Capítulo 2 - Terrorista

Capítulo 2

As luzes retornam abruptamente, ofuscando meus olhos ainda marejados. Antes mesmo que eu possa reagir, sinto dedos firmes ao redor do meu braço. O homem que ouvi ser chamado de Kai está me puxando, com um controle que faz meu coração bater ainda mais rápido. Ele não diz nada enquanto me arrasta até o palco, onde vejo o restante dos reféns já reunidos, todos amarrados. O ar está carregado de pânico, gritos abafados e soluços.

Ele me faz sentar ao lado de uma pilastra. Sua mão aperta meu ombro para me manter imóvel enquanto ele pega cordas e amarra meus pulsos e tornozelos. O tecido áspero arranha minha pele, mas não ouso reclamar. Estou tremendo, tentando conter o que parece ser o início de uma crise de pânico.

Quando Kai termina, ele permanece ajoelhado na minha frente. Seus olhos percorrem meu rosto e, por um momento, penso ver algo mais ali – talvez curiosidade, talvez dúvida. Ele inclina a cabeça levemente, e então sua mão se move para o colar que pende no meu pescoço.

O colar de mais de cem mil dólares que meu pai me deu de presente de aniversário. 

— Não… — Murmuro, minha voz quase um sussurro. Tento me afastar instintivamente, mas não consigo ir muito longe com as cordas me prendendo.

— Por favor… — Imploro, quase inaudível, enquanto ele segura o delicado pingente. — Você pode ficar com ele… e com o meu dinheiro… mas me deixa ir… — As palavras saem trêmulas, desesperadas, enquanto lágrimas deslizam pelo meu rosto.

Kai não responde. Seu olhar fixa o meu, intenso, e por um momento parece que ele está considerando minhas palavras. Mas então, com um movimento brusco, ele puxa o colar. A corrente quebra, e sinto uma dor aguda ao redor do pescoço, onde a pele fica marcada em vermelho. Eu engasgo com um soluço, segurando o grito que ameaça escapar.

— KAIIII! — Uma voz áspera e autoritária o chama. Ele se levanta sem cerimônia, jogando o colar no bolso enquanto se afasta. Fico ali, sozinha, tentando não me desfazer completamente.

Eu ouço fragmentos de conversa enquanto Kai caminha para se juntar aos outros homens. Eles estão discutindo algo sobre uma ligação. Meu coração aperta ao perceber o que está acontecendo: estão planejando entrar em contato com o governo. Querem anunciar a invasão, os reféns, e negociar uma quantia absurda de dinheiro em troca de nossas vidas.

Uma onda de desespero me consome. Não é possível que tudo isso esteja acontecendo. O ar ao meu redor parece mais pesado, difícil de respirar. Tento acalmar meu coração descompassado, mas cada ruído ao meu redor intensifica minha ansiedade.

Do outro lado do palco, ouço um choro abafado. Um dos reféns, um homem mais velho, um dos jurados, murmura algo em voz baixa, implorando pela vida. Um dos terroristas – alto, com um sorriso cruel estampado no rosto – se aproxima dele. Sem qualquer aviso, ele levanta a arma e acerta o homem com a coronha, derrubando-o no chão com um baque surdo.

— NÃO! — O grito escapa da minha garganta antes que eu consiga me conter pelo absurdo da situação. 

Os olhos do terrorista se voltam para mim. Um sorriso maligno curva seus lábios enquanto ele se aproxima, devagar, saboreando meu medo.

— Ah, a princesinha está com medo? — Ele se agacha à minha frente, os olhos brilhando com diversão cruel.

Eu tento me encolher contra a pilastra, desejando desaparecer, mas não há para onde ir. Meu corpo inteiro está tremendo, e lágrimas silenciosas deslizam pelo meu rosto.

— Paul, sai fora. — A voz de Kai interrompe a cena.

O outro homem – Paul, aparentemente – levanta-se com um resmungo irritado.

— Sempre se metendo onde não deve, não é, Kai?

Kai não responde, apenas segura firmemente o braço de Paul, forçando-o a se afastar. Eles trocam olhares tensos antes que Paul desista, lançando-me um último olhar lascivo enquanto se afasta. Meu estômago se revira, e eu desvio o olhar, tentando não sucumbir ao pânico.

Kai volta sua atenção para mim por um breve momento, seus olhos avaliando meu estado. 

