Um Desejo Estranho

— Então, o que deseja? — O homem de aparência tão rústica quanto o lugar perguntou depois de um longo silêncio.

— Ah, eu…

Ele tinha um olhar intenso, profundo. Embora seus traços fossem fortes a ponto de deixá-lo com uma expressão séria, eu via uma gentileza contida. Tudo nele parecia combinar, desde os cabelos escuros e um pouco revoltos que caiam de forma desordenada por seu pescoço, até aquela barba que acentuava o maxilar definido. Parecia selvagem no primeiro momento, mas olhando-o profundamente, era aconchegante, tranquilo.

Por um breve momento, senti como se tudo estivesse no lugar. Era como chegar em casa.

— Você é a nova moradora ou turista?

— Bem… — Estava agitada, sem saber como agir. — A primeira opção.

— Imaginei, nós estávamos esperando os novos moradores. Seja bem vinda. — Estendeu-me a mão e me ofereceu um sorriso gentil.

Olhei para sua mão e fiquei mais nervosa, porém quando a toquei, senti aquele arrepio, aquela sensação quente. Um calor se formou no meu centro e quando o encarei, ele me olhava de cenho franzido. Seus lábios já não tinham aquele sorriso e imediatamente o soltei.

— Eu… — Por que eu estava tão atordoada? Será que iria entrar em uma crise agora?

— Tudo bem? Precisa de ajuda?

Sua voz grossa era tão agradável, eu queria ouvi-lo mais, no entanto, não estava conseguindo me expressar e cada vez mais, meu corpo reagia de forma estranha. Eu não entendia. Já vi muitos homens bonitos, mas ele… ele tem algo que me atrai terrivelmente. Eu queria cheirá-lo, lambê-lo.

Eu devia estar enlouquecendo.

Analisei seus olhos escuros. Eu queria ver mais da sua pele que estava coberta com uma camisa de gola alta. Eram desejos estranhos para ter por um homem que estava vendo pela primeira vez, mas ele me causava fascínio. Se eu pudesse tocá-lo mais uma vez…

Inclinei-me.

Se eu pudesse…

— Aurora! — Espantei-me e corrigi a postura. Senti vergonha junto àquela irritação. — Meu Deus, menina, quase fico louca quando não te achei! — Minha mãe disse firmemente quando parou ao meu lado e depois olhou para o homem atrás do balcão. — Olá, desculpe entrar assim no seu estabelecimento. Sou Janete, como vai? — Ela estendeu a mão para ele e senti mais vergonha, tanto que olhei apenas para o balcão.

— Thales, o dono do bar. Sejam bem vindas a nossa cidade.

— Muito obrigada. Aqui parece ser muito agradável para se morar.

— Bastante, espero que gostem.

No momento que o olhei novamente, nossos olhares se encontraram, ele sorriu e me senti mais nervosa. Tinha aquele calor que continuava subindo. Meu rosto estava quente.

— Bem, vamos indo. — Minha mãe agarrou em meu braço e me puxou sutilmente. — Foi bom conhecê-lo, Thales, até breve.

— Até.

O encarei uma última vez e a acompanhei ainda atordoada.

— O que você estava fazendo dentro daquele bar, Aurora? Eu levei um susto quando não a encontrei.

— Mãe, não me trate como criança! — Apressei-me e entrei no carro, ela entrou em seguida.

— Então não aja como uma! Todos estavam te olhando, só tinha homens lá dentro.

— Eu só entrei, foi apenas uma curiosidade. Eu só… eu me senti estranha e quando vi, já tinha entrado.

— Estranha? Estranha como?

— Foi só uma sensação esquisita, não importa.

— Claro que importa. Nós combinamos de conversar quando você se sentir diferente, filha.

— Mãe, deixa pra lá, vamos embora, por favor.

Seu suspiro foi longo.

— Ok. Vamos esquecer isso, estamos cansadas também.

Concordei e fechei os olhos ao encostar totalmente no assento. Sentia o início da minha febre e não conseguia tirar a voz daquele homem da minha cabeça, nem mesmo aqueles olhos.

Saímos da rua principal e nos afastamos da parte central da cidade. Chegamos a uma casa que mais parecia uma cabana, toda em pedra e madeira em um estilo diferente das casas centrais. Ao redor muita floresta tomada pela neve. As casas eram distantes umas das outras e ao menos tinha eletricidade.

A frente estava limpa, o carro que limpava a neve parecia passar com frequência. Isso me fez pensar no trabalhão que era manter o chão livre.

O cheiro de essência floral me atingiu forte quando entramos. Para meu olfato sensível, tudo era um exagero. A casa limpa quase brilhava, fora que, as luzes amarelas nas luminárias distribuídas nas paredes eram tão charmosas quanto a decoração rústica.

Na verdade, era bem mobiliado. Na sala, uma lareira de pedras subia até o teto baixo. O jogo de cadeiras acolchoadas tinham poucas almofadas em tons marrons, me senti em um hotel fazenda.

— Tem um gerador nos fundos, no caso de apagões, às vezes acontece devido ao mau tempo. — mamãe disse ao ligar alguns interruptores em um quadro próximo a porta. — O dono da imobiliária me deu uma lista de recomendações, mas vamos nos acostumar. — Ela parou ao meu lado e olhou para a lareira apagada. — Então? O que achou?

— Achei bonitinha.

— Bonitinha?

— Bem, é uma casa pequena com um tapete de pele falsa na sala. Bonitinha.

— Hum… deve ser algo bom então. Vem, vamos ver o resto da casa.

Olhei mais uma vez para a sala pequena e bem organizada. Até mesmo a mesinha redonda de madeira escura foi bem planejada para ficar em frente a lareira.

Aconchegante.

Depois de conferir a cozinha, seguimos pelo corredor e entramos no primeiro quarto, bem pequeno e com uma janela proporcional, sem banheiro e com uma cama de solteiro, até mesmo o armário era pequeno.

— Ficarei nesse quarto, venha ver o seu, recebi algumas fotos e é bem bonito.

Suspirei por saber como eram suas escolhas, nem precisava ver para entender.

— Esse é o quarto suíte. — ela disse e olhei a grande vidraça que ia quase até o chão, mostrava bem a floresta. — Tem uma banheira grande. — Ela abriu a porta do banheiro, mas não a acompanhei, apenas sentei na cama e observei sua animação que ela sempre se forçou a ter. — Será útil nos dias de crise.

— O quarto é bonito, obrigada. — Sorri, levemente.

— Sim, tem uma vista maravilhosa. — Sentou ao meu lado e acariciou minhas costas.

Baguncei meus cabelos rebeldes, estava desanimada para desfazer as malas, mas principalmente, por recomeçar mais uma vez em um novo lugar.

— Vou fazer uma bebida quente pra gente e fazer uma comida. — Levantou depois de um suspiro. — Eu paguei um pacote completo, faxina e supermercado, foi uma boa ideia, imagina ter que fazer tudo isso hoje depois dessa longa viagem, amanhã já vou me apresentar na escola. Pega as malas?

— Pego sim.

— Obrigada, não esqueça que te amo.

— Também te amo.

Joguei-me de costas na cama quando fiquei sozinha. Algo estava diferente, aqueles olhos escuros…

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