Daryk
O cheiro fresco de sangue inundava minhas narinas e para onde eu olhasse, via apenas a morte.
Os seres se enfrentavam em meio a escuridão da floresta. A lua banhava seus filhos através das pequenas frestas entre as árvores. Eu lutava pelos meus já em menor número. Estávamos morrendo.
Meu lar era consumido pelas chamas e, embora meu sangue fosse o alvo, quem estivesse pelo caminho perderia a vida. Em breve eu seria o alfa, meu pai estava próximo de me passar esse título, no entanto, o destino quis de outra forma.
Nosso mundo estava morrendo, sendo sugado pouco a pouco. Nós dependíamos da magia, mas ela também servia como combustível para seres malígnos que almejam poder. Havia um bruxo, ele começou tudo isso, sua ambição por controle e vida eterna plantou a escuridão nos corações de muitos, a magia limpa foi se tornando negra e o solo infértil.
Mas não era só ele que se tornava estéril. Nossas fêmeas não geram mais filhotes, a última geração foi a minha e já tinha muito tempo. Isso não se limitava a apenas os lobos, mas a todos os seres desse mundo. Quando a magia desse mundo acabar, ele vai procurar outro e fará o mesmo, depois, repetirá mais uma vez em outro.
Minha família liderava um grupo rebelde, nós lutamos por nosso mundo, mesmo que isso significasse perder muitos dos nossos, seria assim até restar o último.
Olhando para aquele campo de batalha em meio às árvores que um dia foram majestosas, lamentei por aqueles que lutaram tão bravamente, talvez eu morresse ali, mas iria até o fim. Até meu último sopro de vida.
— Daryk, você precisa ir. — Arin olhou-me brevemente, não podíamos nos distrair, eram muitos. Arin estava quase sem forças.
Arin lutava com sua magia, o dom herdado da nossa mãe, eu lutava em forma de lobo, porém, nada do que fizéssemos agora seria suficiente para contornarmos aquela situação. Eles nos encurralaram.
Desviei a tempo do ataque de um lobo e minha mordida foi o suficiente para deixar um estrago na lateral de sua cabeça, porém, não tive tempo para olhar novamente para meu irmão, fui atacado por uma besta de pelagem cinza, a pancada foi forte o suficiente para jogar-me contra a árvore. A carne da minha pata traseira foi rasgada pelas longas garras da criatura que não era nem lobo e nem homem, era apenas uma besta irracional criada para matar.
Fui agarrado e arremessado novamente, a força daquela besta ia além da minha. O impacto foi suficiente para que eu perdesse a forma lupina. O desespero atingiu Arin, ele usou quase toda sua energia para jogar os lobos e bestas longe. Assim que abaixou-se na minha frente, criou uma barreira ao redor de nós dois. Eu estava muito ferido e não tinha condições de lutar naquele momento, embora a cura fosse acelerada, não daria tempo. Eu não estava conseguindo me recuperar na velocidade certa devido a exaustão.
— Daryk, olha pra mim! — Arin segurou em meu rosto. — Não vamos conseguir, estamos em menor número e minha barreira não vai aguentar por muito tempo. Você precisa ir. — Ajudou-me a levantar enquanto os lobos e bestas se jogavam contra a barreira tentando ultrapassá-la. — Eu jurei te proteger, jurei aos nossos pais, não posso quebrar essa promessa.
— Não vou te deixar, não me peça isso — disse com dificuldades ao meu irmão mais velho.
— Lembra do que nossa mãe disse? — Arin sorriu naquela ternura que também era herdado dela. — Ela disse que você seria nossa última esperança, que seu destino estava traçado e que teria um papel muito importante no futuro.
— Arin. — Olhei brevemente para os seres que continuavam se jogando contra a barreira. — Vamos sair daqui juntos.
— Eu estou feliz por conseguir cumprir minha missão, irmão. Eu sempre soube que esse dia chegaria, então não fique triste.
— Eu não aceito que seja assim, eu…
— Eu te amo, me perdoe — Arin interrompeu-me e me abraçou.
Após isso, fez um rápido feitiço e bateu a palma contra o meu peito, o impacto me fez cambalear para trás, a dor era quase insuportável.
Ele aprisionou meu lobo.
Ainda atordoado, não tive tempo de recuperar-me, Arin fez o impensado, Algo que ele jamais poderia fazer ali naquele lugar. Um portal foi aberto e ele me jogou dentro dele.