— Fique onde está. — Ele diz, sua voz baixa, quase inaudível.

Como se eu pudesse sair com essas cordas me prendendo. 

Não o respondo. 

Kai se afasta de mim com a mesma rapidez com que chegou. Agora, os terroristas estão em uma conversa séria, discutindo como irão proceder. Ouço um deles mencionar uma ligação – algo sobre fazer um acordo com o governo. Meu estômago se aperta ainda mais ao imaginar que a única coisa que podemos oferecer a eles é uma troca por dinheiro. Eles não nos veem como seres humanos. Somos apenas mercadoria.

Tudo parece estar acontecendo muito rápido e, ao mesmo tempo, de maneira caótica. Estou perdida, sem saber o que fazer ou para onde olhar. Tento manter os olhos focados no que está à minha frente, mas a cada movimento, o medo parece tomar mais conta de mim.

Então, ouço uma voz familiar.

— É dinheiro que vocês querem? — A voz venenosa de Noemie – minha inimiga – corta o ar, e sua presença, sempre arrogante, parece invadir o ambiente.

Ela está amarrada a outras garotas, com a cabeça erguida, olhando com um sorriso esperto para os homens armados. 

— Eu tenho uma informação valiosa. Alguém aqui entre nós vale uma grana.

Meu corpo se tensa instantaneamente. 

Não, Noemie… ela não faria isso, não é? 

— Eu posso dizer se vocês me libertarem. — Ela continua, com um brilho de confiança na voz, mas algo em seus olhos me diz que ela está desesperada. Ela sabe que está arriscando muito, mas não parece se importar.

Um dos terroristas, um homem de expressão dura e impassível, aponta a arma para a cabeça dela. Ele parece divertir-se com a ideia de manipular uma mulher tão arrogante. 

— E por que não negociamos assim? — Ele murmura, olhando para ela com um brilho ameaçador nos olhos. — Você diz o nome e continua viva?

Eu me encolho, instintivamente, meu coração batendo forte no peito. Mas o que me assusta ainda mais é a visão de Kai, que se aproxima rapidamente. Ele observa a cena com os olhos fixos, e o ar ao redor parece carregar um peso, como se ele fosse a única coisa que poderia interromper a carnificina iminente.

— Parem! — Ele diz, sua voz firme, mas não agressiva. Ele não hesita. — Ela só está blefando. 

O terrorista se afasta de Noemie com um movimento brusco. 

— Ah, vai se foder, Kai. — O homem rosna. — Você sempre se mete onde não deve. 

Mas Kai não reage. Ele permanece tranquilo, a postura firme, como se estivesse sob controle da situação – e, em algum nível, ele provavelmente está.

Ele olha de volta para mim, e eu sinto a pressão da sua presença aumentar. Ele não se aproxima de mim fisicamente, mas o modo como seus olhos se fixam nos meus me faz sentir que ele está, de alguma forma, se preocupando com o que está acontecendo.

Como se ele soubesse… meu Deus! 

De repente, Noemie fala, e sua voz, que antes estava cheia de confiança, agora soa mais desesperada. 

— Eu sei o nome dela! Eu sei quem ela é! Não estou blefando! Ela vale muito mais do que vocês conseguiram por todos nós juntos! 

Eu congelo. O terror toma conta do meu corpo, e meu estômago se aperta em um nó.

Noemie me entrega sem hesitar. 

— A loirinha ali! Ela é filha do deputado mais votado do estado. — Ela diz, com um sorriso cínico. — Eu sei disso porque a instituição regida por esse teatro recebe doações do pai dela todos os anos. 

Eu fico atônita. Não consigo acreditar no que estou ouvindo. Isso não está acontecendo. O medo é como gelo nas minhas veias. 

Os terroristas se aproximam de mim com um olhar mais atento, e o homem que parecia ser o líder começa a rir, um som baixo e amargo.

— A filha de um dos caras que mandou um dos meus irmãos para a cadeia? — Ele olha para os outros, e eles trocam olhares incrédulos. — Seria muita sorte, não acham?

Ele me agarra com força pelo braço, me levantando do chão, sem se importar com o meu choro contido. Ele me força a olhar para o seu rosto, e posso sentir o cheiro forte de seu suor, a respiração pesada. Ele segura uma faca com precisão, e começa a passar a lâmina bem perto do meu rosto. Eu congelo, meu corpo se encolhendo involuntariamente.

