A TENTAÇÃO

(Leandro)

A porta do escritório onde eu estava se abriu e o capiroto entrou, vestindo um resto de pano transparente que não dava nem pra chamar de roupa, os bicos dos peitos do capeta estavam oriçados e a minha primeira reação foi voltar a olhar pras pastas que eu estava mexendo na hora pra não cair nas artimanhas do diabo.

Eu havia colocado uma placa avisando pra ninguém entrar na sala e nenhuma pessoa teve a audácia de passar por cima de uma regra estabelecida por mim, mas a filha da dona Maria, que havia acabado de chegar na cidade decidiu ignorar a placa e invadir os meus aposentos.

Quando a perguntei sobre ela não ter visto a placa que estava na porta, ela me deu uma justificativa que calaria a boca até do papa.

Eu me dei conta de que eu não estava lidando só com o demônio, mas também com a legião inteira dele.

Ela perguntou se estava errada em dizer que ela não precisava pedir permissão pra entrar na casa do Pai dela, e eu fui logo mudando de assunto pra ela não se sentir no direito de fazer isso sempre.

Eu perguntei o que ela queria enquanto desviava o meu olhar pras pastas outra vez, a presença dela era uma verdadeira ameaça pra mim, não por eu estar me sentindo atraído por ela, mas por saber e sentir as reais intenções dela, afinal alguém jamais iria ao encontro de um padre vestindo uma blusa branca sem sutiã e mostrando os bicos dos peitos, pra mim ela era só uma alma perdida.

Ela não respondeu a minha pergunta, mas tentou se aproximar de mim como um leão atrás de sua presa, e eu fugi dela como o diabo foge da cruz, eu a encarei e disse pra ela se retirar, pois eu tinha bastante coisa pra fazer.

Os olhos dela eram penetrantes e selvagens, e eu nunca havia visto uma mulher tão despida de si mesma, ao ponto de revelar o que de fato ela era sem nenhuma cerimônia, porém eu não gostei do que vi, na verdade eu não gostei do que senti quando ela me invadiu com o olhar dela.

Ela disse que eu parecia mais amigável quando fomos apresentados e fez questão de me chamar pelo nome, então eu percebi que ela estava forçando uma intimidade que eu não queria ter com ela.

Eu disse pra ela me chamar só de padre, e ela me questionou se "Leandro" não era o meu nome, e o nervosismo me invadiu de uma maneira inesperada, como se ouvi-la pronunciar o meu nome fosse algo inapropriado, como se eu tivesse ferindo a Deus a permitir tamanha intimidade.

Em uma tentativa desesperada de fugir, eu mandei ela se retirar e abri a porta pra que assim ela fizesse, ela sorriu, balançou a cabeça e caminhou até a porta fixando os olhos dela nos meus, ela perguntou se eu estava com medo dos meus instintos e eu disse que não sabia do que ela estava falando, e finalizei mandando ela cuidar da mãe dela.

Eu fechei a porta sentindo algo novo, era um sentimento carnal, um sentimento de desejo por aquilo que é proibido, as batidas do meu coração me denunciavam, e eu estava envergonhado por ter permitido que o demônio influenciasse meus sentimentos e emoções.

Eu ouvi as risadas dela pelo outro lado da porta, não se tratava apenas de uma garota aparentemente inocente, ela estava tomada pelo próprio diabo e ele queria me desviar da vontade de Deus.

Eu tentei trancar meus pensamentos impróprios e voltei a rezar, e rezei noite adentro na tentativa de exterminar o pecado que eu havia cometido, e quanto mais eu rezava, mais os bicos dos peitos da Letícia apareciam na minha mente, como se eu tivesse vivendo uma guerra entre carne e espírito, entre anjos e demônios.

— Santo Deus, tenha piedade de mim.

Eu já havia passado por várias tribulações, mas nunca fui tentado por uma mulher, e isso me assustou de uma forma aterrorizante.

Depois de eu me livrar de todos os pensamentos impróprios que tive eu pude dormir, e logo o dia amanheceu, anunciando que a tempestade havia passado, isso era o que eu pensava, até ver a Letícia rezando na igreja.

Assim que eu a vi, pensei em me esconder e evitar me aproximar dela, mas o meu papel de padre me impediu de tomar tal atitude.

Além dela, existia mais três pessoas rezando, eu abençoei as três e fui falar com o demônio.

Ela estava com o olhar baixo, fingindo não prestar atenção em mim, mas quando me aproximei dela ela levantou o olhar e eu estremeci.

— Que diabos...

Eu falei alto demais, chamando a atenção das outras pessoas.

Letícia: Você tem algum problema comigo padre?

— Não, porquê eu teria?

Letícia: Eu ouvi você abençoando as outras pessoas, e na minha vez, você xinga?

— Eu não xinguei, padre não faz esse tipo de coisa.

Letícia: E por qual motivo você mencionou o diabo assim que olhei pra você?

— Você sempre teve essa péssima mania de fazer questionamentos fora de hora?

Letícia: E qual seria a hora certa pra obter as respostas para os meus questionamentos, padre?

Estava cada vez mais difícil manter uma conversa amigável com ela, parecia que ela estava fazendo tudo propositalmente apenas pra me irritar.

— Eu não sei qual é a hora certa, mas com certeza não é agora.

Letícia: Você não acha que pra ser um padre é necessário ter um espírito manso?

— Eu tenho um espírito manso.

Letícia: Então é assim que você trata todos os fiéis que o procuram?

— Não! Trato assim apenas os que são tomados pelo diabo.

Eu dei as costas pra ela na tentativa de fugir mais uma vez, mas ela me interrompeu.

Letícia: Então você está me dizendo que eu estou tomada por ele?

Eu olhei pra trás e a encarei com desdém, afinal eu já estava extremamente irritado e isso quase nunca acontecia.

— Vai fazer alguma diferença se eu afirmar isso pra você?

Letícia: Sim, fará muita diferença, pois nunca vi um padre fugir do demônio, reze na minha cabeça então padre, pra vê se o demônio que há em mim vai embora.

Uma raiva incontrolável se apoderou de mim, como se existisse apenas eu e ela na igreja e ninguém mais, eu ignorei as pessoas que ali estavam e ignorei até mesmo Deus, pois uma atitude assim jamais poderia ter saindo de mim.

— Saia da minha igreja, agora.

Eu disse gritando, como se eu não tivesse domínio sobre mim mesmo.

Ela se assustou, ficou em pé, e entramos em um embate visual.

Letícia: Tudo bem padre, eu saio, mas eu volto, até porquê essa igreja não é sua e sim de Deus...

Ela deu um passo em minha direção e falou bem no meu ouvido.

Letícia: Mas os seus pensamentos, esses sim não são pensamentos de Deus, cuidado padre, talvez seja você o possuído.

— Fora daqui.

Gritei mais uma vez, ela se afastou de mim e saiu andando, rebolando aquela bunda que me fez virar o rosto pra não olhar.

Eu coloquei a mão na cabeça e me dei conta que outras pessoas estavam na igreja e haviam presenciado tudo.

Eu olhei pra eles que estavam assustados me encarando.

— Desculpem a minha atitude desequilibrada, eu estava apenas defendendo a casa do Senhor.

Eu saí andando pra parte interna da igreja e fui rezar mais uma vez, pois eu sabia que eu tinha errado, afinal na minha posição, aquilo jamais poderia ter acontecido.

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