A casa de Guilherme ficava em um bairro de classe média, arborizado, jardins na maioria bem cuidados e casas que lembravam as de bonecas. No caminho Tábata visualizou um parque familiar, com crianças correndo e brincando com os aparelhos colocados especialmente para elas: escorregadores, caixas de areia, entre outros. Era um bairro perfeito para criar uma família, o que estava longe de combinar com a visão que tinha de Guilherme.
Ela nunca questionou o primo a respeito do Perez, mas sabia que continuava solteiro, por isso presumiu que vivesse em um apartamento frio e solitário como o dono. Mas o bairro e a pequena casa de fachada creme e telhado de lajotas estavam longe de corresponder às suas expectativas. Parecia à casa perfeita para um comercial de margarina, só faltava o casal e as crianças felizes no quintal.
Ele estacionou dentro da garagem, construída do lado da casa e com acesso ao imóvel, fechando a porta com o controle enquanto descia e dava a volta para abrir o lado dela. Distraída olhando para as ferramentas dispostas ordenadamente em uma das paredes, Tábata errou o lugar de pisar e cairia no chão se ele não a segurasse contra o peito.
— Obrigada — repetiu envergonhada a palavra que adotou desde que o reencontrou. — Pode me colocar no chão.
— Você está muito leve — ele comentou ainda envolvendo-a nos braços, os olhos claros presos nos dela e o rosto perigosamente perto.
— Sou magra...
— Esta grávida, deveria pesar um pouco mais.
— Por acaso tem experiência em carregar grávidas?
Percebeu um olhar estranho dele, mas foi rápido.
— Não. Mas tenho certeza que está magra demais para seu estado. Seu rosto também está abatido, pensei que fosse pelo ocorrido, mas agora tenho minhas dúvidas. — Guilherme comentou, examinando o rosto dela com atenção. — Esta se alimentando bem?
— Vai bancar meu pai agora? — Tábata perguntou com riso na voz, pois não estava zangada, achava fofa a preocupação excessiva dele. — Advirto que ele não se importaria com meu peso. Então, por favor, pode me colocar no chão?
— Não queria estressá-la. — Ele o fez parecendo verdadeiramente sem graça.
— Não estressou — esclareceu seguindo-o para dentro da residência.
Por dentro a casa era ainda mais perfeitinha, e descobriu isso conforme Guilherme mostrava os cômodos. Sala com um sofá para quatro pessoas e duas poltronas, mesinha de centro de madeira, estante com livros de direito, cds, dvds, todos organizados em seus lugares, televisor de tela plana, aparelhos eletrônicos e quatro porta-retratos da família, não havia nada fora do lugar ou sujo. A pequena cozinha seguia o exemplo de arrumação e limpeza com seus móveis brancos. Lavanderia simples e prática. Só havia dois quartos na casa, um pequeno transformado em escritório e o quarto principal, maior e com banheiro individual.
— Você ficará aqui. — Guilherme indicou quando passou pela porta do quarto principal.
— Aqui? — Olhou para a cama de casal e depois para ele, agradecendo mentalmente sua pele bronzeada ocultar qualquer possível marca que a quentura em seu rosto deixaria. — Esse quarto é o seu, não é?
— Ficarei no escritório.
— Lá não tem cama. E suas roupas... — Apontou para o enorme guarda roupa branco embutido na cama.
— Tenho colchão inflável e levarei algumas roupas. — Antes que Tábata mostrasse resistência, Guilherme justificou sua decisão. — Você precisa dormir em um lugar adequado.
Tábata aceitou, sorrindo agradecida. Guilherme fazia mais por ela do que seus próprios pais, não fazia ideia de como retribuiria, mas um dia, demorasse o tempo que fosse, conseguiria fazê-lo.
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Se remexendo no pequeno colchão inflável que colocou no quarto que usava como escritório, Guilherme não conseguia parar de pensar na mulher ocupando seu quarto.
Era impossível não pensar na situação delicada de Tábata, as circunstâncias injustas que os reuniu e como ela estava lidando bravamente com tudo. Ser expulsa de casa pelos próprios pais por optar manter uma gravidez sendo solteira, sem apoio do parceiro e de ninguém próximo era algo que quebraria qualquer mulher. Mas Tábata mostrou-se forte e determinada a cuidar do bebê, mesmo que sozinha.
