no homem dentro do carro, imaginando a conversa que teriam quando ele voltasse do trabalho.O som de freios a despertou para outro carro parando perto dela. Moveu os olhos para o sedan preto de janelas escurecidas, reconhecendo-o imediatamente: era o veículo que sempre trazia Paulina. Apesar do retorno de Guilherme, a prima dele a visitava todos os dias pela manhã.Curvando-se com uma mão pousada no ventre, sorridente acenou para Paulina enquanto o carro terminava de estacionar. Deu um leve pulo ao sentir um abraço em seus ombros. Confusa, percebeu que o Ranger estava parcialmente para fora da garagem, a
A cozinha estava mergulhada em um silêncio sereno, quebrado apenas pelo som suave da colher que Tábata girava na xícara de chá. Seu olhar pairava sobre o pequeno vaso de hortelã no peitoril da janela. As folhas verdes pareciam brilhar sob o sol, contrastando com a opressão pesando em seu peito.A conversa com Paulina girava em sua mente. Era irônico e doloroso pensar que a prima de Guilherme tentou empurra-la para um quase estranho, mas nunca pareceu enxergá-la como uma opção para Guilherme, mesmo conhecendo a proximidade dos dois.— Deve me achar indigna — murmurou para si mesma, os dedos pousando instintivamente sobre o ventre arredondado.Os pensamentos lhe escapavam em fluxo desordenado. O que Paulina e a família Perez pensariam dela quando soubessem a verdade? Não sobre o bebê, uma luz pura em sua vida, mas sobre o homem que a deixou nessa s
Tábata despertou lentamente, os olhos piscando preguiçosos enquanto o calor familiar do corpo de Guilherme a envolvia por trás. O braço dele estava sobre sua cintura, aconchegando-a, a mão grande cobrindo seu ventre de uma forma que a fazia sentir-se protegida.Sorriu, um sorriso cheio de uma felicidade serena e infinita. Deslizou os dedos delicadamente pela mão dele, sentindo a textura da pele, os calos que denunciavam sua dedicação ao treino de artes marciais e, ao mesmo tempo, tinham uma suavidade ao tocá-la.Era difícil acreditar que fosse real. Que, depois de tantas reviravoltas, estavam juntos. Mesmo que em segredo.Inspirou fundo, recordando que sua relação anterior, com o pai de sua bebê, quando passou do flerte para namoro, também foi segredo, porém, por decisão dele.Havia se permitido sonhar naquela época, acreditando nas promessas vazias de casamento, de que ele precisava de tempo para apresenta-la aos pais, por morarem em outro es
Na consulta com a obstetra, Guilherme estava sentado ao lado de Tábata, segurando sua mão, enquanto ela olhava os quadros com imagens de bebês e mensagens sobre maternidade preenchendo as paredes brancas.— Está se sentindo bem? — ele perguntou apertando de leve a mão dela, sentindo o nervosismo dela desde que entraram na sala.— Sempre sinto um pouco de receio nas consultas — admitiu acariciando a barriga. — É como se estivesse prestes a fazer uma prova, mas o resultado é a saúde dela.Compreendendo o motivo da insegurança, visto que tinham passado por momentos delicados na primeira consulta a respeito da saúde da bebê, ele inclinou-se beijando a testa dela com carinho.— Estou aqui por vocês! — garantiu recebendo um beijo doce em retorno.A porta se abriu e a Dra. Mariana entrou com o costumeiro sorriso calmo, os olhos verdes
Os dias ao lado de Guilherme passaram a ter um ritmo gostoso para Tábata. Se entendiam com perfeição e ela não tinha dúvidas sobre os sentimentos dele, tão pouco sobre os próprios. A única razão para não aceitar expor que estavam juntos era o temor de como seria a aceitação dos parentes dele, principalmente quando soubessem do passado dela.Ele dizia para não se preocupar, mas Tábata não conseguia. Sabia que Guilherme valorizava a família e queria fazer parte dela junto com sua filha. No entanto, não era boba de achar que Simone desistiu de afastá-la de Guilherme, e era bem capaz de contar de um jeito deturbado seu passado para os parentes dele se soubesse que estavam juntos.Preferia ir com calma. Com essa intenção, além de aproveitar as visitas matinais de Paulina para firmar uma amizade com a prima dele, sempre ia com Gui
Onze dias depois, o silêncio da madrugada foi interrompido pelo gemido de dor escapando dos lábios de Tábata. Uma pontada intensa atravessou seu ventre, e ela levou a mão automaticamente à barriga arredondada, se sentando desajeitada na cama.— Ai...! — soltou arfante, iniciando a respiração aprendida nas aulas e tentando não entrar em pânico. Outra contração a atingiu e ansiosa bateu no ombro de Guilherme, deitado ao seu lado. — Gui... Guilherme...! Acorda...!Sonolento, ele abriu os olhos sem se mover muito e quase voltando a dormir, mais outro gemido de dor dela o despertou por completo, fazendo-o sentar assustado.— Taby? O que foi? — perguntou confuso, a voz rouca e ainda carregada de sono.— Acho que... ela... está chegando...! — A mistura de dor e ansiedade transparecia em cada palavra solta por Tábata entre
O sol poente tingia o quintal da casa de Lee Mamoru com tons dourados, criando uma atmosfera acolhedora e tranquila. Sentada em um banquinho junto à parede, sua prima Tábata Mamoru sentia-se nervosa enquanto observava Guilherme Perez treinar kung fu com Lee. Seu coração batia descompassado, ansioso pelo momento de coragem, aquele que a faria chegar no rapaz e fazer o pedido que martelava em sua mente desde que acordou naquela manhã. Sendo sincera consigo, aquele pedido dominava seus sonhos desde que conheceu Guilherme.O vento suave brincava com os fios soltos dos coques duplos prendendo seu cabelo, quando, enfim, o treino acabou e Taby ergueu-se para colocar em ação seu desejo.Graças aos céus seu tio chamou seu primo, que correu para dentro da residência sem perceber as intenções dela. A presença dele inibiria sua intenção.Concentrado em tirar o suor do corpo, lavando o tórax fortificado e o rosto no tanque, Guilherme não reparou em sua aproximação, ou não se importou. Taby temia p
A primeira vez que recebeu uma amostra da raiva de sua mãe, Tábata Mamoru tinha sete anos. Era uma menina magrela, com longas madeixas marrons espremidas até as lágrimas em dois coques alto, feitos todas as manhãs por sua mãe a fim de evitar piolhos. Já naquela época notava que não era amada como os outros três irmãos e tentava, dentro das possibilidades de sua tenra idade, agradá-la e demonstrar que desejava ser aceita por ela.Do seu ponto de vista – que persistiria nos anos seguintes – era uma filha exemplar. Ajudava nos afazeres de casa, nunca respondia os mais velhos, respeitava todas as regras de comportamento e ordens de seus pais e, por mais que não gostasse em alguns momentos, ajudava nos cuidados de seu irmão seis anos mais novo.Mas nada satisfazia sua mãe. O desagrado e desaprovação sulcavam o rosto dela toda vez que olhava em sua direção. Por isso, em sua inocência infantil, achou que se maquiar como ela a faria perceber que a amava e queria ser igual a mãe. Entretanto, q