— Não!! — Gritei e levantei com dificuldades para, em seguida, correr para alcançar a passagem que estava se fechando.
Do outro lado, Arin sorriu. A barreira ao seu redor se desfez permitindo que chegassem até ele.
— Viva, Daryk…
Foi a última coisa que ouvi antes do portal fechar.
— Não!! — Meu grito ecoou pela mata, agora silenciosa.
SeleneEnfim, estava de volta.Uma música tocava no som do carro e a estrada só não estava mais escura devido a lua cheia alta no céu. Eu gostava de noites assim, iluminadas, sempre achei fascinante, às vezes passo horas a olhando, é como se me prendesse, me hipnotizava.Hoje, com vinte e sete anos nas costas, voltava pra casa com certo orgulho pelas minhas conquistas, mesmo assim, ainda sentia que algo me faltava. Sempre acreditei que o futuro guardava algo grandioso para mim, mas com o tempo, fui apegando-me cada vez mais a realidade maçante que a sociedade impõe: Estudar igual uma louca para fazer uma faculdade, depois, aceitar a rotina árdua do dia a dia por um salário, e claro, não menos importante, casar e ter filhos.O que mais poderia querer? O que mais... Era uma pergunta recorrente que eu ainda não tinha respostas.A faculdade foi algo que lutei muito para ter, apesar da minha família sempre apoiar-me, queria conquistar as coisas por mérito próprio. Um orgulho besta talvez
SeleneO que foi aquilo?Levei a mão na cabeça, atordoada, demorei alguns segundos para recuperar os sentidos e felizmente, eu estava de cinto.— Por Deus… é um homem! — Senti o desespero. — Eu... eu o matei?O farol iluminava o homem mais na frente que ainda estava de pé, felizmente, eu não o atropelei, mas suas pernas cederam no momento seguinte e ele caiu.Apertei o volante, ele estava ferido e… O que um homem nú faz no meio da estrada em lugar desses? Há chácaras e fazendas nas proximidades, mas são distantes da rodovia. Apesar disso, eu sentia que deveria ajudá-lo, estava aflita e minha intuição era forte o suficiente para que eu saísse do carro, mesmo que racionalmente, entendesse que talvez fosse perigoso. Nervosa, desci do carro. Firmei meus pés no chão buscando o equilíbrio, minhas pernas estavam moles.Forcei-me a andar mesmo com os joelhos trêmulos, ele não estava muito longe do carro e ao redor não tinha nada além da floresta. E quando cheguei perto, fiquei horrorizada co
SeleneO homem estava em pé de braços cruzados em frente a janela, ele não se deu nem o trabalho de cobrir seu corpo, suas costas largas e músculos bem definidos estavam parcialmente cobertas por seus longos cabelos lisos. As pernas torneadas e aquela bunda... Mas ele olhou-me com seriedade e senti vontade de recuar.Respirei fundo e me recompus.— Você não deveria estar fora da cama — disse um pouco constrangida.Certamente, lindo. Uma beleza única e selvagem. Os cabelos negros combinavam com a pele bronzeada. Seus traços eram fortes e seus olhos negros... olhos profundos, misteriosos… Senti um arrepio quando me perdi naquele olhar, mesmo que breve.Que estranho.— Como está se sentindo? — perguntei finalmente entrando mais no quarto, mas ainda permaneci distante dele.Ele continuou me olhando, como se não entendesse. Seus lábios continuavam cerrados, mas os olhos percorriam meu corpo, sentia-me avaliada e desnuda. Ele parecia um guerreiro de histórias fictícias.— Você entende o qu
Selene— Não. Eu estou nervosa desde que aconteceu o acidente. Ele acordou e pareceu bem, mas não falou nada ainda. — Desviei o olhar ao responder. Eu sempre fui uma péssima mentirosa e em muitas vezes, preferia deixar tudo as claras, mas não tinha essa vontade agora.— Hum, ele deve estar atordoado ainda. — Eu também acho, é normal sentir-se assim depois de algum trauma. — Tentei falar naturalmente e abri um armário em busca de uma bandeja. — Eu vou levar alguma coisa pra ele comer, também preciso de algumas roupas.— Eu já separei algumas roupas, mas não sei se vai dar. Erik é menor que ele e até agora não acredito que conseguiu socorrer ele sozinha. Já viu a diferença de alturas entre ele e você? — Ele é um pouco alto mesmo.— Ele é bem grande em vários sentidos. — Loren sorriu ao levantar, ela colocou o prato cheio de legumes descascados na pia e parou ao meu lado de braços cruzados. — Não acha essa história muito estranha, Selene? O que esse homem fazia ali naquele lugar? Aind