Como os pais dela podiam ter feito isso? A abandonando quando mais necessitava? Guilherme suspirou, uma pontada de indignação e de identificação o atingindo. Conhecia o gosto amargo do abandono e sabia que Tábata necessitava mais que um teto.
Seus pensamentos se moveram para o bebê que ela carregava. Como seria a vida daquela criança?
Mesmo quando Lee e o pai dele voltassem Tábata e o bebê não teriam estabilidade. Seu amigo ia de um lado para o outro constantemente devido o trabalho. Não era a vida ideal para uma mulher desempregada com um recém-nascido.
Não bastava oferecer um teto temporário. Ela precisava de mais que isso: precisava de segurança, apoio, de alguém que estivesse ao lado dela em cada passo, alguém que garantisse que nem ela nem a criança sofressem mais abandono e tivessem todo o cuidado que necessitavam.
Sentou-se no colchão, apoiando os cotovelos nos joelhos, os olhos vagando pela escuridão até se fixarem em um canto específico do cômodo, onde uma grande caixa coberta por um lençol e uma pequena cômoda branca estavam praticamente invisíveis, cobertos pelas sombras da noite.
— Vou ajudá-la — comprometeu-se ao deitar-se e fechar os olhos. — Vou dar a ela e a esse bebê o que precisam.
O desconforto físico persistia, mas sua mente relaxou diante da promessa. Amanhã seria um novo dia, e ele tinha muito a fazer para cuidar adequadamente de Tábata e do bebê.
~
N/A: O que será que ocorreu com Guilherme para ele ter tanta admiração pela atitude de Tábata e querer fazer mais do que foi pedido? Descubra nos próximos capítulos <3
Ao acordar a primeira coisa que Tábata registrou foi o cheiro delicioso de café impregnando o ar. Seu estômago gemeu de apreciação, imaginando que o caçula em breve a sacudiria para tomarem o café em família. Foi o silêncio que a despertou para sua realidade, a fez sentar na cama e olhar ao seu redor com o coração apertado.Não haveria mais nenhuma refeição com sua família. Foi expulsa da casa por eles.Tombou o corpo novamente na cama, olhando cegamente para o teto branco, pensando no que fazer dali em diante.Do momento em que recusou a proposta de abortar do pai de seu bebê, até falar para seus pais sobre a gravidez, teve tempo para pensar nas consequências. Apesar de suas desavenças com a mãe, tinha uma vida estável, um trabalho garantido e teto seguro. E abriu mão de tudo isso ao decidir ficar com a crian&cced
Depois que Guilherme saiu para o trabalho, Tábata sentiu-se inquieta. Não era acostumada ao silêncio. Sua casa era o pandemônio todos os dias. O pai, que sofria com a audição limitada devido a um derrame a cerca de três anos, deixava o volume do televisor nas alturas, o que exigia que os demais falassem em tom alto. Sua mãe sempre gritava por qualquer motivo, enquanto os irmãos mais velhos discutiam. Só ela e o caçula, Thomas, traziam a tranquilidade no lugar, isso por se refugiavam no que amavam: ele nos livros e ela nas antiguidades.Não tinha mais o trabalho para distrai-la dos problemas. Não tinha mais nem família para perturbá-la, concluiu num longo respiro.A certeza de que, com exceção do caçula e talvez seu pai, ninguém sentia sua falta não era suficiente para que se esquecesse deles. Quem cuidaria do pai? Pesquisaria novos it
Sem ter o que fazer e desejando retribuir a ajuda de Guilherme, Tábata decidiu limpar a casa. Não era uma grande cozinheira e, com a gravidez avançada, encontrar um novo emprego parecia impossível naquele momento. Por isso, organizar a casa e causar o mínimo incômodo possível durante sua estadia ao menos mostraria o quanto era grata.Depois de limpar sem dificuldade a sala, a cozinha, o quarto em que estava e os corredores, dirigiu-se ao escritório de Guilherme. O ambiente, assim como os demais, era milimetricamente organizado, com poucos objetos em cima da pequena escrivaninha. Uma leve camada de poeira era o máximo que encontrou em todos os cômodos, ali, em que havia poucos móveis, não foi diferente.— Meus irmãos deviam ter umas aulas de limpeza com ele — murmurou impressionada por até o colchão inflável, estar vazio e arrumadinho na caixa, como