— Seria uma honra desfigurar essa carinha bonita. — Ele sussurra, a lâmina tocando levemente minha pele.

Eu fecho os olhos com força, tentando controlar a onda de pânico que ameaça tomar conta de mim.

— Chega. — Kai ordena, sua voz cortante.

Ele aparece de repente, mais rápido do que eu esperava, e segura a mão do terrorista antes que ele possa me ferir.

— Precisamos verificar se ela realmente é quem estão dizendo ser. Se for, não podemos machucar ela, o preço do resgate será muito mais alto. Não é dia de vingança, e sim se ganharmos dinheiro. 

Meu coração dispara. Eu sei o que isso significa: eles descobrirão sobre os meus pais, e o resgate será uma fortuna. Eles não vão me matar – não ainda. Mas isso só faz com que eu me sinta mais impotente. Estou à mercê deles.

— E como vamos saber a identidade dela? — O terrorista me solta bruscamente. 

Kai me segura antes que eu caia. 

Noemie se apressa em ajudar eles: 

— Guardamos nossas carteiras de dançarinas nos nossos armários. Lá guarda o nome dos nossos pais. 

Os terroristas se entreolham. Kai segura meu braço com mais força. 

— Eu levo ela. — Ele me guia para parte de trás do palácio, onde fica localizado nossos armários. 

Outro terrorista agarra o braço de Noemie, a trazendo junto comigo. 

Eu vou chorando todo o caminho. Isso só vai confirmar a eles o que Noemie me diz. Vão descobrir quem é o meu pai e vão querer me usar como moeda de troca ou até como vingança. Qualquer possibilidade é muito ruim. 

Kai me guia até o meu armário. Ele coloca uma mão no meu ombro, e a sensação do seu toque inesperado me faz sentir algo estranho – talvez uma mistura de conforto e apreensão.

— Fique calma. — Ele sussurra, sua voz suave. Ele se aproxima ainda mais, seu rosto perto do meu. — Predadores gostam de caçar presas submissas. Não seja uma presa fácil.

As palavras dele me atingem de uma forma inesperada. Não sei por que, mas aquilo me dá uma força que eu não sabia que possuía. Assinto, sem falar nada, e abro o armário. Dentro, está o cartão de identificação que toda dançarina ganha ao realizar apresentações, aquele cartão que usamos para facilitar o acesso a alguns lugares.

Eu hesito por um momento, mas então entrego o cartão a Kai, sentindo o peso da decisão. Ele o examina rapidamente, e seus olhos se estreitam.

Os terroristas olham o cartão com desconfiança. Um deles franze a testa.

— Isso não diz nada sobre ela ser filha de algum deputado. 

Eu fico tensa, mas Kai não parece surpreso. Ele entrega o cartão a um dos outros terroristas, que o examina por mais tempo. A tensão no ar cresce enquanto espero pela confirmação. Quando o homem finalmente olha para os outros, vejo a frustração em seu olhar.

— Thomas Moreau. Quem deputado se chama Thomas Moreau? — Um dos terroristas apontam, zombando. 

Meus olhos se arregalam, porque esse definitivamente não é o nome do meu pai. Os terroristas parecem ficar descontentes. O que está segurando Noemie simplesmente a j**a no chão e lhe dá um chute raivoso. Eu arregalo os olhos, me encolhendo contra o armário.

— Sua vadia mentirosa! Nos querendo fazer perder tempo! 

— Não, eu juro! Ela é filha de um deputado!

— Cala a boca, vadia! 

Ele começa a bater nela como se ela fosse a responsável por tudo. Noemie grita em dor enquanto os golpes continuam, e eu vejo tudo em choque. 

Me sinto culpada. Eu sei que ela me traiu, mas eu poderia evitar tudo isso se apenas dissesse a verdade. Sou egoísta por não admitir? 

Abraço meu próprio corpo, tentando me afastar mentalmente de tudo o que está acontecendo. 

Uma mão nas minhas costas me faz saltar. Olho rapidamente para Kai, que está atrás de mim, sua presença confortável, mas ao mesmo tempo, perturbadora. Ele não diz nada.

Mas eu não posso pensar no que ele está fazendo ou tentando fazer. Eu sinto o estômago revirar e, sem querer, tapo a boca, sentindo a necessidade de vomitar. 

— Eu preciso vomitar. — Murmuro, com a voz rouca de tanto chorar.

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