DarykQuando aquela fêmea chegou mais perto, senti uma palpitação estranha em meu peito. Era uma bela fêmea, apesar de estar com meus sentidos fracos consegui sentir seu cheiro, era bom. Um aroma único que nunca senti antes. Era estranhamente sedutor.Achei gracioso o rubor na sua face por eu estar nu, eu não me importava, mas os humanos tinham outros costumes. Não resisti em chegar mais perto para sentir mais. Os cabelos escuros com leve ondas me faziam querer tocá-lo, mas o que mais me atraiu foram seus olhos cor de jade. Foi o verde mais bonito que já vi, limpos, vivos. Seus lábios cheios em um tom rosa pálido eram terrivelmente sedutores.Por um momento, esqueci de tudo e desejei prendê-la entre meus braços, abraçar suas curvas suaves tão bem expostas naquelas roupas levemente justas. Ela é pequena, delicada. Será que aguentaria a minha dominância?Duvidava.Mas isso não estava certo. Quando ela me tocou, eu reagi inesperadamente. Eu nunca reagi tão rápido assim por um simples to
Selene Alguns dias depois… Terminei de pentear os cabelos e fiz uma trança lateral, era um dia comum de trabalho. Depois que retornei, algumas encomendas surgiram, mas ainda estava recuperando algumas ervas que ficaram abandonadas na minha estufa. Vó Laura tentou cuidar, mas era trabalho demais para uma senhora de quase setenta anos, mesmo que ela insistisse em dizer que aguentava. Bem, ela se orgulhava em trabalhar ativamente todos os dias, nunca se queixava de nada, dizia que trabalharia até seu último dia de vida. Eu tinha orgulho dela. O cultivo de rosas raras e exóticas era o negócio da família, nós tínhamos grandes estufas espalhadas pela propriedade. E, era gratificante ver o resultado do nosso trabalho, mexer com plantas e flores me deixava realmente feliz, esse sentimento certamente era compartilhado com todos os trabalhadores daqui. Daryk parecia totalmente recuperado. Eu finalmente descobri seu nome depois de alguns dias de silêncio, mas era só, ele diz não lembrar d
DarykQuando aquela fêmea saiu por aquela porta, esqueci o que estava fazendo ali. Ela estava linda. As bochechas rosadas e o sorriso me prenderam de tal forma que perdi as poucas palavras que iria lhe dizer. Ela parou na minha frente e admirei seus lábios pintados com um rosa mais forte que a cor natural, o brilho sutil que me fez querer lamber e tirar.— Bom dia. Podemos ir? Sua voz gentil me trouxe calma e acenei antes de responder:— Bom dia.Ela sorriu mais e me prendi em seus olhos que estavam mais bonitos na claridade da manhã. A segui para o carro e forcei-me a desviar o olhar das suas curvas. Eu queria elogiá-la, mas talvez fosse grosseiro e não queria ofendê-la. Essa fêmea parecia sensível e eu não poderia compará-la às do meu mundo onde falávamos mais abertamente e sem pudores. Eu passei a hesitar na presença de Selene.Ela entrou no carro e acompanhei, não gostava desse tipo de transporte, mas tinha confiança nela. — A cidade é pequena, mas é bem abastecida — ela disse
Daryk— Vamos tomar uma bebida? — Selene perguntou ao segurar o chapéu para impedir que o vento levasse. Os fios soltos daquela trança voaram e senti um forte impulso de ter eles entre meus dedos. — Tem uma lanchonete aqui perto e as coisas lá são ótimas.Acenei confirmando e a segui. Apertei as alças das sacolas um pouco inquieto. Aquela situação estava me distraindo, eu não deveria estar ali pensando e agindo como se não tivesse responsabilidades. Há pouco tempo perdi minha família e guerreiros queridos, meu mundo estava morrendo e eu estava aqui satisfazendo uma fêmea que nem era minha. Eu não devia me acomodar e nem gostar da companhia dela, não havia tempo para distrações. Selene abriu a porta do lugar e nos levou para uma mesa mais afastada. Não tem lugares assim no meu mundo, nós vivemos de forma mais primitiva e próximos à natureza. Coloquei as sacolas no chão e me sentei no assento acolchoado na sua frente. — Eu gosto muito da torta de chocolate daqui e as bebidas são muito