A chegada de Guilherme para almoçar não surpreendeu Tábata, supôs ser parte da rotina dele, o que causou estranheza foi que ele parecia mais preocupado em alimentá-la do que comer.Desde que pisou os pés na casa, encontrando-a assistindo televisão, Guilherme esquentou a comida do dia anterior e a chamou para comerem juntos. Tábata teve a ligeira impressão que não fez o prato dela, porque se antecipou montando-o.— Vai comer só isso? — ele questionou olhando com reprovação a comida em seu prato— Tem bem mais do que no seu — afirmou apontando para o dele com o garfo— Mesmo grávida está muito magra. Não parece se alimentar direito.Ela o encarou irritada.— Apesar do que insinua, me alimento bem, é o estresse... e você bancando o meu pai não vai ajudar em nada.— N&
Quando Guilherme chegou em casa, Tábata sentiu imediatamente o cheiro irresistível que emanava das sacolas em suas mãos. Seus olhos brilharam enquanto o seguia até a cozinha, a curiosidade aguçada pelo aroma saboroso.— Nossa, que cheiro bom! O que é? — perguntou seguindo-o até a cozinha.Ele pousou as sacolas na mesa e, sem responder imediatamente, abriu as embalagens, revelando os pratos que comprou no caminho.— Chow mein [1]com molho de ostra, legumes e carne de porco — disse, sorrindo satisfeito ao abrir a segunda embalagem antes de olhar para ela. — Ah, e tem guioza[2] também.O estômago de Tábata pulou eufórico de felicidade e seus olhos salivaram diante dos pratos.— São os meus favoritos!— Eu sei — ele disse com um sorriso de puro orgulhoso por sua façanha. — Pode comer à vontade, &e
Depois de tomarem o café da manhã juntos, Guilherme e Tábata caminharam lado a lado até a garagem. Girando as chaves do carro na mão, ele olhou para ela de soslaio ao parar ao lado do veículo, um pequeno sorriso brincando em seus lábios.— Não exagere limpando a casa, está bem? — pediu. — Tenta descansar um pouco e, por favor, se alimente direito.Bem-humorada, ela deu uma risadinha e balançou a cabeça.— Como é que eu vou me desgastar em uma casa onde cada coisa está no seu perfeito lugar? — retrucou, estendendo um dedo em direção as ferramentas alinhadas em uma das paredes da garagem. — A casa de um verdadeiro perfeccionista. — provocou. Mas, ao lembrar-se de algo, observou cautelosa: — Bom, com exceção do seu escritório…Guilherme ergueu uma sobrancelha, surpreso com a men&c
O consultório da obstetra estava silencioso, apenas o som suave do ar-condicionado preenchendo o ambiente. Deitada na maca, Tábata olhava para o monitor ao lado, onde o ultrassom exibia borrões indefinidos para seus olhos destreinados. Guilherme estava ao seu lado.Depois dos exames iniciais, ela não queria ficar sozinha e, como se captando isso, ele se ofereceu para acompanha-la no ultrassom. Foi natural ter a ajuda dele para se ajeitar na maca, assim como segurar a mão masculina em busca de conforto.Mesmo tendo dito várias vezes que estava bem, temia que ele estivesse certo sobre o modo com que lidou com a gravidez até ali, que algo estivesse errado com seu bebê por sua culpa.O ambiente ficou silencioso, exceto pelo som suave do aparelho de ultrassom, enquanto a obstetra, uma mulher de meia idade de nome Mariana de sorriso gentil, movimentava o transdutor pelo gel espalhado no ventre de Tábata com
Tábata e Guilherme caminharam em silêncio até o estacionamento do hospital, cada um envolvido em seus pensamentos. A noite preenchia o céu e um vento fresco balançava suavemente o cabelo dela, que observava ele pelo canto do olho ainda pensando no que ocorreu ao fim da consulta.Estava confusa, perdida entre a preocupação pela bebê e o novo envolvimento de Guilherme naquilo tudo. Ele parecia tão natural, tão à vontade com a ideia de participar de algo que ela achava que seria apenas responsabilidade sua.Parecendo despreocupado, ele girava a chave da Ford Ranger no dedo até chegarem à vaga. Quando se acomodaram no carro, ele enfim explicou sua atitude.— Só pra esclarecer, não vi necessidade de corrigir a médica quando presumiu que eu fosse o pai da bebê por achar desnecessário. — Guilherme ligou o veículo. — E &eacu