Capitulo Dois

Quando cheguei na casa de Letícia, mal podia conter a empolgação. Estava morando com ela provisoriamente, e queria contar as boas notícias. Abri a porta e entrei apressada.

— Letícia! — chamei, mas a resposta foi o silêncio.

Senti um frio na espinha. Corri pela pequena sala, em direção ao quarto dela, e a encontrei caída no chão. Meu coração disparou. Sabia o que aquilo significava: drogas. Respirei fundo e, com dificuldade a levantei do chão, a arrastando até o banheiro. Abri o chuveiro e deixei a água gelada cair sobre ela.

— Está gelada! — Letícia reclamou, despertando do seu estado entorpecido.

— O que você está fazendo da vida, Letícia? — Olhei para ela, cheia de raiva e preocupação.

Ela levantou os olhos pesados para mim, ainda grogue.

— Vida? Que vida? Não sei o que é isso há um bom tempo — respondeu com um tom amargo.

Ajudei Letícia a se manter em pé, respirei fundo antes de falar. Era triste demais ver minha amiga nessa situação, Letícia chegou ao clube bem antes de mim, ela acabou contraindo uma dívida altíssima com o Mauro, e agora ele a obriga a vender o seu corpo. Além de dançar e tirar a roupa, minha amiga é obrigada a deixar os homens usarem o corpo dela da forma que desejam. Letícia me olhou com olhos cansados e desesperançados.

Mauro sempre que pode tenta me obrigar a me prostituir, mas suas investidas sempre falham. Eu prefiro a morte a fazer algo desse tipo.

Eu tinha tantos sonhos para mim, sonhava em me tornar uma médica, mas agora o que sobrou pra mim, foi tirar a roupa por uns trocados, mas nem posso reclamar, pois se continuasse na rua provavelmente já estaria morta. Não sei se um dia conseguirei perdoar a minha mãe, ela deixou uma menina de dezesseis anos por conta própria e a justiça que deveria me proteger, ficaram ao lado do meu padrasto, como se ele fosse uma pobre vítima. Quer saber de uma coisa: Não vou ficar aqui chorando, vou levantar e agir e o primeiro passo é conseguir aquele emprego de babá. Depois de um tempo, coloquei minha amiga na cama e a cobri. Olhei para ela com tristeza e acariciei seus cabelos.

— Em breve, vou tirar nós duas dessa situação deplorável. — Digo a ela que não respondeu, já voltando a adormecer, mas eu sabia que ela tinha ouvido.

Fui para o meu quarto e comecei a separar minhas roupas para dançar naquela noite. Precisava do dinheiro, mesmo que fosse pouco, para pagar as dívidas e conseguir a nossa liberdade.

No clube, encontrei Letícia nos bastidores. Ela respirava fundo, secando uma lágrima solitária. Perguntei se ela estava bem, e ela respondeu que dentro do possível, sim.

— Obrigada por cuidar de mim mais cedo e desculpe por ter que ver aquilo — ela disse me abraçando. — Como foi lá na mansão dos ricaços?

— Fui selecionada para a etapa final — respondi, sorrindo.

Ela abriu um sorriso genuíno, e por um momento, esquecemos nossos problemas. Comemoramos juntas, mas logo Mauro apareceu, sua expressão irritada.

— Estou pagando vocês para bater papo? — ele nos encarou com a sobrancelha arqueada.

Letícia o afrontou, e ele respondeu com um tapa no rosto dela.

— Hoje, você não terá pagamento — ele decretou.

— Não é justo — Letícia murmurou, segurando o rosto. — Eu sou obrigada a trepar com muitos homens em uma noite para encher teu bolso de dinheiro, não é justo me deixar sem grana, você sabe que eu tenho minhas contas a pagar. — Mauro pegou seu rosto e apertou entre os dedos.

— Quem sabe o que é certo ou errado aqui sou eu. E eu sei exatamente que você gasta todo o seu dinheiro em pó.

Estava prestes a defender Letícia, mas ela me olhou de uma forma que dizia "não faça nada". Me contive com dificuldade sentindo a raiva borbulhar dentro de mim.

— Em cinco minutos, é a sua vez de subir ao palco, esteja pronta ou já sabe. — Mauro se virou para mim.

Respirei fundo, me preparando para a apresentação. Quando anunciaram meu nome de guerra, "Viollet Rose", subi ao palco, deixando a raiva guiar meus movimentos.

Depois do show, desci do palco e fui encontrar minha amiga. Ela estava mais calma, mas ainda machucada pediu para nunca mais tentar defendê-la de Mauro.

— Se ele descobrir que você ainda é virgem, pode leiloar você para algum desgraçado — ela disse olhando para o nada.

Aquelas palavras me atingiram como um soco. Será que isso já havia acontecido com ela? Letícia parecia perdida em pensamentos, e eu prometi a mim mesma que faria de tudo para nos libertar. Saí da sala, deixando-a descansar, e me preparei para a próxima batalha que seria sobreviver mais uma noite naquele lugar.

Enquanto me preparava para a próxima dança, não conseguia tirar da cabeça as palavras de Letícia. A ideia de ser leiloada como um objeto me dava náuseas. Precisava encontrar uma maneira de sair dali, para o bem de ambas.

A noite parecia se arrastar. Subi ao palco mais algumas vezes, os homens me observavam com desejo, houve um momento que um cara tentou subir no palco e precisou ser retirado pelos seguranças.

Quando finalmente a noite chegou ao fim, estava exausta, mas aliviada por mais um dia. Mauro pegou as nossas gorjetas e dividiu 60% / 40%, quer dizer 70% para a casa e 30% para nós. Era humilhante trabalhar por tão pouco, porém era o que tínhamos no momento.

Letícia estava encostada na parede dos bastidores, com os olhos flamejantes de raiva, pois Mauro cumpriu a sua promessa e não lhe pagou.

— Vamos para casa — sussurrei.

— Vamos antes que eu soque a cara de alguém.

Ela também sussurrou e concordei. Finalmente, chegamos ao apartamento pequeno e mal iluminado que chamávamos de lar. Letícia foi direto para o quarto, enquanto fui até a cozinha, preparar uma sopa quente. Quando a sopa ficou pronta, levei uma tigela para Letícia, que estava encolhida na cama.

— Obrigada — ela murmurou, aceitando a tigela.

Depois de comer, ela se deitou novamente, e eu fui para o meu quarto, tentando descansar. Mas o sono não veio facilmente.

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